R E S E N H A
Cantor: OSWALDO MONTENEGRO
CD: “CANÇÕES DE AMOR”
Gravadora: MICROSERVICE
Ele é carioca, mas como, desde cedo, se tornou um andarilho, foi quando residiu em Brasília, no início da década de setenta, que mergulhou de vez na música. O reconhecimento maior aconteceu ao se sagrar vencedor do Festival MPB 80, organizado pela Rede Globo, com a música “Agonia”, de autoria de seu irmão adotivo, Mongol. Pouco antes, no entanto, ele já havia estourado nacionalmente com “Bandolins”, canção de sua autoria, cuja interpretação dividiu com Zé Alexandre e foi uma das finalistas de outro Festival de Música, daquela feita realizado pela extinta Rede Tupi.
Estamos a falar de Oswaldo Montenegro, cantor e compositor incontestavelmente inspirado, criador de grandes sucessos, a exemplo de “Lua e Flor”, “O Condor”, “Léo e Bia”, “Intuição”, “História Estranha”, “A Lista” e “Aquela Coisa Toda”, mas que, por um desses mistérios que a própria razão desconhece, nunca foi gravado pelos grandes nomes da nossa música popular brasileira (com exceção de Ney Matogrosso) e que, talvez devido a uma personalidade no mínimo exótica, sempre dividiu opiniões, tanto da crítica quanto do público em geral: há os que o amam loucamente e aqueles que, ao contrário, não o suportam.
O fato é que ele é, de fato, talentoso. Instrumentista competente, seu lado compositor tem forte influência dos antigos menestréis, alcunha pela qual ficou conhecido (e que abraçou) quando capitaneou várias trupes itinerantes de teatro Brasil adentro. Durante sua trajetória, criou canções muito bonitas, muito embora, de uns anos para cá, pareça vir se contentando em lançar trabalhos revisionistas.
É por aí que acaba de chegar ao mercado, através da Microservice, o CD intitulado “Canções de Amor”, gravado no ano passado e anteriormente já disponibilizado na internet. Composto por treze faixas (dentre elas, dois medleys), a sonoridade é simples, mas resulta eficiente. Os arranjos contam tão somente com a presença de violão, teclado (ambos executados pelo próprio Oswaldo) e flauta (a cargo da companheira-amiga de toda uma vida, Madalena Salles).
Oswaldo continua se mostrando um dos melhores cantores em atividade. Sua voz é possante, afinada e bem colocada, com grande extensão. Nesse recém-lançado álbum, no entanto, até por conta da embalagem sonora escolhida, ele se apresenta mais suave. Para que isso acontecesse, fez-se necessário baixar o tom das canções, como bem ressalta o sucinto e expressivo texto assinado por Roberto Menescal apropriadamente inserido no encarte.
A maioria do repertório é de autoria somente de Oswaldo que se abre a parcerias em alguns poucos momentos: em “Tempo das Águas” e “Rio Descoberto” (ambas feitas com Raíque Mackáu), “Paixão de Bar” (ao lado de Mongol) e “Em Tempo” (com os dois parceiros citados). A onipresente Zélia Duncan dá o ar de sua graça e competência em “Sempre Não É Todo Dia”, tema originalmente composto para o musical “Aldeia dos Ventos”. Dentre os melhores momentos do roteiro selecionado, podem ser destacadas as faixas “Por Descuido ou Displicência”, “Quem Havia de Dizer”, “Não Há Segredo Nenhum” e “Sem Mandamento”.
Apoiado por versos que remetem à solidão, a lembranças amorosas, a encontros e despedidas, Oswaldo Montenegro construiu uma obra graciosa que não deve ser esquecida. Artista que, durante décadas, fez parte da trilha sonora de milhares de pessoas, ele resgata, no CD ora resenhado, boas canções em formato eminentemente acústico, mas é de se torcer para que sua inquietude inata venha a lhe fazer brotar ainda muitas outras novas e bonitas canções.
N O V I D A D E S
* Manuela Rodrigues é nome que vem da Bahia e, como tal, poder-se-ia supor que se trata de mais uma a enveredar pelas canções rasteiras que povoam micaretas e prévias carnavalescas. Mas não! Felizmente, “Uma Outra Qualquer Por Aí” é tão somente o título do segundo CD dessa artista, o qual acaba de chegar ao mercado de maneira independente. Produzido por ela ao lado do tecladista Tadeu Mascarenhas que faz parte da banda que a acompanha (juntamente com Son Melo no baixo e Lalo Batera na bateria), o disco é o sucessor de “Rotas” (lançado em 2003) e, composto por doze faixas, mostra uma cantora de bons recursos vocais e uma compositora com reais lampejos criativos (sim, Manuela é mais uma que, além de cantar, também se aventura na arte de compor!). Entre momentos menores, caso de “Moça de Família” e “Desencanto” (parceria com Leandro Morais), emergem temas de fato interessantes como “Teve Reflexão” (arranjado com células de maracatu) e “Barraqueira” (divertida canção lançada originalmente pela conterrânea Marcia Castro e na qual Manuela mostra os seus dotes de atriz inata em meio a efeitos e samplers do DJ Mauro Telefunksoul). Há ainda bem-humorada crítica à esperteza dos tempos modernos (no sambão “Vende-se um Poema”, parceria com Álvaro Lemos, que participa dos vocais), abordagem sobre a necessidade artística de se sentir livre (em “Profissional Liberal”) e tentativa de adentrar em questionamento mais sério (em “Neurose”). Manuela também canta músicas criadas por outros compositores, como “Doce de Limão”, do já citado Leandro Morais, em letra que remete quase que explicitamente ao ato da felação, e a faixa-título, um samba torto resultante da parceria dos paulistas Romulo Fróes e Clima (Romulo, aliás, participa como convidado especial da faixa bônus, a delicada “Por Um Fio”, parceria dele com a própria Manuela). Curiosamente, no entanto, o maior destaque do repertório fica por conta de “Berimbau” (de Pierre Onassis, Marquinhos e Germano Meneguel), sucesso do grupo afro Olodum, regravada com maestria pela intérprete e emoldurada por um arranjo de tons épicos que resultou pra lá de interessante. Trata-se, enfim, de um CD que tem como principal objetivo fazer com que o nome de Manuela Rodrigues venha a ser conhecido além dos muros da Bahia. Que o Senhor do Bonfim assim queira, pois talento a moça tem de montão!
* Jerry Adriani, nome sempre associado à Jovem Guarda, está lançando o CD “Pop, Jerry & Rock” sob a produção do tecladista Reinaldo Arias. O repertório é inédito e concilia romantismo e rock’n roll.
* Mesmo tendo garantido, no ano passado, que não mais lançaria CD's, o cantor e compositor Lulu Santos já se encontra em estúdio registrando as canções que farão parte de seu novo álbum, o qual chegará ao mercado ainda este ano. Como muda rápido de opinião esse rapaz, heim?
* Raphael Gemal, Paulo Baiano e Antônio Saraiva são alguns dos compositores da atual cena independente gravados pela vigorosa intérprete Valéria Lobão em seu CD intitulado “Chamada”, o qual chegou recentemente ao mercado. Produzido pelo pianista Carlos Fuchs, o álbum mostra uma artista de técnica irrepreensível, mas que também emana emoção, conforme se pode depreender através das treze faixas que compõem o seleto repertório (ela chega, em alguns momentos, a lembrar a insuperável Elis Regina). Há as participações especiais do grupo vocal Equale (do qual Valéria também faz parte) na faixa-título, de Marcos Sacramento em “Oração Perdida” e da banda Pedro Luís e a Parede em “Ritual Profano”, esta um dos destaques do disco, ao lado da arrebatadora “Fubá”, da interessante “Roda Baiana” e da sensível “Vivência”. Vale a pena conhecer!
* Na década de setenta, Marília Barbosa esteve em considerável evidência posto que, além de participar como atriz de várias telenovelas globais, ela chegou a frequentar as paradas de sucesso com algumas canções. Um dos primeiros nomes, no Brasil, a concomitantemente atuar e cantar, ela lançou em 1978 o disco “Filme Nacional”, o qual retornará ao catálogo neste segundo semestre, no formato CD, através da gravadora Joia Moderna. O repertório traz músicas assinadas por Djavan (“Total Abandono”), Rita Lee (“Melodia Inacabada”), Roberto e Erasmo Carlos (“Olha”), Dom Beto (“Como um Sonho”) e Renato Teixeira (“Antes Que Aconteça”).
* Chegou recentemente às lojas, através da gravadora Biscoito Fino, o CD intitulado “Pra Que Chorar” que reúne os talentos do cantor Celso Sim e do musicista Arthur Nestrowski em formato voz e violão. Composto por dezesseis faixas, o álbum mostra o perfeito entrosamento musical entre esses dois artistas. Celso canta muito bonito, com um timbre que remete a Caetano Veloso, mas abraçando uma interpretação toda própria. Nestrowski é violonista dos melhores em atuação no nosso país e dispensa maiores comentários. O repertório resgata temas já bastante conhecidos, a exemplo de “As Rosas Não Falam” (de Cartola), “Antonico” (de Ismael Silva), “É Doce Morrer no Mar” (de Dorival Caymmi e Jorge Amado) e “O Amor” (de Caetano Veloso e Ney Costa Santos sobre poema de Maiakóvski), mas também apresenta canções inéditas de autoria de Nestrowski (“Cartografia”, “Retrato de uma Senhora”, “Aquecimento Global” e “Acalanto”, esta uma parceria com Zé Miguel Wisnik, estão entre as melhores). Dois dos grandes destaques do álbum ficam por conta de regravações de obras de Lupicínio Rodrigues (“Um Favor” e “Quem Há de Dizer”, esta feita com Alcides Gonçalves).
* ”Nó na Orelha” é o título do novo CD de Criolo, nome artístico de Kleber Cavalcante Gomes, que até então havia lançado trabalhos inteiramente voltados para o hip hop. No entanto, no recém-lançado álbum, que é composto por onze faixas e foi produzido por Marcelo Cabral e Daniel Ganjaman, mesmo não abandonando por inteiro o gênero que o consagrou, o artista se abre a novas possibilidades, marcando uma nova fase na carreira. Além de rap (as faixas “Grajaeux”, “Sucrilhos” e “Lion Man”), o disco traz samba (“Linha de Frente”), reggae (“Samba Sambei”) e brega (“Freguês da Meia Noite”), transformando-se numa salada musical bem interessante. Os melhores momentos ficam por conta de “Bogotá” (com seus metais maravilhosos), “Não Existe Amor em SP” (em cujos versos se ressalta a solidão das grandes metrópoles) e “Subirusdoistiozin” (um diagnóstico do cotidiano nas favelas). A única parceria presente no repertório inteiramente autoral é a canção “Mariô”, feita por Criolo ao lado de Kiko Dinucci. Na ficha técnica, constata-se que os interessantes vocais femininos ficaram a cargo das excelentes Verônica Ferriani e Juçara Marçal. Muito legal!
RUBENS LISBOA é compositor e cantor
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