Luiz Eduardo Oliveira
Universidade Federal de Sergipe (UFS)

Numa garagem quente de Aracaju, no bairro São José, em 1983, três adolescentes descobriram que o risco podia virar som. Mercinho, 18 anos, baixista da banda H2O, que fundara com Alexandre, decidiu deixar o grupo e convidou Luiz Eduardo, 16, e o baterista Sérgio Pauleira, 17, para formar o Perigo de Vida — uma das primeiras bandas de rock autoral em Sergipe. Até que se prove o contrário, é nesse momento que começa, de forma sistemática, a história do rock autoral sergipano.
Em 1984, a banda já fazia seus primeiros shows registrados em Aracaju (SE), como o do conjunto Inácio Barbosa. A formação mudou ao longo do tempo. Sérgio Pauleira deu lugar a Kennedy na bateria ainda em 1984. Em 1985, no último ano do grupo, George assumiu as baquetas e Ricardo Cadastro entrou como guitarrista base. A sonoridade era crua. O repertório, autoral. A atitude, abertamente contestadora. Não era apenas música. Era um gesto de existência. Um registro dessa formação foi o show do conjunto Sol Nascente.
No mesmo período, atuava a banda H2O, inicialmente dedicada a covers de rock nacional e internacional. Pouco depois, também passou a compor músicas próprias, contribuindo para a formação de uma cena autoral até então inexistente em Sergipe.
Esse movimento não se expressava apenas nos palcos. Em 1984, surgia em Aracaju o fanzine O Submundo, publicação independente produzida por jovens ligados à cena punk e pós-punk local. O fanzine trazia uma resenha assinada por Wilton “Sardão”, registrando as três bandas de rock autoral em atividade naquele momento: Perigo de Vida, H2O e The M.E.R.D.A. Um documento raro, feito em papel, xerox e urgência.
Mais que um simples folheto, O Submundo era arquivo vivo. Conectava músicos, ouvintes e ideias em plena década de 1980, quando não havia internet, streaming nem redes sociais. Tudo circulava de mão em mão, nas escolas, nas praças, nos ensaios e nos pequenos shows.
Pouco depois, o Perigo de Vida se dissolveu. Mas sua energia não se perdeu. Transmutou-se no Crove Horrorshow, banda que, ao longo de quase 40 anos, marcou gerações e ajudou a escrever a história do rock sergipano.
A pergunta que fica é simples: se não fosse aquela garagem abafada de 1983, aquele fanzine xerocado de 1984, aquela juventude sem apoio nem palco, teria existido o rock autoral em Sergipe do jeito que conhecemos hoje?