Ailton Silva dos Santos
Mestre em História (PROHIS/UFS)
Integrante do Grupo de Estudos do Tempo Presente (GET/UFS/CNPq)
E-mail: ailton@getempo.org

O imaginário é um campo frutífero para reflexões e investigações nas ciências humanas, com diversos trabalhos abordando sua definição e indefinição conceitual. O debate sobre tal assunto, além de permear a história cultural e social, integra conceitos de estudos religiosos, literatura e arte, o que possibilita problematizar o teatro como uma representação da vida. Pois, o teatro grego clássico com seus mitos entrelaçados ao cotidiano, evidencia sua extensão simbólica além das memórias individuais, compondo representações.
O imaginário se torna real ao ser discursivamente significado como objeto das ciências sociais e humanas num contexto histórico, inserido no âmbito da longa duração, que compõe o tempo da formação das mentalidades, abarcando cenários materiais e imateriais que constroem o fenômeno histórico. Emergindo no plano cognitivo, o imaginário, por vezes, é interpretado como fantasia ou ilusão simbolista de pouca importância para o real. Mas, sem imaginação não há arte ou cultura, pois teorias e metodologias são frutos também dela. Com o teatro grego, observamos igualmente imaginário e realidade, pois concepções artísticas comungam com suas crenças, moldando parte da realidade.
Por sua vez, o alcance universal do teatro exerce influência, levando a pensar sobre símbolos que chegaram até nós, como definido por Gilbert Durand, dado que a espécie humana possui um patrimônio imaginário.
O teatro, como procissões em culto a Dionísio, desempenhou múltiplas funções, não só religiosas, mas também estéticas e políticas. Atribui-se a Téspis a invenção do ator, mas a arte de atuar é mais antiga e se confunde com a natureza do próprio homem. A mimese, como chamou Aristóteles, é a capacidade de dar vida a outra persona para compreender a natureza e seu meio. Entrementes, a dramaturgia ateniense tinha uma faceta competitiva, com autores e diretores disputando com suas peças, sendo um evento anual com espírito festivo, quase uma orgia, aonde as peças iam em cena uma vez e não repetidamente.
O teatro ganhou os palcos como manifestação do cotidiano mitológico, com deuses e criaturas sobrenaturais, com música e coro, onde os intérpretes usavam máscaras que representavam sensações e estados de espírito, tristes para tragédia e sorridentes para comédia. Por sua vez, a vida cênica era proibida às mulheres.
Destacaram-se autores como Ésquilo, cujas obras mostram a tragédia dos homens e dos deuses. Eurípedes, e a plena pintura das paixões humanas que, para Aristóteles, era o mais trágico dada a maior sensibilidade da verdade. E, mais dramaturgo que poeta, Sófocles tinha seu foco voltado para o palco. Com um atraso de cinquenta anos em relação à tragédia, a comédia ganhou os palcos, com conteúdo voltado à crítica política. A tragédia eleva quem sofre, sublimando o crime, transformando o personagem em mito ou herói, e a comédia é banalizante, trazendo a consolação para os problemas da vida.
Podemos usar o estudo sobre o teatro, não somente o grego, como meio para debater sobre manifestações e o desenvolvimento do imaginário na sociedade, focando na realização desse teatro e seus elementos constituintes. Pois, o imaginário não é somente uma maquiagem para realidade, ele é tão real quanto à realidade e constitui como um dos mais importantes mecanismos de produção e organização da sociedade. E pode ser compreendido como uma das respostas que a coletividade forneceu à seus conflitos, violências e divisões. Um meio de expressar desejos, aspirações e valores.
Agindo como força inerente à vida coletiva, influenciado por essa mesma vida cotidiana, carrega formas de poder através de um vasto sistema simbólico, o imaginário compõe uma estrutura que ajuda a estruturar a sociedade em movimento. Nesse ínterim, o teatro, em seu surgimento clássico e além dele, traz a representação de aspectos do imaginário coletivo. É manifestado pelos sentidos, as impressões e as emoções, e podemos penetrar em ambos os conceitos, o imaginário e o real, que não são concepções adversas e sim complementares. O teatro, ainda hoje, povoa o mundo com símbolos, objetos, imagens e crenças que integram a cultura, este denso sistema simbólico com o qual o homem norteia seu comportamento. Não é uma disciplina, mas um elo reflexivo entre saberes.