Musiqualidade

R E S E N H A

 

Cantora: CÉLIA
CD: “O LADO OCULTO DAS CANÇÕES – 40 ANOS”

Gravadora: SOM LIVRE

 

Desde a adolescência, a cantora Célia mostrou-se interessada pela música. Antes de se decidir pelo canto, chegou a estudar teoria e composição, harmonia e violão. No início da década de setenta, após se destacar no programa “Um Instante Maestro”, do apresentador Flávio Cavalcanti, lançou o seu primeiro disco, o qual, à época, chegou a receber vários prêmios. O grande sucesso aconteceu em 1975 com a canção “Onde Estão os Tamborins?” (de Pedro Caetano). Artista que sempre teve um público cativo, Célia, no entanto, jamais conseguiu ver o seu nome devidamente reconhecido e projetado da forma como o seu talento sempre fez por merecer. Tanto que nunca foi uma grande vendedora de discos e se pode dizer que seus lançamentos, ao longo de quarenta anos de carreira, foram de fato esporádicos.

É para comemorar essa data redonda que ela acaba de fazer chegar às lojas, através da gravadora Som Livre, o CD intitulado “O Lado Oculto das Canções”, que se consubstancia como um dos grandes trabalhos fonográficos deste ano. Produzido por Ogair Jr. e com a direção artística sob o encargo de Fernando Cardoso, o novo álbum é composto por quatorze faixas pinçadas do vasto baú de referências sonoras acumuladas por Célia ao longo de décadas como cantora da noite.

E há, nele, vários méritos a serem destacados: o primeiro – que logo salta aos ouvidos – é a forma mais contida de impostação adotada. Intérprete de fartos recursos vocais, afinadíssima e dona de um timbre deliciosamente volumoso, neste disco ela se esquece das costumeiras projeções (que, por vezes, beiravam o erudito) e se entrega ao prazer de cantar de forma agradavelmente macia. Isto se constata já na primeira faixa, um delicado resgate de “Vinho Antigo”, bonita e esquecida canção assinada pela dupla Dalto e Cláudio Rabello. O segundo grande mérito do trabalho diz respeito aos arranjos ao mesmo tempo econômicos e primorosos, os quais, a todo momento, ratificam a elegância e o bom gosto adotados. E o terceiro mérito (e não menos importante) reside no fato de Célia ter sido corajosa e inteligente em doses iguais quando da escolha do repertório. Corajosa, sim, porque decerto muito pouca gente se arriscaria a juntar num mesmo trabalho, sob o risco de se perder a coerência, temas de uma disparidade evidente, tais como “Se Não For Amor”, samba de autoria de Benito Di Paula até agora marcado por um certo ranço de brega, e “Êxtase”, uma das músicas mais bonitas e complexas da lavra inicial de Guilherme Arantes. E inteligente também porque, ao invés de se escorar em obras de medalhões ou, no oposto, de dar vez somente a nomes mais recentes do nosso cancioneiro, ela optou por ambas as possibilidades. Assim, convivem harmonicamente, lado a lado, uma obscura criação de Jair Amorim e Evaldo Gouveia (“Cantiga de Quem Está Só”) e uma composição inédita de Adriana Calcanhotto (a tão soturna quanto linda “Vidas Inteiras”, que toca na trilha sonora da telenovela global “Passione” como tema da personagem Felícia).

Mas há outros grandes momentos a serem destacados. Um deles, talvez o melhor do disco, é “Desejo de Mulher”, inspirada parceria de Zélia Duncan com Hamilton de Holanda. Outro é a revisita a “Não Vou Ficar”, uma das canções mais regravadas de Tim Maia (que ficou inicialmente conhecida na voz de Roberto Carlos) e que ganhou uma de suas melhores e mais inventivas versões. E mais um é a redescoberta de “Cigarro”, pungente e menos conhecido tema de Zeca Baleiro. E até a pegajosa “Não Se Vá” (hit que catapultou a dupla Jane & Herondy aos topos das paradas de sucesso) ganha um brilho especial com a insuspeita participação especial de Ney Matogrosso nos vocais. Quem diria!

O fato é que, se alguma falha há, ocorre por conta de um certo ar de tristeza que permeia o disco. Se tivesse substituído as desnecessárias releituras de “Sonhos” (de Peninha) e “Apelo” (de Baden Powell e Vinicius de Moraes), canções hiper batidas que pouco acrescentaram ao set list final, por outras músicas mais “para cima”, Célia teria construído um CD sublime.

Permanecendo às beiras da perfeição, a cantora apresenta aquele que certamente é o ponto-alto de sua discografia. Um belo CD digno de uma grande intérprete. Imprescindível conhecê-lo, portanto!

 

 

N O V I D A D E S

 

· A gravadora Biscoito Fino já anuncia para o ano que vem um disco com a cantora Alcione no qual ela reviverá os tempos em que cantava na noite carioca como crooner de bares e boates. Do repertório deverá constar uma miscelânea de canções brasileiras e sucessos internacionais.

 

· “A Noite Perfeita” é o título do novo projeto do cantor e compositor Leoni que chegará em breve às lojas nos formatos CD e DVD. O repertório alia canções já conhecidas, as quais foram escolhidas pelos fãs do artista através de votação feita diretamente em seu site oficial, a músicas inéditas, entre estas “Do Teu Lado Essa Canção”, parceria com Rodrigo Maranhão.

 

· Lia Sabugosa estreia no mercado fonográfico com o CD intitulado “Pra Quem Quiser”, um lançamento do selo Sesc do Rio de Janeiro. Boa cantora, ela apresenta um repertório composto por oito faixas assinadas por gente ainda pouco conhecida, como é o caso de Daniel Lopes, Apoená Frota, Jorge Ailton e Mila Bartilotti. O som eminentemente pop vem emoldurado por um acabamento bem feito, o que proporciona ótimos momentos, a exemplo de “Olhe no Céu” e “Chorei Por Mim”.

 

· “Mãe das Águas” é o nome do projeto que reuniu recentemente sete cantoras negras, a saber: Alaíde Costa, Daúde, Luciana Mello, Margareth Menezes, Mart”nália, Paula Lima e Rosa Marya Colin. Gravado durante show realizado no Teatro Nacional, em Brasília, com o objetivo de celebrar os vinte e dois anos da Fundação Cultural Palmares, o produto chegará ao mercado ainda este ano nos formatos CD e DVD.

 

· Gilberto Gil será o responsável pela trilha sonora do filme “Gonzaga – De Pai para Filho”, película do cineasta Breno Silveira que vai contar a conturbada relação familiar e musical de Luiz Gonzaga com seu filho Gonzaguinha. Nas telonas em 2011.

 

· Simone está lançando o projeto “Em Boa Companhia”, disponível em CD duplo e também em DVD. Gravado ao vivo no Teatro Guararapes, em Recife (PE), em abril deste ano, o produto chega ao mercado através da gravadora Biscoito Fino e mostra a vigorosa intérprete em ótima forma vocal. O repertório se concentra no seu último álbum de estúdio (o bom “Na Veia”), mas a cantora abre espaço para rever alguns de seus sucessos pretéritos, a exemplo de “Face a Face”, “Tô Que Tô” e “Ai, Ai, Ai”, e empresta seu talento a novas versões para conhecidíssimos temas, como “Lá Vem a Baiana”, “Ive Brussel”, “Certas Coisas”, “Fullgás” e “Nada por Mim”.

 

· Já se encontra em fase de pré-produção o novo projeto do grupo 14 Bis (que será registrado em CD e DVD), o qual contará com a participação de Flávio Venturini, seu ex-integrante, e deverá vir recheado de canções inéditas.

 

· Em uma das apresentações da cantora Ângela Ro Ro no Morro da Urca, em 1988, o compositor Cazuza, que se encontrava presente na plateia, subiu ao palco e improvisou uma longa canja com a artista. A fita contendo o áudio dessa apresentação foi recentemente encontrada por ela que a disponibilizou, em três partes, no seu perfil do portal MPB.com, cujo endereço é: www.mpb.com/angelaroro. Muito legal!

 

· “Tangos Tropicais” é o título do CD instrumental que o guitarrista Victor Biglione está lançando através da gravadora Biscoito Fino. São onze sucessos do cancioneiro brasileiro em registros que receberam os tons passionais do tango argentino. Dentre os melhores momentos estão as faixas “Esse Cara” (de Caetano Veloso), “Tatuagem” (de Chico Buarque) e “Dois pra Lá, Dois pra Cá” (de João Bosco e Aldir Blanc).

 

 

RUBENS LISBOA é compositor e cantor

Quaisquer críticas e/ou sugestões serão bem-vindas e poderão ser enviadas para o e-mail: rubens@infonet.com.br   

Comentários

Nós usamos cookies para melhorar a sua experiência em nosso portal. Ao clicar em concordar, você estará de acordo com o uso conforme descrito em nossa Política de Privacidade. Concordar Leia mais