Série especial do Sesquicentenário de Aracaju Os números citados pelo presidente da Província chamavam a atenção. O movimento das barras, malgrado a falta de praticagem, de Catraia, de atalaias, revelava as disparidades entre os portos sergipanos. O açúcar e demais produtos que saíam pela Barra do Rio Cotinguiba representavam 2.475.940$906rs, enquanto os demais portos, somados, atingiam 1.101.731$076rs, ou seja, as barras dos rios Real, São Francisco e Vaza-Barris, juntos, não alcançavam a metade do que era exportado pela barra do Rio Cotinguiba (na verdade, barra do rio Sergipe). Quando a comparação é feita porto por porto, têm-se os seguintes números: Barra do Rio Real – 656.371$890 rs, Barra do Rio São Francisco – 277.235$636 rs, Barra do Rio Vaza-Barris – 168.123$550 rs. É fácil constatar que a Barra de São Cristóvão não chegava a 8% do valor exportado pela Barra do Cotinguiba, abastecida pelos tributários do estuário do rio Sergipe. Os números serviram de argumento ao jovem presidente que além de realizar serviços de melhoria nas barras sergipanas, pensar em copiar o Regulamento da Barra do Rio Grande do Sul, decidiu-se por mudar a capital, atendendo ao interesse econômico da Província. Não se tratava como alguns defendem, de “um consignado” para levar adiante idéias de outros, principalmente do Barão de Maroim, mas de um administrador comprometido com o desenvolvimento da terra que governava. São Cristóvão, sem porto e sem produção, dava lugar a Aracaju, onde já estava a Mesa de Rendas e a Alfândega atestando a riqueza açucareira, crescente em toda a região de terras pretas e gordas, os massapês, ao norte de Aracaju. Mudar a capital, portanto, foi uma opção técnica, com forte conotação política, apoiada pelo Império. Dificilmente poderia ocorrer coisa igual com a República, pois os interesses locais, partidários, não deixariam alternativa ao presidente. O mérito do Império foi o de constituir uma elite itinerante para gerir as Províncias, com certo grau de independência e autonomia. Eram os presidentes, os secretários, os chefes de Polícia, os juízes, dentre outras ilustres figuras, que quase sempre estavam empenhados na solução dos problemas do País, em cada uma das Províncias. Independentemente da dimensão territorial, da população, das atividades econômicas, as Províncias tinham nessa elite itinerante a interlocução necessária. Circularam, então, pelo Brasil grandes nomes que com suas biografias de intelectuais, administradores e políticos, preencheram páginas notáveis da história. Inácio Joaquim Barbosa, nascido no Rio de Janeiro em 1821 (o padre Aurélio de Almeida, citando o próprio Inácio Barbosa data o nascimento em 1823), formado em Direito pela Faculdade de São Paulo, em 1844, foi Juiz Municipal, funcionário público, Secretário da Província do Ceará, suplente de Deputado Federal, pelo Ceará, chegando a assumir por algum tempo o mandato, chegou a Sergipe com 32 ou mesmo 30 anos, para governar uma Província que tinha sido administrada por figuras como Joaquim Marcelino de Brito, Manoel Ribeiro da Silva Lisboa, José Mariano de Albuquerque Cavalcanti, José Eloy Pessoa, Venceslau de Oliveira Belo, João Lins Vieira Cansanção do Sinimbu, Manoel Vieira Tosta, Zacarias de Gois e Vasconcelos, Luiz Antonio Pereira Franco, dentre muitos outros brasileiros ilustres, que também governaram outras Províncias, exerceram mandatos legislativos, integraram tribunais, ministérios, deixando marcas que estão na base da história brasileira. Há quem lembre Inácio Barbosa como um “mulato pobre”, o que não deixa de ser uma exteriorização de preconceito, tão em voga durante o Império, quando a economia repousava no braço do negro escravo. A campanha abolicionista vem depois, na imprensa, nas ruas, nos corredores das faculdades, nas lojas maçônicas, nos teatros, num crescente que culmina com a lei de 13 de maio de 1888. Tobias Barreto, mulato genial de Sergipe, pilar essencial da cultura brasileira, sofreu, como poucos, o preconceito racial e foi preterido, algumas vezes, por conta de sua condição mulata. Nos anos de 1850 era muito difícil a um mulato ascender a posição destacada, pois a própria história mostrava que era muito raro a um homem preto ascender à posição destacada. Havia exceção, como a de Antonio Pereira Rebouças, mulato baiano, que foi Secretário da Província de Sergipe, acompanhando o presidente Manoel Fernandes da Silveira, no longínquo 1823. Tratar Inácio Barbosa como “mulato” e como “pobre” era, talvez, a forma de recusar a sua identidade política, sua visão econômica, tratando da Província com a responsabilidade do administrador autônomo, e com os olhos lançados no futuro. Aracaju nasceu, enfim, da coragem de um moço que teve a oportunidade de governar Sergipe e de morrer pela sua idéia e seu feito. E de tal forma a opção era técnica, sob os auspícios da geografia e da economia, que jamais foi abandonada pelos sucessores de Inácio Joaquim Barbosa. Permitida a reprodução desde que citada a fonte “Pesquise – Pesquisa de Sergipe / InfoNet”. Contatos, dúvidas ou sugestões de temas: institutotobiasbarreto@infonet.com.br.
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