STALKER: Uma Ficção Cientifica soturna e controversa

Ailton Silva dos Santos

Aluno do Mestrado Acadêmico (PROHIS/UFS)

Pós-Graduado em Didática e Metodologia de Ensino (FSLF)

Graduado em História (FJAV)

O Escritor e “sua coroa de espinhos”. Fonte: https://m.imdb.com/title/tt0079944/mediaviewer/rm3376750592/

 

Uma produção fora da curva comercial, que se caracterizou como uma construção crítica e evidenciou o caráter descartável que ainda domina o gênero. Considerada a maior obra, dentre a pequena filmografia, do soviético Andrei Tarkovski, conhecido por seu trabalho com temas metafísicos, STALKER enfatiza a passagem do tempo e contempla a subjetividade, evocando meditações profundas acerca da vontade, da melancolia e da fé. O filme foi gravado na Estônia e chegou a sofrer com a censura, devido ao posicionamento político contrário ao regime, que o diretor expunha ao longo da vida. Dentre os críticos e telespectadores, costuma existir certa dualidade quanto a sua qualidade. Uns consideram-o maçante, tedioso e longo demais. Enquanto outros o têm como uma obra prima irretocável do cinema.

No enredo, temos um misterioso acidente que deixou um lugar inabitável, estando em um país não nomeado em um tempo não definido. Então, a região é isolada pelos militares e passa a ser conhecida como “A Zona”. Com o passar do tempo, surgiu a promessa de que, em algum lugar em seu interior, existia um quarto capaz de realizar desejos. Mas o caminho até ele é um labirinto mutável e cheio de armadilhas, onde apenas homens conhecidos como Stalkers são capazes de caminhar até à Sala dos Desejos. O Stalker atravessa o bloqueio militar, acompanhado pelo Professor e pelo Escritor. Ao mesmo tempo, o mistério sobre a origem e a finalidade da Zona perpassa por todo o filme, pois não é revelado o que caiu, ou o que lá habita. Entrementes, o Professor quer explorar tal mistério e, quem sabe, ganhar um Nobel. Enquanto o Escritor deseja recuperar sua inspiração e voltar a ser admirado, emudecendo todos os críticos. Essas são as personagens que acompanhamos ao longo de quase duas horas e quarenta minutos de filme. Um dos pontos mais marcantes, além da sonorização, é a coloração sépia para o resto do mundo e colorido para A Zona. Sendo a realidade caracterizada como melancólica, entulhada e barulhenta, frente à silenciosa presença vicejante da vida.

Detentor de uma poeticidade visual digna de nota, propõe, a todo momento, uma introspecção contemplativa, em que o silêncio é perpassado por diálogos, e grandes monólogos, que dominam o tempo de tela. Não obstante, o filme acaba sendo um exercício de paciência e cognição, pois assistir às cenas “imóveis” é um verdadeiro desafio aos dias de hoje, quando a cultura de massas criou a percepção da realidade como uma alternância frenética de informações e estímulos. O conflito interior é emergido a partir dos diálogos e chega a alcançar quem assiste, pois o diretor mantém um jogo de sedução constante. Entrega apresentando algo e logo nega a compreensão sobre esse algo; nos tirando, o tanto quanto entrega, sobretudo ao percebemos que A Zona se modifica a partir da composição do espírito dos que a trilham. Contudo, não podemos deixar de considerar que a interação dos três personagens pode aludir à composição de um único indivíduo. Sendo o ceticismo que, ao fim, intenta destruir o milagre. O individualismo, melancólico, que vê no julgamento dos outros o fim de sua própria personalidade, e ainda assim tenta reconquistar a aceitação alheia. E a devoção, onde nada mais resta, senão buscar em um labirinto intransponível o significado da vida, enquanto a própria vida, em suas relações interpessoais, é negligenciada.

O Stalker, assim como um religioso, sobrenaturaliza a realidade ao criar adversários e aliados que não identificamos. Sem chegar a responder sequer um mistério, mantém a indagação perene sobre a Sala dos Desejos, que só vemos por um enquadramento, muito bem executado, dos protagonistas que não tiveram coragem de entrar. Para onde será que foram as pessoas que habitavam o lugar antes do surgimento da Zona? O diretor nunca deu uma resposta clara, ou um posicionamento, sobre o que Stalker buscou retratar e ainda negou todas as interpretações que lhe foram apresentadas. Dentre elas, emergiu a concepção de que fosse uma análise crítica ao regime totalitário em vigor na localidade onde viveu. Portanto, ainda me pergunto qual será a natureza da Zona. Vinda de um meteoro ou de uma nave alienígena? Será que é uma realidade alternativa da existência? Ou, por que não, uma revolução que prometeu realizar todos os desejos do indivíduo, enquanto coletividade, ao passo que negou os anseios e características individuais?

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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