Musiqualidade

R E S E N H A     1

 

Cantor: EDU LOBO

CD: “TANTAS MARÉS”

Gravadora: BISCOITO FINO

 

Edu Lobo é carioca, mas como filho de sergipano (o compositor Fernando Lobo), sempre teve o legado nordestino ressaltado em suas criações. No entanto, mesmo tendo começado na música tocando acordeão, elegeu o violão e o piano como seus instrumentos de trabalho.

Voltando à década de sessenta, podemos dizer que o ano de 1962 foi marcante para ele pois não apenas gravou o seu primeiro compacto como dividiu uma primeira parceria com Vinicius de Moraes, a canção “Só Me Fez Bem”. Quando, anos depois, Edu começou a compor ao lado de Ruy Guerra, inaugurou uma linhagem de canções mais engajadas. Em seguida, compôs trilhas para teatro e participou de festivais de música popular, obtendo o primeiro lugar em 1965 com “Arrastão” (outra parceria com Vinicius e que ganhou arrebatadora interpretação de Elis Regina) e em 1967 com “Ponteio” (construída com Capinam, uma das mais belas canções de todo o cancioneiro nacional). O ponto alto de sua carreira, no entanto, reside nos quatro trabalhos que desenvolveu com Chico Buarque para trilhas de espetáculos de balé (“O Grande Circo Místico”, “Dança da Meia Lua”, “O Corsário do Rei” e “Cambaio”).

É esse artista único que, após um considerável período de quinze anos sem lançar um CD de carreira com músicas inéditas, acaba de fazer chegar às lojas (através da gravadora Biscoito Fino) o seu novo trabalho. Intitulado “Tantas Marés” e composto por uma dúzia de faixas, o muito bem-vindo disco foi produzido por Cristóvão Bastos, o qual também assinou os arranjos ao lado do próprio Edu.

Cercado por músicos de ponta, tais como Carlos Malta (flauta), Jurim Moreira (bateria), Lula Galvão (violão), Mingo Araújo (percussão) e Carlos Prazeres (oboé), entre outros, Edu construiu um disco delicado e bastante agradável, que só peca por uma certa sensação de melancolia que, por vezes, termina soando demasiada.  

Do repertório selecionado, apenas quatro canções são completamente inéditas, todas estas com letras assinadas pelo profícuo Paulo César Pinheiro. São elas a suave “Coração Cigano”, o acalanto “Primeira Cantiga” (que traz Edu acompanhado apenas por piano e baixo acústico, mas dividindo os vocais com a sempre correta Mônica Salmaso), a bonita “Qualquer Caminho” e a biograficamente universal faixa-título.

Ao revisar seu baú, ele pinçou do álbum de 1980 (“Tempo Presente”) o frevo “Angu de Caroço” (Edu, aliás, sempre revelou grande apreço por esse ritmo pernambucano). A canção, que é fruto de parceria com o poeta Cacaso, é um dos melhores momentos do recém-lançado disco, ao lado da bonita “Senhora do Rio”, letra de domínio público que o compositor ousou pôr melodia. Duas músicas inicialmente compostas como temas instrumentais, o baião “Dança do Corrupião” e o choro “Perambulando” (lançados pelo artista nos álbuns “Corrupião”, de 1993, e “Meia-Noite”, de 1995, respectivamente) são igualmente revisitados, mas após ganharem letras também assinadas por Paulo César Pinheiro, terminando, assim, por assumirem novos e insuspeitos ares.

Completam o set list ótimas parcerias com o já citado Chico Buarque (“Ode aos Ratos”, “Ciranda da Bailarina”, “A Bela e a Fera” e “A História de Lily Braun”). As quatro já receberam diversos registros anteriores, mas sempre é bom conhecer uma obra na voz de seu próprio criador. Nessa seara, convém ressaltar que Edu não é um intérprete fora de série, daqueles que arrebatam pelo alcance da voz ou por uma entrega visceral, mas seu timbre grave e encorpado encontra-se em forma e o fato é que ele soa correto em suas intenções.

De volta ao mercado fonográfico, Edu Lobo merece todo o nosso apreço. Que continue produzindo por muito tempo pérolas como tantas as que já fazem parte de nossas vidas…

 

 

R E S E N H A     2

 

Cantora: CLÉCIA QUEIROZ

CD: “SAMBA DE ROQUE”

Gravadora: INDEPENDENTE

 

Roque Ferreira é compositor baiano nascido em Nazaré das Farinhas e a primeira composição sua que foi registrada em disco recebeu a voz de Clara Nunes no já distante ano de 1979. Embora de lá para cá venha sendo gravado por gente como Zeca Pagodinho, Martinho da Vila e Beth Carvalho, somente há pouco tempo ele, que conta atualmente com mais de seis décadas de vida, vem começando a receber a reverência que de fato merece. Prova disso é que é de sua autoria a maior parte das músicas que integram os repertórios dos dois últimos discos de Maria Bethânia (“Tua” e “Encanteria”, ambos lançados no ano passado) e que cantoras como Roberta Sá e Mariene de Castro prometem lançar, ainda este ano, novos álbuns totalmente compostos por canções de Roque.

Referência do samba-de-roda, gênero musical primo-irmão da chula e característico do recôncavo baiano, com melodias ricas, harmonias simples e versos curtos, ele é mesmo um compositor compulsivo e grande parte de suas músicas possuem construções cativantes sustentadas por letras que geralmente trazem muitas influências afro-brasileiras.

Saindo na frente, a conterrânea cantora Clécia Queiroz fez chegar recentemente ao mercado (de maneira independente) o bom CD “Samba de Roque” que, como o próprio título já entrega, mergulha de cabeça na obra do compositor. São onze faixas assinadas por Roque (apenas uma em parceria, “De Maré”, criada ao lado de Toninho Gerais, um dos melhores momentos do trabalho) que tentam fazer um apanhado geral, ainda que superficial, de temas criados por Roque ao longo dos vários anos de estrada. Completam o repertório (como faixas-bônus) um medley de onze chulas recolhidas da cultura popular nordestina e a faixa “Ciúmes” (de Dalva Damiana de Freitas, grande dama do samba-de-roda de Cachoeira), espécie de vinheta na qual a artista se faz acompanhar apenas por percussões.

Clécia, além de cantora e compositora, é mestre em Performance Art pela Howard University, bailarina formada pela Universidade Federal da Bahia e atriz premiada, com alguns dos mais importantes troféus da sua terra, tendo lançado seu disco de estreia (“Chegar à Bahia”) em 1997. No recém-lançado álbum, ela mostra uma competência ímpar para a alegria. Alguns poderiam simplificar dizendo que ela é baiana. É provável que isso a tenha ajudado no foco, mas o fato é que, afinada e dona de um timbre bastante agradável, ela consegue fazer, de forma certeira, com que o ouvinte sinta a sua entrega àquilo que canta, na maioria dos casos músicas de pegada rítmica contagiante. Ao escolher o repertório, fica claro que ela optou por aliar a tradição à contemporaneidade e soube fazer isso com sabedoria. Com direção musical do músico Dudu Reis, o CD apresenta arranjos interessantes nos quais instrumentos como clarinete, flauta e acordeão se destacam em momentos solo. Grandes destaques ficam por conta de “Pimenteira” (canção que integra e dá título ao mais recente disco de Pedro Miranda), “Bambá de Dendê” e “Linho Branco”. E, no meio de momentos mais pulsantes (“Xirê”, tema que Roberta Sá também deverá incluir em seu próximo álbum) e outros mais suaves (“Olori”), há espaço para flertes com o choro (“Brilhos e Luzes”) e com o afoxé (“Omim-Ô”).

Clécia Queiroz é cantora que merece ser reconhecida além fronteiras soteropolitanas. Sua coerente homenagem ao talentoso Roque Ferreira tem bastante munição para ajudá-la nessa empreitada. Agora, é torcer!

 

 

N O V I D A D E S

 

·                     Dan Nakagawa é compositor que tenta seu lugar ao Sol. Talentoso, ele já teve uma canção de sua autoria gravada por Ney Matogrosso (“Um Pouco de Calor”). É o próprio Ney quem continua a avalisar o trabalho de Dan quando participou como convidado especial do show realizado em São Paulo no finalzinho do ano passado, o qual, devidamente registrado, se transformará em DVD que chegará às lojas ainda neste primeiro semestre. Sairá concomitantemente a “O Oposto de Dizer Adeus”, o segundo CD de Dan.

 

·                     E falando em Ney Matogrosso, ele também se fez presente em participação especial na faixa “Dentro de Você”, constante do repertório de “A Paixão Segundo o Cabaret”, segundo CD da banda carioca Cabaret, o qual estará aportando nas lojas muito em breve.

 

·                     “Melodia Sentimental” é o título do CD instrumental que reúne os talentos do pianista Gilson Peranzzetta e do flautista e saxofonista Mauro Senise. O novo álbum chega às lojas através da gravadora Biscoito Fino e traz a harpista Sílvia Braga como convidada especial. Dentre as onze faixas selecionadas (algumas delas pinçadas do repertório erudito) estão canções assinadas por Ary Barroso, Tom Jobim e Heitor Villa-Lobos.

 

·                     A Sony Music está repondo em catálogo alguns discos originalmente lançados nas décadas de setenta, oitenta e noventa, incluídos em um pacote denominado “Caçadores de Música”. Dentre os quarenta e dois títulos nacionais estão grandes álbuns (alguns pela primeira vez chegando ao formato CD), tais como “Quem Me Levará Sou Eu” (décimo disco de Dominguinhos que traz a presença de Gilberto Gil em “Abri a Porta”), “Porta Secreta” (terceiro disco de Amelinha que, não obstante alavancado pelo hit “Foi Deus Que Fez Você”, contém outras belas canções menos conhecidas, a exemplo de “Esquinas Nacionais” e “Isso ou Aquilo”, além da participação de Toquinho em “Valsinha”), “Danado de Bom” (disco que marcou o retorno de Luiz Gonzaga às paradas de sucesso e ao reconhecimento do grande público com canções como “Pagode Russo”, “Pense n’Eu” e “Sanfoninha Choradeira”), “Sanfoneiro Macho” (outro disco de Luiz Gonzaga, o qual contou com a participação de Gal Costa na faixa “Forró nº 1”), “Antonio Carlos e Jocafi Cantam Jorge Amado” (disco em que a dupla mostrou temas inspirados no universo fictício do escritor baiano, a exemplo de “Jesuíno Galo Doido”, “Dona Flor e Seus Dois Maridos” e a bonita “Olho d’Água”) e “Elba” (terceiro disco de Elba Ramalho que contém pérolas como “Temporal”, “Oitava”, “O Pedido” e “Vem”).

 

·                     Marina Lima promete para este ano a sua estreia como escritora com o livro “Marina Entre as Coisas”. Junto, virá encartado um CD que conterá duas canções inéditas da artista (“Doce de Nós” e “A Parte que me Cabe”).

 

·                     Em breve, Moska marcará seu retorno ao mercado fonográfico nacional com o lançamento de dois álbuns: “Muito” (que concentra repertório inédito) e “Pouco” (que trará músicas do compositor já registradas por outros artistas).

 

·                     O compositor Luiz Tatit lançará em abril “Sem Destino”, seu novo CD que trará treze canções inéditas. O filho violonista, Jonas Tatit, é o responsável pelos arranjos do novo trabalho que leva a assinatura de Alexandre Fontanetti na produção.

 

·                     A gravadora EMI promete para este ano o relançamento em vinil de toda a discografia da banda Legião Urbana. Quem viver, verá!

 

RUBENS LISBOA é compositor e cantor

Quaisquer críticas e/ou sugestões serão bem-vindas e poderão ser enviadas para o e-mail: rubens@infonet.com.br   

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