Musiqualidade

R E S E N H A

Cantora: ANA CAROLINA
CD: “#AC”
Gravadora: SONY MUSIC

A cantora, compositora, violonista e percussionista (ela é um ás no pandeiro) Ana Carolina é natural de Juiz de Fora (MG) onde começou sua trajetória musical, cantando em barezinhos locais. Pouca gente sabe, mas três mulheres foram responsáveis pelo impulso inicial no deslanchar de sua carreira: Zezé Motta (que produziu seus primeiros espetáculos), Cássia Eller (que a hospedou em sua residência no Rio de Janeiro) e Luciana de Moraes (uma das filhas de Vinicius que resolveu apostar em seu talento). Assim, em 1999 chegou às lojas o primeiro CD, muito bem recebido pela crítica e pelo público que, curioso por saber quem era a dona da voz grave que embelezava “Garganta” (de autoria de Antonio Villeroy), canção impulsionada por integrar a trilha sonora da telenovela global “Andando nas Nuvens”, fez com que Ana despontasse rapidamente de norte a sul do Brasil. Ali já se esboçava também a compositora que tomaria nos anos seguintes a linha de frente do seu repertório, sempre recheado de temas passionais em que as letras revelam amores desencontrados e paixões ora mal resolvidas, ora com final feliz. De lá para cá, a artista vem lançando discos regularmente e engatando um sucesso após o outro, tendo conhecido o ápice em 2005 quando registrou seu vigoroso encontro com Seu Jorge.

Como cantora, embora por vezes exagere nos maneirismos vocais, é indiscutível que sua voz possui uma extensão acima da média, além de uma potência considerável. Enquanto compositora, ela tanto cria sozinha quanto já desenvolveu parcerias com vários colaboradores. Nomes de ponta da nossa MPB, a exemplo de Maria Bethânia, Mart’nália e Alcione, já a gravaram e ela vem conseguindo incluir faixas de seus trabalhos em produções da Rede Globo com uma assiduidade espantosa. Agora mesmo está no ar duplamente, embalando as emoções de personagens de “Amor à Vida” e “Flor do Caribe” com as canções “Combustível” e “Luz Acesa”, respectivamente, ambas incluídas no repertório de “#AC”, o novo CD que aportou recentemente no mercado através da gravadora Sony Music.

Composto por doze faixas autorais (mas desta vez todas divididas com parceiros) e com a produção assinada pela própria artista ao lado de Alê Siqueira, o trabalho não deve ter sua avaliação precitada por uma audição restrita às duas músicas acima destacadas. Pelo contrário, elas não estão entre as melhores criações de Ana e certamente foram incluídas nas aludidas trilhas por conta da abordagem amorosa das letras. Tampouco representam o sopro criativo de uma constatável mudança presente na maior parte do CD. É que Ana se mostra procurando sair do lugar comum, fantasma que costuma rondar os artistas após algum tempo de estrada, e isso logo se torna constatável através da audição da primeira faixa, a dançante “Pole Dance” (parceria com o carioca Edu Krieger) na qual se traçam os percalços e escolhas na vida de uma stripper.

Se por um lado os arranjos repletos de programações e scratches conferem um ar de modernidade ao trabalho, por outro é verdade que essa opção termina meio que o pasteurizando. Um ar de sensualidade se faz explicitado em várias passagens, atingindo seu pico em “Libido” (outro tema composto com Krieger), e se torna bem-vindo o resgate de “A Rita”, conhecido samba buarquiano, na faixa “Resposta da Rita” (mais outro momento dividido com Krieger) que conta com a participação especial do próprio Chico Buarque. Os outros convidados do recém-lançado projeto são Chiara Civello (voz em “Un Sueno Bajo El Agua”) e Guinga (violão em “Leveza de Valsa”).

Alguns dos destaques ficam por conta da inspirada “Pelo Iphone” (parceria com o já citado Villeroy), da bem bolada “Bang Bang 2” (feita com Rodrigo Pitta) e da quilométrica “Canção Pra Ti” (composta com Moreno Veloso e Carlos Rennó).
Certamente, este não será um dos álbuns mais executados de Ana Carolina. Ainda que seja louvável sua vontade de percorrer novos caminhos e que a cantora continue em plena forma vocal, é fato que o resultado causa certa sensação de estranhamento, especialmente para aqueles acostumados aos refrões altamente cantáveis até então característicos da obra da artista. Trata-se de um bom disco, mas que, como um bom vinho, exige ser degustado aos poucos e com uma atenção redobrada…

N O V I D A D E S

* Héloa é sergipana de Aracaju. Boa cantora e ótima compositora, também atua nos palcos como atriz. Recentemente, ela lançou de maneira independente o primeiro EP intitulado “Solta”, o qual já se encontra disponível no mercado de Sergipe, prenúncio de um CD que vem sendo maturado com muito carinho. Com influências musicais diversas que vão do samba ao pop, passando pelo forró, pelo rock e até pelo brega, o seu trabalho autoral se mostra bastante criativo e antenado com as tendências atuais. O que a diferencia da média comum é que suas canções são de fato interessantes, passando longe de experimentalismos excêntricos. Com melodias fáceis de cantar e de serem assimiladas e letras descomplicadas, porém repletas de boas tiradas, Héloa é, sem dúvida, a melhor surpresa da nossa música em muitos anos. O EP traz a participação de vários músicos da terra, dentre os quais Vinícius Bigjohn (sanfona e teclado), Allen Alencar, Pedro Yuri e Igor Gnomo (guitarras), Fabinho Oliveira, Rafael Ramos e Julico Andrade (baixo), Ravy Bezerra e Dudu Prudente (bateria) e Léo Airplane (programações). Composto por seis canções inéditas e autorais e mais três vinhetas, “Solta” surge embalado por um projeto gráfico primoroso que traz, no encarte, as letras das músicas em folhas avulsas com belas imagens refletidas em mosaicos e sombras. Entre os destaques do repertório, além da inspirada faixa-título, estão a contagiante “Sai deste Corpo” (que conta com a participação especialíssima de Andreia Dias, cantora paulista que, aos dezessete anos, fugiu de casa porque os pais, evangélicos, reprimiam sua vontade de frequentar shows de rock), o já hit “Entra na Dividida” e a deliciosa “Barquinho”. Héloa é dona de voz delicada e muito agradável e dela faz uso se apropriando inteligentemente de suas facetas de intérprete, o que só valoriza o resultado. Mas é no palco que a artista se agiganta: foi assim no recente show de lançamento quando a timidez do início da apresentação logo deu lugar à segurança e à alegria cênica que permearam quase todo o espetáculo. Lá, inclusive, além das músicas constantes dessa bem-vinda amostra inicial, ela cantou outros interessantes temas também de sua autoria, tais como “Santinha do Pau Oco”, “Príncipe Encantado” e “Menino Lindo”, os quais deverão fazer parte de seu próximo registro fonográfico. Se você ainda não conhece o trabalho de Héloa, está mais do que na hora de fazê-lo!

* A cantora e compositora Mathilda Kóvak também está a desenvolver seu talento como escritora e é nesta seara que está lançando esta semana o livro “O Urso Bipolar”. As ilustrações da obra ficaram sob a responsabilidade de Mario Bag. Vale a pena conhecer!

* Trazendo um som psicodelicamente percussivo, o grupo Zulumbi (formado por Lúcio Maia, DJ PG e MC Rodrigo Brandão) estará lançando o primeiro CD em breve. Tentando buscar elos entre o rap e os batuques afro-brasileiros, o disco vai apresentar dez músicas inéditas e trará as cantoras Anelis Assumpção e Juçara Marçal como convidadas especiais, além da rapper Yarah Bravo e dos jazzistas norte-americanos Rob Mazurek e Jason Adasiewicz.

* A trilha sonora da próxima novela global das 18 horas, “Joia Rara”, já começa a ser formatada: será composta por diversos clássicos da nossa MPB, os quais serão regravados por vários artistas especialmente para a nova produção. A música de abertura está sendo composta por Gilberto Gil e deverá ser por ele gravada, a exemplo do que aconteceu com “Cordel Encantado”.

* Sexta-feira que vem, dia 30 de agosto, completam-se quarenta e um anos que a cantora Dalva de Oliveira partiu para o andar de cima. Uma das artistas que ajudou a construir a música popular brasileira, ela foi casada com Herivelto Martins e o relacionamento conturbado dos dois serviu de inspiração para várias canções que se tornaram antológicas. Infelizmente, a estrela Dalva é atualmente tão pouco reverenciada, ela que serviu de referência para muitas das intérpretes que ainda estão na ativa. Entre os sucessos que ela colecionou ao longo da carreira e que nos deixou como herança estão as pérolas “Ave Maria no Morro”, “Errei, Sim”, “Tudo Acabado”, “Segredo”, “Kalu” e “Bandeira Branca”.

* A cantora e compositora paraibana Roberta Miranda está lançando o CD e DVD “25 Anos ao Vivo em Estúdio”, projeto composto por dezoito músicas e que chega às lojas através da gravadora Som Livre. O repertório reúne alguns dos maiores sucessos de sua trajetória, a exemplo de “São Tantas Coisas” e “Vá com Deus”, mas abre espaço para três músicas inéditas (“Lua de Angola”, “Onde Mora o Coração” e “Quem Sentiu”, esta com a participação especial de Alcione). Um dos hits do cancioneiro romântico de Roberto Carlos, a canção “Café da Manhã”, foi regravada com tintas carregadas.

* Enquanto não chega às lojas em formato físico (o que ocorrerá em breve através do selo carioca Lab 344), o segundo trabalho da cantora e percussionista Lan Lan já se encontra disponível no iTunes. Intitulado “Mi”, o projeto une a percussão da artista a batidas eletrônicas. O repertório é eminentemente autoral e traz temas inéditos como “Geminiano”, “Bananeira Song” e “Babador”. O ator João Miguel é o convidado especial da faixa “Cosme e Damião”, recitando “Seu Corpo Luminoso”, poema de sua própria autoria.

* O disco “Imyra, Tayra, Ipy” do cantor e compositor Taiguara, lançado originalmente em 1976 (e recolhido em seguida por ordem da censura então vigente à época), ganha sua primeira edição em CD no Brasil através da Sony Music. Trata-se de um trabalho formatado sobre referências indígenas, após a leitura que o artista fez de “Quarup”, famoso romance do escritor Antônio Callado. Seis das oito faixas tiveram os arranjos concebidos por Hermeto Pascoal e as regências ficaram a cargo de Wagner Tiso. O repertório é majoritariamente autoral, exceção feita a “Três Pontas” (de Milton Nascimento e Fernando Brant).

RUBENS LISBOA é compositor e cantor.
Apresenta o quadro "Musiqualidade" dentro do programa "Canta Brasil”, veiculado pela Aperipê FM todas as sextas-feiras, às 10 horas.
Quaisquer críticas e/ou sugestões a este blog serão bem-vindas e poderão ser enviadas para o e-mail: rubens@infonet.com.br

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