R E S E N H A 1 CD: “CANTO DE RAINHA” A ariana Dona Ivone Lara completou este ano oitenta e oito anos de vida e isso – é fato – não é para qualquer um. Ainda mais porque ela se mostra em forma vocal invejável, conforme se pode constatar através de “Canto de Rainha”, o primeiro DVD de uma vitoriosa carreira, o qual, através da gravadora Universal, acaba de chegar ao mercado, também disponível no formato CD (aquele, com seis faixas adicionais). Gravado ao vivo durante show realizado no Canecão (RJ) em agosto passado, dirigido por Túlio Feliciano e com os arranjos assinados por Paulão 7 Cordas, o álbum apresenta uma compilação dos grandes sucessos de autoria da própria artista (a primeira mulher a compor um samba enredo), exceção feita apenas para “Sorriso Negro” (de Adilson Barbado e Jorge Portela) e para a inspirada faixa-título (de Arlindo Cruz e Sombrinha, que conta com a intervenção vocal do primeiro), ambas compostas em homenagem à diva negra. Dona Ivone nasceu em Botafogo (RJ) e, filha de família pobre, passou a infância em um internato. Chegou a estudar música com Lucila Guimarães, primeira esposa de Villa-Lobos, tendo cantado sob a regência do maestro. No final da década de quarenta, passou a frequentar o Império Serrano, escola de samba do coração. O primeiro disco, no entanto, só veio a ser lançado em 1978, quando se aposentou do ofício de enfermeira. Praticamente nessa época foi gravado o seu maior sucesso até hoje, o samba “Sonho Meu”, que alcançou os primeiros lugares das paradas nas vozes de Maria Bethânia e Gal Costa. A partir dali, seu nome começou a ser conhecido e respeitado no meio musical, tanto que teve suas criações gravadas, em seguida, por gente do porte de Paulinho da Viola, Clara Nunes, Roberto Ribeiro e Verônica Sabino, entre vários outros. Compositora inspirada, seu repertório é composto, na maioria, por sambas românticos ou inspirados em suas raízes africanas. O recém-lançado projeto conta com a participação de diversos convidados. Eles vão desde os baianos Caetano Veloso e Gilberto, presentes nas faixas “Força da Imaginação” e “Samba de Roda pra Salvador”, respectivamente (ambos perfeitamente à vontade), até alguns dos parceiros mais constantes de Dona Ivone, representados por três gerações do samba mais genuíno através de Délcio Carvalho (em “Acreditar”), Jorge Aragão (em “Enredo do Meu Samba” ) e Bruno Castro (em “Nas Escritas da Vida”). Além destes, outros dois sambistas de primeira estirpe fizeram questão de se fazer presentes nessa merecida homenagem: trata-se de Beth Carvalho (na já citada “Sonho Meu”) e Zeca Pagodinho (em “Dizer Não pro Adeus”). É visível a alegria de Dona Ivone, majestosa em sua cadeira disposta no centro do palco. Assim como se faz nítida a sua sincera emoção no número final quando recebe a Velha Guarda do Império Serrano, coroando uma noite memorável. A cantora ainda possui força na voz e, afinada, exibe belos floreios vocais, embora, por conta da idade, já se mostre com a mobilidade de certo modo comprometida. Alguns dos melhores momentos surgem quando a sambista se posta sozinha com seu canto preciso. É o caso de “Mas Quem Disse Que Eu Te Esqueço” (parceria com Hermínio Bello de Carvalho), cuja introdução é entoada a capella, ou das bonitas “Alvorecer” e “Tendência”, feitas sob medida para a interpretação da venerável senhora. Dona Ivone incorpora todas as tradições do samba. Merece, pois, nosso reconhecimento e mais: que sua obra seja admirada pelas gerações mais jovens. Com CD e DVD de primeira nas lojas, faz-se aí uma adequada oportunidade. CD: “PIMENTEIRA” Gravadora: INDEPENDENTE Que Caetano Veloso gosta de expressar sua admiração por cantoras novatas, isso já é de praxe. Quase sempre quando uma delas começa a se destacar no cenário musical brasileiro, lá vem o baiano e desanda em elogios. Esses, no entanto, geralmente não vêm com constância quando se trata de intérpretes masculinos. A exceção fez-se aberta para Pedro Miranda, cantor egresso das rodas de samba da Lapa carioca, o qual acaba de pôr no mercado, de maneira independente, o seu segundo CD intitulado “Pimenteira”. Sobre ele e o seu novo disco, Caetano teceu recentemente robustas linhas de elogios que vão desde “há muito tempo não ouço um disco inteiro com tanto entusiasmo no coração” até “na verdade, é um disco que já nasce antológico”. Excessos à parte, trata-se, sim, de um álbum muito bem produzido por Luís Filipe de Lima que traz o samba como prato principal e a alegria como mola propulsora. São doze faixas pinçadas a dedo por Pedro (com o auxílio de Cristina Buarque e Paulão 7 Cordas) que terminam se irmanando de forma incontestável, mesmo que nenhuma delas seja assinada por ele. Pedro é dono de timbre maleável e embora não possua uma grande extensão vocal, consegue exibir considerável agilidade sem que seja necessário muito esforço. Com divisão esperta e fraseado talhado para o samba, ele consegue imprimir sua reverência ao estilo (em vários momentos os arranjos descambam para a gafieira), passeando também por caminhos outros como o choro, a chula e o coco. Sua voz tem colocação limpa, sem afetações ou tiques, denotando um estilo ao mesmo tempo despojado e elegante. No encarte, colorido como manda a receita apimentada do produto, as letras vêm inteligentemente acompanhadas por notas que introduzem os ouvintes no universo das canções, o que ressalta que o artista é também atento a todos os detalhes. O repertório, recheado de temas inéditos, tem como pontos altos as canções “Baticum” (de Maurício Carrilho e Paulo César Pinheiro que, a despeito do título, é a faixa mais calma do disco com suas tintas interioranas e que conta com a intervenção irretocável do Trio Madeira Brasil) e “Meio-Tom” (irresistível achado de Rubinho Jacobina que cresce com a participação dos Anjos da Lua nos vocais). Mas há outros ótimos momentos como, por exemplo, a animada faixa-título (de Roque Ferreira, compositor baiano em grande evidência ultimamente por conta, em especial, da inclusão de várias de suas criações nos repertórios de Maria Bethânia e Roberta Sá), a divertida “Compadre Bento” (do sempre competente Nei Lopes, composta a partir da soma de referências de mulatos que habitaram os subúrbios cariocas) e da irônica “Coluna Social”, crônica de costumes criada pela mente privilegiada de Edu Krieger que entrelaça personagens como o cinismo, a dissimulação, a incoerência e a raiva. Possuidor de rara habilidade para conciliar tradição com modernidade, Pedro Miranda conseguiu construir um CD realmente bem legal que alia em doses certas emoção e bom humor, credenciando-o como um dos nomes mais interessantes da nova safra musical. É bom anotar e conferir! N O V I D A D E S · E neste finalzinho de ano, a notícia triste é que passou para o andar de cima o nosso querido Gilson Batata, grande baixista e ser humano ímpar. Baiano de nascimento e sergipano de coração, ele tocou com vários artistas do nosso Estado e atualmente atuava junto à banda Calcinha Preta. Vai deixar uma lacuna muito grande… e saudades eternas! · A cantora Ligiana estreia em CD apresentando um repertório nada óbvio, o que demonstra coragem e perspicácia. Dona de um bonito timbre de voz e ancorada pela produção de Alfredo Bello e Fernando Cavaco, ela apresenta um repertório de treze faixas e se permite abrir uma exceção para o convencional apenas na faixa final, uma apropriada releitura de “Eu Quero é Botar Meu Bloco na Rua”, de Sérgio Sampaio, em versão que conta com a participação especial de Tom Zé. Entre flerte com os Novos Baianos (“Só Se Não For Brasileiro Nessa Hora”, de Moraes Moreira e Luiz Galvão, abrilhantada pelos vocais de Marcelo Pretto) e mergulho em canções de lavra própria (a ótima “Onda” e “Queda Por um Samba”, esta em parceira com Celso Araújo), a cantora encontra seus melhores momentos em “Conselheiro” (de Batatinha e Paulo César Pinheiro), “Canto do Caboclo Pedra Preta” (de Baden Powell e Vinicius de Moraes) e “Consideração” (de Cartola e Heitor dos Prazeres). · O quarteto baiano Ronei Jorge e os Ladrões de Bicicleta acaba de lançar, de maneira independente, o segundo CD intitulado “Frascos Comprimidos Compressas”, o qual leva a assinatura do cultuado Pedro Sá na produção. Formado desde 2003 por Ronei Jorge (voz e guitarra), Edson Rosa (guitarra), Sérgio Kopinski (baixo) e Maurício Pedrão (bateria), o grupo apresenta um som que combina elementos da música popular brasileira (principalmente samba) ao rock, com letras interessantes. Dentre o repertório composto pelas quatorze faixas autorais destacam-se: “A Respeito do Sono”, “Aquela Dança” e “Ó Você Dizendo”. · Em janeiro, sairá mais um CD contendo canções selecionadas para fazer parte da trilha sonora da telenovela global “Viver a Vida”. Estão entre elas: “Vem Ver” (com Tamy), “O Último Pôr do Sol” (com Lenine), “Presente Passado” (com Isabela Taviani), “Nova Ilusão” (com Joyce), “Jogo Sujo” (com Erasmo Carlos) e “Mais Alguém” (com Roberta Sá). · A gravadora Biscoito Fino lança “Zé Renato Ao Vivo”, CD que contém o registro do show realizado pelo cantor e compositor em junho de 2006 na casa de espetáculos Estrela da Lapa (RJ). Com sua voz privilegiada, o artista apresenta várias de suas criações feitas ao lado de parceiros como Xico Chaves (“Papo de Passarim”), Cláudio Nucci e Ronaldo Bastos (“A Hora e a Vez”), Teresa Cristina (“Delicada”) e Pedro Luís (“Luz da Nobreza”) e recria pérolas como “Cantoria” (de Paulinho da Viola e Hermínio Bello de Carvalho) e “Foi Deus” (de Alberto Soares). Milton Nascimento é o convidado especial da faixa “Ânima”, mas os melhores momentos ficam por conta das pouco conhecidas “Benefício” e “Todo Mundo Quer um Bem” (parcerias do artista com Hamilton Vaz Pereira e Fausto Nilo, respectivamente). Na verdade, o álbum se trata do áudio extraído do DVD homônimo, lançado em maio de 2007. · “Projeto Guri Convida” é o título do CD que acaba de chegar às lojas em pré-comemoração aos quinze anos de existência dessa tão salutar iniciativa da Secretaria de Estado da Cultura de São Paulo, os quais se completarão em 2010. O aludido projeto tem como objetivo promover a educação musical básica, buscando o desenvolvimento das gerações em formação. O álbum em tela leva a assinatura de Beto Villares na direção, é composto por dezoito faixas e conta com a adesão de nomes como Zélia Duncan, André Abujamra, Arnaldo Antunes, Andréia Dias, Thalma de Freitas e Anelis Assumpção. Dentre os melhores momentos estão as canções: “Sem Embaraço” (com Fernanda Takai), “Encarnada” (com Iara Rennó) e “Cantando Ciranda na Beira do Mar” (com Siba). · Chegará em janeiro próximo ao mercado a caixa “10.000 Anos à Frente” que reunirá seis discos de Raul Seixas, a saber: “Krig-Há, Bandolo!” (de 1973) “Gita” (de 1974) “Novo Aeon” (de 1975) “Há 10 Mil Anos Atrás” (de 1976), “Rock Seixas” (de 1977) e “30 Anos de Rock” (de 1985). Os fãs mais aficcionados já esperam ansiosos pelo produto que será lançado com o som devidamente remasterizado. · Ângela RoRo planeja festejar as seis décadas de vida com um projeto composto por CD e DVD que serão registrados em show festivo que deverá apresentar novas canções e contará com as participações de Maria Bethânia e Ana Carolina. · Em seu mais recente CD (intitulado “Romântico”) que aportou recentemente nas lojas, Fábio Jr. mergulha de cabeça na regravação de sucessos sertanejos, tais como, entre outras: “Estrada da Vida”, “Fio de Cabelo”, “No Rancho Fundo” e “Cabecinha no Ombro”. No repertório há ainda uma nova versão para “Românticos” (de Vander Lee). A faixa “Amar é Perdoar” foi incluída na trilha sonora da telenovela global “Cama de Gato”. · E no apagar das luzes de mais um período, gostaria de desejar a todos um Feliz Ano Novo e que possamos conquistar todos os nossos sonhos sem precisar deixar ninguém triste. Saúde, paz e amor são os meus sinceros desejos! RUBENS LISBOA é compositor e cantorCantora: DONA IVONE LARA
Gravadora: UNIVERSAL
Cantor: PEDRO MIRANDA
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