R E S E N H A
Cantora: ANNA BELLO
CD: “LÁGRIMAS E RIMAS”
Gravadora: INDEPENDENTE
Entre os ritmos característicos do nosso país, o choro (ou chorinho) é um dos que menos vem tendo o devido reconhecimento ao longo dos anos. E se é fato que, até meados do século passado, nomes como Pixinguinha, Jacob do Bandolim e Carmen Miranda ajudaram a propagá-lo, também o é que ele vem sendo relegado a um injusto segundo plano de uns tempos pra cá. Ademilde Fonseca, uma das mais representativas intérpretes do nosso choro, infelizmente saiu de cena este ano e Baby Consuelo (hoje, Baby do Brasil), que parecia ser uma herdeira natural, resolveu optar por uma carreira evangélica.
Assim, é com grande satisfação que se viu recentemente chegar ao mercado o CD intitulado “Lágrimas e Rimas”, uma produção independente capitaneada por Edu Krieger que vem a ser o primeiro CD da cantora e atriz carioca Anna Bello. O repertório desse muito bem-vindo álbum é totalmente dedicado ao choro cantado. Fã assumida de Ademilde, conhecida nacionalmente como a Rainha do Chorinho, Anna a conheceu pessoalmente na cerimônia de premiação da Medalha Pedro Ernesto no Museu da Imagem e do Som, no Rio de Janeiro, em 1999, e desde então manteve o desejo de debutar no mercado fonográfico com esse trabalho temático.
Isso assim aconteceu e com a possibilidade de ela reunir canções já bastante conhecidas e outras inéditas. No primeiro caso, se enquadram “Cachorro Vira-Lata” (de Alberto Ribeiro) e “Diamante Verdadeiro” (de Caetano Veloso), por exemplo. No segundo, encontram-se “Orla de Plutão” (de Marcelo Caldi e Camila Costa) e “O Bravo e a Formosa” (do já citado Krieger) na qual se destaca o violino mágico de Nicolas Krassik. Aliás, a ficha técnica é um caso de felicidade à parte: Alexandre Caldi nos sopros, Rogério Caetano no violão 7 cordas, Carlos Cesar Mota na percussão e Luis Barcelos no bandolim e cavaquinho, além da participação especial de Moraes Moreira no violão do delicado “Choro Novo”, uma criação sua em parceira com Armandinho. No entanto, o destaque maior do projeto fica mesmo por conta de presença de Ademilde Fonseca, em sua derradeira gravação aos 91 anos, dividindo os vocais com Anna no forrozeiro “Arrasta-Pé” (de Waldir de Azevedo e Klecius Caldas), música que, apesar de fazer parte do repertório da veterana, permanecia inédita em CD. E há também uma faixa bônus multimídia, alocada no final do álbum, na qual Ademilde registrou um depoimento, contando sua trajetória no choro.
Quanto a Anna, ela canta bonito e soa leve e graciosa, características imprescindíveis ao gênero musical escolhido. Dona de especial timbre agudo e límpido, possui emissão perfeita e divisão rítmica precisa. Afinada, é nítida sua técnica, o que não esmaece a emoção impregnada a cada nota musical.
Dentre os momentos mais interessantes de um set list que é todo ele um primor, destacam-se “Um Chorinho” (tema seminal de Chico Buarque), “Viração” (sofrida canção de Zé Paulo Becker e Roque Ferreira), “Injuriado” (uma das mais inspiradas criações de Eduardo Dussek) e “Santo Amaro” (bonita parceria entre Franklin da Flauta, Luiz Claudio Ramos e Aldir Blanc).
Enfim, um CD bacanérrimo que resgata o chorinho em um momento mais que apropriado. Corra e ouça!
N O V I D A D E S
* Composto por apenas nove faixas, o novo e homônimo CD da cantora e compositora carioca Anna Ratto está chegando às lojas através da gravadora Bolacha Discos sob a direção musical de Rodrigo Vidal. Anna é da geração atual de artistas da cena indie nacional que batalha por um lugar ao Sol e vem de dois discos muito interessantes. Cantora correta, dona de voz afinada e delicada, ela ainda não foi descoberta por um público maior como o seu talento justifica. O álbum recém-lançado (o terceiro de sua discografia oficial) é recheado de composições próprias (são seis ao todo) e delas merecem uma atenção especial o reggae “Penumbra”, a delicada “Nem Sequer Dormi” e a pop “Seja Lá Como For”. O repertório se faz completado por uma boa canção inédita de Dani Black (“Pensando Bem”) e por duas regravações de autoria de Tom Zé: o samba-tango “Se o Caso É Chorar”, parceria com Perna (adornada com o acordeão de Marcelo Caldi), e a interessante “Frevo (Pecadinho)”, feita com Tuzé de Abreu (canção que foi recentemente também revisitada pela baiana Marcia Castro). Trata-se de um trabalho que merece ser conhecido, assim como Anna Ratto, um nome a ser memorizado porque certamente ainda vai dar muito que falar!
* A gravadora Universal reuniu vários fonogramas dispersos de artistas interpretando canções de Luiz Gonzaga e os reuniu na coletânea dupla intitulada “Olha pro Céu”. É mais um projeto com vistas a homenagear o centenário de nascimento do Rei do Baião. Estão lá, entre outros, Caetano Veloso, Maria Bethânia, Gilberto Gil, Gal Costa, Amelinha, Alceu Valença, Elba Ramalho e Fafá de Belém.
* A trilha sonora do remake da telenovela global “Gabriela” já se encontra nas lojas. Trata-se de um lançamento da gravadora Som Livre resultante da compilação de dezoito fonogramas, nove deles oriundos da trilha sonora da primeira versão estrelada por Sônia Braga e levada ao ar em 1975 (ficaram de fora somente quatro canções do disco original, a saber: “Doces Olheiras” com João Bosco, “Adeus” com Walker, “Horas” com o Quarteto em Cy e “Quero Ver Subir, Quero Ver Descer” com Walter Queiroz). Na outra metade, quatro foram gravados especialmente para o atual projeto (“Me Leva Embora” com Ivete Sangalo, “A Morena” com Mu Chebabi e Luiza Casé, “Aura de Glória” com João Bosco e “Lindinalva” com a banda Babado Novo) e os restantes arregimentados de gravações anteriores de Elba Ramalho (“Lamento Sertanejo”), Caetano Veloso (“Você Não me Ensinou a te Esquecer”), Tom Jobim (“Tema de Amor de Gabriela”), Mart’nália (“Depois Cura”) e Nana Caymmi (o magistral registro de “Flor da Noite”).
* Preta Gil está lançando o seu quarto CD (se incluído o registro ao vivo do show “Noite Preta”). Intitulado “Sou Como Sou’, é uma produção independente capitaneada por Fábio Lessa e Ronnieri Oliveira. Como a própria artista acentua no texto constante do encarte, realmente ela cresceu enquanto cantora, mostrando-se mais segura. O que a complica é a seleção do repertório que se revela ainda bastante irregular. Preta grava temas criados para ela especialmente pelo filho, Francisco Gil (“Mulher Brasileira”) e pelo pai, Gilberto Gil (“Praga”). Gil, aliás, se faz presente pela primeira vez em um trabalho da filha e com uma inédita muito bonita que ela quase chega a desperdiçar (dá para acreditar que a segunda parte da melodia, a mais forte, só é cantada uma vez?). Mesmo assim, transforma-se no momento maior do CD ao lado da faixa-título, uma interessante canção de autoria de Alex Góes. Ana Carolina, como de costume, presenteia Preta com uma nova música: desta vez é “Batom”, parceria com Chiara Civello e Diana Tejera, mas que não chega sequer a roçar a força de “Sinais de Fogo”, primeiro sucesso de Preta feita por Ana e Antonio Villeroy.
* E chega às lojas mais um registro ao vivo na razoavelmente curta carreira do sambista Diogo Nogueira. Trata-se do projeto “Ao Vivo em Cuba”, disponível nos formatos CD e DVD, que acaba de ser lançado pela gravadora EMI. Produzido pelo próprio artista ao lado de Afonso Carvalho, foi gravado durante apresentação realizada no Teatro Karl Marx, em Havana, em novembro do ano passado, e na realidade é um apanhado de diversos sambas que fizeram grande sucesso, aqui no Brasil, nas vozes de outros intérpretes. As versões apresentadas por Diogo pouco acrescentam a temas como “Verdade Chinesa”, “Madalena”, “Tanta Saudade”, “É” e "Portela na Avenida”, que, por exemplo, já receberam tratamento sonoro mais vigoroso nas vozes de Emílio Santiago, Elis Regina, Djavan, Gonzaguinha e Clara Nunes, respectivamente. O DVD traz duas faixas a mais que as quatorze integrantes do CD: “Sou Eu” e “Homenagem ao Malandro”, ambas de autoria de Chico Buarque (a primeira uma parceria com Ivan Lins). O grupo cubano Los Van Van surge em participação especial na canção “El Quarto de Tula”.
* Mônica Salmaso é cantora tão correta que se torna até difícil encontrar diferenças entre uma gravação sua de estúdio e outra ao vivo. É o que ocorre com o lançamento do CD “Alma Lírica Brasileira’ que traz o áudio do DVD registrado em janeiro deste ano no Teatro Alfa em São Paulo e que chegará às lojas em breve. O repertório é praticamente o mesmo do álbum homônimo lançado no ano passado com a substituição apenas de quatro das quatorze faixas: no lugar de “A História de Lily Braun”, “Trem das Onze”, “Casamento de Negros” e “Veranico de Maio”, Salmaso apresenta “Ciranda Da Bailarina”, “Véspera De Natal”, “Na Minha Palhoça” e “Valsinha”. Acompanhada unicamente pelo piano de Nelson Ayres e pelos sopros de Teco Cardoso, seu marido, ela empresta a belíssima voz a grandes canções como “Melodia Sentimental”, “Mortal Loucura” e “Carnavalzinho (Meu Carnaval)”, transformando-as nos maiores destaques desse bem concedido projeto.
* A cantora Eliana Pittman fez grande sucesso tanto no Brasil quanto no exterior nas décadas de sessenta e setenta do século passado. Intérprete segura, dona de grandes recursos vocais e de um belo timbre, ela é um dos nomes escolhidos pelo pesquisador musical Rodrigo Faour para integrar a série “Super Divas”, uma compilação composta por dezesseis fonogramas reunidos entre discos de carreira e compactos avulsos. Um dos maiores sucessos da carreira de Eliana está lá, abrindo o álbum: “Das 200 Para Lá”, uma das primeiras músicas gravadas de autoria do então iniciante João Nogueira. Outro que viria a se firmar como um grande nome da nossa MPB também se faz presente: trata-se de Gonzaguinha com sua “Por um Segundo”. Versátil, a artista se arrisca em idiomas outros e registra com especial desenvoltura “Qui Nem Jiló” (de Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira) e “Favela” (de Padeirinho e Jorginho), transformando-as em dois grandes momentos ao lado de “Estrela É Lua Nova” (tema recolhido por Heitor Villa-Lobos), “Sonho de um Lugar” (de Marcos Valle e Paulo Sérgio Valle) e “Maria Joana” (de Roberto Carlos e Erasmo Carlos). Vale a pena conferir!
* Pedro Mariano, o filho do meio de Elis Regina, anuncia que o show “Elis por Eles”, realizado no começo deste mês no Teatro Positivo, em Curitiba (PR), foi devidamente registrado e será lançado, nos formatos CD e DVD, até o final deste ano. Com arranjos de Otávio de Moraes, alguns cantores homenagearam a Pimentinha ao cantar vários de seus sucessos, marcando, assim, os trinta anos de sua ausência. Entre os nomes presentes: Jair Rodrigues, Jorge Vercillo, Lenine, Seu Jorge, Moska e Filipe Catto. Músicas atemporais como “Madalena”, “Arrastão”, “Como Nossos Pais”, “O Bêbado e a Equilibrista” e “Atrás da Porta” foram selecionadas para compor o repertório do tributo. Nunca se faz pouca qualquer homenagem a Elis!
RUBENS LISBOA é compositor e cantor
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