LITERATURA ORAL, UM MUNDO DE CULTURA

A oralidade tem sido, em todo o mundo, grande parceira da história. Uma completa a outra. A história, como a ciência do homem, condutora do destino humano, produzindo uma experiência, nutre a cultura. Cícero nomina a história como “Luz da Verdade, Testemunho dos Tempos, Mestra da Vida, Mensageira da Antigüidade”.

 

Cada povo soube guardar, na memória do tempo, os seus fatos históricos, nas versões emocionadas do heroísmo, dos feitos gloriosos, nos embates pela vitória, ou nas derrotas tristes das guerras. Cada fato estará revestido, então, de um sentimento profundo, tão íntimo quanto social, na relação da pessoa com o grupo, da personagem com a cena da vida.

 

Foi comum, a todos os povos, catalogar as suas aventuras para que servissem à educação dos mais novos, e de exortação aos governantes, pela clareza dos exemplos. As grandes coleções de estórias, como o Panchatranta, ou de poemas, como Os Vedas, O Mahabharata, O Ramaiana, parecem confirmar o uso das Purunas ou antigüidades como princípios pedagógicos, realimentando a sobrevivência das castas inferiores.

 

Talvez mesmo por isso Splengler tenha feito da cultura, e não dos homens e nem dos povos, a protagonista da história, como se bastasse dizer: Era uma vez…

 

A oralidade tem, assim, um vínculo completo com o passado dos povos e funciona para manter a tradição. Foi com ela que os povos criaram ou prolongaram a vida das orações e dos cantos, para a exaltação das forças divinas, como com ela glorificaram as façanhas famosas do passado.

 

É certo que a escrita alargou o campo da memória, mas ainda hoje a oralidade e a escritura cumprem papéis essenciais, com os quais alimentam e realimentam as bases da sobrevivência dos povos e das sociedades. Considerada como fundamento da civilização superior, a escritura tem sido a arte civilizatória por excelência, dinamizando nos presentes os repertórios dos passados, como meio visual de comunicação.

 

Na longa trajetória humana em busca das expressões de linguagem, as figuras e as cores dos pictogramas, os signos dos ideogramas, os sinais cuneiformes, os sons dos fonogramas, que levaram aos alfabetos cumpriram uma espécie de rito de passagem, valorizando o oral, em todas as suas manifestações, fixando as coleções que a escritura trouxe aos dias atuais.

 

Não é tarefa fácil separar, pela medida da importância, o oral e o escrito na história dos povos, nem de suas culturas. O domínio da escrita não impõe, e nem significa, uma ruptura definitiva e completa com o passado da pessoa, a tradição herdada, o contexto social, nem com o conhecimento oral. As duas formas: A Oral e a Escrita, se compõem como um conjunto interativo, que alonga a vigência de toda a produção cultural do povo.

 

Em algumas sociedades africanas era comum ouvir-se, quando morria um velho, que morria uma biblioteca. Porque o conhecimento, tanto o de natureza histórica, como o das relações jurídicas, sobrevivia acomodado na cabeça das pessoas, como referência à qual era possível recorrer, sempre que necessário. A oralidade possui, então, a força da herança, que não se altera com a simples troca da vigência moral dos fatos. A oralidade conserva, como reforço à Pedagogia da exemplaridade, os valores, nos quais e com os quais os grupos sociais moldam e mantém as suas relações de interesses.

 

A escritura estabeleceu um conjunto de formas novas de ação preservadora dos repertórios, guiando-os mais objetivamente para os fins aos quais deveriam estar destinados. Assim, a Igreja Católica, que se valia da oralidade, fez a impressão da Bíblia e ampliou o domínio doutrinário da fé, ampliando o poder do seu magistério moral. E fez mais: reelaborou, para uso catequético, a herança oral dos povos antigos. (Continua)

 

Permitida a reprodução desde que citada a fonte “Pesquise – Pesquisa de Sergipe / InfoNet”. Contatos, dúvidas ou sugestões de temas: institutotobiasbarreto@infonet.com.br.

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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