JOSÉ HAMILTON: 70 ANOS – CERTEZA DO DEVER CUMPRIDO

     Não me recordo de ter presenciado qualquer atividade do movimento médico de Sergipe nos

José Hamilton Maciel Silva
últimos trinta anos sem a presença de um nome: José Hamilton Maciel Silva. Sua ligação com a Medicina sempre foi extraordinária, como psiquiatra, professor, empreendedor, dirigente classista. E olhe que quase o perdemos para a odontologia.
     Tive o privilégio de conhecê-lo através do mano Marcos. Ele tinha um convívio fraterno com Hamilton, alagoano de Pão de Açúcar, que um dia foi pra Maceió e terminou dentista. Inquieto, tornou-se médico para cuidar das “mentes atrapalhadas”, no dizer de Manoel Cabral Machado, ao se referir à especialidade. Estávamos em 1985 e ele resolveu se candidatar à presidência da Sociedade Médica de Sergipe, mas estava com dificuldade para formar uma chapa de oposição. Os colegas não se entusiasmavam com a ideia, até porque a entidade estava completamente desacreditada naquela oportunidade. Fez-me o convite para participar de sua chapa no cargo de orador, o último na hierarquia da diretoria. Começou aí a nossa relação.
     
José Hamilton havia passado pelo comando do Conselho Regional de Medicina, onde fez profícua administração. Sentia-se pois estimulado para uma nova missão: recuperar o prestígio da mais antiga entidade médica do estado, a Somese, fundada em 30 de junho de 1937. O que parecia uma transição tranqüila transformou-se, entretanto, numa contenda eleitoral memorável, porque a situação não estava disposta a passar o comando e lançou um nome de muito prestígio: Fernando Maynard, urologista e professor da Faculdade de Medicina, homem de temperamento forte e impetuoso, que montou uma chapa para vencer a eleição.   
      
O dia da votação foi de festa, com as duas chapas promovendo grande agitação na busca dos votos, talvez a eleição mais disputada da história da Somese. José Hamilton vence a disputa e torna-se presidente, tendo Marcos Prado como seu vice, de 1985 a 1989. Começava uma nova era para a Sociedade Médica de Sergipe, que perdurou por 17 anos com as sucessivas eleições dos candidatos da situação, apoiados por ele: Fernando Barbosa, Lucio Prado Dias, William Soares e Henrique Batista.
      
Na profícua administração de José Hamilton Maciel Silva surgiu o Jornal da Somese, o Museu Médico Dr. Augusto Leite, o bar O Bisturi e a completa e radical reforma da sede, na verdade uma nova sede. Construída primeiramente em 1968, em terreno doado pelo governo do Estado, comandado à época pelo Dr. Lourival Baptista, ela encontrava-se completamente  deteriorada pela ação do tempo e pela  falta de uma manutenção adequada. Hamilton arregaçou as mangas e conseguiu viabilizar um convênio inédito com a Confederação Nacional da Indústria, através do economista Marcos Melo e do então presidente da entidade, Albano do Prado Franco.    
     
O convênio propiciou a reforma completa da sede da Guilhermino Rezende, construiu-se um novo auditório com a posição invertida e foram construídas cinco novas salas para aluguel, propiciando recursos adicionais para a Somese. O Museu Médico se tornou possível também graças a uma parceria com a Fundação Joaquim Nabuco e, nesse caso, a participação do escritor Luiz Antonio Barreto foi de fundamental importância, colocando técnicos qualificados da Fundação para a montagem do acervo composto por painéis temáticos e peças mobiliárias. 
     
Aproximava-se a data do centenário de Augusto Leite. Setores da Sociedade começavam a se movimentar para comemorar a data. A Somese então elaborou uma edição especial do seu Jornal, com 12 páginas, para registrar a efeméride, com depoimentos e discursos históricos, alguns deles inéditos na forma de publicação impressa. Esta edição tornou-se referencia e fonte de consultas.
     
Terminado o seu mandato em 1989, Hamilton continuou participando da vida da Somese, assumindo posteriormente funções na AMB, como vice-presidente, colaborando na administração de Antonio Celso Nunes Nassif. Participou da Comissão Nacional que elaborou o Código de Ética que vigorou até abril deste ano. Depois veio a Secretaria de Saúde e mais uma vez tive o privilégio de estar ao seu lado no gabinete, como assessor e colaborador. Foram tempos difíceis, tempos do cólera, que chegava avassalador. A equipe da Secretaria fez um trabalho notável, começando com o treinamento na longínqua Iquitos, no Peru e o forte trabalho de contenção na divisa com Alagoas, nas cidades ribeirinhas de Brejo Grande e Ilha das Flores. Graças à determinação do Secretário e sua equipe, destacando três pessoas, Darcy Tavares Pinto, João Augusto Figueiredo  e a enfermeira Natividade, o cólera não chegou a Sergipe.  
   
Em 1996, José Hamilton tornou-se presidente da Academia Sergipana de Medicina, continuando a sua missão associativa, de dedicação plena ao movimento médico, que permanece até os dias de hoje. E como fizera na Somese, seguindo o seu rastro iluminado, assumo o cargo logo em seguida.
    
Portanto, meus amigos, não foram os 50, nem os 60, que o fizeram esmorecer na luta e desmontar as armas. Tampouco os 70, em face da sua enorme disposição em servir, de somar e defender seus princípios. Ninguém se encaixa tão bem no pensamento de Bertolt Brecht, em Elogio do Revolucionário: “…Quando aumenta a repressão, muitos desanimam. Mas a coragem dele aumenta. Organiza sua luta pelo salário, pelo pão e pela conquista do poder. Interroga a propriedade: de onde vens? Pergunta a cada ideia: serves a quem? Ali onde todos calam, ele fala. E onde reina a opressão e se acusa o destino, ele cita os nomes”.
    
Finalmente… no poema, “Os que lutam”: “Há aqueles que lutam um dia; e por isso são muito bons; há aqueles que lutam muitos dias; e por isso são muito bons; há aqueles que lutam anos; e são melhores ainda; porém há aqueles que lutam toda a vida; esses são os imprescindíveis.”

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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