Musiqualidade

M U S I Q U A L I D A D E

 

 

R E S E N H A

Cantora: PAULA MORELENBAUM

CD: “BASSARENOVA”

Gravadora: BISCOITO FINO

 

A cantora Paula Morelenbaum chega ao quarto CD que acaba de aportar no mercado através da gravadora Biscoito Fino. Depois de anos de estrada, tendo inclusive atuado, por um período considerável, como backing vocal da banda que acompanhou Tom Jobim em seus derradeiros momentos, a artista se mostra realmente em uma fase iluminada. Casada com o grande violoncelista Jaques Morelenbaum (que, aliás, se faz presente no novo álbum em “Modinha”, peça de Heitor Villa-Lobos), ela não é dessas intérpretes que arrebatam multidões com um repertório popularesco nem tampouco se aventura em experiências sonoras ditas modernosas. De maneira própria, ela prefere mergulhar em clássicos da nossa música popular, pinçando alguns deles que começam a se esmaecer do conhecimento coletivo por conta do passar dos anos.

Trata-se o disco recém-lançado de um projeto bastante especial. Foi gravado entre Stuttgart (na Alemanha) e Rio de Janeiro e nele a artista é acompanhada pela SWR Big Band (formada por vinte integrantes), uma das mais respeitadas da atualidade, conduzida pelas mãos seguras do arranjador alemão Ralf Schmid (mister se faz ressaltar que, aos músicos da orquestra, se juntaram os brasileiros Luis Brasil e Lula Galvão no violão, Marcelo Costa na bateria e Sidinho na percussão). E quem supõe que, por conta disso, o trabalho tenha uma sonoridade grandiosa e enfadonha constata estar equivocado logo na primeira audição. Mesmo contando com flautas, clarinetes, trompetes, trombones e sax aos borbotões (a orquestra prioriza os sopros na sua formação), a sonoridade tende em geral para uma leveza que confere ao CD um clima cool, levando a uma dimensão de rara delicadeza.

Como o próprio título escolhido para o projeto denuncia (“BossaRenova”), o caminho escolhido percorre as trilhas da bossa nova, mas com um olhar diferenciado. Resulta original, sem prejuízo da leveza característica do gênero. Essa viagem ao movimento que credenciou a música brasileira mundo afora torna-se explícita já no início de “Águas de Março” (de Tom Jobim), canção que abre o disco, quando Paula declama trecho de “O Que É Bossa Nova?”, de Vinicius de Moraes. Os dois, Tom e Vinicius, são também os responsáveis pela autoria de “O Morro Não Tem Vez”, clássico do samba tupiniquim e que se consolida como um dos pontos altos do álbum. Tom ainda se faz presente com “Chovendo na Roseira”, de tessitura melódica complexa que Paula destrincha com maestria, e Vinicius com “Tempo de Amor”, deliciosa parceria com Baden Powell (outro dos destaques) e com “Tarde em Itapoã”, criada ao lado de Toquinho.

É claro que há momentos em que a citada big band mostra-se incrivelmente sonzeira. O belo arranjo de “Mas Que Nada” (de Jorge Ben Jor) é um exemplo claro disso. Canção integrante da fase áurea do artista, ela é sempre um coringa no set list de um artista quando ele precisa de um momento mais empolgante. Também de sua autoria Paula escolheu “Vem Morena Vem”, música menos conhecida, e que agora ressurge repleta de solos jazzísticos.

O conceito do disco, no entanto, se mostra um tanto quanto elástico e é com esse entendimento que agrega temas de universos aparentemente díspares como “Blackbird” (de John Lennon e Paul McCartney) e a versão da balada alemã “Ich Grolle Nicht” (de Robert Schumann e Heirich Heine que se transforma em “Pra Que Chorar” pelas mãos de Arthur Nestrovski) com direito a citação de “Carinhoso” (de Pixinguinha e João de Barros). Completam o repertório “Setembro” (de Ivan Lins e Gilson Peranzzetta, com participação de Joo Kraus) e “Soul Bossa Nova” (esperto tema instrumental da lavra de Quincy Jones, incluída como faixa bônus).

Com voz doce e afinada, Paula Morelenbaum se mostra uma solista segura e sedutora e, ao proporcionar o encontro entre a big band com o “banquinho e o violão”, termina presenteando o público com um CD de altíssimo nível. Conheça!

 

 

N O V I D A D E S

 

· Anotem aí esse nome: Khrystal. Ela é uma versátil cantora do Rio Grande do Norte que tem apenas um CD lançado (“Coisa de Preto”), mas que já vem se destacando (merecidamente) também no eixo Rio-São Paulo. Dona de voz vigorosa e afinada, possui uma presença de palco fenomenal e é uma típica representante da mais fina música nordestina. No seu ótimo álbum de estreia, ela conta com a participação especial do compositor e violonista Guinga nas faixas “Baião de Lacan” e “Influência de Jackson” (ambas parcerias dele com Aldir Blanc) e revisita canções de Chico César (“Sem Ganzá Não É Coco”), Lenine (“Coco da Mãe do Mar”, parceria com Siba), Dominguinhos (“Sete Meninas”, parceria com Toinho Alves), Cátia de França (“Lá Vem Batista”) e Rosil Cavalcanti (“Coco do Norte”). Vale a pena correr atrás para ouvir o trabalho da moça!

 

· E continua a expectativa em torno da gravação do próximo DVD de Ivete Sangalo que acontecerá em setembro próximo no Madison Square Garden, em Nova Iorque. Dentre os convidados internacionais, já confirmaram presença o cantor britânico James Morrison e o astro pop colombiano Juanes. No terreno brasileiro, Seu Jorge também já acenou positivamente. E falando nessa baiana arretada, recentemente ela gravou sua participação no álbum que Genival Lacerda (aquele da “Severina Chique Chique”) deverá lançar ainda este semestre. Ivete pôs sua voz grave a serviço de “O Chevette da Menina”, música de Durval Vieira, um outro grande sucesso da carreira do sempre irreverente Genival.

 

· É basicamente pop o som do CD “Varrendo a Lua” que a cantora Roberta Campos acaba de lançar através da gravadora Deckdisc. Com a produção assinada por Rafael Ramos, o álbum é composto por dez faixas, nove delas de autoria da própria artista (a única exceção é a regravação de “Quem Sabe Isso Quer Dizer Amor?”, de Lô e Márcio Borges, canção registrada originalmente por Milton Nascimento). Não são músicas avassaladoras, mas Roberta não faz feio com sua voz de timbre agradável (que, por vezes, lembra o de Vanessa da Mata) e o disco apresenta bons momentos, especialmente a faixa-título, “Mundo Inteiro”, “Estou em Paz (Com Você)” e “Felicidade” (esta uma parceria com Carolina Zocoli). Nando Reis avaliza o trabalho ao fazer uma adequada participação especial em “De Janeiro a Janeiro”. 

 

· A gravadora EMI pôs recentemente no mercado a caixa “Os Anos Dourados de Dolores Duran”, idealizada pelo pesquisador musical Rodrigo Faour e composta por seis CD’s que trazem todas as setenta e cinco gravações feitas pela artista entre 1951 e 1959. Entre o material, há os seus quatro álbuns oficiais e duas coletâneas póstumas. Aos seis títulos se soma ainda o CD duplo “O Negócio É Amar”, que reúne vários cantores interpretando as vinte e oito músicas da obra autoral de Dolores que não chegaram a ser gravadas pela compositora, falecida precocemente.

 

· Acabam de ser reeditados pela gravadora Sony Music dois discos de Fafá de Belém: “Fafá”, de 1989, e “Doces Palavras”, de 1991. Em ambos, a artista já havia aderido ao repertório de cunho popularesco que pautou sua carreira durante um considerável período. Mas há alguns momentos interessantes… No primeiro, os destaques são a bela “Coração do Agreste” (que integrou a trilha sonora da telenovela global “Tieta”) e as baladas “Só Pra Te Ver Feliz” e “Será”, além de uma típica representante da Jovem Guarda, a canção “Ninguém Vive Sem Amor”. O estouro nacional, no entanto, se deu com a faixa “Nuvem de Lágrimas” que contou com a participação especial de Chitãozinho & Xororó. No outro álbum, os melhores momentos ficam por conta da boa faixa-título e do hit “Dê Uma Chance ao Coração”, cuja gravação contou com a adesão de um de seus autores, Michael Sullivan (a música é uma parceria dele com Paulo Massadas) e de Lia Monteiro.

 

· É através da gravadora Biscoito Fino que chega ao mercado este mês o DVD intitulado “O Teatro na Palma da Mão”, dedicado à obra de Flávio Rangel, renomado diretor teatral que também esteve à frente de grandes espetáculos musicais, como os seis shows realizados por Simone entre os anos de 1979 e 1986 (os mais elogiados de sua carreira, diga-se de passagem). A cantora, aliás, se faz presente no vídeo em um emocionado depoimento que enfatiza a importância que Rangel teve em sua carreira.

 

 

RUBENS LISBOA é compositor e cantor

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