R E S E N H A
Cantora: MARIA BETHÂNIA
CD: “OÁSIS DE BETHÂNIA”
Gravadora: BISCOITO FINO
(Fotos: Divulgação) |
A cantora Maria Bethânia atingiu um patamar tal que dela não é justo que se cobre mais coisa alguma. Não que não tenha muito ainda a dar à nossa música popular brasileira, mas é que ela é, sem sombra de dúvida, a artista brasileira que, nas últimas décadas, mais tem lançado trabalhos de incontestável qualidade.
Quando surgiu, na década de sessenta, vinda do recôncavo baiano para substituir Nara Leão em famoso espetáculo musical, era ainda uma intérprete com arestas a serem aparadas. O tempo foi o seu mais aliado cúmplice e hoje Bethânia encontra-se no ápice de sua forma vocal. Os anos setenta a consolidaram como a maior vendedora de discos do Brasil ao lado de Roberto Carlos e com ela somente concorriam Elis Regina e Gal Costa. E se a primeira passou para o andar de cima de forma precoce, a segunda, entre derrapadas e ousadias estilísticas, tem se mostrado um tanto cansada. Já Bethânia soube preencher todos os espaços que o destino lhe deixou abertos e, em meio a várias outras cantoras que surgiram aos borbotões no cenário musical durante todos esses anos, sempre conseguiu se destacar, mantendo lugar de destaque.
Acaba de chegar às lojas o seu quinquagésimo CD, um número que, por si só, já denota o quanto sua carreira tem sido profícua. Lançado pela Biscoito Fino, gravadora na qual encontrou espaço para concretizar projetos os mais variados (geralmente emoldurados por conceitos específicos), e intitulado “Oásis de Bethânia”, o novo álbum traz, no seleto repertório, apenas dez faixas.
Alguns podem situá-lo como um disco de transição. Outros, os mais desatentos, vislumbram talvez como ‘mais do mesmo’. Na verdade, trata-se de um trabalho diferencial dentro de uma trajetória vitoriosa. É verdade que, já há alguns anos, Bethânia vem alternando discos gravados em estúdio com registros ao vivo, ancorada nos arranjos delicados e inteligentes do experiente violonista Jaime Alem. Desta vez, no entanto, ela preferiu dividir a “criação geral” (é este o termo que pareceu o mais apropriado à Abelha Rainha) com o baixista Jorge Helder, o qual entendeu rapidamente o que Bethânia queria: um som nu, minimalista, em que pudesse compartilhar sua voz bela e grave com pouquíssimos instrumentos.
E assim se fez! O que poderia resultar monocórdio ganha vida faixa a faixa por conta do arrebatador talento dessa intérprete única e dos instrumentistas de rara sensibilidade. É o caso da faixa de abertura, uma oportuníssima releitura de “Lágrima”, de Cândido das Neves, sucesso de Orlando Silva, na qual a diva se faz acompanhada tão somente pelo bandolim de Hamilton de Holanda. É preciso certo grau de sensibilidade para mergulhar profundo numa viagem assim, ainda mais em dias de tantos temas descartáveis, por isso não é demais afirmar que se faz necessário certo tempo de maturação para que se depreendam todas as sutis e reais intenções desse recém-lançado disco.
Já anunciando o seu próximo vigoroso projeto musical (Bethânia gravará ainda este ano oito CDs com o melhor do cancioneiro de Chico Buarque), ela termina por conferir novas tintas ao nostálgico “O Velho Francisco”, iluminada pela batida do violão característico de Lenine e com direito a citação da folclórica “Lenda Viva”. De seu mais recente xodó, o conterrâneo Roque Ferreira, ela pinçou três canções (todas, a princípio, fora do universo característico do compositor, mais conhecido por conta de suas alegres chulas e buliçosos sambas-de-roda). São elas: a cinematográfica “Casablanca” (que traz como destaque o sax de Marcelo Martins), a envolvente “Fado” (único momento do trabalho em que se faz presente o supracitado Jaime Alem) e a inspiradíssima “Barulho” (com o acompanhamento do magistral piano de Vítor Gonçalves), um dos destaques do set list apresentado, ao lado da balada (quase bolero) inédita “Vive” que ela ganhou de presente de Djavan (que a acompanha ao violão) e da regravação do samba-canção “Calúnia”, de Marino Pinto e Paulo Soledade, pérola que se tornou conhecida na voz de Dalva de Oliveira.
Bethânia ainda se arrisca como autora do texto que surge entremeado a “Carta de Amor” (de Paulo César Pinheiro), faixa na qual ela evoca deuses e orixás para mandar recados e expor mágoas, e se apropria de “Calmaria”, canção da lavra do sobrinho Jota Velloso, para apresentá-la somente ao som de berimbaus (executados pelos percussionistas Marco Lobo e Marcelo Costa) com inserção do texto “Não Sei Quantas Almas Tenho” (de Fernando Pessoa). Fechando o CD em clima camerístico, ela se entrega aos versos de “Salmo”, parceria de Rafael Rabelo com Paulo César Pinheiro, música que ganha o adequado tratamento sonoro de André Mehmari com seu primoroso piano.
Enfim, é mais um disco em que Maria Bethânia se mostra inteira. Trata-se, na verdade, de um trabalho diferencial dentro de sua vasta discografia, mas que já se consubstancia como um de seus títulos mais interessantes. Realmente talhado para quem gosta de música de qualidade. Corra e ouça!
N O V I D A D E S
Letícia Scarpa |
* Letícia Scarpa lançou, no apagar das luzes do ano passado, o seu primeiro CD. Intitulado “Lê”, o álbum comprova a versatilidade da artista que também é atriz e apresentadora. Dona de voz agradabilíssima, ela assina (sozinha ou lado de parceiros) onze das doze canções que fazem parte do repertório e também se faz responsável pela produção ao lado do violonista Edu Maranhão. Entre os melhores momentos estão as faixas “Zumbaiá”, “Balão” e “Toma Lá Dá Cá”. Vale a pena conferir!
* Arlindo Cruz anuncia para breve o lançamento do terceiro DVD de sua carreira, o qual deverá ser registrado durante apresentação que se realizará na Bahia com a participação de diversos convidados.
* Sempre atuante, Carlinhos Brown lançará este ano dois novos trabalhos. Um deles é o registro ao vivo do show relativo à turnê “Romântico Ambiente” e o outro já está sendo gravado em estúdio com repertório basicamente autoral e deverá se intitular “Mixturação”. Quem viver, ouvirá!
* “Veia Mestiça” é o titulo do segundo CD da cantora e compositora carioca Telma Tavares que acaba de ser lançado de maneira independente com arranjos a cargo do pianista Leandro Braga. O trabalho conta com as participações especiais de Alcione e Leci Brandão. Sete das doze faixas que compõem o repertório são frutos de parcerias entre Telma e Roque Ferreira, o qual também surge como convidado. Bem legal!
* Chegará às lojas ainda neste primeiro semestre dentro da série “Acústico MTV” o novo projeto de Arnaldo Antunes. Produzido por Liminha e registrado ao vivo durante apresentação realizada em dezembro do ano passado em São Paulo, o CD (que será também disponibilizado no formato DVD) contará com as participações especiais de Moreno Veloso, Guizado e Nina Becker e trará, no repertório, duas canções inéditas.
* Os aficcionados por música instrumental não podem deixar de conhecer o CD intitulado “Guitarra Brasil Universo”, lançado pelo violonista Mário Conde. Em dez faixas autorais, o talento do músico se faz mais do que comprovado. Há as participações especialíssimas de Hermeto Pascoal (percussão em “Hermetizando”), Raul de Souza (trombone em “De Raul pra Donato”) e Ithamara Koorax (voz em “O Amor”). E em alguns momentos surgem ainda os vocais preciosos de Izabel Padovani e Rogéria Holtz abrilhantando o interessante trabalho.
* Impulsionada pela participação na faixa “Memória do Prazer”, registrada originalmente no CD “D.N.A.” lançado em 2010 por Jorge Vercillo e que fez parte da trilha sonora da telenovela global “Fina Estampa”, a cantora paranaense Ninah Jô estará lançando em breve o seu primeiro álbum, o qual contará com as participações especiais do violoncelista Jaques Morelenbaum e do mesmo Vercillo, seu padrinho musical. O repertório contempla regravações de temas de Milton Nascimento, Vital Lima, Sérgio Sampaio, Guilherme Arantes e João Bosco, mas há algumas canções inéditas, como “Caminhos de Mim” (de Dudu Falcão) e “Mãe de Menina” (de Fátima Guedes em parceria com Vercillo).
* “Não Tente Compreender” é o título do novo CD de Mart’nália, o qual estará disponível até o final deste mês com distribuição a cargo da gravadora Biscoito Fino. Produzido por Djavan, esse novo e aguardado álbum trará, no seu eclético repertório, músicas inéditas assinadas, entre outros, por Gilberto Gil, Caetano Veloso, Nando Reis e Ivan Lins, além da regravação de “Vai Saber”, samba composto por Adriana Calcanhotto especialmente para a filha mais famosa de Martinho da Vila, mas que terminou sendo gravado primeiramente por Marisa Monte (em 2006).
* Chegará às lojas no próximo mês o primeiro DVD póstumo da cantora Maysa. A iniciativa da gravadora Warner conterá as doze canções interpretadas pela artista romântica em 1975 durante a gravação do programa “Estudos”, dirigido por Antonio Abujamra e exibido à época pela TV Cultura.
* E a banda sergipana Maria Scombona chega ao terceiro CD. Composto por Henrique Teles (composições e vocal), Saulo Ferreira (guitarra), Robson Souza (baixo) e Rafael Jr. (bateria), o grupo apresenta um trabalho inteiramente inédito e autoral (o que, por si só, já merece os elogios de estilo), o qual se faz composto por uma dúzia de faixas. Intitulado “Um Nu” e gravado aqui em Aracaju ao longo de dois anos, o álbum (também disponível no formato vinil) mostra a fase de maturação em que os rapazes se encontram, fazendo um som redondo e agradável. Entre os melhores momentos estão as faixas “Rosalina Amanheceu no Mercado”, “Canção de Dragão” e “Samba da Aflição”. O ótimo Thiago Ribeiro surge como convidado especial na faixa “Mundo Interior”.
RUBENS LISBOA é compositor e cantor
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