Lembranças de um 11 de setembro

Katty Cristina Lima Sá
Graduanda em História na Universidade Federal de Sergipe
Bolsista PIBITI/UFS do projeto “Memorial Virtual da Segunda Guerra Mundial: pesquisa e ensino da História através da Internet”
Integrante do Grupo de Estudos do Tempo Presente (GET/UFS)
katty@getempo.org
Orientador: Prof. Dr. Dilton Cândido Santos Maynard

“Como alguém que foi indiretamente afetado pelas tragédias de 11 de setembro de 2001, minha vida mudou de forma semelhante à vida de milhões de americanos. As viagens aéreas tornaram-se um pouco mais complicadas, os Estados Unidos entraram em guerra no Afeganistão e no Iraque, e todos nós sentimos um pouco menos seguros. Eu tinha 12 anos quando aconteceu 11/09. Eu não consegui descobrir sobre o que aconteceu até que eu saí da escola naquela tarde. De muitas maneiras, os eventos de 11/09  parecia surreal e irreal.”  (Depoimento Anônimo, disponível no Setptember Digital Archive < http://911digitalarchive.org/items/show/97078> Tradução nossa)

“As operações 11/09 são a maior operação na história da humanidade. Dezenove mujahidins conseguiram infligir perdas humanas e financeiras contra o inimigo de uma forma sem precedentes”  (Yahya Ibrahim, Inspire Magazine, n° 07, p. 12. Tradução nossa)

O que você estava fazendo no dia 11 de setembro de 2001? Algumas pessoas estavam no trabalho, outras em casa assistindo televisão, até que as programações de todas as emissoras do mundo foram interrompidas pela cena de um  avião colidindo contra as torres gêmeas do World Trade Center. As cenas pareciam trechos de um filme apocalíptico, ao estilo de The Day After de Nicholas Meyer, filme de 1983 que retratou o cenário ficcional de uma invasão soviética nos Estados Unidos e por consequência o início de uma guerra nuclear. Aquelas imagens, no entanto, foram transmitidas ao vivo e anunciaram ao mundo a chegada do século XXI.

Naquele 11 de setembro, quatro aviões foram sequestrados por 19 jihadistas membros da Al-Qaeda, grupo extremista islâmico fundado por Osama Bin Laden. O primeiro avião, um Boeing da American Airlines colidiu com a torre norte do Word Trade Center as 8h55 do horário local, dezoito minutos depois o segundo avião da United Airlines Flight  antingiu a torre sul, muitos bombeiros e sobreviventes do primeiro ataque morrem durante o segundo, enquanto tentavam ajudar na evacuação do prédio. O terceiro avião também da American Airlines foi lançado contra o Pentágono, em Washington, na mesma manhã, destruindo parte do complexo. O último  Boeing sequestrado tinha como alvo o Capitólio, porém explodiu na Pensilvânia. Os Estados Unidos assistiram através das emissoras de televisão algo que não ocorria desde a guerra civil do século XIX,  um grave ataque dentro do seu território; o tráfego aéreo americano pela primeira vez foi paralisado completamente e o medo se espalhou pelo país.

O World Trade Center  foi inaugurado em 1973, contando com 110 andares. Era um símbolo econômico e também do  combate ao terrorismo, após resistir ao ataque de 1993, planejado e executado por um dos treinados pela Al-Qaeda, Razim Yousef. O rapaz tinha outras grandes ideias para atentados como matar o presidente Bill Cliton e o Papa João Paulo II, e sequestrar aviões nos Estados Unidos para destruir suas construções simbólicas estadunidenses. Depois da prisão de Yousef, coube a seu tio Khaled Sheikh Mohammed plantar a semente da “Operação Grande Casamento”, que resultaria nos ataques 11 de setembro, ao procurar Osama Bin Laden no Afeganistão para passar os planos deixados por seu sobrinho, em 1996.

Quatorze anos após os ataques, as lembranças destes não antigem somente a nação norte-americana, mas todos que viram ao vivo o maior atentado terrorista da história. Lembranças do que fazíamos no momento da explosão da torres e como soubemos dos atentados se misturam aos relatos dos sobreviventes, como o de Marcy Boders, que trabalhava no 81º andar da torre norte. Boders, aos 28 anos, ficou conhecida como “Duty Lady” (Dama da Poeira) após ser fotografada coberta da poeira provocada pelo desmoronamento das torres. Se misturam as lembranças dos bombeiros nova-iorquinos, como o capitão Daniel Daly,  que trabalhou no resgate das vítimas e viu pessoas se atirando dos andares mais altos para se salvarem, pedaços de corpos espalhados e amigos de profissão mortos enquanto tentavam salvar as vítimas. Por fim temos as memórias dos parentes e amigos das vítimas, como Ester DiNardo, que relembra a última noite com sua filha quando comemoraram o aniversário de Ester no Windows on the World, bar no último andar da torre norte do World Trade Center.

Os membros da Al-Qaeda e seus simpatizantes também relembram esta data, porém com sentimentos diferentes aos dos vitimados. Em 2010, como comemoração dos dez anos do que chamam de “os grandes eventos de expedição realizados para Washington D.C. e Nova York” e para desmentir a fala do então presidente iraniano Marmud Armadinejad,  que afirmou ser o 11 de setembro uma farsa planejada pelo governo americano, a Al-Qaeda lançou o número sete da Inspire, publicação oficial do grupo disponível na Internet em formato PDF em vários idiomas – como árabe, russo e inglês –  como uma edição especial para os atentados de 11/09/2001 intitulada “A maior operação de todos os tempos”.

Os “erros americanos” como o apoio a Israel e as suas ocupações em espaços sagrados para o Islã, as sanções impostas ao Iraque em 1991, a utilização da tortura contra presos e a existência dos grupos de extrema direta são relembrados como justificativas para o ataque contra a América. A morte das três mil vítimas são lembradas como forma de comemoração e da aplicação da justiça, pois “como a América o lamenta, nós celebramos este glorioso evento” que  “vieram como o resultado de décadas de agressões americanas” (Inspire, n° 07, 2011. Págs 03; 12. Tradução Nossa).

Para os editores, o ataque contra World Trade Center e o Pentágono significou levar  a guerra para aqueles que a levaram ao Oriente Médio, ou seja, culpabiliza sobretudo a economia e as forças armadas norte-americanas. “A dor, o sofrimento e a angústia que Xeique Osama causou na América é o troco por toda dor, sofrimento e angústia que esta causou em muçulmanos em todo mundo” (Inspire, n° 07, 2011, p. 03, Tradução Nossa), deste modo, os traumas permanentes nos americanos são consideradas lembranças não só do 11 de setembro em si, mas da “perversão” americana, principalmente contra os muçulmanos. Além disso, os altos custos financeiros e as vidas perdidas nas guerras do Afeganistão e do Iraque são dados como castigos pelas perversidades americanas, e também como mais consequências dos atentados em Nova York e Washington, o que torna a operação ainda mais bem-sucedida para o grupo executor. O que para alguns são memória de barbárie e dor, para outros nada mais é do que a lembrança do dia em que a justiça se fez.

Para Al-Qaeda relembrar seu grande feito é mais do que provar sua veracidade e mostrar sua grandiosidade. As lembranças do 11 de setembro servem como inspiração e convite para que novos jihadistas se unam a jihad, que prosseguirá até a derrota  considerada iminente do inimigo: “para nós, é apenas uma questão de tempo. A questão não é se a América cairá ou não. América já está caindo, ela simplesmente não bateu no chão. Ainda.” (Inspire, n° 07, 2011, p.13. Tradução Nossa).

Mais de uma década depois, as imagens de aviões acertando o WTC ainda  parecem cenas de um filme para aqueles que as assistem. Alguns ao vê-las choraram pela perda de amigos e familiares, sofrem com pesadelos resultante de lembranças daquele dia, ou sentem raiva diante a capacidade de matar tantos inocentes. Outros ainda, comemoraram a dor causada ao inimigo infiel e corrompido, que não se importa em matar mulheres crianças para manter seus interesses, os Estados Unidos. Dor,  medo, ódio, alegria e esperança, tantos sentimentos em torno de um único fato. Dificilmente os que vivenciaram este dia passam imunes a tantos sentimentos e lembranças.

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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