Musiqualidade

R E S E N H A

Cantor: CHICO CÉSAR
CD: “CANTOS E ENCONTROS DE UNS TEMPOS PRA CÁ”
Gravadora: BISCOITO FINO

Como tudo o que acontece sob o Sol, a música popular brasileira também tem lá os seus ciclos. E estes acontecem de maneira separada ou até concomitantemente. Alguns podem nominá-los de movimentos; outros, de modismos. O fato é que já tivemos, entre outros, a Bossa Nova, o Tropicalismo, a Jovem Guarda e explosões pontuais protagonizadas por algumas regiões específicas, como é o caso do chamado “Pessoal do Ceará” (que, na década de setenta, inseriu no mercado fonográfico talentos como Fagner, Amelinha, Belchior e Ednardo) e das bandas alternativas pernambucanas (que, até há pouco tempo, multiplicavam-se aos borbotões).
Dentro dessa linha de raciocínio, talvez o último grupo de real representatividade na nossa MPB tenha surgido em meados da década de noventa, não com uma intensidade absurda como outros que lhe antecederam, mas trazendo uma forma interessante de se pensar música. Nem mesmo pareceu que foi engendrado como tal, mas o fato é que, com o aparecimento do paraibano Chico César e dos maranhenses Zeca Baleiro e Rita Ribeiro, um bem-vindo sopro de inventividade denotou que existe música inteligente oriunda do Nordeste, a despeito da visibilidade percussivamente avassaladora da Bahia. A reboque, ótimas cantoras como Vange Milliet, Miriam Maria e Vanessa Bumagny também lançaram bons discos, mesmo que infelizmente não tenham conseguido conquistar uma fatia maior de público.
Igualmente compositores criativos, os citados Chico e Baleiro emplacaram alguns sucessos, mas a realidade é que, com a crise do mercado fonográfico e com a proliferação frequente de tantos novos nomes, tornou-se mesmo bastante complexo manter-se em evidência. E se Baleiro, mesmo lançando trabalhos com maior regularidade, por vezes parece perder o foco (talvez por influências alheias), Chico, por seu lado, vem se mostrando, ao longo desses anos, de uma coerência artística ímpar.
Daí porque se faz bastante apropriado o lançamento do CD intitulado “Cantos e Encontros de Uns Tempos Pra Cá”, registro ao vivo de apresentação realizada em 2006 no Auditório Ibirapuera em São Paulo. É que, naquela oportunidade, ele estava a realizar shows de divulgação do álbum “De Uns Tempos Pra Cá” que havia lançado um ano antes, através da gravadora Biscoito Fino, o qual contou com a participação efetiva do Quinteto da Paraíba, grupo que também o acompanhou no recém-lançado disco, cujo registro em vídeo – é bom que se frise – já havia chegado ao mercado em 2007.
Chico é um autor realmente inspirado, dos poucos que transitam bem por vários gêneros musicais. E é nessa qualidade inata de se fazer eclético que reside o seu maior mérito. O que o torna inconfundível em qualquer lugar, contudo, é mesmo sua voz única, de timbre seco e marcante, a qual lhe serve de instrumento para mostrar sua obra, não obstante já tenha sido ela gravada por muitos dos maiores nomes do nosso cancioneiro, especialmente intérpretes femininas que se mostram fascinadas pelo trabalho do artista.
Três delas aparecem, como convidadas especiais, no CD ora em tela. Captado ao vivo, o encontro com a conterrânea Elba Ramalho soa bem legal no medley que reúne “A Prosa Impúrpura do Caicó” (uma das mais belas canções criadas por Chico) e “Asa Branca” (antológico tema de Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira). Como faixas bônus, surgem os registros feitos em estúdio com Maria Bethânia e Ana Carolina. A primeira revisita a parceria inaugural de Chico com Vanessa da Mata, a contundente “A Força que Nunca Seca”, e a segunda mergulha de cabeça em “Mulher Eu Sei”, música lançada por Chico, em 1995, em seu disco de estreia. E ainda há o exímio violonista Chico Pinheiro, comprovando sua cultuada versatilidade em “1 Valsa p/ 3”, uma parceria entre os dois artistas.
Ademais, o repertório de dezesseis faixas alia sucessos próprios (“Mama África”, “À Primeira Vista”, “Templo”, “Pensar em Você” e “Pedra de Responsa”) a ótimas canções autorais menos conhecidas (“Moer Cana”, “Orangotanga”, “Por Que Você Não Vem Morar Comigo?”, “Alcaçuz” e “De Uns Tempos Pra Cá”), além de resgatar “Cálice” (de Gilberto Gil e Chico Buarque) e “Paraíba” (outra de Gonzaga e Teixeira).
Enquanto não chega o próximo disco inédito, mostra-se esse CD uma ótima oportunidade para amenizar as saudades do talentoso Chico César!

N O V I D A D E S

* Anelis, filha do grande Itamar Assumpção, está lançando o seu primeiro CD solo. Trata-se de “Sou Suspeita, Estou Sujeita, Não Sou Santa”, um álbum produzido por ela ao lado do tecladista Zé Nigro, que é composto por quinze faixas (treze delas assinadas pela própria artista, algumas ao lado de parceiros). Como cantora, Anelis possui uma voz cativante. Embora pequena, possui um timbre seguro e uma emissão afinada. Enquanto compositora, é fato que ela apresenta boas ideias, mas a maioria dos temas ainda resulta distante do formato tradicional da canção, o que, decerto, trará certo estranhamento ao ouvinte médio. As exceções ficam por conta de “Passando a Vez” (dela e Luz Marina), “Quaresmeira” (dela e Jerry Espíndola) e “Sonhando” (de Karina Buhr), não à toa as melhores músicas do disco que, dedicado ao pai e à filha Rubi, traz as vozes dos mesmos na primeira e última faixa (as canções “Mulher Segundo Meu Pai”, de autoria de Itamar, e “Paixão Cantada”, respectivamente), como uma ode à continuidade da vida. Há as participações especiais do ator Gero Camilo (em “Amor Sustentável”), Céu e Thalma de Freitas (em “Alta Madrugada” – aliás, as três cantoras integram o trio Negresko Sis), Zé Nigro (em “Bola com os Amigos”) e Alzira E (na já citada “Quaresmeira”).

* No próximo dia 15 de julho (sexta-feira próxima, portanto) estará se apresentado, a partir das 21 horas, no Teatro Tobias Barreto, o cantor e compositor Michael Sullivan. O artista será o primeiro a protagonizar uma série de shows que farão parte do Projeto Grandes Nomes, uma iniciativa da Mac2 Entretenimento que tem como objetivo promover, aqui em Aracaju, eventos de porte para um público diferenciado. Do repertório da apresentação farão parte alguns dos grandes sucessos de Sullivan, a exemplo de “Retratos e Canções”, “My Life”, “Estranha Loucura”, “Deslizes” e “Um Dia de Domingo”.

* Programado para chegar às lojas ainda neste mês de julho, o novo CD de Seu Jorge já começa a ter executada, em algumas rádios mais antenadas, a canção “A Doida”. Intitulado “Músicas para Churrasco – Volume 1”, o projeto é composto por uma trilogia e tem explícita intenção de inserir o nome do artista junto a uma parcela mais popular de público.

* De volta à carreira após um recesso involuntário causado por problemas de saúde, a cantora Joanna está lançando o CD “Em Nome de Jesus – Joanna Interpreta Padre Zezinho”. Como o próprio título já entrega, a cantora mergulha no repertório do conhecido padre mineiro que está completando setenta anos de vida e quarenta e cinco de sacerdócio.

* Gravado de maneira independente, acaba de chegar ao mercado o primeiro CD da cantora carioca Thais Macedo. Intitulado “O Dengo que a Nega Tem” (nome da faixa de abertura, antigo sucesso de Dorival Caymmi propagado por Carmen Miranda) e produzido por Carlinhos Sete Cordas, o trabalho traz uma dúzia de faixas integradas ao universo do samba. Thais soa super graciosa em um repertório majoritariamente inédito que traz, no entanto, outra regravação: a conhecida “Filosofia” (de Noel Rosa e André Filho). Entre os destaques do repertório estão as canções “Minha Arte de Amar” (de Nei Lopes e Zé Luiz), “Morena do Mar” (de Norma Acquarone), “O Amor Fala em Você” (de Moacyr Luz e Luiz Carlos da Vila) e “Candeeiro da Saudade” (de Dunga e Roque Ferreira). Uma intérprete pronta e que tem tudo para emplacar!

* E do Maranhão chega uma alvissareira novidade! Trata-se do cantor Glad Azevedo que lançou há pouco tempo, através da gravadora Mills Records, o ótimo CD intitulado “Canto de Lá”. Composto por uma dúzia de faixas, todas assinadas por compositores maranhenses (a exemplo de João do Vale, César Teixeira, Nonato Buzar e Papete), o álbum se destaca pela coerência de um repertório que se mostra acima da média. Glad canta muito bem, com impostação segura e timbre bonito, lembrando, em algumas passagens, Lenine. Entre os melhores momentos estão as faixas “Diverdade” (de Chico Maranhão, em belíssimo arranjo que supera o da gravação original da canção feita por Diana Pequeno em 1980), “Ponteira” (de Sérgio Habibe), “De Cajari pra Capital” (de Josias Sobrinho) e “Cajueiro Velho” (de João Carlos, que vem a ser o pai da cantora Alcione).

* Três anos depois de lançado na Europa, chega ao mercado brasileiro, através da gravadora Biscoito Fino, o CD “Mafuá” do violonista Yamandu Costa. Entre outros temas instrumentais, o repertório de treze faixas, essencialmente autoral, apresenta como destaques “El Negro del Blanco”, “Elodie” e “Bachbaridade”.

* “Áudio Retrato” é o título do CD que o cantor e compositor Ricardo Dias lançou recentemente de maneira independente. Com produção assinada por Ítalo Simão e composto por treze faixas, o álbum apresenta um repertório totalmente autoral que passeia pelo samba e seus afins, tais como o choro, o maxixe e a marcha. Cantor mediano, Ricardo conta com as participações especiais e afetivas de Pedro Miranda (em “Jorgete”), Claudia Ventura (em “Nunca Fui Santa”) e o parceiro Rodrigo Alzuguir (em “Por Ela”). Alguns dos melhores momentos ficam por conta das faixas “Quesito Retrocesso”, “Classificados” e “Leviana”.

* Findo o primeiro semestre de 2011, a constatação é de que, ao menos até agora, este ano vem se caracterizando como pouco profícuo para a nossa música popular brasileira. Isso porque, afora honosas exceções (e aqui se encaixam os novos CD’s de Thaís Gulin, Adriana Calcanhotto e Mônica Salmaso), foram raros os lançamentos realmente interessantes. O segundo semestre que se inicia, no entanto, promete! É que, ainda este mês, deverá chegar ao mercado o novo álbum de Chico Buarque. Em setembro, será a vez de Gal Costa lançar o alardeado disco cujo repertório será composto somente por canções de Caetano Veloso. Já em outubro, aportarão nas lojas os novos CD’s de Lenine, Marisa Monte, Roberta Sá, Rita Lee, Beth Carvalho e o primeiro projeto solo de Pedro Luís. Aguardam-se ainda definições quanto a Maria Rita e Roberto Carlos, este para poder presentear os seus milhares de fãs com o tão aguardado álbum de inéditas. Tomara que esses trabalhos resultem de fato legais para alavancar um mercado que, em constatável crise, necessita não somente de boas intenções, mas de músicas de qualidade!

RUBENS LISBOA é compositor e cantor
Quaisquer críticas e/ou sugestões serão bem-vindas e poderão ser enviadas para o e-mail: rubens@infonet.com.br

Comentários

Nós usamos cookies para melhorar a sua experiência em nosso portal. Ao clicar em concordar, você estará de acordo com o uso conforme descrito em nossa Política de Privacidade. Concordar Leia mais