“MEU COMPROMISSO É DINAMIZAR O TRIBUNAL”

A segunda mulher a presidir o Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe pretende investir na tecnologia e na qualificação de pessoal, para facilitar o acesso da sociedade à Justiça. Aos 33 anos de magistratura, a desembargadora Marilza Maynard Salgado de Carvalho se tornou uma celebridade no mundo jurídico, graças à maneira simples de analisar o direito e sua atuação como professora da Universidade Federal de Sergipe.

Casada com o economista João Salgado de Carvalho Filho, é mãe da advogada Mayra Maynard e do juiz de direito do Estado da Bahia, Ulysses Maynard Salgado. Durante a entrevista em seu gabinete, pudemos notar a suavidade agradável da decoração, cumulada com uma dose de respeito aos princípios morais e jurídicos de quem preside o mais alto escalão do Poder Judiciário. Facilmente, os jurisconsultos definiriam essa harmonia embasando-se na tese da identidade, onde a moral e as normas jurídicas se unem para o cumprimento da lei.

 

Esta é a forma que a sociedade sergipana deve ver a laranjeirense Marilza Maynard. Serena, na administração nos primeiros 60 dias instaura uma relação sadia com a sociedade, a imprensa e Ordem dos Advogados do Brasil, cumprindo assim o papel social que lhe é de obrigação. Rompendo o silêncio com a imprensa, fala ao Portal InfoNet – em entrevista concedida ao jornalista e advogado Fausto Leite – sobre suas metas à frente do TJ, e mostra preocupação em levar a Justiça a todos os sergipanos.

 

PORTAL INFONET – A senhora disse em sua posse que o momento é de muita reflexão para o judiciário. Efetivamente o que venha ser essa reflexão?

MARILZA MAYNARD – Às vezes somos mal interpretados quando falamos em sentido amplo. Ora, nossa língua é rica em significado e, por isso, podemos ter vários tipos diferentes de interpretação. Mas, seguramente, quanto a essa afirmação me referir sobre nossas atitudes, nossos procedimentos e a maneira de tramitar os processos, pois não só o judiciário, quanto outras instituições, passam por um momento delicado e de descrédito junto à sociedade. Nossa administração tem como finalidade mostrar a sociedade que estamos trabalhando, talvez porque a nossa forma de trabalho que é enclausurada não demonstra o quanto desenvolvemos nossa atividade em busca de manter a harmonia entre os cidadãos. Por isso é que falo sobre essa necessidade de reflexão dos magistrados para com a população, pois com a evolução natural, nós juízes, não podemos nos comportar como outrora. Para se ter uma idéia, quando eu entrei na magistratura fui orientada pelo Tribunal para que não tivesse nenhum relacionamento maior com políticos, empresários e até a com a própria sociedade, para que ficássemos isentos de qualquer situação quando tivéssemos que julgá-los. Hoje, é totalmente diferente. O juiz tem que estar perto do povo, observar seu cotidiano, fazer parte da sociedade, ou seja, ser tão gente quanto todos. Ora, não somos melhores que ninguém. Apenas aplicamos a lei, graças ao poder que o Estado nos concedeu. Devido isso é que precisamos dar continuidade aos projetos dinâmicos do desembargador Manuel Pascoal no que se refere a manutenção dos Fóruns Integrados e na criação de outros novos, como já está previsto a construção de um no município de Nossa Senhora do Socorro e outro na Terra Dura. Vamos refletir sobre o judiciário levando justiça a todos, seja onde for, pois nosso compromisso é com a sociedade e ela precisa ser respeitada e o magistrado deve a cada momento se socializar.

 

 

INFONET – Quais seriam os projetos primordiais para o desenvolvimento do TJ/SE?

MM – Estamos em mundo globalizado e temos de investir em tecnologia e na formação dos nossos servidores. Vamos comprar agora 500 computadores e 300 impressoras, pois é inadmissível que os funcionários não tenham computadores para trabalhar. Investiremos em cursos e qualificação de pessoal, pois assim poderemos ter uma mão de obra mais qualificada e capaz de manter a máquina do judiciário funcionando a todo vapor. Para que isso fosse possível, fui obrigada a tomar algumas decisões importantes, como ajustar os salários dos conciliadores aos auxiliares de juiz, pois ambos os cargos são destinados a bacharéis de direito e, com a quantia que sobrou, demos uma gratificação aos 130 executores de mandato que hoje funcionam como os antigos oficiais de justiça, cargo este já em extinção no Tribunal, afinal são eles os representantes do magistrado no primeiro contato com a sociedade, afinal também sabemos que este tipo de atividade é perigosa. Outro ponto é a construção de fóruns distritais no interior do Estado para levar a justiça a todos. Ainda esta semana nos reunimos com vários prefeitos, com finalidade de fechar parcerias para a manutenção desses fóruns e temos tido por parte deles uma boa receptividade. Outro ponto que gostaria de registrar é que no site do TJ temos uma caixa de sugestões e, graças a Deus, os advogados e a população têm colaborado para tornar mais célere nosso atendimento. No campo processual estamos estudante o projeto de implantação do “processo virtual” nos juizados especiais, que muito facilitará a vida dos advogados, dos juízes e promotores. Temos também a intenção de levar juizados especiais e uma vara de assistência judiciária para dentro das faculdades para que os graduandos de direito através da matéria prática forense possa realizar um trabalho social e ao mesmo tempo aprender na prática como funciona a liturgia processual. Temos também uma unidade móvel que voltará a funcionar nos bairros de Aracaju, pois é necessário que a população veja o trabalho do Poder Judiciário.

 

 

INFONET – O começo de sua administração foi marcada por mudanças fortes, que mexeram com a estrutura do TJ, tanto na capital quanto no interior. Isso mostra que seu perfil administrativo é efetivamente diferente dos demais?

MM – Não, muito pelo contrário. Estou pronta para trabalhar e cumprir com as minhas obrigações. Minha equipe tem saído do Tribunal invariavelmente às 22 horas, pois somos compromissados com a sociedade e o horário tem que ser cumprido tanto pelos magistrados quanto pelos servidores. A informação que veiculou na imprensa sobre a questão dos fóruns do interior funcionarem nos dois expedientes não procede. Óbvio que este pode funcionar internamente, pois é nesse horário que os juízes fazem suas sentenças, os chefes de secretaria atualizam os despachos com a finalidade de dar vazão aos trabalhos cartoriais, pois houve um enxugamento muito grande de funcionários e isso reflete no andamento processual. No interior, em especial, onde alguns destes funcionários são cedidos sem ônus para o tribunal, não há tanto problema, porém a variação é muito grande entre um município e outro. Para se ter uma idéia, de nossa preocupação quanto ao pessoal estamos viabilizando a formação de um quadro substituto para suprir essa deficiência. Mas os problemas administrativos são resolvidos de acordo com seu surgimento e para isso é que temos uma equipe do próprio corpo do Tribunal nos dando uma assessoria sobre esses aspectos. Voltando ao foco da questão, gostaria de frisar que cada pessoa tem uma visão de administração. Talvez a minha seja diferente das demais, até porque, cada qual tem sua identidade própria e temos que respeitá-las, mas quanto a minha pessoa, pelo fato de me colocar mais perto da população, tenha tido uma repercussão maior. Mas todos nós temos um compromisso com a sociedade e em prol da justiça.

 

INFONET – Os servidores do TJ/SE têm se mostrado descontentes com alguns atos de Vossa Excelência, como é o caso da suspensão das horas extras e do corte da verba de 30% de representação de gabinete. Como a senhora analisa esta situação?

MM – Analiso da forma mais tranqüila possível, pois sei que ninguém gosta de ver seu salário reduzido, mas é preciso fazer isto para que o judiciário possa pagar suas contas. No que se refere às horas extras, não foi ato da minha administração. Outro fator que deve ser levado em consideração é a questão da distribuição dessa gratificação. Havia pessoas no mesmo setor desempenhando o mesmo trabalho sem essa gratificação. Sou da teoria de que se não pode dar a todos, é melhor não a dar a ninguém. Gerir um poder do tamanho do Judiciário é algo muito complicado e, às vezes, os servidores não entendem porque são tomadas algumas medidas. Costumo economizar luz, água e telefone, pois isso é público e quem nos paga é a sociedade. Com essa economia posso dar melhores condições de trabalho para eles próprios e ter uma reserva para ampliar as unidades judiciárias e criar mais cargos na capital e no interior, abrindo assim oportunidades para os jovens ingressarem no mercado de trabalho via concurso público. Para se ter uma idéia, o Tribunal de Justiça de Sergipe hoje tem a mão de obra mais qualificada do Brasil. A maioria dos nossos técnicos tem formação jurídica, cerca de 80%, isso faz com que o serviço seja qualificado e capaz de atender os anseios da comunidade.

 

INFONET – Alguns setores têm elogiado sua posição em devolver os policiais militares à disposição do TJ ao comando da Polícia Militar. Entretanto, há uma corrente que defende a manutenção destes sob a alegação de que os juízes precisam de segurança. Isso é verdade?

MM – Ingressei na magistratura em 1971, sendo uma das três primeiras mulheres a se tornar juíza neste Estado. Trabalhei nas comarcas de Neópolis, Simão Dias, Itabaiana, 4ª Vara Criminal e 9ª. Cível, e nunca precisei de segurança à minha disposição. A polícia tem que dar proteção à sociedade como um todo, e não especificamente ao magistrado que está contido nela. Obviamente que o juiz que estiver passando por qualquer tipo de ameaça terá o apoio irrestrito do Tribunal. Não posso permitir esse privilégio, que não é ético no meu modo de pensar. Quem mais sabe desta necessidade sou eu, que já senti na pele o que é trabalhar nas comarcas do interior.

 

INFONET – O presidente da OAB/SE, Henri Clay tem elogiado sua administração. Isto pode ser visto como um ponto positivo à nova presidente?

MM – Eu penso nisso de forma coerente e para bom do andamento da justiça. Em meu discurso de posse fui clara em enfatizar que a justiça não funciona sozinha. Ela funciona com o Ministério Público, com os juízes, com os advogados, com a Defensoria Pública e com os seus servidores quem têm que andar de mãos dadas dando sua contribuição à sociedade, que não mais almeja e sim exige a celeridade do processo. Então, se tivermos uma boa parceria nesse sentido os processos não ficarão emperrados, por isso temos que oferecer condições de trabalho a todas essas classes, pois são dependentes entre si. Tanto assim que nossa função é solucionar problemas, e não criá-los. Passo o dia todo pensando em maneiras de resolvê-los e, quando temos um diálogo amistoso com essas classes, tudo fica mais fácil. Penso na Justiça de forma panorâmica e não restrita, e acredito que isso é que me faz ser um pouco diferente dos demais.

 

INFONET – Finalizando, o que a sociedade pode esperar desse biênio do TJ/SE?

MM – Olha, a sociedade pode esperar muito trabalho com transparência. Muita vontade de acertar, pois às vezes almejamos algo que não venha a corresponder com sua expectativa. Mas meu objetivo é acertar, fazer com as justiça funcione e a sociedade possa ter uma credibilidade maior do Poder Judiciário. Na verdade, nada mais é que dar condição digna aos servidores. Vamos tentar fazer uma justiça cidadã e aproximarmos cada vez mais da sociedade.

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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