Lucindo José Quintans Júnior
Professor Titular no Departamento de Fisiologia e docente no Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde (PPGCS) da UFS.
Num cenário nacional desafiador para a produção científica, o Brasil vivenciou, pela primeira vez em três décadas, uma redução expressiva entre 2021 e 2022. É o que revela um levantamento da renomada Agência Bori. A queda de 7,4% nas publicações científicas coloca o país na última posição entre 51 nações, compartilhando esse ranking com a Ucrânia, atualmente em meio a um contexto de guerra.
O ambiente para Ciência, Tecnologia e Inovação (CT&I) no Brasil enfrenta obstáculos significativos e a Universidade Federal de Sergipe (UFS) não ficou imune a essa tendência, apresentando uma redução de 9,1% na produção de artigos científicos no mesmo período. A Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) aponta para cortes orçamentários e um ecossistema de financiamento impactado, especialmente nas universidades federais, como fatores cruciais para esse declínio inédito. Políticas negacionistas, desestímulos e ataques, particularmente vindos do Governo Bolsonaro, contribuíram para abalar a capacidade de produção científica nacional, ao lado de outros fatores, como os impactos da pandemia de covid-19 e a falta de um plano nacional para CT&I a médio e longo prazos. O cenário desafiador é evidenciado pelos cenários recorrentes de um quadro orçamentário desfavorável e uma política prejudicial para o setor de CT&I.
No entanto, em meio a esse panorama, a UFS emerge como um farol de conquistas notáveis em 2022. A universidade alcançou seu maior índice de publicações em periódicos científicos globalmente reconhecidos, conforme atestado pelos dados da Scopus, uma plataforma líder em resumos e citações de literatura científica revisada por pares, vinculada à Elsevier. Com 43,2% de sua produção científica destacada entre as revistas científicas mais referenciadas globalmente, a UFS superou o índice de 2021, que foi de 42%. É digno de nota o incrível avanço ao longo da última década, saindo de 28% em 2012 para os atuais 43,2%. Projeções para 2023 indicam que a UFS está no caminho para alcançar impressionantes 47 ou 48% de sua produção nas “top 25%”.
Outro destaque positivo é o aumento na colaboração internacional, passando de 30,1% em 2021 para 31,2% em 2022, evidenciando o reconhecimento internacional da universidade. Assim, apesar das adversidades nacionais, a UFS demonstra que é possível alcançar excelência e crescimento significativo na produção científica, destacando-se como uma instituição que, mesmo diante dos desafios, continua a trilhar um caminho de conquistas e impacto positivo no setor.
Ainda assim, apesar dos avanços qualitativos na produção científica da UFS, o panorama para CT&I no Brasil, e particularmente no estado de Sergipe, revela-se extremamente preocupante. Acentua-se uma lamentável trajetória de declínio na produção de artigos científicos entre 2022 (que já evidenciou uma queda inédita em comparação com 2021) e 2023, consolidando um movimento de inércia que suscita inquietação. Para ilustrar a amplitude dessa tendência negativa, projeções (levantadas no Scopus para o período de 2021 e 2023, portanto, ano inacabado) indicam uma considerável redução na produção científica de instituições renomadas, como a Universidade de São Paulo (USP) e a Universidade Federal do Rio Grande do Sul, estimadas em aproximadamente 18% e 18,5%, respectivamente. No Nordeste do país, instituições como a Universidade Federal do Piauí (UFPI) e a Universidade Federal de Alagoas (UFAL) também enfrentam projeções de quedas acentuadas, atingindo 19% e 16%, respectivamente. Nesse contexto, a UFS projeta uma redução de cerca de 18%.
Note-se que o ano de 2023 ainda não finalizou; apesar de estarmos em novembro, é plausível que haja ajustes em parte desses indicadores. No entanto, a perspectiva de reverter esse cenário parece desafiadora, ressaltando a urgência de adotar medidas capazes de conter e reverter o declínio evidenciado na produção científica em âmbito nacional e regional. Nesse contexto, torna-se imperativo o imediato restabelecimento de editais estruturantes, os quais, nos últimos anos, têm sido escassos e insuficientes, embora historicamente representem o alicerce da CT&I nacional.
O papel desempenhado por órgãos como o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), vinculada ao Ministério da Educação (MEC), e as agências de fomento à pesquisa, destacando-se a Fundação de Apoio à Pesquisa e à Inovação Tecnológica do Estado de Sergipe (Fapitec/SE), revela-se crucial para revitalizar o crescimento desses indicadores. Restaurar o papel do Brasil como um “player” internacional relevante no cenário científico exige esforços conjuntos dessas entidades, visando à retomada do protagonismo na produção científica e inovação, tanto a nível nacional quanto regional.