Depois de lançar dois promissores trabalhos, os quais o credenciaram como grande e incansável pesquisador da música sergipana de raiz, o cantor e compositor Kleber Melo acaba de pôr no mercado o seu terceiro e mais interessante CD. Intitulado “Herança”, nome de sua belíssima canção que participou do 1º Prêmio Banese de Música, realizado em maio de 2004, e que, mesmo indo para a final, injustamente não conseguiu se classificar entre os três primeiros lugares, o álbum contém músicas que denotam, de forma indiscutível, o amadurecimento artístico do artista. A citada canção, inclusive, é, sem qualquer exagero, um desses temas que soam atemporais. Com um refrão forte pra caramba e uma letra super elaborada, tem tudo para se transformar em um dos carros-chefe da carreira de Kleber. Em seu bojo, o disco faz uma homenagem à cultura africana trazida ao Brasil dentro dos navios negreiros, cultura essa que vem merecendo do artista uma pesquisa árdua, resultando já em alguns trabalhos sonoros sobre o tema. Kleber começou sua carreira participando de festivais universitários, mas foi no Sescanção que teve seus momentos de reconhecimento, posto que foi nesse evento que ele alcançou, por duas vezes, o primeiro lugar. Compositor criativo, suas letras se destacam da média geral por conterem construções elaboradas e idéias muitas vezes bastante criativas, repletas de referências à sua aldeia. Suas melodias, via de regra, remetem às pesquisas musicais que se baseiam nas fontes mais genuínas da nossa cultura. Assim é que cocos, maracatus e forrós aparecem em sua obra de forma freqüente e se misturam em um caldeirão sonoro característico que termina trazendo à tona reminiscências de um Nordeste ao mesmo tempo alegre e sofrido. Como cantor, há que se destacar que os anos de estrada têm lhe trazido avanços consistentes. Tanto assim o é, que se torna mais que prazeroso ouvir sua voz se soltar certeira em canções como “A Dança das Mãos”, “Piabeta” e “Pedintes” (esta já gravada anteriormente pela cantora Amorosa). O trabalho gráfico do disco está bem bacana, fazendo falta somente as letras no enxuto encarte. Gravado no Estúdio Capitania do Som, do competente Neu Fontes, os arranjos contam com a intervenção de músicos de ponta da nossa terra, a exemplo de Carlinhos Menezes (teclados), Jorginho (baixo), Mestrinho (sanfona), Tom Toy (percussão), Eduardo Montessanto (violino), Rominho (bateria), Genivaldo Lima (cello) e Denise de Aragão (flauta transversal). Kleber assina sozinho sete das doze faixas. Nas outras, fazem-se presentes alguns de seus parceiros mais constantes, tais como: Jorge Ducci (na obra-prima “Só e Vadio” e na embolada “Banho de Gato”), Marta Mari (no macio reggae “Santa Idade”) e Mingo Santana (na otimista “Ao Deus Dará”).Junta-se agora ao seleto time o produtor musical Bruno Montalvão, co-autor da meso-indiana “Lentes de Contato”. Completam o repertório a etérea e contemplativa “Vilarejo”, a contagiante “Estrela Sergipana” e o afoxé “Oxum das Fontes”, três ótimos momentos desse CD que chega em muito boa hora e merece ser conhecido pelos apreciadores da nossa música de qualidade. É certo que o cara já havia se destacado ao integrar a banda Los Hermanos, a qual aterrissou no mercado fonográfico com a explosão do hit descartável “Anna Júlia”, mas que, logo depois, optou por um repertório “cabeça”, tornando-se, ato contínuo, a queridinha dos descolados. A fatia universitária mais empolgada, então, sabe todas as canções de cor e sentiu-se órfã quando, no ano passado, os rapazes optaram por um recesso por tempo indeterminado (leia-se: dissolução). Mas é também incontestável que se hoje Marcelo Camelo tem caminho aberto na MPB (especialmente entre as intérpretes femininas), muito se deve por conta da inclusão de três canções de sua autoria no aclamado disco de estréia da cantora Maria Rita (as ótimas “Cara Valente”, “Veja Bem Meu Bem” e “Santa Chuva”). Foi, decerto, daí em diante que a curiosidade em torno de seu nome se fez despertada, especialmente junto a uma mídia que procura criar novos ídolos com a mesma velocidade com que os esquece. Camelo é, de fato, um compositor talentoso, embora algumas de suas canções soem difíceis de serem assimiladas. Tenta ser plural (o que, nos dias de hoje, se mostra um mérito e tanto) e explicita criativas idéias em letras que se apresentam, de fato, inteligentes. Por conta de tudo o até aqui escrito não seria de se estranhar que o desejo de abraçar uma carreira solo fosse somente uma questão de tempo. E isso acaba de se concretizar através do lançamento do CD intitulado “Sou” (palavra que, numa sacada extraordinária, vista de ponta a cabeça na capa, transforma-se em “Nós”), o qual acaba de chegar às lojas através da gravadora Sony & BMG. Produzido pelo próprio artista, o trabalho é composto por uma dúzia de canções que ele assina sozinho, quase todas elas inéditas (a exceção é a já citada “Santa Chuva”, que ganha ares camerísticos em delicado arranjo de cordas assinado pelo competente Gilson Peranzzetta). No quesito intérprete, embora fosse de se esperar que rasgasse a voz aos borbotões, como seria de praxe a um ex-vocalista de banda de (pop) rock, Camelo prefere cantar minimalisticamente, opção reforçada pela limitada extensão vocal. Conhecedor disso e sabendo até onde pode ir, emoldura as canções apresentadas em arranjos que ressaltam muito mais os pequenos detalhes do que a massa sonora propriamente dita. É de se esperar, assim, que os moderninhos curtam o recém-lançado álbum (bom no resultado geral), mas menos por apresentar canções extraordinárias (o tema central é a solidão) do que por se centrar na aura mítica que já envolve Camelo. Os melhores momentos ficam por conta da bonita “Téo e a Gaivota”, da surpreendentemente animada “Menina Bordada”, do pseudo-maracatu “Vida Doce” e da marchinha “Copacabana”, esta incrementada por um pesado naipe de metais. Além da participação ativa dos rapazes do grupo paulista Hurtmold em quatro faixas, Camelo conta, para abrilhantar o seu trabalho de estréia, com as participações especiais da exímia pianista Clara Sverner (nas versões instrumentais das canções “Passeando” e “Saudade” – que também surgem no formato violão e voz), de Dominguinhos (que toca sanfona na melodicamente confusa “Liberdade”) e de Mallu Magalhães (presente nos vocais da folk bilíngüe “Janta”). Um CD que poderia ser melhor, mas que credencia Marcelo Camelo para futuros e mais altos vôos. N O V I D A D E S · E enquanto Marcelo Camelo põe nas lojas o seu primeiro CD solo, um dos companheiros da extinta banda Los Hermanos, Rodrigo Amarante, finaliza um novo trabalho ao lado de sua nova banda, a Little Joy, formada por ele, Fabrizio Moretti (o baterista do grupo norte-americano The Strokes) e Binki Shapiro (a namorada de Moretti) e que deverá ser lançado em novembro próximo. Composto por onze faixas (somente uma tem letra em português, as demais são cantadas em inglês), o CD leva a assinatura de Noah Georgeson na produção e terá lançamento internacional a cargo do selo Rough Trade. · Pela primeira vez, o Prêmio Shell de Música homenageou alguém que não é compositor. Trata-se de Maria Bethânia, laureada na noite do último dia 9 na casa Viva Rio, onde realizou um show memorável para os presentes, revisitando canções pontos-chave de sua consagrada carreira e apresentando, em primeira mão, alguns temas inéditos com sua abençoada voz. Muito merecido! · Idealizado dentro do projeto “Grandes Encontros”, realizado pelo Teatro Rival (RJ), o show “Olho de Lince” reuniu naquele palco, semana passada, Jards Macalé, Adriana Calcanhotto e Omar Salomão com o objetivo de homenagear o pai deste último, o polêmico e criativo Wally Salomão. Na apresentação, que poderá virar disco, foram revisitadas algumas das grandes canções letradas por Wally, como “Vapor Barato”, “Anjo Exterminado” e “Negra Melodia”, entremeadas com intervenções poéticas de sua autoria. · Chegará às lojas no comecinho do próximo mês, através da gravadora Universal, o novo CD de Zeca Pagodinho, recheado de canções inéditas. As participações especiais ficarão por conta de Jorge Ben Jor (que recitará a Oração de São Jorge na faixa “Ogum”) e da Velha Guarda da Portela. · “La Plata” é o título definitivo do novo CD do Jota Quest, um lançamento da gravadora Sony & BMG, que chegará ao mercado no início de outubro. Produzido por Liminha, o álbum trará o repertório baseado em músicas inéditas e terá como carro-chefe “Ladeira”, parceria da banda com Nelson Motta. · O DVD “Samba Meu”, gravado ao vivo por Maria Rita na casa de shows Viva Rio, no Rio de Janeiro, chegou recentemente às lojas reunindo, no repertório, canções apresentadas em seus três CD’s. Como extra, a cantora interpreta “Não Deixe o Samba Morrer”, sucesso imortalizado pela cantora Alcione. · A trilha sonora da nova telenovela das 19 horas, “Três Irmãs”, acaba de aportar no mercado reunindo nomes famosos da música internacional com conhecidos artistas brasileiros. Dentre as canções escolhidas estão “Midnight Bottle” (com Colbie Caillat), “Barbara Ann” (com The Beach Boys), “Summer at Eureka” (com Pete Murray), “Medo de Amar nº 2” (com Simone), “Maracangalha” (com Diogo Nogueira), “Moça” (com Caetano Veloso), “10 Contados” (com Céu), “Maior Abandonado” (com Léo Jaime), “Não é Proibido” (com Marisa Monte) e a faixa de abertura, “Don´t Worry, Be Happy” (com Mart’nália). RUBENS LISBOA é compositor e cantorCantor: KLEBER MELO
CD: “HERANÇA”
Gravadora: INDEPENDENTE
Cantor: MARCELO CAMELO
CD: “SOU”
Gravadora: SONY & BMG
Quaisquer críticas e/ou sugestões serão bem-vindas e poderão ser enviadas para o e-mail: rubens@infonet.com.br
Comentários