Mochilando pelo Recôncavo Baiano

Igreja Matriz de Cachoeira
Convento do Carmo com pousada e igreja

Partindo de Aracaju ou de Salvador? Depende. A unanimidade é que as cidades do Recôncavo Baiano preservam um cotidiano próprio, tradições seculares, casarios tombados pelo Patrimônio Histórico Nacional e uma boa gastronomia a ser referenciada pelos visitantes.

O Tô no Mundo partiu de Aracaju (SE), com parada em Feira de Santana (BA), e fez um mochilão pela terra do clã Veloso, Santo Amaro da Purificação, com dois dias em Cachoeira e São Félix.

O destino é para quem gosta de patrimônio histórico aliado à observação de imagens sacras seculares das igrejas católicas, apreciação dos gostos apurados dos temperos baianos e do azeite de dendê, além de muita cultura afro-brasileira. Santo Amaro da Purificação, Cachoeira e São Félix têm o que mostrar.

Casa dos Velosos em Santo Amaro

Terra dos Velosos – Santo Amaro da Purificação é a primeira parada a ser desbravada a 49km de Feira de Santana, 80km de Salvador ou 313 km de Aracaju. Famosa por seus ilustres filhos: Caetano Veloso e Maria Bethânia, Santo Amaro da Purificação (BA) é bem mais que a terra quase que santificada por Dona Canot. A cidade resguarda um patrimônio histórico secular, a exemplo da Igreja da Matriz de Nossa Senhora da Purificação, da casa da câmara e cadeia pública, do Solar de Subaé, hoje Casa do Samba, da Santa Casa de Misericórdia, da Igreja de Nossa Senhora do Amparo, além da Igreja de Senhor Santo Amaro.

O traçado irregular das ruas datado do século XVIII, além de casarões e sobrados com varadas típicas da época provocam uma viagem ao tempo áureo da região, que resguarda a uníssona composição patrimônio/ musicalidade. Basta caminhar pelas ruas no entorno da igreja matriz aos domingos para ouvir músicas tocadas pelas bandas de fanfarra da cidade ou a sonoridade dos diversos músicos nas varadas dos casarões.

Roda de capoeira é hábito do Recôncavo

O Museu do Recolhimento dos Humildes é outra boa opção para quem busca turismo cultural. O acervo composto por 493 peças inclui relíquias como imagens barrocas do século XVIII, mobiliário do século XIX, alfaias e imaginária. Destaque especial para as imagens de traços orientais e as peças e monumentos artístico-religiosos elaborados à mão pelas freiras, a exemplo da Divina Pastora, uma relíquia artesanal exposta em redoma de vidro. De quebra, o visitante ainda pode saborear deliciosos sequilhos caseiros feitos pelas freiras do convento que funciona ao lado do museu. (Aberto de terça a sábado, das 09h às 13h).

Não deixe de visitar a feira local onde pode-se encontrar os tradicionais ingredientes da culinária baiana, a exemplo do azeite de dendê e do camarão defumado.

A viagem só está começando, porque bem pertinho dali a próxima mochilada é em Cachoeira, Patrimônio Cultural e Arquitetônico do Brasil, que fica a 40km dali pela BR-420.

Altar-mor da Igreja Matriz
Igreja Matriz de Santo Amaro

Bela vista do Paraguaçu – Ao desembarcar no terminal rodoviário de Cachoeira o turista tem uma visão privilegiada do Rio Paraguaçu e observa de imediato o que lhe aguarda: muita história dos tempos aéreos do Brasil escravocrata.

A charmosa cidade preserva um patrimônio histórico dos séculos XVIII e XIX, quando seu porto era utilizado para escoamento de grande parte da produção agrícola do Recôncavo Baiano, principalmente açúcar e fumo, produtos até hoje produzidos no município.

Samba de roda do Recôncavo é patrimônio

Destacam-se o Paço Municipal, com sobrados tombados pelo Iphan, a casa de câmara e cadeia pública e a Igreja e Convento da Ordem Terceira de Nossa Senhora do Carmo, um ícone na história do município, datado de 1715, construído em estilo barroco. O interior da Igreja do Carmo é revestido de ouro e painéis de azulejos portugueses, abrigando também imagens de madeira de Macau.

A significativa presença de africanos e afrodescendentes em interação com europeus de variadas nacionalidades fez de Cachoeira uma base de estudos do sincretismo religioso. Basta fazer uma visita ao casario e a igreja da Irmandade de Nossa Senhora da Boa Morte para perceber o quanto a cidade é importante para a história.

Flanar pelas ruas – Passear pelas ruas de Cachoeira é sentir o cheiro da cozinha tipicamente do tempo escravocrata, a base de mandioca, a exemplo da maniçoba e do bobó, apreciados nos restaurantes locais. É ouvir as histórias dos terreiros de candomblé e imaginar como foi Cachoeira, segunda capital da Bahia.

Feiras livres em Cachoeira

Não deixe de conhecer a Igreja da Matriz Nossa Senhora do Rosário, com teto em estilo barroco, completamente adornado por afrescos. Sua sacristia é um patrimônio a parte. Vizinho a ela fica o casario onde nasceu à enfermeira Ana Néri. Há também a Casa de Samba da Dona Dalva e mais adiante a Santa Casa, construído no século 18, a Capela de Santa Bárbara e o chafariz imperial.

O edifício que abriga a Igreja Nossa Senhora da Ajuda foi construído em 1687 e se trata da primeira igreja da cidade de Cachoeira. Construção de relevante importância arquitetônica, abriga as imagens de Nossa Senhora da Ajuda, São Francisco de Assis, São Benedito, Santa Luzia, São Caetano e São Pedro. Nesta Igreja encontra-se a Irmandade de Nossa Senhora D´Ajuda.

No entardecer, a dica é aguardar o pôr do sol à beira do Paraguaçu. Do outro lado do rio fica a cidade de São Fêlix e unindo as duas está a Ponte D. Pedro II, inaugurada em 7 de julho de 1865.

Vista de São Félix a partir de Cachoeira

Do outro lado do rio – Há uma disputa em saber se a vista do Rio Paraguaçu é mais bonita da cidade de Cachoeira ou do outro lado do rio, em São Félix (BA). Difícil de responder, mas é sabido que em São Félix o pôr do sol e a visita guiada a fábrica de charutos Dannemann atraem cada vez mais visitantes.

Na cidade, o turista terá o contato com a história do Brasil tão logo chegue passe pela ponte D. Pedro II, datada em 1865. A instalação é considerada uma preciosidade da engenharia da América do Sul à época, construída em estrutura de ferro e lastros de madeira importados da Inglaterra. A vista das duas cidades é um espetáculo à parte.

Percorrer as suas ruas de São Félix e observar com calma os casarões é um retorno ao tempo hegemônico da cana de açúcar e do fumo na região. A arquitetura do paço municipal e do mercado ao centro mostra um Brasil escravocrata, através do conjunto arquitetônico bastante representativo em cidades históricas. Mas é no cruzar do trem da Ferrovia Centro Atlântico que a cidade para no tempo esperando a locomotiva dividir o espaço público com pedestres, bicicletas e carros.

Irmandade da Boa Morte – Cachoeira

Há um cruzeiro na parte mais alta de São Félix, onde se tem uma visão privilegiada do Paraguaçu e da cidade de Cachoeira, com as torres das igrejas em desencontro com os casarios. Para se chegar lá é preciso ter fôlego e condicionamento físico ou utilizar dos serviços de um moto-táxi. Na parte de baixo, visite a primeira igreja em frente à antiga estação ferroviária. Percorra mais um pouco e veja a fachada da antiga cadeia pública e a igreja alusiva a São Félix.

Enquanto o sol não se despede, faça uma visita guiada ao tradicional Centro Dannemann, que fabrica charutos “puros” iguais aos cubanos. A estalagem leva o título de mais antiga do gênero do Brasil (1873), com fabrico totalmente artesanal e sem conservantes. Lá é possível acompanhar todo o processo de fabricação, desde o conhecimento de sementes, secagem de folhas, fermentação, distribuição do fumo, colagem, depuração em estufas e testes de qualidade.

Fabrico de charrutos em São Félix

Conta-se que a cidade observou seu apogeu devido a uma região denominada de Mata Fina, propicia ao cultivo do tabaco. Dela, as “Charuteiras do Recôncavo” souberam aproveitar o solo fértil e o cultivo das folhas, transformando os charutos em iguarias disputadas nos mais famosos mercados internacionais, a exemplo da Suíça e da Alemanha.

Basta dar uma olhada no enrolar das folhas de fumo, em consonância com o cheiro, para aguçar os paladares mais exigentes, até mesmo de quem nunca levou um charuto à boca.  As vestes coloridas das charuteiras, o turbante branco, os chinelos rasteiros completam um desenho em que a baianidade, aliada ao fino trato do tabaco, fazem do Centro Dannemann um dos principais pontos turísticos a ser visitado na histórica São Félix. Agora é só apreciar o pôr do sol na saída da fábrica e se despedir do Recôncavo com o gostinho de quero voltar.

Como chegar

Caso opte pelo ônibus partindo de Aracaju, distante 340km, a dica é ir até Feira de Santana. Na cidade baiana há uma empresa denominada de Rodonave, que parte quase que de uma em uma hora. A depender dos trechos, o preço da passagem não chega a R$ 10, mas cuidado: as vezes os ônibus chegam nas rodoviárias lotados e os passageiros são obrigados a fazer o trajeto em pé. Partindo de carro, a BR 101 é sempre rota principal para se chegar ao destino.

Partindo de Salvador, percorre-se de ônibus 80km até chegar a Santo Amaro da Purificação. Há duas empresas denominada de Jauá ou Viação Santana, que fazem o trajeto ao preço que não chega a R$ 20. Da rodoviária de Santo Amaro, há ônibus de uma em uma hora para Cachoeira.

Dicas de viagem – Santo Amaro da Purificação

Não deixe de dar uma passadinha na casa 179, da rua do Amparo. Foi lá onde Dona Canô morou e faleceu aos 105 anos. Em fevereiro a cidade homenageia Nossa Senhora da Purificação com a tradicional procissão e missa cantada por Maria Bethânia.

Geralmente os principais museus e igrejas não abrem às segundas-feiras. No domingo, a maioria das lojas do centro está aberta e há uma feirinha no centro de abastecimento.

No entorno da cidade, há trilhas, cachoeiras e lagoas, onde o contato com a natureza é ponto principal.

Não deixe de visitar o teatro Dona Canô. Vizinho ao teatro fica a tradicional Casa de Samba do Recôncavo Baiano.

Dicas de Viagem – Cachoeira

Rio Paraguaçu

A dica é ter Cachoeira como ponto de estadia. Há boas instalações, principalmente de pousadas e apart-hoteis, porém a sugestão é se hospedar na Pousada Convento do Carmo. As instalações precisam de reforma e melhoria dos serviços, porém, continua sendo uma boa pedida para quem quer curtir a história. A pousada possui um bom restaurante com agradável vista da piscina.

Não deixe de visitar o Centro Cultural da Irmandade da Boa Morte, aberto a partir das terças-feiras. Há uma exposição permanente de fotos. A história é recheada de segredos e misticismo da Irmandade, originada a mais de 200 anos. A Casa da Irmandade funciona em um conjunto de quatro sobrados do século XVIII, restaurados pelo Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural (Ipac). A festa aconteceu de 13 a 15 de agosto, todos os anos. Rua Treze de Maio, nº 32. (75) 3425-1468;

Antiga estação de trem de Cachoeira

Há inúmeros ateliês na cidade, a exemplo do casarão Hansen Bahia, que deverá ser visitado. Na Praça da Aclamação, o sobrado-sede do Iphan abriga obras de artistas baianos. Há também bons restaurantes no entorno.

O samba de roda é o ritmo tradicional do Recôncavo Baiano e Patrimônio Imaterial do Brasil. No mês de março acontece a emancipação política da cidade e apresentações são quase que diária.

Dicas de Viagem – São Félix

No Centro Dannemann há uma visita guiada e o visitante pode escolher sua árvore para ser plantada dentro de um programa de reflorestamento. Com agendamento prévio, também se pode visitar as fazendas da empresa. A fábrica não funciona às segundas-feiras.

Sacristia da Igreja do Carmo em Cachoeira

O trem cruza o centro da cidade até hoje por volta das 16h. O fim de tarde proporciona um belo pôr do sol com vista para o Paraguaçu;
Na orla de São Félix há uma estátua representando a índia Paraguaçu.

Populares não recomendam subir até o Cruzeiro sem o devido acompanhamento de um guia local por conta da segurança.

Fotos: Sílvio Oliveira

Contato: silviooliveira@infonet.com.br

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