R E S E N H A
Cantora: JUSSARA SILVEIRA
CD: “AME OU SE MANDE”
Gravadora: JOIA MODERNA
Jussara Silveira é cantora correta que vem, há anos, tentando alcançar uma maior visibilidade a nível nacional. Mineira, ela foi criada em Salvador (BA), onde formatou toda a sua base musical. Dona de um canto cool, estreou profissionalmente em 1981, fazendo backing vocal no disco “Outras Palavras”, de Caetano Veloso. Seis anos após, ela realizou o seu primeiro show solo, ainda na capital baiana, até que, em 1995, ao participar do CD coletivo “Elas Cantam Caetano”, viu a música que interpretou (“Dama do Cassino”) ser escolhida para fazer parte da trilha sonora da segunda versão da telenovela global “Irmãos Coragem”. Em 1996, gravou o primeiro CD que sedimentou espaço para o lançamento, dois anos depois, de “Canções de Caymmi”, trabalho que, à época, foi super bem recebido pela crítica especializada.
Acaba de chegar às lojas, através da gravadora Joia Moderna, o mais novo CD da artista, o sexto de sua carreira. Produzido a quatro mãos pelo tecladista Sacha Amback e pelo percussionista Marcelo Costa, o álbum composto por onze faixas se intitula “Ame ou se Mande” (faixa que, por questões burocráticas, terminou sendo limada ao final) e é o registro de estúdio do show que a cantora estreou em fevereiro deste ano dentro da programação do “Tabuleiro da Bahia”, projeto do Centro Cultural Banco do Brasil.
Trata-se de um projeto concebido com uma sonoridade minimalista, o que, em alguns momentos, termina deixando certa sensação monocórdia. Jussara, embora domine tecnicamente a arte do canto com sua projeção límpida e técnica apurada, não é daquele tipo de intérprete que arrebate o ouvinte de pronto. Entre outras características inatas, os que se deparam com a obra da artista têm que gostar de cantoras mais contidas, senão, por maior que seja o esforço, sentir-se-á um tanto quanto frustrado.
Observações como esta tentam tão somente usar da sinceridade para apresentar Jussara a quem ainda não a conhece. Seu recém-lançado disco decerto não irá se transformar em campeão de vendagens nem de execução, embora alguns formadores de opinião já se apressem em catalogá-lo como um dos melhores lançamentos deste ano. E se, na verdade, não chega a tanto (é um bom título dentro da coerente discografia da artista, mas ainda não é o grande trabalho que ela pode apresentar), também não merece passar batido por aqueles apreciadores da música popular brasileira de qualidade.
Quanto ao repertório, talvez o maior mérito seja o de que as escolhas não recaíram sobre canções óbvias, praga que vem assolando o mercado fonográfico nacional (e não é de hoje). De fato, as músicas escolhidas não estão entre as mais conhecidas de seus autores, exceção feita a “Dê um Rolê” (de Moraes Moreira) e “Babylon” (de Zeca Baleiro). E se esta soa um tanto deslocada junto às demais, aquela se ressente da comparação com o registro definitivo feito por Zizi Possi em 1984.
Jussara parece sentir-se mais à vontade quando permanece na sua aldeia. É aí, junto ao celeiro baiano, que ela pescou dois dos melhores momentos do disco: “Ifá” (de Cézar Mendes e Capinan) e “Doce Esperança” (de Roberto Mendes e J. Velloso), esta já gravada anteriormente por Daniela Mercury em seu trabalho de estreia de 1991. Outro tema que se destaca é “O Dia que Passou” (de Toni Costa e Luiz Ariston), o qual cita “Here Comes the Sun” (de George Harrison).
Alguns compositores recorrentes nos trabalhos da cantora também se fazem presentes. É o caso de Zé Miguel Wisnik (em “Tenho Dó das Estrelas”, cujos versos pertencem a Fernando Pessoa) e Caetano Veloso (“Madre Deus”, canção composta para a trilha sonora de balé do Grupo Corpo, “Onqotô”, mas que resulta aquém da costumeira inspiração do filho mais famoso de Dona Canô). O tema sideral tem duplo espaço: tanto na pueril “Contato Imediato” (de Arnaldo Antunes, Marisa Monte e Carlinhos Brown) como na bobinha “Marcianita” (versão de Fernando César para sucesso de Caetano com os Mutantes). Completam o repertório a releitura de “A Voz do Coração”, boa parceria entre Celso Fonseca e Ronaldo Bastos, e a inédita “Bom” (de André Carvalho, filho do baixista Dadi, em parceria com Qinho), música sem maiores pretensões.
Jussara Silveira segue seu caminho musical e, mesmo que ninguém se sinta obrigado a amá-la, muito menos será o caso de se mandar…
N O V I D A D E S
* Com quinze anos de carreira, Fabiana Cozza chega, de maneira independente, ao seu terceiro CD mostrando que realmente é, na atualidade, o nome que mais compreende e mergulha com propriedade no samba nacional. Cantora paulista de fartos recursos vocais, ela apresenta um álbum homônimo menos urgente que seus bons trabalhos anteriores e, talvez por isso mesmo, bastante agradável. Voltando-se, desta feita, para compositores pertencentes ao quintal carioca e sob a produção do competente Paulão 7 Cordas, Fabiana reuniu uma dúzia de faixas que, de fato, ganham nuanças especiais ao receberem sua voz iluminada. O pai da cantora, Oswaldo dos Santos, comparece como convidado especial em “Narainã” (de Ideval Anselmo, Jordão e Zecão), a qual, unida em medley a “Solo Sagrado” (de Julio Marcos e Xuxu), fecha com chave-de-ouro esse muito bem-vindo trabalho. Entre os destaques do repertório apresentado estão “Sandália Amarela” (de Wilson Moreira e Nei Lopes), “Lupiciniana” (outra de Nei Lopes, agora com Wilson das Neves), “Sabe Deus” (de Sombrinha, Marquinho PQD e Carlinhos Vergueiro), “Escudo” (de Ivor Lancellotti e Wanderley Monteiro) e “Candeeiro de Deus” (de Roque Ferreira). Em tempo: as duas canções assinadas pelo emergente Kiko Dinucci (“São Jorge” e “Santa Bamba”, esta em parceria com Fabiano Ramos Torres) também merecem ser ouvidas com atenção. Corra e ouça!
* Se viva estivesse, Clara Nunes comemoraria setenta anos em 2012. Para lembrar tal data, a gravadora EMI anuncia o lançamento de um CD que trará registros inéditos de shows realizados pela artista mineira, como sua participação no espetáculo coletivo “Sabor Bem Brasil” e o da apresentação feita por ela na Costa do Marfim, na África, dentro do “Festival Brasil”. Também será lançado um DVD com o registro do especial gravado por Clara em 1973 para a TV Bandeirantes com o Conjunto Nosso Samba.
* O show que Daniela Mercury realizou na Praia de Copacabana, no Rio de Janeiro, na virada deste ano foi devidamente registrado e, enfim, acaba de chegar às lojas nos formatos CD e DVD. No afã de agradar a gregos e troianos, a cantora terminou por realizar um trabalho que soa no mínimo afoito. É muita informação, como as participações da Escola de Samba carioca Unidos da Tijuca, da Banda baiana Didá, do grupo mineiro Afro Lata, do Boi Bumbá amazonense Garantido, e até sampler da voz de Carmen Miranda em “O que É que a Baiana Tem” (de Dorival Caymmi). O repertório contempla alguns dos maiores sucessos de Daniela, a exemplo de “O Mais Belo dos Belos”, “Por Amor ao Ilê”, “Sol do Sul”, “O Reggae e o Mar”, “Batuque”, “Trio em Transe” e “Oyá por Nós”. Entre os melhores momentos estão “Paixão de Coração”, “Quero a Felicidade” e “Iluminado” (este, um belo tema da lavra de Vander Lee). O filho da estrela divide com ela os vocais de “Minas com Bahia” (deliciosa criação de Chico Amaral).
* Registro de shows realizados por Dominguinhos em 2009 deram origem ao CD e DVD “Iluminado”, os quais chegaram recentemente ao mercado através da gravadora Biscoito Fino. Com produção a cargo do experiente Zé Américo, o projeto conta com as participações especiais de Elba Ramalho e Gilberto Gil, além dos pianistas Wagner Tiso e Gilson Peranzzetta, do baixista Arthur Maia, do sanfoneiro Waldonys e do violonista Yamandu Costa, este na faixa “Noites Sergipanas”.
* Um ótimo lançamento é o CD de estreia da cantora carioca Elisa Addor, outra cria das noites musicais da Lapa. Ela canta bonito e, mesmo que ainda não se mostre è vontade em um ou outro momento (“Mar de Copacabana”, de Gilberto Gil, por exemplo), realizou um disco coeso composto por treze faixas e que vale a pena ser ouvido. Produzido com a competência habitual pelo cantor e compositor Edu Krieger, o álbum segue a vertente do samba e suas variações mais próximas. Entre os destaques estão as releituras de duas grandes canções de João Nogueira (“De Amor É Bom” e “Bons Ventos”, parcerias com Edil Pacheco e Ivor Lancellotti, respectivamente), além dos dois momentos em que Elisa se apresenta como compositora (“Janaína” e “Deixa Falar”, esta criada ao lado de Valmyr de Oliveira). Mas “Roendo Unha” (de Luiz Gonzaga e Luiz Ramalho), “Nasci para Sonhar e Cantar” (de Dona Ivone Lara e Delcio Carvalho) e “Alguém que Chora” (do já citado Krieger) também merecem ser ouvidas com atenção. Moraes Moreira é o autor e o convidado especial da faixa “Tia Ciata”.
* O proprietário da gravadora Joia Moderna, o DJ Zé Pedro, lançará em breve o seu quarto disco: trata-se de um projeto de remixes nos moldes do que ele fez há dois anos com várias cantoras e que, desta feita, dará vez e voz aos intérpretes masculinos da nossa MPB. Intitulado “Um Homem Também Dança”, o álbum surpreendentemente chegará ao mercado através da gravadora Lua Music.
* Durante apresentação recentemente realizada na Quinta da Boa Vista, no Rio de Janeiro, Seu Jorge registrou material suficiente para futuro lançamento de DVD. Artistas convidados como Caetano Veloso, Alexandre Pires e Zeca Pagodinho renderam o máximo possível.
* A banda paulista Zabomba está chegando ao terceiro CD. Trata-se de “Vivendo de Truque”, álbum composto por dez faixas, oito delas autorais. De lavra alheia somente figuram no repertório “Parafuso na Cabeça” (de Rogério Skylab) e “Teatro?” (de João Ricardo, que traz o mesmo em participação), este o mentor do lendário grupo Secos & Molhados que se destacou no cenário musical pela presença andrógina de Ney Matogrosso. Aliás, Ney surge como convidado especial na bacana “Mente”, um dos destaques ao lado da faixa-título e de “Dó de Mim”. Formado por Rapha Z (voz), Beto Boing (baixo), Paulo Passos (guitarra) e Marcelo Bonin (bateria), a Zabomba faz um som voltado para o rock com boas sacadas nas letras e arranjos interessantemente construídos. Vale a pena conhecer!
* Por questões editoriais, foi abortada a tentativa da gravadora Joia Moderna de reeditar o disco “…Maravilhosa”, originalmente lançado por Wanderléa em 1972.
* “Oito” é o título do oitavo CD de Pedro Mariano, o qual chegou recentemente às lojas através do selo Nau com distribuição da Microservice. O artista, que é filho de Elis Regina e César Carmargo Mariano, canta bem pra caramba, mas parece ainda meio perdido quanto ao repertório, o que continua a ser o calcanhar de Aquiles de sua carreira. Produzido por ele próprio ao lado de Otávio de Moraes e Conrado Goys, o novo álbum é composto por onze faixas, dentre as quais se destacam “Simples” (de Jair Oliveira), “Miragem” (de Dani Black) e “Por Nada e Por Ninguém” (de Edu Tedeschi). Luiza Possi é a convidada especial da faixa “Sei de Mim” (dela em parceria com Dudu Falcão).
* O selo Discobertas relança “Um Passeio Musical”, disco lançado em 1958 por Pacífico Mascarenhas. Louvável iniciativa!
* O violonista e guitarrista sergipano Saulo Ferreira está lançando o CD intitulado “Direções”. Trata-se de um trabalho independente, produzido pelo próprio artista e composto por dez faixas inéditas e autorais. Dosando com perfeição técnica e sensibilidade, o artista arrasa em temas como “Sweet Blues”, “Lamparina”, "Folia de Reis” e “Num Olhar”, alguns dos destaques do seleto repertório. Há as participações de músicos de ponta da nossa aldeia, a exemplo de Robson Souza (baixo), Rômulo Filho (bateria) Manoel Vieira (teclados) e Thiago Ribeiro (vocais). Os interessados em adquirir o álbum poderão fazê-lo entrando em contato através do celular (79) 8843-0439.
RUBENS LISBOA é compositor e cantor
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