Leis Mortas (III)

Os organismos culturais da sociedade, que existem como suporte ao interesse e à necessidade das pessoas, dependem muito, em sua sobrevivência, da sensibilidade dos homens públicos. No Brasil a cultura é um artigo suspeito, um apêndice que só se sabe dele quando incomoda. E no entanto é a cultura que dá ao Brasil um retrato, um perfil, um conceito, uma respeito de admiração, como se viu, recentemente, na escolha da cidade maravilhosa do Rio de Janeiro para sediar as Olimpíadas de 2016. Algumas áreas são projetadas como pedaços de natureza, mas na grande maioria do território brasileiro é a cultura a melhor medida, seja aquela espontânea, produzida diretamente ou guardada, como herança, pelo povo, seja a arte refinada, sintonizada com as novas linguagens estéticas do mundo.

No meio da massa a cultura tem sua função, seja nos grupos folclóricos, que são guardiões da memória, seja nos estádios de futebol, onde os clubes com suas cores e suas bandeiras mostram a capacidade de atrair multidões de torcedores, como ocorre, atualmente, na reta final do Campeonato Brasileiro de Futebol. A cultura dos símbolos e estes representados pelas cores dos distintivos dos clubes, expostas nas camisas, nas bandeiras, nos bandeirões, noutros modos de exibição da fidelidade aos times do coração. Isto vai além dos estádios, como é possível ver-se nas ruas, quando torcedores expõem suas preferências, vestindo garbosamente as camisas do clube.

Quando o assunto é valorizar a cultura encontram-se no registro dos jornais diversas promessas, intenções, que poucas vezes se tornam realidade. Muitas leis deixam de ser cumpridas, como letras mortas, perdidas no esquecimento. Os exemplos estão, como já foram referidos, nos textos constitucionais, nas leis ordinárias, nas definições políticas e orçamentárias. O exemplo mais recente prende-se a uma Emenda parlamentar, do deputado sergipano Iran Barbosa, em favor da Biblioteca Epifânio Dória, destinando a quantia de R$ 100.000,00 (cem mil reais) para aquisição de livros. Enfim, um gesto político, na expressão mais alta, sem fins eleitoreiros, mas de iniciativa exemplar, para proteger o hábito da leitura, atualizar o acervo e colocar ao dispor do público.

Entraves burocráticos – é o que se diz -, estão impedindo a liberação dos recursos, levando a supor que o povo sergipano perderá a oportunidade de ter o acervo da Biblioteca Pública renovado, com a aquisição de títulos novos, nos diversos campos do conhecimento. A Biblioteca fez, ao que parece, a sua parte, atendendo as orientações dos setores especializados da Câmara Federal. No entanto, a Emenda do deputado professor Iran corre o risco de ficar na intenção, de morrer como as leis mortas já sumariadas e outras tantas que não vigoraram. Na mesma linha, aliás, o professor Luiz Alberto na sua gestão como Secretário da Cultura definiu a utilização de cerca de R$600.000,00 (seiscentos mil reais) para aquisição de livros e também enfrentou dificuldades na burocracia para cumprir sua promessa. Daí a prática, ainda hoje vigente, de doações de livros, geralmente  sem focos de interesse, alimentando as prateleiras da velha biblioteca.

Dinheiro há, como se sabe. Os gastos públicos com promoções de shows, durante o ano todo e todos os anos, são astronômicos, mas a cultura não tem proteção maior do que a de simples guarda dos acervos já existentes, acomodados inadequadamente, correndo sérios riscos de degradação. Os prédios ainda recebem, periodicamente, reparos e melhorias, como se viu, há poucos dias, com o Museu Histórico de Sergipe, de São Cristóvão, mas os acervos, estes carecem de providências protetoras, para que cumpram com suas funções culturais e sociais. Num tempo em que tanto se fala em inclusão social, inclusive através da cultura, é lamentável que 100 mil reais sejam perdidos, devolvidos, deixando sem consolo a esperança de aquisição de grande número de livros novos, nas mais diversas áreas do conhecimento.

É preciso insistir, jamais desanimar. A expectativa é que o deputado Iran Barbosa continue sensível à causa da leitura e volte a colocar no Orçamento quantias destinadas à compra de

Livros. O futuro será a melhor gratidão, porque contará com gerações mais preparadas, mais lúcidas para os enfrentamentos na sociedade. E que outros parlamentares se rendam as necessidades dos espaços culturais públicos, para que sirvam melhor aos usuários, e coloquem Emendas no Orçamento da União e no Orçamento do Estado, destinadas a ampliação, proteção e restauração dos acervos: livros, papéis, fotos, mapas, objetos, quadros, enfim tudo aquilo que represente uma expressão cultural do povo sergipano.

Numa sociedade bem informada, que dispõe de meios modernos de comunicação, não cabe mais o descumprimento de lei alguma, muito especialmente daquelas que tratam de bens culturais, como as que protegeram as edições dos autores locais, e visaram proteger os acervos bibliográficos, iconográficos, sonoros, e outros que dão retrato cultural ao povo sergipano.

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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