Inovação ou criatividade: Afinal, quem vem primeiro?

“Inovação, tipicamente, vem de um olhar lançado ao mundo através de lentes um tanto diferentes”.

Gary Hamel, presidente da Strategos (www.strategos.com)

 

Numa época na qual se fala em inovação a todo instante e das mais diferentes formas contata-se, lamentavelmente, que uma maioria absoluta das pessoas ao pensar no futuro considera-se comprometida com 98% do que percebem de normalidade. Ou seja, as pessoas não conseguem muito pensar no seu futuro em uma linha de tempo maior do que 5 anos e também em cenários que lhes sejam desconhecidos. É só fazer um teste com um jovem universitário; para uma maioria esmagadora a sua linha de tempo em relação ao futuro não vai um dia além da sua formatura.

“Mas, o que há de errado nisso?”, pode ser uma pergunta. Não se trata de certo ou de errado, mas apenas do fato de que as pessoas não conseguem se imaginar no futuro e, por conta disto, só conseguem pensar na sua vida praticamente com as mesmas similaridades dos seus pais. É algo similar já descrito e imortalizado através da canção “Como nossos pais” de autoria do Belchior e imortalizada na voz da Elis Regina. Em outras palavras, antes mesmo de começar a viver e experimentar a sua vida, já limitam o seu potencial de criatividade, para uma linha de “background” confortavelmente baixa. Na verdade em sua maioria, incentivados pelos próprios pais, muitos se limitam a copiar velhos modelos que deram certo no passado, mas que hoje estão praticamente ultrapassados. Daí volta e meia, nos defrontamos com jovens apenas preocupados em “estudar” para concursos públicos, e a buscar empregos “seguros e duráveis” como se essa fosse a única saída para o futuro desafiador que se descortina para eles.

O mundo vem evoluindo numa velocidade fantástica, mas é necessário que as pessoas ocupem esses espaços que a vida esta lhes oferecendo, que cada um conheça os seus talentos e de que maneira esses talentos poderão ser combinados, potencializados e explorados para que os mesmos trabalhem a seu favor. É preciso entender que existe ainda um campo de oportunidades não exploradas imenso.

É só observar as várias e diferenciadas formas de negociar. Como, por exemplo, o antigo “este ou esse” no mundo das ofertas deixou de ser uma verdade. Por exemplo: “Você pode escolher este produto melhor e mais caro ou aquele de qualidade inferior e de preço menor”. Esta afirmação, tão em moda até alguns anos atrás, deixou de ser verdadeira porque mais rápido do que se espera vai aparecer alguma empresa no mercado com um produto melhor e de preço compatível; portanto, preço – em muitos casos – deixou de ser um referencial para a qualidade.

Assim sendo, a estratégia do negócio deixa de ser observada apenas analisando as “forças e fraquezas” da empresa e começa a ser tornar uma busca minuciosa dos espaços e nichos de mercado nos quais os concorrentes não estão ainda. E, o mais interessante é que o maior concorrente – muitas vezes – deixa de ser aquele da mesma categoria de negócios e passa a ser empresas de grupos totalmente diferentes. Um exemplo bastante interessante foi o fato de com o aparecimento da internet há alguns anos atrás e o começo da exploração das reuniões à distância por parte das empresas fez com que muitas empresas de aviação americanas que foram criadas para atender executivos começaram a ter prejuízo porque o número de viagens diminuiu intensamente. Outro exemplo bastante interessante e atual é o fato das ofertas de passagens aéreas pelas companhias de aviação com preços muitas vezes inferiores aqueles cobrados pelas empresas de ônibus que trabalham com viagens a grandes distâncias.

Portanto, a criatividade pode ser encontrada na capacidade de se criar novos nichos de mercado ainda não vistos pelos concorrentes e, uma vez criados esses nichos a capacidade de inovar continuamente os produtos e serviços ofertados. Uma coisa é certa, não adianta pensar que a inovação vai acontecer continuamente se não se criar um clima favorável à geração de idéias para se fomentar a criatividade. Em outras palavras, quanto mais se cria, mais teremos capacidade e possibilidades para inovar.

A inovação, por sua vez, não cai do céu. Recentemente, ouvi um comentário que um grande dono de empresa reuniu toda a sua equipe em uma sala e disse: “Vocês vão passar todo o dia aqui e só sairão quando encontrarem uma inovação.” Isto não é piada, é um fato verdadeiro. Não soube do desfecho final, mas pelos vistos nada de fabuloso essa empresa gerou senão a notícia já teria chegado ao mercado.

Logo, vale considerar que a inovação também não é o resultado de uma fórmula matemática, um passe de mágica e, muito menos, de uma vontade programada. Por exemplo, será que alguém, há alguns anos passados, chegou a pensar em entrar em uma livraria e solicitar ao vendedor um “e-book”, ou dizer “o quão feliz ficaria de pudesse fazer um download de algumas músicas’”  Logo o “e-book” é um exemplo clássico de inovação, enquanto o jornal é um exemplo de inovação social. Todavia, isso chegou ao mercado através de uma série de transformações que foram acontecendo e porque algumas pessoas conseguiram enxergar uma série de possibilidades as quais antes não puderam ou não foram ser vistas e consideradas como um potencial produto ou serviço.

E, a criatividade só acontece quando o indivíduo começa a ver as coisas com olhos diferenciadas; até mesmo conseguir ver as mesmas coisas de modo diferente. Até porque a criatividade pode ser traduzida[1] como uma força atitudinal que está diretamente ligada a três elementos essenciais: o conhecimento, a imaginação e a capacidade de avaliação. Seja em que cenário for, um indivíduo para ser criativo precisa possuir um determinado “expertise” sobre um assunto e a isso se diz conhecimento, por sua vez, esse mesmo individuo precisa – também – ser uma pessoa que seja capaz de imaginar e gerar muitas opções para a sua idéia; além disto, é necessário que o mesmo tenha um determinado senso critico, ou seja, a sua capacidade de avaliação. E, finalmente, tenha uma força atitudinal que o impele a agir, a se mostrar presente, a se posicionar, a dizer para que veio. Portanto, são aqueles indivíduos que têm uma força visceral para estar enfrentando continuamente o novo e os desafios e não são capazes se deixarem atingir por sua “zona de conforto”.

Embora tenhamos um sistema educacional formal que lamentavelmente tolhe gradativamente a criatividade dos indivíduos, a boa notícia é que hoje em dia, os grandes centros para desenvolvimento da pesquisa da criatividade humana desenvolveram mecanismos e ferramentas que nos ensinam a resgatar e desenvolver a nossa criatividade. Portanto, afinal nem tudo está perdido.

No entanto, apesar de tudo, é importante que entendamos que por mais que desejemos – lamentavelmente – a inovação não pode florescer a contento em ambientes hostis à criatividade.  Daí – primeiro – vem a criatividade…

(*) Fernando Viana

Presidente da Fundação Brasil Criativo

presidente@fbcriativo.org.br



[1] Ruth Noeller, Creative Education Foundation, USA. Criatividade = fa (Cn x I x Av), onde: Cn = conhecimento, I = Imaginação, Av = avaliação e fa = função atitudinal.

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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