Adriana Mendonça Cunha
Doutoranda pelo PPGHCS/COC/Fiocruz
Integrante do GET/UFS/CNPq
E-mail: adriana@getempo.org
A produção em massa de filmes de heróis dos universos da Marvel e da DC Comics tem arrebatado audiências, lotando salas de cinema no mundo inteiro, de jovens a adultos aficionados. No entanto, a quantidade de filmes e a tentativa de emplacar um sucesso atrás do outro promovem também a reprodução de obras mal construídas e enfadonhas para o público, muito bem ilustrada pelo exemplo de Thor: amor e trovão (2020).
O sucesso veio acompanhado de críticas e da necessidade de atender a um público diverso, o que exige atualizações em relação aos quadrinhos produzidos entre os anos 1940 e 1960. Não por acaso, produções como o Pantera Negra (2018) e Shang-Chi e a lenda dos dez anéis (2021) finalmente chegaram ao cinema, colocando em evidência heróis de origem africana e asiática.
Seguindo esse caminho, o Besouro Azul (2023) ganhou uma versão para o cinema com um elenco quase que exclusivamente latino-americano, incluindo a brasileira Bruna Marquezine. A presença de Marquezine movimentou as redes sociais promovendo, em grande medida, a divulgação do filme no Brasil. Isso não impediu que, muito antes do lançamento, muitas pessoas postassem vídeos e comentários nas redes sociais apostando no fracasso da produção.
Sem grandes expectativas e influenciada pelas péssimas impressões deixadas pelos últimos lançamentos, assim como pelos comentários nas redes, fui ao cinema despretensiosamente cumprir meu “dever cívico” de prestigiar nossa atriz brasileira. Quão surpresa fiquei ao me deparar com uma história comovente e repleta de significado. Quem vai ao cinema esperando por grandes lutas, mega efeitos especiais, a eterna guerra do bem contra o mal ou um herói destemido vai se decepcionar.
Besouro Azul é sobre um jovem, descendente de imigrantes mexicanos, que luta por um espaço numa sociedade que odeia pessoas como ele. Ao final da exibição, ouvi alguém dizer “é um filme legal, mas o herói é muito chato.” Automaticamente, me peguei refletindo sobre o protagonista e concluí que o entendia melhor do que jamais compreendi o Batman ou o Superman. Afinal, quando se é pobre, você não sonha em ser herói, você só deseja ter uma vida melhor. Jaime não queria ser um super herói porque isso não lhe garantiria um emprego digno, nem mudaria o fato do seu pai trabalhar 13 horas por dia ou mesmo traria mais respeito e dignidade para a sua família.
Para além das diversas críticas ao imperialismo estadunidense, o Besouro Azul é uma celebração da cultura e da família latino-americana, repleta de afeto, orgulho e coragem. É sobre um povo que resiste, persiste e se orgulha de onde vem, de quem é. Talvez, o filme não agrade ao público que esperava um herói forte e altruísta, disposto a salvar a humanidade numa batalha épica contra o mal. A mim, bastou encontrar na tela “um rapaz latino-americano sem dinheiro no banco, sem parentes importantes”, lutando “para suportar o dia a dia”. Finalmente, um herói que representa um pouco de nós, celebrando o que temos de melhor.
Para saber mais:
BESOURO AZUL. Direção: Angel Manuel Soto. Produção: John Rickard, Zev Foreman. Estados Unidos: Warner Bros, 2023.
BELCHIOR, Antonio Carlos. Apenas um rapaz latino-americano. Disponível em: https://www.letras.mus.br/belchior/44449/. Último acesso: 22/08/2023.
BELCHIOR, Antonio Carlos. Alucinação. Disponível em: https://www.letras.mus.br/belchior/153384/. Último acesso: 22/08/2023.