|
R E S E N H A
Cantora: MARISA MONTE
CD: “O QUE VOCÊ QUER SABER DE VERDADE”
Gravadora: EMI
Nem tanto ao mar, nem tanto à terra… E o fato de estar causando tantas discussões (uns amam de paixão, outros detestam com veemência) só faz jogar luzes (e para todo artista isso é muito bom) sobre “O Que Você Quer Saber de Verdade”, o novo e oitavo CD de Marisa Monte, o qual acaba de chegar às lojas através da gravadora EMI.
A verdade é que ele não é o melhor trabalho da artista que ainda mantém insuperável o seu primeiro e magistral álbum, lançado em 1989, o qual aliava, no eclético repertório, canções de Candeia e Luiz Gonzaga (“Preciso me Encontrar” e “O Xote das Meninas”, respectivamente), passando por Mutantes (“Ando Meio Desligado”) e Jovem Guarda (“Negro Gato”, de Getúlio Côrtes). Mas também não é o seu pior trabalho, embora seja incontestável que é o que mais se aproxima de um tom mais popular, o que para muitos críticos faz com que beire a aura de brega.
Marisa começou sua carreira já embalsamada como “a grande revelação da MPB em décadas”. Em seguida ao boom inicial, soube se manter no topo por sabiamente cultuar um estilo hype, o que lhe garantiu um enorme séquito de fãs. No entanto, um olhar mais observador sobre sua obra faz constatar não ser de agora que ela namora canções de apelo romântico mais aguçado.
A intérprete continua intacta dona de seu canto e surge envolta em arranjos que lhe permitem ressaltar quase sempre um clima etéreo. Dona de voz suave, afinada e de timbre mais que agradável, a artista assina ao lado de parceiros nove das quatorze canções do repertório apresentado. Talvez esse excesso de confiança em seu lado compositora é que venha mesmo comprometendo seu trabalho, uma vez que os temas por ela abordados são geralmente os mesmos (as conquistas amorosas e seus desdobramentos), o que já começa a se tornar repetitivo (embora – há que se ressaltar e constatar – haja uma fatia considerável de público sempre ávida pelos assuntos ligados ao coração).
O novo CD (que foi produzido pela própria cantora ao lado de Dadi, ex baixista da lendária banda A Cor do Som, e cuja ficha técnica agrega nomes ligados a grupos como Nação Zumbi, músicos americanos, o pianista Daniel Jobim e o sanfoneiro Waldonys) começa realmente morno com a insossa faixa-título e um resgate de “Descalço no Parque”, canção das mais tolas de Jorge Ben Jor. O primeiro momento interessante surge com “Depois”, tema com grandes chances radiofônicas que bem poderia figurar no repertório de Roberto Carlos. Seguem “Amar Alguém”, uma boa música prejudicada pelo arranjo que soa um tanto solto, e “O Que Se Quer” (primeira parceria de Marisa com o ex-hermano Rodrigo Amarante que, aliás, comparece nos vocais como convidado especial). Com uma pegada pop regional, esta se transforma em um dos bons momentos do disco. Melhor sorte não possui a toada “Nada Tudo” (de André Carvalho, filho do citado Dadi), que passa batida. “Verdade, uma Ilusão” (lançada por Carlinhos Brown no ano passado em seu CD “Diminuto”) ganha tratamento delicado, todavia não é mesmo um dos temas mais inspirados dentre os já compostos pelos dois artistas juntamente com Arnaldo Antunes, os três Tribalistas. Aí surge a releitura de “Lencinho Branco” (versão de Wagner Maugeri Neto para “El Pañuelito”, tema de Juan Dios Filiberto e Gabino Coria Peñaloza), pseudo-tango pescado de um disco antigo de Dalva de Oliveira: soa exótica e triste, mas meio confusa, ainda que conte com a participação especialíssima do grupo Café de Los Maestros. O melhor momento do CD, enfim, aparece com “Ainda Bem”, canção que já vem tocando exaustivamente nas rádios, e que, além de uma letra simples e eficiente, conta com uma melodia bacana que remete aos deliciosos mariachis mexicanos, juntando violão flamenco, guitarra surf music, trompete característico e muito nã-nã-nã-nã. Em “Aquela Velha Canção”, Marisa mete o pé de vez no desenho caipira-country, mas é uma faixa que deve conquistar as almas apaixonadas. Outros destaques ficam por conta da interessante balada “Era Óbvio” e do contagiante forró “Hoje Eu Não Saio, Não” (de Arnaldo Antunes em parceria com Marcelo Jeneci, Betão e Chico Salém), outra que deve vir a tocar bastante. Completam o set list a razoável “Seja Feliz” (que, pela pegada, pode funcionar mais no palco) e a sem gracinha “Bem Aqui” (de Dadi e Arnaldo Antunes).
Como sempre se mostrou uma artista inteligente que conduz a carreira com mãos de ferro, é de se supor que Marisa Monte saiba o que está fazendo nessa suposta busca da essência da canção popular. A enxurrada de críticas que vem recebendo com esse novo CD é fato inédito em sua carreira. Tomara que ela consiga transformar esses limões em uma deliciosa limonada…
|
N O V I D A D E S
* Em 1997, foi lançado o CD “Paradiso”, segundo título de uma trilogia completada por “Sorte” (de 1994) e “Juventude/Slow Motion Bossa Nova” (de 2002), o qual mostrava canções resultantes da parceria entre Celso Fonseca e Ronaldo Bastos. Pois não é que as músicas que compunham o repertório daquele álbum super interessante receberam nova roupagem, fazendo com que ele ora volte ao catálogo, através da gravadora Dubas, com o título de “Liebe Paradiso”? O repertório recebeu o incremento do belo e inédito tema “O Tempo Não Passou” que surge na apropriada interpretação de Adriana Calcanhoto. Aliás, seis das doze faixas contam com participações especiais, como é o caso de “Ela Vai pro Mar” (que ganhou a voz de Luiz Melodia em registro já conhecido pelo público por ter sido o tema da personagem da atriz Camila Pitanga na telenovela global “Insensato Coração”) e de “Quanto Tempo/Vento Azul”, medley emoldurado pelos preciosos vocais de Milton Nascimento. Nada que supere, no entanto, o sublime registro de Nana Caymmi para “Flor da Noite”. Outros ótimos momentos ficam por conta das gravações de Sandra de Sá (em “Polaroides”) e de Paulo Miklos (em “Você Não Sacou”). Já na voz de Celso, os destaques recaem sobre as faixas “Candeeiro” e “Alma de Pierrô”. Realmente, um trabalho deveras interessante!
* Concomitantemente, chega às lojas o novo CD de Celso Fonseca sozinho. Trata-se de “No Meu Filme”, arranjado por ele próprio e composto por uma dúzia de inéditas faixas autorais, três delas compostas em parceria com o supracitado Ronaldo Bastos. Apesar da produção esmerada com a utilização de cordas e metais permeando todo o álbum e a presença de músicos de primeiro quilate nos créditos, o disco esbarra na qualidade mediana do repertório apresentado. Entre os destaques, além da faixa-título, estão as canções “Maio e Junho” e “Ninho Vazio”.
* Formada por Ava Rocha (voz), Emiliano 7 (violão), Daniel Castanheira (bateria) e Nana Carneiro da Cunha (violoncelo), a banda Ava está lançando, através da gravadora Warner, o seu primeiro CD intitulado “Diurno”. Produzido por Felipe Rodarte, o álbum é composto por quatorze faixas, sendo que onze delas são de autoria dos seus próprios componentes. Destas, destacam-se “Doce Explosão”, “Acorda Amor” e “Ela É o Samba”. As três restantes são revisitas a temas gravados por Maria Bethânia (“Movimento dos Barcos”, de Jards Macalé e Capinam), Tim Maia (“Bons Momentos”, de Michael e Marquinhos) e Elis Regina (“Pra Dizer Adeus”, de Edu Lobo e Torquato Neto). A vocalista Ava é filha do cineasta Glauber Rocha e possui um timbre perculiaríssimo que transita entre os registros masculino e feminino.
* Luis Represas é cantor e compositor português que, correndo à margem da maré lusitana, não adotou o fado como mola-mestra de seu repertório. Talentoso, ele gravou no Brasil o CD “Navegar É Preciso”, cuja produção foi dividida entre Martinho da Vila e Marco Mazzola, e que chegou recentemente às lojas. Composto por treze faixas, o álbum mostra um intérprete de bela voz grave, do tipo que entende o que está cantando. Dos oito temas autorais, os destaques ficam por conta de “Eu Vi” e “Foi Como Foi”. Há as regravações de “Meu Erro” (de Herbert Viana), faixa que conta com a participação especial de Zélia Duncan e foi incluída na trilha sonora da telenovela global “Aquele Beijo”. Outro convidado é o já citado Martinho na releitura de “Oração de Mãe Menininha” (de Dorival Caymmi). O pai de Mart’nália ainda contribuiu, como autor, com a canção “Viajando”. Já o excepcional grupo vocal Arranco de Varsóvia pontua algumas faixas, com destaque maior para “Feiticeira” (parceria de Represas com Francisco Viana). Alguns dos melhores momentos do repertório ficam por conta das releituras da obra-prima “Sinal Fechado” (de Paulinho da Viola) e da conhecida “Apaga o Fogo, Mané” (de Adoniran Barbosa).
* Um grande prazer de se ouvir é o novo CD do cantor e compositor Ivor Lancellotti, após um jejum fonográfico de treze anos! Mergulhando no universo do samba com algum espaço para braçadas em ritmos nordestinos, o artista (que tem composições gravadas por Roberto Carlos, Nana Caymmi, Alcione, Joanna e Clara Nunes, entre outros) mostra-se em grande forma, não obstante o peso dos anos. Sugestivamente intitulado “Em Boas e Mais Companhias” e composto por dez faixas autorais, nas quais Ivor divide parcerias com Paulo César Pinheiro, João Nogueira, Delcio Carvalho, Roque Ferreira e Wanderley Monteiro, o álbum chega às lojas através da gravadora Dubas Music. A maioria do repertório é formada por temas inéditos, dos quais se destacam “Contradizendo”, “Mais que Saudade É Essa!”, “Sete e Meia” e “Pelos Ventos”. As regravações de “Sem Companhia” e “Bela Cigana” também merecem menção. Há as participações especiais de Pedro Miranda, Soraya Ravenle, Áurea Martins, Moyseis Marques, Mariana Bernardes e Teresa Cristina, além dos filhos Alvinho Lancellotti e Domenico Lancellotti.
* O selo Sesc lançou recentemente o CD “Sociedade Amigos da Gafieira” da Orquestra Saga, a qual, formada por quinze músicos, tem Gabriel Moura e Flávia Menezes à frente dos vocais. Composto por dezesseis faixas, trata-se de um álbum sensacional que joga luzes sobre o velho samba de gafieira, embora o repertório não albergue somente esse gênero. Entre os destaques estão as faixas “Aqui É o País do Futebol” (de Milton Nascimento e Fernando Brant), “Na sua Boca um Dia” (do citado Gabriel ao lado de Maurício Oliveira e Linox), “Minha” (de Cartola), “O Samba É meu Dom”, “Sábado à Noite” e “Conjunto de Baile” (estas três de Paulo César Pinheiro em parceria com Wilson das Neves, Maurício Tapajós e Eduardo Gudin, respectivamente). Como auxílio luxuoso, o projeto conta também com as participações especiais de, entre outros, Seu Jorge e Fabiana Cozza, dois dos nossos melhores intérpretes da atualidade.
RUBENS LISBOA é compositor e cantor
Quaisquer críticas e/ou sugestões serão bem-vindas e poderão ser enviadas para o e-mail: rubens@infonet.com.br