R E S E N H A
Cantora: CÉLIA
CD: “OUTROS ROMÂNTICOS”
Gravadora: JOIA MODERNA
País difícil de entender este nosso, onde a cada dia pipocam aos quatro cantos vozes pequenas e desafinadas que, por razões diversas que muitas vezes não merecem ser trazidas a lume, começam a ser supervalorizadas pela crítica dita especializada, a qual termina por influenciar o público em geral, conseguindo conferir alguns minutos de fama a essas pobres sonhadoras. O que serão delas daqui a uma década quando ficar comprovado que o estouro inicial não passou de fogo de palha? Na mesma linha de raciocínio, mas por via oposta, o que explicaria o fato de uma cantora do porte e talento de Célia, há quarenta anos na estrada, nunca ter feito de fato o sucesso merecido? Mistério…
Célia começou a se interessar pela música desde a adolescência, tendo estudado violão clássico e popular, harmonia, teoria e composição. Em 1971, lançou o seu primeiro LP, um ano depois de ter se destacado no lendário programa “Um Instante Maestro”, apresentado por Flávio Cavalcanti. De lá para cá emplacou algumas poucas músicas nas paradas, como “Onde Estão os Tamborins?' (de Pedro Caetano) e “Adeus Batucada” (de Sinval Silva) e lançou álbuns com certa regularidade. Mas de 2000 para cá vem intensificando a frequência de lançamentos, fazendo chegar ao mercado CDs de qualidade incontestável.
Mais um desses títulos aportou recentemente nas lojas através da gravadora Joia Moderna. Trata-se de “Outros Românticos”, álbum que reúne, no seleto repertório composto por dez faixas, canções gravadas por Roberto Carlos no período de 1970 a 1979 mas que não são de autoria do Rei. Com a produção assinada por Thiago Marques Luiz e os arranjos sob a responsabilidade do violonista Rovilson Pascoal e do pianista Alex Vianna, após atentas audições o projeto termina por fazer com que se chegue a duas conclusões.
A primeira delas é que realmente Roberto Carlos não se transformou no fenômeno que é por acaso. Naquela época, que se consubstanciou o apogeu criativo de sua trajetória, ele não só compôs os seus mais belos temas (ao lado do parceiro-amigo-irmão Erasmo Carlos) como também soube escolher canções bem interessantes de outros autores, as quais, via de regra, também se enraizaram na memória afetiva de toda uma geração. A segunda é que Célia realmente é uma intérprete fora-de-série. E se em trabalhos anteriores ela já demonstrou dominar “sambas e outras levadas moderninhas”, neste comprova que igualmente sabe pisar com maestria no terreno romântico. Com voz de potência inabalada e bonito timbre grave, resgata com destreza os temas apresentados, conferindo aos mesmos novas e interessantes nuances. É como se ela se apropriasse dos mesmos, injetando doses precisas de técnica e emoção, sem permitir que uma obscureça a outra.
Apenas duas das canções escolhidas são menos conhecidas: “Atitudes” (de Getúlio Côrtes) e “Se Eu Partir” (de Fred Jorge). As demais ressurgem bem interessantes, destacando-se “Jogo de Damas” (de Isolda e Milton Carlos, que ganhou ares de tango), “Quero Ver Você de Perto” (uma das mais bonitas criações de Benito di Paula) e “Uma Palavra Amiga” (outra de Getúlio Côrtes). Célia mostra toda a amargura de um amor desfeito (em “Abandono”, de Ivor Lancellotti), se entrega à esperança do retorno da pessoa amada (em “Vivendo por Viver”, de Márcio Greick e Cobel) e denota a resignação pelas emoções vividas (em “Nosso Amor”, de Mauro Motta e Eduardo Ribeiro). Completam o set list as delicadas “Preciso lhe Encontrar” (de Demétrius) e “Sonho Lindo” (de Maurício Duboc e Carlos Colla). Em tempo: o projeto ganhou uma faixa bônus virtual, vez que a cantora disponibilizou em seu site oficial (www.celiacantora.com.br) para audição e download a canção “Amigos, Amigos”, outra parceria de Isolda e Milton Carlos.
Trata-se de um lançamento muito legal que merece ser conhecido por todos os verdadeiros amantes da música popular brasileira. Corra e ouça!
N O V I D A D E S
* Qinho é nome que vem devagarzinho ganhando força entre os artistas da cena indie nacional. Bom cantor e compositor inspirado, ele acaba de lançar seu novo álbum. Intitulado “O Tempo Soa” e produzido por Bernardo Palmeira e Fábio Lima, o CD é composto por dez faixas, nove delas de autoria do próprio artista. A exceção é a releitura de “Morena”, tema da lavra de Gonzaguinha que ganha o auxílio luxuoso de Elba Ramalho nos vocais. Outras participações especiais ficam a cargo de Amora Pêra (em “Irmã Forte”), Mart’nália (em “Segredinho”) e Botika (em “Coração Gigante”). Vale a pena conferir!
* Já se encontra em estúdio registrando as canções que farão parte de seu terceiro CD (que tem o lançamento previsto para o primeiro semestre deste ano) a cantora Ana Cañas.
* O cantor e compositor Pipo Pegoraro lançou recentemente o CD intitulado “Táxi Ímã”. Produzido por ele ao lado de Bruno Morais, o trabalho apresenta dez faixas autorais que mostram um artista que tem muito a dizer. A ficha técnica contempla a presença de grandes músicos, a exemplo de Kiko Dinucci (viola), Guilherme Kastrup (percussão) e Henrique Araújo (bandolim). Entre bom tema instrumental presente no repertório (“Graveto”), a cantora Luisa Maita comparece como convidada especial na faixa “Samambaia”. Além da faixa-título, os destaques do disco ficam por conta das canções “Hoje”, “Arapuê” e “Radinho”.
* O sexto CD da cantora Paula Fernandes, que chegará às lojas ainda neste primeiro semestre, já começa a ser formatado. A ideia da gravadora Universal é orquestrar um encontro musical dela com o cantor espanhol Alejandro Sanz.
* “Veraneio” é o título do novo CD do grupo olindense Eddie, surgido nos anos noventa em meio ao Mangue Beat e composto por Fábio Trummer (guitarra e voz), Urêa (percussão e voz), Andret (trompetes, teclados e samplers), Kiko (bateria) e Rob (baixo). A produção ficou a cargo do experiente BiD que soube conferir novas nuances ao som pop da galera que conta, neste trabalho, com as participações de Junio Barreto (em “Tanta Coisa na Vida”) e Karina Buhr (em “Delírios Espaciais”). Já Otto surge como convidado especial na faixa “O Saldo da Glória”, um dos destaques do repertório que alberga nove faixas. Outros bons momentos ficam por conta de “Parque de Diversões” e “Casa de Marimbondo”.
* Sob a produção de Clemente Magalhães chegará às lojas em março, através da gravadora Universal, “Me Conta uma Música”, o primeiro CD de Daniel Chaudon, cantor brasiliense projetado na terceira edição do programinha “Fama”, realizado pela Rede Globo em 2004. O álbum contará com as participações especiais de Maria Gadú e Mart'nália.
* A cantora Graça Cunha põe no mercado seu novo CD intitulado “Tiro de Letra”. O trabalho tem arranjos e direção musical assinados pelo violonista Dino Barioni e é composto por treze faixas criadas por bons compositores ainda pouco conhecidos, a exemplo de Vinicius Calderoni, Fabio Cadore e Tô Bradileone. Graça canta com afinação e segurança e sabe segurar contornos melódicos complexos. Do repertório que prioriza o samba (ainda que não o convencional) merecem destaque as faixas “Falso Amor” (de Jair Oliveira), “Os Livros” (de Alexandre Leão e Manuca Almeida) e “Bangulê por Beleléu” (de Rafael Altério e Rita Altério).
* Rhaíssa Bittar estreia muito bem no mercado fonográfico com o CD intitulado “Voilá” que traz a assinatura de Daniel Galli na produção. Intérprete de personalidade, ela apresenta um repertório de treze faixas nas quais predominam o bom-humor e a criatividade. Se é verdade que o disco perde um pouco o pique na sua segunda metade, também o é que revela o supracitado Galli como um compositor inspirado já que são de autoria dele doze das canções apresentadas, algumas em parceria com a própria Rhaíssa, Filipe Trielli e Maurício Pereira (este, aliás, comparece como convidado especial na faixa “Boneca de Palha”). Entre os melhores momentos, além da canção-título, estão “Pa Ri”, “Pif-Paf” e “Entre Outras Coisas”.
* A gravadora Warner Music reeditou recentemente os três álbuns gravados pela cantora e compositora Zélia Duncan, os quais foram lançados originalmente em 1994, 1996 e 1998 (“Zélia Duncan”, “Intimidade” e “Acesso”), além do DVD “Ensaio” que exibe a entrevista concedida pela artista em 1997 para um programa homônimo da TV Cultura.
* A loja de CDs Passadisco, sediada em Recife (PE), é um verdadeiro oásis no que se refere a música brasileira de qualidade e, como tal, acaba de concretizar mais uma grande ideia: lançou recentemente a coletânea “Pernambuco Frevando para o Mundo”, composta por dois volumes, os quais traçam, como o próprio título já diz, um vasto painel do mais conhecido ritmo pernambucano, o frevo. Estão lá ótimos fonogramas nas vozes de diversos artistas, dentre os quais Alceu Valença, Geraldo Azevedo, Elba Ramalho, Lenine, Claudionor Germano, Ortinho, Quinteto Violado, Maciel Melo e Spok Frevo Orquestra. Imperdível!
RUBENS LISBOA é compositor e cantor
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