Meu 1º Casamento Gay

Recentemente recebi o convite de casamento de dois conhecidos meus e aceitei. Foi a primeira vez que compareci a uma cerimônia de união entre duas pessoas do mesmo sexo, e não vou negar que entre a curiosidade (sobre os procedimentos) e o sentimento de felicidade por presenciar dois jovens casando nos dias atuais, não tive como dizer não. E não me arrependi. Aprendi sobre coisas que ainda nem sabia e também um pouco mais sobre o amor.

No atual (e sangrento) tempo em que estamos posicionados agora, o amor luta incansavelmente para não ser engolido pelo ódio. Nesta batalha diária, onde a vida alheia sempre nos causa comoção e rancor, vivemos numa corda-bamba estreita transpassada num despenhadeiro de desesperos. Se ligamos a TV é um tal atentado contra gays alí, se abrimos um site de notícias tem sempre um político, vestido em pele de cordeiro, pregando sutilmente que queimem homossexuais acolá, enfim… virou uma loucura esse tal ódio. Mas, se de um lado temos o ódio, de outro, graças a Deus, ainda lemos e presenciamos que o amor também existe. E que sorte a minha em poder presenciar algo sobre o tal-sofrido-amor-do-tempo-do-hoje.

Quando duas pessoas, independente do sexo, resolvem se unir perante a justiça e os olhares dos amigos é como se um estalo de felicidade fosse entoado no Universo. Acontece algo mágico. Quem nunca teve vontade de casar se vê diante da vontade de um sim e quem deseja casar um dia, só se consegue chorar durante todo o ritual. Creio que não existe nada mais sublime do que a louca intenção de dividir uma cama “para sempre” com outra pessoa. Sempre achei casamento um ato de suma coragem e total entrega. Só em saber que dormiremos de costas para outra pessoa e que no dia seguinte não teremos uma faca cravada nas costas já é um atestado de confiança maior que qualquer contrato firmado com um banco na Suíça.

Assim, quando um casal abre sua vida para que outras pessoas resolvam participar desse rito, tão sério e intenso, quanto é o casamento, desperta nos desacreditados aquela fagulha de esperança na vida. Cada casamento nada mais é que um sopro de vida adulta. Porém, creio eu, quando se trata de um casamento gay, tanto a força quanto a esperança ganham tons mais intensos.

Ali, diante da alegria do jovem casal de noivos, pude perceber um histórico de vida transcendendo para nos alertar que viver simplesmente é isto: uma fração de segundos diante do bafo matinal da vida. É rápido e preciso, necessita ser feito e conciso, porém, é fundamental se fazer acontecer e acreditar em tudo que se propôs sentir.

Creio que até para quem não respeita a união gay, o simples sim dito por duas pessoas, nesta situação, deve tocar a alma (seca de um preconceituoso). Se um homem e uma mulher resolvem se casar, hoje, já é motivo pra aplauso. Imagine se são duas pessoas massacradas socialmente, numa fogueira soft de olhares tortos. Já imaginou? Dois caras que se casam ou duas mulheres que resolvem se firmar numa união são vencedores de uma corrida sofrida diante de tantos percalços causados pelas doenças sociais.

A cerimônia da Areia

Quando meus conhecidos seguraram jarros de areias coloridas e seus padrinhos e familiares idem, e juntaram toda a areia num único pote, me emocionei. Horas depois fiquei parado e sozinho olhando o monumento de areia recém-formado e pensando sobre o ritual de união que tinha presenciado. Certamente, uma das coisas mais bonitas que já vi. A areia, segundo algo recitado pelo cerimonialista, tem o poder de se adequar às situações da vida, ela enfrenta o vento do preconceito, se firma em planícies delicadas e pode ser usada para construir algo sólido ou também para destruir preconceitos.

A junção de cada pote com areia (cada qual com sua cor), num único recipiente, tem um simbolismo muito forte. Ali, naquele casamento, significava além de tudo que já citei acima, a possibilidade de se fazer de duas vidas uma junção prazerosa entre pessoas que venceram seus medos e se encontraram numa vírgula do destino. Por isto, quando dois gays se casam não são apenas mais dois homens (ou mulheres) que estão dizendo sins para uma plateia. Um casamento gay deve ter o sabor doce de algo que muitas vezes sonhado (e talvez pensado que impossível), agora se fincou no firmamento da verdade, da existência em si. Acho que por esse motivo vira um acontecimento.

Num mundo de tantos nãos, quando dois gays dizem sins quebram-se correntes do mal, do agouro e do não acreditar ser possível. Um casamento gay nada mais é que uma forma de sobreviver a um tornado de desesperanças, sobreviver depois de um naufrágio em alto mar. Então para cada casal gay que proclama sim, renasce, no mundo, uma ponta de esperança no amor.

P.S: Este texto é dedicado aos jovens, Eder do Valle e Ricardo Oliveira. Obrigado pelo convite, vocês tocaram meu coração. Espero que sejam felizes e que suas mãos tenham sempre remos, para que vocês naveguem esta vida da melhor forma possível juntos.

Para conversar comigo sobre este e outros assuntos (e sugerir temas também):
Facebook: https://www.facebook.com/jaime.neto.58
Twitter: @jaimenetoo
Instagram: @jaimenetoo

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
Comentários

Nós usamos cookies para melhorar a sua experiência em nosso portal. Ao clicar em concordar, você estará de acordo com o uso conforme descrito em nossa Política de Privacidade. Concordar Leia mais