Por Marcos Cardoso*
A Universidade Federal de Sergipe, uma referência no ensino e na pesquisa na região, de repente começa a andar para trás. Há poucos dias a comunidade acadêmica ficou desolada ao saber que a instituição não será contemplada com emenda de bancada, dos senadores e deputados federais sergipanos, algo que há pelo menos uma década não acontecia. A emenda de bancada destinada à UFS era uma garantia, todo ano tinha.
Agora, outra decepção: a instituição gerida desde março pelos professores André Maurício Conceição de Souza, reitor, e Silvana Aparecida Bretas, vice-reitora, é a única universidade do Nordeste não contemplada na Chamada Pública CNPq nº 12/2025 do Programa Institucional de Bolsas de Pós-Graduação (PIBPG) para o ciclo 2026.
A Universidade Federal de Sergipe sempre navegou com firmeza pelos editais nacionais. Durante anos, esteve entre as instituições contempladas pelo PIBPG do CNPq — inclusive na chamada de 2024, destinada à execução em 2025, quando garantiu 12 bolsas de doutorado e 35 de mestrado, conforme registro em seu próprio site institucional. Mas o resultado da Chamada 12/2025, que define as bolsas a serem implementadas em 2026, trouxe esse fato inédito: todas as universidades federais e estaduais do Nordeste foram aprovadas — todas, exceto a UFS.
Segundo a Portaria CNPq nº 2.080/2024, o PIBPG é um dos pilares da formação de pesquisadores no país. A exclusão da UFS não é um contratempo burocrático: representa uma perda estrutural. Em números, são R$ 882 mil anuais que deixaram de entrar com as bolsas de mestrado e outros R$ 446,4 mil das bolsas de doutorado. No total, R$ 1,33 milhão por ano, mais de R$ 5,3 milhões ao longo de um ciclo quadrienal.
O prejuízo, porém, vai além do valor financeiro. Sem bolsas, dezenas de estudantes — muitos sem qualquer outra fonte de renda — simplesmente não conseguirão permanecer na pós-graduação. E o impacto atinge toda a estrutura acadêmica: os 50 programas de pós-graduação da UFS, segundo o GeoCAPES/CAPES, enfrentam queda na atratividade, riscos para a continuidade das pesquisas e possíveis repercussões futuras nas avaliações nacionais.
Enquanto UFBA, UFPE, UFC, UFRN, UFPI, UFMA, UFAL, UEPB, UECE, UNEB, UFERSA e outras universidades celebram mais uma conquista, a UFS aparece isolada — um ponto fora da curva. Não por falta de mérito científico, mas por falhas institucionais que poderiam ter sido evitadas. A UNIT não cometeu essas falhas e é a única universidade sergipana contemplada.
O resultado deixa um recado claro: Sergipe perde recursos, perde cérebros, perde fôlego competitivo. E a UFS, que já esteve entre as instituições que melhor disputavam essas chamadas, agora observa de fora enquanto o restante do Nordeste avança. Não esquecer que a UFS abriga cientistas que estão entre os melhores do mundo. Neste ano mesmo, confirma-se que seis pesquisadores da instituição integram a edição do Stanford/Elsevier’s Top 2% Scientists, levantamento que avalia a influência de cientistas entre mais de 10 milhões de pesquisadores em todo o mundo.
Os últimos quatro reitores foram questionados sobre o resultado da Chamada 12/2025 do CNPq.
“São dores da transição, explicitação da fragilidade do corpo técnico que deve executar as políticas institucionais independentemente dos dirigentes do momento. Na UFS já tivemos a presunção de que a fragilidade técnica e administrativa era exclusividade do governo estadual e governos municipais. Espero que aprendamos que a UFS precisa estar mais aberta ao mundo político externo e, simultaneamente, fortalecida em seu ethos acadêmico protegido das disputas políticas. É difícil, mas precisa ser perseguido”, respondeu Josué Modesto dos Passos Subrinho, reitor de 2004 a 2012.
Angelo Antoniolli (2012 a 2020) foi lacônico: “Inexperiência do pró-reitor (de Pós-Graduação e Pesquisa)”. Valter Joviniano de Santana Filho (2021 a 2025) apenas lamentou: “Uma pena”. E José Fernandes de Lima, reitor de 1996 a 2004, não respondeu.
UFS sem emenda de bancada
As emendas dos parlamentares sergipanos em Brasília sempre foram fundamentais para a consolidação dos programas e expansão da Universidade Federal de Sergipe. Foi graças às emendas que a instituição pôde construir um novo campus universitário no sertão de Nossa Senhora da Glória. Graças a emendas parlamentares a UFS conseguiu concluir as obras da Unidade Materno Infantil do Hospital Universitário, localizada no Campus da Saúde, em Aracaju, em 2020. São exemplos.
Agora, a bancada de Sergipe vai poder distribuir, em 2026, R$ 400 milhões em emendas coletivas e a UFS ficou de fora. O senador Rogério Carvalho e o deputado federal João Daniel, ambos do PT, defenderam a inclusão de emenda para a UFS. No entanto, a bancada parlamentar decidiu, sem nenhum respeito pela instituição, que as emendas que a UFS costumava receber não serão renovadas. Mas a culpa é da gestão. A avaliação quase unânime é que faltou competência para correr atrás, sobrando o isolamento e, para piorar, uma arrogância que afasta até quem queria ajudar.
Professores com experiência no assunto observam: mais do que tratar bem a bancada federal, independentemente de partido ou ideologia, é preciso ter interlocução constante, manter contato frequente com os 11 deputados e senadores e apresentar as reivindicações sobre as necessidades da instituição com antecedência. O reitor teria levado sugestões de emendas muito em cima da hora, segundo avaliam.
Outros problemas têm sido apontados. Os cursos de Psicologia e Direito, aprovados para implantação no Campus de Itabaiana, não foram autorizados pelo Ministério da Educação para 2026. E culpou-se o MEC. A proposta da UFS no edital Fapitec em relação ao PIBIC (Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica) teve a proposta desclassificada por perda de prazo.
Para o bem da grande e histórica Universidade Federal de Sergipe, é preciso levar a instituição mais a sério. Ali não é um sindicato ou um centro acadêmico, que muitas vezes se dirige com pruridos de toda espécie. A única universidade pública de Sergipe pertence a todos, indistintamente.
*Marcos Cardoso é jornalista. Autor de “Sempre aos Domingos – Antologia de textos jornalísticos” (Editora UFS, 2008), do romance “O Anofelino Solerte” (Edise, 2018) e de “Impressões da Ditadura” (Editora UFS, 2024). marcoscardosojornalista@gmail.com
Foto: Adilson Andrade/Ascom UFS.