R E S E N H A
Cantores: OLIVIA e FRANCIS HIME
CD: “ALMAMÚSICA”
Gravadora: BISCOITO FINO
Num tempo em que as relações amorosas têm por característica principal a instabilidade, ainda mais quando envolvem artistas, é até difícil de acreditar que o casal Olivia e Francis Hime esteja à beira de completar bodas de ouro. Sim, é verdade! Os cantores e compositores estão a comemorar exatos quarenta e seis anos de vida em comum, regados a muitas letras e melodias.
Olivia é cantora de voz delicada que lançou bons discos na década de oitenta, mas que, de fato, nunca chegou a conquistar um reconhecimento nacional. Como letrista de várias canções, a maioria delas em parceria com Francis, já demonstrou ser capaz de boas doses de criatividade.
Francis, por seu lado, é um exímio pianista e tem composições ao lado de vários dos maiores nomes da nossa MPB (com Chico Buarque, por exemplo, ele compôs, entre outras, pérolas como “Trocando em Miúdos”, “Vai Passar” e “Atrás da Porta”), muitas delas gravadas por intérpretes de ponta como Maria Bethânia, Simone e Leila Pinheiro. Melodista inspirado, como cantor ele pode não chegar a empolgar, mas consegue sair-se muito bem quando mergulha em suas intrincadas harmonias.
Durante esses anos de amor e música, Olívia e Francis comumente estiveram presentes um nos discos do outro, mas nunca haviam gravado um álbum em conjunto. Essa lacuna se dissipa agora com o lançamento do CD “Almamúsica” (título de uma recente parceria deles), o qual chega ao mercado através da Biscoito Fino, gravadora na qual Olivia responde, desde a sua fundação, pela direção artística.
O repertório do novo trabalho, composto por vinte e seis músicas cantadas ou citadas em seis faixas-suítes, foi pinçado das lembranças dos dois. Canções representativas de suas vidas foram resgatadas, como, por exemplo, o belo acalanto “Canta Maria” (de Ary Barroso) que Olivia cantava para fazer ninar suas filhas e que, antes, havia lhe sido soprada aos ouvidos por sua própria mãe, e a pungente “Saudade de Amar” (uma das primeiras parcerias entre Francis e Vinicius de Moraes) que serviu como pano de fundo para o namoro do então juvenil casal.
Urdido somente com o piano preciso de Francis, o disco se faz dividido em seis quadros, alguns maiores, outros menores, mas todos de uma delicadeza ímpar. “Minas Gerais”, tema pouco conhecido de Novelli e Ronaldo Bastos, surge como uma espécie de carta de intenções que descamba, logo a seguir, para o momento em que há reverências ao já citado Vinicius de Moraes (através de “O Grande Amor” e “Tristeza e Solidão”, parcerias do Poetinha com Tom Jobim e Baden Powell, respectivamente) e incursões em obras mais recentes como “Desde que o Samba É Samba” (de Caetano Veloso) e “Paciência” (de Lenine e Dudu Falcão), esta um dos melhores momentos do projeto ao lado da soberba “A Ostra e o Vento” (de Chico Buarque), escolhida para abrir o terceiro quadro do qual consta também o belo solo de Francis para a já antológica “Senhorinha” (de Guinga e Paulo César Pinheiro).
As lembranças de quando ele estudou na Suíça francesa, na década de cinquenta, são resgatadas com “Du Soleil Plein La Tête” e "Chiens Perous Sans Coullier” (dois temas do repertório de Yves Montand), separadas pela genial “Canção de Pedroca” (dele e Chico, composta especialmente para o musical “O Rei de Ramos”). A inédita “Balada de um Café Triste” (de Francis e Geraldo Carneiro, atualmente seu colaborador mais frequente) surge no penúltimo bloco que traz “Tristão e Isolda” (de Wagner) como apropriada introdução.
Um CD de cores intimistas que certamente será pouco comentado e que não alcançará vendas consideráveis, mas que foi feito na certeira hora de maturação por dois artistas que entregam suas almas à deusa música. Quem tiver bons ouvidos para ouvi-lo, que o faça!
N O V I D A D E S
• Levados ao ar no último trimestre do ano passado pela TV Globo, os dez episódios do excelente seriado “As Cariocas” chegaram recentemente ao mercado no formato DVD e já se torna uma excelente opção de presente para o Dia dos Namorados que se aproxima. Também foi recentemente disponibilizado, através da gravadora Som Livre, o CD que contém a trilha sonora original, o qual foi produzido por Rodrigo Campello e Pedro Luís. Composto por quatorze faixas, traz fonogramas gravados especialmente para o projeto, a exemplo de “Menina” (de Paulinho Nogueira) com Mart’nália, “Tempo de Estio” (de Caetano Veloso) com Olívia Byington, “Samba do Carioca” (de Carlos Lyra e Vinicius de Moraes) com Elza Soares, “Só Love” (de MC Bochecha) com Nina Becker, “Só o Ôme” (de Edenal Rodrigues) com Ney Matogrosso, e “Malandro” (de Jorge Aragão e Jotabê) com Alcione. Mas o destaque maior fica mesmo por conta do inspiradíssimo tema de abertura “Bela Fera” (do já citado Pedro Luís) a cargo do grupo Pedro Luís e a Parede. Ótima pedida!
• Domenico Lancellotti é nome dos mais requisitados atualmente na cena indie nacional. Depois de três volumes lançados com o trio + 2, do qual faziam parte Moreno Veloso (filho de Caetano) e Kassin, ele acaba de fazer chegar às lojas, através da gravadora Coqueiro Verde Records, o CD intitulado “Cine Privê”. Trata-se de um trabalho composto por dez faixas e eminentemente autoral, já o artista é o responsável pela criação de todas as músicas, algumas delas, contudo, ao lado de parceiros. Não se espere encontrar um disco de melodias fáceis de serem assimiladas nem de letras com mensagens óbvias. É, antes de tudo, um trabalho conceitual em que a tentativa de expor ideias deixa em segundo plano a estrutura comum das canções. Na verdade, o som apresentado por Domenico – diga-se de passagem, um exímio baterista – tende para o experimental. Adriana Calcanhotto aparece como convidada especial na concretista “Pedra e Areia”. Destaques para “Fortaleza”, “Su Di Te” e a instrumental “Hugo Carvana”, uma homenagem explícita ao ator e cineasta de sucessos como “Vai Trabalhar, Vagabundo”.
• O primeiro CD solo do cantor e compositor Chico Adnet (“Alma do Brasil”) já se encontra disponível. Produzido pelo próprio artista ao lado de Jaime Alem, o trabalho traz quatorze faixas, dentre as quais “Arquiteto”, parceria póstuma com Pedro Caetano (autor de, entre outros conhecidos temas, “É Com Esse que Eu Vou” e “Onde Estão os Tamborins?”).
• A multinacional Sony Music acaba de repor em catálogo alguns bons títulos lançados originalmente pela gravadora Kuarup que, infelizmente, fechou suas portas por conta da atual crise que assola o mercado fonográfico mundial. Dentre os CD’s que novamente poderão ser encontrados nas lojas estão o segundo trabalho de Vander Lee (que contém, dentre outras ótimas canções, o reggae “Neném” e a romântica “Fogo”), o álbum que registrou o encontro entre Renato Teixeira e Rolando Boldrin (que traz como destaques as releituras de “Funeral de um Lavrador” e “Acorda, Maria Bonita”) e o histórico disco “A Floresta do Amazonas” no qual os pianistas João Carlos Assis Brasil e Wagner Tiso prestam seu tributo à obra do maestro Villa-Lobos ao lado de Jaques Morelenbaum (no cello), Jurim Moreira (na percussão) e Ney Matogrosso (nos vocais de “Cair da Tarde”, “Canção de Amor” e “Melodia Sentimental”).
• O primeiro CD solo de Marcelo Yuka, ex-integrante da banda O Rappa, finalmente será lançado este ano. O trabalho contará com as participações especiais de Marisa Monte, Seu Jorge, Céu e Cibelle.
• O tecladista Mú Carvalho (ex-integrante da lendária banda A Cor do Som, sucesso inquestionável na virada dos anos setenta para os oitenta) uniu-se à sua esposa, a cantora Ana Zingone, e juntos acabam de lançar, através da gravadora Som Livre, o ótimo CD intitulado “Voo Silencioso”. Mú, além de exímio musicista, geralmente se mostra um compositor inspirado e sabe cantar com voz suave e bem colocada. Ana é dona de um timbre super delicado e afinado que pega o ouvinte logo na primeira audição. O repertório é composto por dez faixas, nove delas assinadas pelo próprio Mú ao lado de parceiros (a única canção de lavra alheia é “A Lua É Testemunha”, de Edu Krieger). Há a regravação de “Swingue Menina” (feita com Moraes Moreira) e a participação especial de Luiz Caldas em “Convite Pra Gafieira”. Entre boa parceria inédita com Cazuza (“Onde Todos Estão?”) e incursão por ritmo nordestino (“Vamos Somar, Meu Bem”, parceria com Galvão), os melhores momentos desse super bem-vindo trabalho ficam por conta das faixas “Olhos d’Água” (parceria com Pierre Aderne e Alexia Bomtempo), “Um Bom Bordeaux” (parceria com Marcelo Costa Santos) e “Quando a Gente Ama Pra Valer” (parceria com Paulinho Tapajós”), esta já um tanto conhecida pelo público por ter feito parte da trilha sonora da telenovela global “Ti Ti Ti”, levada ao ar até março deste ano.
• E para quem ainda não sabe, o mais recente estouro da internet é o vídeo da balada “Oração” (de Léo Pressato) feito pelo grupo paranaense “A Banda Mais Bonita da Cidade” que existe há dois anos e é formado pelos amigos Rodrigo Lemos, Luís Bourscheidt, Uyara Torrente, Vinicius Nisi e Diego Placa. Filmado em plano sequência em um casarão em Rio Negro (na divisa do Paraná com Santa Catarina), a espécie de clipe, cuja produção envolveu cerca de vinte e cinco pessoas (incluindo câmeras, iluminadores e os muitos figurantes em cena), já contabiliza atualmente quase cinco milhões de visualizações. Se você curte arte feita com verdade, simplicidade, originalidade e beleza, não pode deixar de acessar: http://www.youtube.com/watch?v=QW0i1U4u0KE
• E agora uma notícia bacana pra caramba! A grande cantora Amelinha, famosa de norte a sul do Brasil nos idos dos anos oitenta por conta de, entre outras, canções como “Frevo Mulher” e “Foi Deus Que Fez Você”, se encontra em estúdio registrando as canções que farão parte de um novo CD, o qual marcará o seu retorno ao mercado fonográfico através da gravadora Joia Moderna. Entre os compositores já escolhidos figuram nomes como Vinicius de Moraes, Alceu Valença, Fagner e Chico César. Quem viver, ouvirá!
RUBENS LISBOA é compositor e cantor
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