A importância das eleições parlamentares

As eleições gerais de 2022 serão muito importantes para o presente e futuro de nossa combalida democracia, por variados aspectos.

E o início da propaganda eleitoral revela, mais uma vez, a total inadequação desse modelo de disputa eleitoral que faz coincidir em uma mesma campanha e em uma mesma votação as eleições para os mandatos executivos e para os mandatos legislativos.

Com efeito, já na distribuição legal do tempo destinado a cada qual das candidaturas, dos partidos e federações partidárias no horário eleitoral gratuito, é perceptível o quanto o espaço destinado às campanhas para o parlamento (especialmente nas vagas disputadas pelo sistema eleitoral proporcional: Câmara dos Deputados, Assembleias Legislativas e Câmaras Municipais em ano de eleições municipais) é reduzido, relegado a segundo plano e que mal dá para que sejam apresentadas ideias concretas de programas e projetos de atuação a ser implementados em caso de vitória quando do exercício do mandato.

Embora seja muito importante a escolha do governante, que vai comandar a Administração Pública, a política econômica, a execução de serviços públicos e de políticas públicas nas respectivas esferas nacional e estadual (também do Distrito Federal), o fato é que a cidadania não deve relegar a segundo plano a importante missão de eleger, e bem, representantes políticos que vão, no exercício da legislatura, além de fiscalizar os atos da Administração Pública, participar do processo de elaboração e reforma do direito a ser aplicado entre nós, aí incluída a elaboração de políticas públicas já a partir da discussão e aprovação da legislação orçamentária (plano plurianual, leis de diretrizes orçamentárias e leis orçamentárias anuais).

Na esfera nacional, diversos projetos de lei que alteram códigos (Código de Processo Civil, Código Penal, por exemplo) estão em tramitação; diversas propostas em discussão na sociedade já se apresentam no Congresso Nacional e eventualmente podem vir a ser apresentadas e ser objeto de discussão e deliberação [propostas de emenda à constituição (por exemplo, para ajuste ou revogação da emenda do teto de gastos) e projetos de lei sobre, por exemplo, ajuste ou revogação da reforma trabalhista, aperfeiçoamento dos mecanismos de democracia participativa, descriminalização do aborto, regulamentação do imposto sobre grandes fortunas, desmilitarização das polícias, fim do fator previdenciário no cálculo dos valores dos proventos de aposentadoria, democratização e controle social do serviço público das comunicações via televisão e rádio, controle de fake news e garantia da liberdade de expressão e do direito à informação]. O que pensam os candidatos sobre esses e outros importantes temas? Como se posicionam? Como pretendem votar, acaso realmente submetidos à deliberação? Mais ainda: qual é o posicionamento programático de seus partidos políticos e suas federações, pelos quais serão eleitos – e a quem pertencerão, em princípio, os seus mandatos – acerca desses e de tantos outros relevantes temas de competência do Parlamento?

Praticamente nada sabemos. A propaganda eleitoral, em especial aquela realizada no horário eleitoral gratuito no rádio e na televisão, não dá conta minimamente de travar um sério debate sobre programas, ideologias, projetos. Herança trágica da “Lei Falcão” (Lei n° 6.339/1976), a propaganda eleitoral dos partidos na televisão e no rádio, no tempo destinado às candidaturas aos cargos de deputado federal, deputado estadual e deputado distrital, com raríssimas exceções, limita-se a mencionar a legenda partidária, a biografia resumida do candidato, com breve exposição de sua imagem, bem como o pedido de voto, para si e para os candidatos aos cargos das eleições majoritárias. E os meios de comunicação social – que poderiam promover debates e discussões com candidatos aos cargos parlamentares (assegurada a igualdade proporcional de participação) – praticamente restringem esse tipo de iniciativa para a disputa eleitoral dos cargos executivos.

Desse modo, a disputa eleitoral para os mandatos parlamentares fica extremamente despolitizada e desqualificada, tornando-se disputa individual, isso num sistema de eleição (o sistema eleitoral proporcional) que prestigia o conjunto da votação partidária e não a votação individual dos candidatos, ainda que essa sistemática de eleição seja ignorada pela maioria do eleitorado.

É imperativo rever esse modelo. Uma ideia seria separar os momentos de campanha eleitoral e votação para mandatos executivos e legislativos, que não seriam coincidentes, dando margem para que os debates e as reflexões sobre as eleições para mandatos legislativos tivessem exclusividade de atenção e prioridade do eleitorado (é o que ocorre em alguns países, a exemplo dos Estados Unidos e França).

Como qualquer proposta de reforma política, para conseguir aprovação, depende de engajamento popular. A percepção da falência do atual modelo de eleição parlamentar (que até já passou por ajustes, como por exemplo a proibição de coligações partidárias nas eleições proporcionais e a instituição da cláusula de barreira), de tão evidente, precisa servir para a sua reforma significativa. Que a cidadania aproveite o momento para cobrar, de seus candidatos/partidos/federações, o compromisso com a mudança paradigmática do atual modelo de eleição e de campanha eleitoral para os mandatos parlamentares.

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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