MUSIQUALIDADE

R E S E N H A     1

 

Cantores: VEVETA e SAULINHO

CD: “A CASA AMARELA”

Gravadora: UNIVERSAL

 

Quando, em 2005, a gaúcha Adriana Calcanhotto resolveu dar uma “pausa” na sua carreira voltada para o público adulto e mergulhou de cabeça no universo infantil, chegando a adotar o heterônimo de Adriana Partimpim, decerto não imaginava a receptividade que o projeto alcançaria. Tanto que veio a acender em colegas de profissão o desejo de lançar discos de temática similar. E enquanto o maranhense Zeca Baleiro (que – justiça lhe seja feita – de há muito planeja gravar canções suas especialmente criadas para a criançada) promete a concretização desse álbum para o próximo ano, os baianos Ivete Sangalo e Saulo Fernandes (este, o atual vocalista da Banda Eva) acabam de pôr no mercado, através da gravadora Universal, o CD intitulado “A Casa Amarela”, no qual se apresentam como Veveta e Saulinho, seus apelidos de infância.

Com a direção assinada por Alexandre Lins e composto por onze faixas, trata-se de um trabalho que certamente vai ter grande aceitação junto ao público consumidor, mas muito mais pelo inquestionável prestígio atual da dupla do que pela homogeneidade do trabalho apresentado.

Lançado inapropriadamente em cima do último dia das crianças (qualquer estratégia de marketing rasteira diria que pelo menos um mês antes seria o período ideal), o grande boom de vendas do produto deverá ficar mesmo para o final-de-ano quando a procura por discos dispara por conta das trocas de presentes e dos amigos-secreto que se realizam à exaustão.

Fossem artistas que não estivessem tão na crista da onda, poderia ser suscitado o caráter oportunista do projeto. Não parece ser o caso até porque soa uma certa ingenuidade de ambos no conduzir do processo, o que, ao final, termina denotando o sentimento sincero que nutrem pelas crianças. No entanto, não vá esperar por um grande CD (e aqui não se está falar nem da pequena quantidade de faixas, nem da curta duração das mesmas). É que a produção soa insossa, os arranjos caem no lugar comum, chegando a soar tatibitati, e a mixagem não contribui quando, ao optar por um volume de voz bem superior ao da base geral, dá uma idéia de artificialidade.

A criatividade das canções infelizmente também fica a desejar e não é porque se trata de um álbum voltado para as crianças que as idéias devem ser ralas. O próprio mencionado disco de Partimpim (para não citar os trabalhos de Toquinho e Vinicius no projeto “Arca de Noé” e o de Chico em “Saltimbancos”) é prova inequívoca de que a qualidade pode (e deve) estar presente. E ninguém aqui está a comparar Ivete e Saulo a Vinicius e Chico nem a querer que lhe sucedam. O que se faz tão somente é explicitá-los como exemplos.

Assim, construções melódicas pouco definidas e idéias de letra quase sempre não desenvolvidas a contento contribuem para que o resultado final fique aquém do esperado, mesmo se reconhecendo que, em si, a idéia é bacana, já que são lançados muito esporadicamente, no mercado nacional, produtos musicais voltados para a fatia infantil.

O carro-chefe do CD é a canção mais bem resolvida do repertório: “Bicho” e (por incrível que pareça) a única em que os dois artistas cantam juntos. Os vocais das demais são divididos quase que igualitariamente entre os dois (o saldo de Ivete é de mais uma faixa), com exceção de “Sono” que recebe a participação especial de Xuxa e que soa mais como uma vinheta do que como uma música propriamente dita.

O que fica de mais interessante é ouvir tanto Ivete quanto Saulo cantando canções de forma suave (“Maria Flor” e “Fantasia”, respectivamente), o que ressalta os bonitos timbres vocais de ambos, quase sempre escondidos através dos pesados baticuns com que estão acostumados a incendiar os foliões que circundam os seus trios elétricos.

 

 

R E S E N H A     2

 

Cantor: ISAAC R.A.

CD: “DESDE ONTEM”

Gravadora: INDEPENDENTE

 

Isaac R.A. não é sergipano, muito embora tenha escolhido o nosso Estado para mostrar o seu lado musical. Foi aqui que ele efetivamente lançou seus dois CD’s, ambos produções independentes, o segundo deles recentemente disponibilizado para consumo.

Nascido em Itabuna, na Bahia, Isaac residiu muitos anos em Brasília, onde teve a oportunidade de conviver intimamente com os diversos movimentos culturais que ali aconteceram nos anos oitenta. Àquela época, bandas como Capital Inicial e Aborto Elétrico (que terminou dando origem ao Legião Urbana) iniciavam suas carreiras e encontrar os seus componentes (Renato Russo dentre eles) em apresentações intimistas nos barezinhos da Capital Federal era coisa mais que comum. Isaac, então, começou a enveredar pela música, participando de vários festivais e, em seguida, gravando o compacto duplo “Lua, Luz da Terra” que teve considerável repercussão na região Centro-Oeste. Por questões de ordem pessoal, durante um certo período sua chama musical foi posta em um segundo plano, somente se reacendendo quando ele voltou a residir em Aracaju.

O primeiro CD intitulou-se “Caça de Ceva” e foi a partir dele que recebeu o convite para participar da última edição do Projeto Prata da Casa, tendo realizado um show muito elogiado pelo público presente. Impulsionado pela receptividade para com o seu trabalho, Isaac resolveu voltar ao estúdio para registrar mais uma leva de seu trabalho autoral e assim nasceu o novo trabalho. São doze canções (dentre elas uma nova versão para aquela que deu título ao seu álbum inaugural) que passeiam por vários ritmos e mostram, em geral, um compositor inspirado.

As músicas selecionadas na verdade apresentam um painel de sua estética criativa e, de certa forma, de sua trajetória, uma vez que foram pinçadas de obras compostas entre 1980 a 2008, daí o porquê do título do trabalho: “Desde Ontem”.

Isaac, embora nordestino de nascença, não faz disso o direcionamento maior de sua obra. Muito pelo contrário, ele parte dessa nascente, mas catapulta suas canções para o mundo. Por isso, num mesmo caldeirão sonoro ousa condensar suas várias influências, misturando country, blues, rock, reggae, bolero e até MPB. Suas melodias, embora simples, são boas de serem ouvidas e algumas delas pegam o ouvinte de primeira. As letras passeiam por temas diversos, alguns utilizados de forma dubiamente inteligente. Há ecos do universo de Raul Seixas (“Levando a Vida” e “Vida Normal”) e do tom profético de Zé Ramalho (“Mirante do Universo”). E entre malícia explícita (“Pelada”), crítica ao estabelecido (“Padre Padrinho”) e declaração de amor quase escatológica (“Porta Retrato”), Isaac, com sua voz rascante e grave, transforma as faixas “Espírito de Porco” e “Estranhos Contactos” em alguns dos melhores momentos do disco.

Com direção de Jonas Paixão, o CD possui um som redondo e merece ser produzido em escala comercial (a versão ora disponível surge a nível artesanal). Já os arranjos – adequados – fazem-se apropriar de bons músicos que terminam por ressaltar as idéias do artista, um inquieto observador da realidade.

Há que se ressaltar ainda o considerável salto de qualidade entre o CD anterior e o recém-lançado, o que comprova que Isaac está no caminho certo. Decerto em breve (se é que já não aconteceu) ele irá constatar o quanto (infelizmente) é difícil se destacar no campo da música em terras sergipanas. Muitos terminam se perdendo pelo caminho, seja por acomodação, seja por decepção. Se, no entanto, for astuto o necessário e realmente amar a música (o que parece acontecer), Isaac deverá insistir em mostrar o talento que se lhe denota alvissareiro…

 

 

N O V I D A D E S

 

·                     A banda gaúcha Papas da Língua já havia obtido reconhecimento na sua aldeia quando viu, em 2006, o sucesso nacional lhe bater à porta com a inclusão da balada “Eu Sei” na trilha sonora da telenovela global “Páginas da Vida”. Formado desde 1993 por quatro bons músicos (Serginho Moah nos vocais, Léo Henkin na guitarra, Zé Natálio no baixo e Fernando Pezão na bateria), acaba de chegar às lojas o novo CD do grupo. Intitulado “Disco Rock” e produzido pelo galês radicado no Brasil Paul Ralphes, o álbum apresenta algumas canções que, de fato, se bem trabalhadas, podem vir a se transformar em hits. Estão entre estas a ótima faixa-título, o reggae “Oba Oba” e a moderninha “Te Peguei”. Entre uma música com nítida influência do som mineiro (“Estou Aqui”), há as voltadas para os corações apaixonados (as boas “Balada do Amor Perdido” e “Juliana”). No geral, não são canções excepcionais e é aí que se ressalta o trabalho do produtor que, em alguns momentos, parece tirar leite de pedra. O vocalista canta bem legal, sem excessos (porém convincente), e o timbre costumeiramente rouco aqui aparece mais límpido. Ratificando que se encontra em grande momento, Paula Toller faz-se presente, como convidada especial, na faixa “O Amor se Escondeu”, outra canção que tem chance de vir a se destacar.

 

·                     E por falar em La Toller, baseado no repertório de seu segundo CD solo (“SóNós”), será lançado ainda este mês o seu DVD intitulado “Nosso”. Gravado durante show realizado em agosto deste ano no Teatro Oi Casa Grande, no Rio de Janeiro, o vídeo conta com as participações especiais de Dado Villa-Lobos e Kevin Johansen.

 

·                     Enfim, estará chegando às lojas, através da gravadora Universal, a esperada caixa intitulada “Camaleão” que embala dezesseis álbuns originais de Ney Matogrosso (quase todos já fora de catálogo) e mais um que compila gravações raras do artista que, à frente do grupo Secos & Molhados, revolucionou o cenário da música brasileira na primeira metade da década de setenta. Objetivando comemorar os trinta e cinco anos de carreira do grande intérprete, o produto trará os seus primeiros discos devidamente remasterizados (“Água do Céu-Pássaro”, de 1975, “Bandido”, de 1976, e “Pecado”, de 1977) e outros que passaram quase desapercebidos quando da época de seus lançamentos (“Bugre”, de 1985, e “Quem Não Vive Tem Medo da Morte”, de 1988). Imperdível!

 

·                     Gravado no segundo semestre do ano passado e produzido por Clemente Magalhães, acaba de chegar às lojas, de maneira independente, o CD de estréia de Daniel Tendler, artista que vem recebendo os mais calorosos elogios de Jorge Mautner. Composto por onze faixas autorais, “Sorte Que Sou Triste” mostra que Daniel possui sacadas inteligentes, as quais expõe em letras geralmente ácidas. Como cantor, seu timbre grave (que lembra, por vezes, o de Lulu Santos) esbarra numa extensão limitada. Como autor, alterna bons momentos criativos com outros medianos. Os destaques do álbum ficam por conta de “Mais Um Dia”, “Com a Palavra”, “Balada de Um Homem Só” e “Trem Doido”.

 

·                     A dupla gaúcha formada pelos irmãos Kleiton & Kledir, que tanto sucesso fez na década de oitenta, tenciona lançar um CD de canções inéditas no começo de 2009. Enquanto o novo trabalho é formatado, os artistas compuseram a música “História de Amor” para a trilha sonora do filme “As 9 Musas da Memória”, do cineasta Edson Erdmann.

 

·                     A paraibana Elba Ramalho estará comemorando, no próximo ano, trinta anos de vitoriosa carreira, iniciada com o lançamento de seu excelente primeiro disco (“Ave de Prata”, 1979). Para marcar essa data exata, ela convidou Mazzola para produzir seu novo álbum recheado de canções inéditas que já estão lhe sendo enviadas por alguns de seus compositores preferidos, tais como Geraldo Azevedo, Chico César e Dominguinhos. Quem vier, verá!

 

 

RUBENS LISBOA é compositor e cantor


Quaisquer críticas e/ou sugestões serão bem-vindas e poderão ser enviadas para o e-mail: rubens@infonet.com.br

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