R E S E N H A 1
Cantora: MARLENE
CD: “TE PEGO PELA PALAVRA”
Gravadora: EMI
Em comemoração aos (quase) noventa anos de vida e setenta de carreira da cantora Marlene, a gravadora EMI está trazendo de volta ao catálogo, pela primeira vez no formato CD, o clássico registro do espetáculo musical “Te Pego pela Palavra”, lançado originalmente em vinil no já distante ano de 1974. Com apresentação escrita pelo pesquisador musical Rodrigo Faour, trata-se de uma excelente oportunidade para que as gerações mais novas possam conhecer uma das maiores intérpretes da nossa música popular brasileira de todos os tempos.
Marlene começou a cantar aos treze anos no programa “Hora do Estudante”, na Rádio Bandeirantes de São Paulo, e estreou profissionalmente três anos depois na Rádio Tupi, passando a adotar o nome artístico Marlene (ela nasceu Victória Bonaiutti di Martino, passando a assinar Victória Delfino dos Santos quando se casou com o ator Luís Delfino) por influência da fama mundial da atriz Marlene Dietrich. Ao se mudar para o Rio de Janeiro, começou a trabalhar no Cassino da Urca, sendo, em seguida, contratada pelas Rádios Mayrink Veiga e Globo. O pico do sucesso, contudo, aconteceu quando de sua ida para a Rádio Nacional em 1948. Ali, no ano seguinte, foi eleita Rainha do Rádio, título mantido em 1950 e que terminou por gerar a eterna disputa entre o seu fã-clube e o da cantora Emilinha Borba.
Durante sua longa carreira, Marlene lançou alguns discos e participou de diversos filmes e peças, atuando, inclusive, como atriz. E em 1959 se tornou a primeira brasileira a se apresentar no Teatro Olympia de Paris, atendendo a convite da cantora francesa Edith Piaf. Entre os maiores sucessos por ela gravados estão as canções "Lata D'Água", "Zé Marmita" (ambas de Luís Antônio e Brasinha), "Qui Nem Jiló" (de Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira), "Apito no Samba" (de Luís Bandeira e Luís Antônio) e "Mora na Filosofia" (de Monsueto e Arnaldo Passos).
Visceral de corpo e alma, quando da realização do “Te Pego pela Palavra” Marlene encontrava-se no seu apogeu vocal e cênico, realizando, sob a direção de Hermínio Bello de Carvalho, um trabalho primoroso que serve de verdadeira aula a todos os que cantam ou anseiam por cantar. Encadeando uma canção atrás da outra (formato pouco usual à época) e ancorada por bons arranjos criados por Arthur Verocai, ela foi talvez a primeira cantora brasileira a se mostrar intérprete no esplendor da palavra. Fez escola para muitas que lhe seguiram e até há bem pouco tempo ainda estava na ativa.
O repertório do show ora em desenho é primoroso e traz canções de compositores à época iniciantes, como é o caso de João Bosco (que acabava de ser descoberto por Elis Regina – a Pimentinha, aliás, sempre declarou ser fã de Marlene) com “Dois Pra Lá, Dois Pra Cá”, “Cabaré”, “Resistindo”, “O Chefão” e “Beguine Dodói”, e de Gonzaguinha com “Galope”, “O Trem” e “Meu Coração É um Pandeiro”. Marlene arrasa do começo ao fim, mas momentos como “Canção do Medo” (de Toquinho e Gianfrancesco Guarnieri), “Debaixo do Sol” (de Eduardo Souto e Geraldo Carneiro) e a citada “Galope” se tornaram antológicos. E com a mesma desenvoltura que exibe emoção à flor da pele em “Ronda” (clássico de Paulo Vanzolini que, anos depois, viria a se tornar hit na voz de Maria Bethânia), ela se entrega à gaiatice do samba de breque em “Na Subida do Morro” (de Moreira da Silva e Ribeiro Cunha).
Entre os compositores selecionados há ainda, entre outros, Taiguara (“Primeira Bateria”), Manezinho Araújo (“Pra Onde Vai, Valente?”, esta faixa com Sivuca em participação especial no acordeão), Vital Lima (“Rock'n roll”), Milton Nascimento (“Ponta de Areia”, parceria com Fernando Brant), Zé Rodrix (“Roupa Prateada”) e Cartola (“Catedral do Inferno”, feita com o supramencionado Hermínio).
Como se pode depreender, numa época em que a MPB era, de fato, bastante segmentada (cantora de samba, cantora de bolero, cantora de bossa-nova, etc.), Marlene fez do ecletismo o seu maior trunfo. Isso, aliado ao incomensurável talento inato, resultou num registro que está entre os mais importantes do cancioneiro nacional. Realmente imperdível!
R E S E N H A 2
Cantoras: SIMONE GUIMARÃES e CRISTINA SARAIVA
CD: “CHÃO DE AQUARELA”
Selo: TIÊ
As cantoras e compositoras Simone Guimarães e Cristina Saraiva já possuem algum tempo de estrada. Simone vem desenvolvendo uma carreira coerente desde que, em 1996, lançou o seu primeiro disco. Nascida em Santa Rosa de Virtebo, interior de São Paulo na fronteira com Minas Gerais, possui um estilo de compor bastante pessoal, variando do regional ao erudito, da seresta à bossa nova. Como cantora, sua bela voz forte e de timbre grave logo conquistou admiradores mais exigentes, como é o caso de Milton Nascimento, um seu fã de primeira hora. A carioca Cristina, por sua vez, trabalha com Simone desde o início da carreira dela. Letrista inspirada, vez por outra se arrisca soltando a voz, mas prefere ouvir os seus versos vivificados através de grandes intérpretes.
Juntas, as duas acabam de pôr no mercado, através do selo Tiê, o CD intitulado “Chão de Aquarela”, o qual foi idealizado para celebrar os quinze anos de parceria entre elas. Produzido por Cristina e com a direção musical a cargo das duas artistas ao lado de Mario Gil, trata-se de um belo trabalho com ares interioranos. O repertório é composto por uma dúzia de faixas, algumas inéditas, mas todas resultantes da interação entre as duas, e a sonoridade brejeira adotada termina por remeter o ouvinte a um Brasil sertanejo mais puro e sensível onde se ouvem violões, violas, violinos e acordeões.
Enquanto Cristina, na parte vocal do recém-lançado trabalho, se restringe a algumas interseções em terça, a voz quente de Simone toma a linha de frente do projeto e se adequa com perfeição tanto a temas de vertente nitidamente rural, como é o caso de “Ê Saudade”, “Estrela do Meu Querer” e “Um Canto de Amor” (este um dos pontos altos do álbum) quanto a músicas de tessitura mais complexa (armadilha certeira para intérpretes menos experientes, o que definitivamente não é o caso), a exemplo da bela “Estrela da Noite” (que conta com a participação especial de Renato Braz), “Fronteira” (em que se destacam a flauta e o cello executados por maestria por Ocelo Mendonça) e “Canção para um Pianista 2” (adornada com primoroso arranjo criado por André Mehmari). Outros destaques do repertório ficam por conta das interessantes “Na Trilha do Amor” e “Desafios”.
Um CD simples e refinado ao mesmo tempo (é, os opostos, na arte, podem coabitar, sim!) feito para ser ouvido com atenção, de preferência muito bem acompanhado e numa noite onde a Lua e as estrelas estejam se enamorando. Para quem gosta de música regional de qualidade, só resta correr e ouvir!
N O V I D A D E S
* “Amazônia” é o título do novo CD que Mário Adnet lançará em breve através da gravadora Biscoito Fino e que condensará, no seleto repertório, canções da lavra de João Donato, Tom Jobim e Guinga. As cantoras Roberta Sá e Mônica Salmaso serão as convidadas especiais das faixas “A Rã” e “Borzeguim”, respectivamente.
* “Minha Sina” é o título da faixa que Milton Nascimento gravou como convidado especial da banda mineira Scarcéus e que fará parte de um DVD que será lançado ainda este ano.
* Em julho, estará chegando às lojas o novo CD da banda Cascadura, lenda do rock baiano. Composto por vinte e duas faixas, todas de autoria de Fábio Cascadura, e intitulado “Aleluia”, o álbum foi produzido por André T e traz as participações de Nando Reis, Siba, Móveis Coloniais de Acaju, Ronei Jorge e Pitty.
* Aproveitando a onda do retorno aos palcos dos Los Hermanos e sob o pretexto de comemorar os quinze anos de sua formação, já se encontra disponível no mercado uma caixa contendo, em vinil, os cinco álbuns lançados pelo grupo durante sua vitoriosa trajetória.
* Com uma carreira consolidada no Japão, a cantora Joyce Moreno, que nem bem lançou no exterior o álbum “Rio de Janeiro”, já se encontra em fase de finalização de mais um trabalho: trata-se do CD intitulado “Tudo”, o qual contará com a participação especial de Zé Renato na faixa “Dor de Amor É Água”, parceria da artista com Paulo César Pinheiro. Joyce assina sozinha oito das 13 músicas do repertório.
* Para marcar as comemorações dos trinta anos de carreira da banda, a gravadora Warner está relançando, em embalagem luxuosa, o disco “Cabeça Dinossauro”, lançado pelos Titãs em 1986. O projeto vem com dois CDs, um deles o original e o outro a demo tape contendo as versões embrionárias das músicas. O projeto traz como chamariz a inclusão de uma canção inédita (“Vai pra Rua”, de Arnaldo Antunes e Paulo Miklos). Estão lá temas que marcaram época, tais como “AA UU”, “Polícia”, “Bichos Escrotos”, “Homem Primata” e “O Que”.
* Já se encontra em estúdio registrando as canções que farão parte de seu próximo CD a cantora Elba Ramalho. No repertório, estarão temas de autoria de Gonzaguinha, Vander Lee e Monique Kessous, entre outros. A talentosa paraibana pretende lançar esse novo trabalho no começo do segundo semestre, adiando, assim, por tempo indeterminado, sua ideia de gravar um disco com releituras de músicas de Chico Buarque.
* E por falar em Monique Kessous, ela, que ainda continua caitituando o seu último bom CD (o qual foi lançado em 2010), já começa os trabalhos de pré-produção do quarto álbum de carreira que tem garantida, no repertorio, a inclusão de uma canção inédita de Moska intitulada “Por Causa do seu Pensamento”. Quem viver, ouvirá!
RUBENS LISBOA é compositor e cantor
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