Andreza S. C. Maynard
Grupo de Estudos do Tempo Presente (GET/UFS/CNPq)
Universidade Federal de Sergipe

Às 19h do dia 15 de agosto de 1942, o paquete Baependi passava sossegado pelo litoral de Sergipe. Mas, naquela noite, as águas mornas e serenas do Atlântico, até então cenário bucólico de pescadores tranquilos, escondiam um submarino alemão de última geração, o U-507. Às 19h05, os passageiros ouviram um estrondo, seguido de outro barulho muito alto. O Baependi, que levava 323 pessoas, foi atingido por dois torpedos e, em apenas três minutos, estava submerso. Somente 38 pessoas sobreviveram. A guerra estava entre nós.
Duas horas depois de atacar o Baependi, o U-507 afundou outra embarcação, o Araraquara, que passava no mesmo local, levava 146 pessoas e teve apenas 10 sobreviventes. Atento ao trajeto das embarcações brasileiras, o submarino esperou por mais uma vítima. No dia 16 de agosto, por volta das 4h da manhã, o Aníbal Benévolo, que transportava 154 pessoas, foi afundado. A maioria dos passageiros dormia, e apenas 8 conseguiram se salvar.
Ainda no dia 16, os primeiros sobreviventes chegaram à cidade de Estância. Quase todos feridos receberam os primeiros cuidados no Hospital Amparo de Maria. Houve grande alvoroço em todo o estado, especialmente em Aracaju, para onde os sobreviventes foram levados. O interventor federal Augusto Maynard Gomes fez questão de recebê-los. A assistência às vítimas tornou-se tarefa urgente e prioritária. Até mesmo os aviões do Aeroclube foram colocados à disposição para prestar socorro.
Mais triste e desesperador do que os relatos dos sobreviventes foi ver as consequências mais trágicas do ato de guerra chegarem às praias. Corpos sem vida começaram a ser avistados. De acordo com relatos da época, os cadáveres chegaram aos montes, alguns irreconhecíveis, uns sem roupas, outros sem membros, além de muito inchados.
Diante do estágio avançado de decomposição, foi preciso proceder ao sepultamento imediato, realizado em covas improvisadas e coletivas. Mais de 500 pessoas morreram. Os nazistas mataram mais brasileiros no litoral sergipano do que nos campos de batalha da Europa.
No dia 17 de agosto, o U-507 também afundou as embarcações Itagiba (41 mortos) e Arará (21 mortos), próximo a Salvador, na Bahia. A notícia se espalhou pelo Brasil, e uma série de manifestações públicas exigia que o país revidasse ao ataque.
O governo de Getúlio Vargas se viu pressionado pela opinião pública e comoção popular. Em 22 de agosto, o Brasil declarou guerra contra a Alemanha e a Itália. Um dia depois, na Praça Fausto Cardoso, em Aracaju, o interventor Augusto Maynard discursou inflamado e conclamou: “Sergipanos!… Preparai-vos para a guerra!”.
Para Sergipe, além da dor, ficou a marca histórica. Os torpedeamentos mudaram a rotina com o aumento da vigilância costeira, a intensificação da movimentação militar, o estabelecimento de blecautes e um plano de defesa passiva antiaérea. Até os cinemas e o rádio passaram a exibir mensagens patrióticas e de apoio ao esforço de guerra.
Profundamente tocado pela tragédia, Sergipe guardou o registro de um dos capítulos mais sangrentos da história do país. Os torpedeamentos de agosto de 1942 foram um marco divisor. Do luto e do medo, o Brasil rumou à guerra, procurando mobilizar a população a partir do desejo de justiça diante do ataque brutal realizado pelos nazistas em águas nacionais.
Para saber mais:
MAYNARD, Dilton Cândido Santos; ASSIS, Raquel Anne Lima de. “O fim do mundo: os ataques do Submarino U-507 ao litoral sergipano em 1942”. Navigator (Revista da Marinha), 2013.pp. 59-68.
MAYNARD, Andreza S. C.; Maynard, Dilton C. S. Dias de Luta: Sergipe durante a Segunda Guerra Mundial. Rio de Janeiro: Multifoco, 2011.