Musiqualidade

R E S E N H A

Cantora: NINA BECKER
CD: “MINHA DOLORES”
Gravadora: JOIA MODERNA

Uma das integrantes da Orquestra Imperial, a cantora e compositora Nina Becker já vem desenhando, há alguns anos, o desejo de se consagrar em carreira solo. Tendo lançado os gêmeos mornos “Azul” e “Vermelho” em 2010, os quais foram sucedidos pelo interessante “Gambito Budapeste”, dividido com o companheiro Marcelo Callado e que chegou ao mercado em 2012, ela mergulhou, naquele mesmo ano, a convite do Canal Brasil, na obra de Dolores Duran em um episódio específico do programa “Cantoras do Brasil”. Esse foi o pontapé para a apresentação de um show em moldes idênticos realizado no espaço Casa da Francisca, em São Paulo, o qual foi visto por um público antenado. Lá se encontrava também o DJ Zé Pedro que, admirador de Dolores, se impressionou com as apropriações que Nina fez das canções gravadas há tanto tempo atrás pela colega e, como proprietário da gravadora Joia Moderna, a convidou para perpetuar aquele momento.
Assim, chegou recentemente às lojas o CD “Minha Dolores” que, produzido pela própria artista com a colaboração de Duda Mello, se faz composto por treze faixas que foram pinçadas, a maioria delas, de lados B da obra de Dolores. Eis aí um dos grandes méritos do álbum que termina, assim, por jogar luzes sobre canções pouco batidas, porém portadoras de incontestáveis qualidades.
As exceções ficam por conta das conhecidas “Estrada do Sol” (parceria de Dolores e Tom Jobim, propagada nacionalmente por Gal Costa em 1979 através do álbum “Gal Tropical”) e “Solidão” (assinada por Dolores solitariamente e redescoberta inicialmente por Marina Lima que a registrou em desconcertante versão no seu disco de estreia, “Simples como Fogo”, também lançado em 1979). Afiada, Nina consegue imprimir novas tintas a essas duas músicas, concorrendo em beleza e inquietude com as interpretações citadas (a atmosfera lusitana ora conferida à segunda, então, é um achado e tanto!).
Cantando bonito em clima de seresta contemporânea, com voz suave e segura, Nina se faz acompanhada tão somente pelo violão de 7 cordas de Lucas Porto e pelo bandolim de Luís Barcelos e o que poderia soar monocórdio revela-se surpreendente.
Há as participações especiais de Ricardo Dias Gomes (wurlitzer em “Vou Chorar”, de Dolores e Lúcio Alves, faixa em que Nina quase que sussurra a tristeza embutida nos versos), Pedro Sá (guitarra em “Feiúra Não è Nada”, de Billy Blanco, crítica bem-humorada à ditadura da beleza) e o já citado Marcelo Callado (percussão em “Estatuto de Boate”, outra de Billy Blanco, um dos mais iluminados momentos do repertório). Entre buliçoso samba (“Marca na Parede”, de Ismel Neto e Mario Fachini) e assumido rosário desfiado (“Manias”, de Flávio Cavalcanti e Celso Cavalcanti, que também compuseram juntos a interessante “O Amor Acontece”), há a eterna constatação dos perigos de residir no morro (“Tradição”, de Ismel Silva) e dos ciúmes característicos da alma feminina (“Coisas de Mulher”, de Chico Baiano). Voz associada às desventuras do coração, Dolores sabia como poucas cantar mágoas de amor sem soar piegas. Nina vai pelo mesmo caminho e se safa com maestria das possíveis armadinlhas, conforme se pode constatar através da audição de temas mais claudicantes como “Coisa Mais Triste” e “Outono” (mais duas de Billy Blanco).
Cariocas, Nina e Dolores encontram-se separadas por mais de seis décadas de distância, mas ambas conheceram muito bem o roteiro da boemia carioca. Por isso, talvez nada mais emblemático para esboçar o traço de união entre as duas do que a bela canção “Carioca 1954” (parceria de Antonio Maria e Ismael Neto), pérola constante desse CD realmente que merece ser reverenciado, conhecido e curtido pelos amantes da música popular brasileira de qualidade!

N O V I D A D E S

* Uma verdadeira aula de samba! É assim que pode ser definido o novo CD do quinteto vocal Demônios da Garoa que acaba de chegar às lojas através da gravadora Biscoito Fino. Intitulado “Um Samba Diferente”, o álbum, que foi produzido pelos próprios integrantes do conjunto e gravado em apenas um dia, se faz composto por quatorze faixas. Delas, a única exaustivamente já conhecida é a obra-prima “Trem das Onze” (de Adoniran Barbosa), canção que se transformou em um dos carros-chefes da trajetória do Demônios, longevo grupo que surgiu em 1943, em São Paulo, com o nome inicial de Grupo do Luar e que terminou entrando, em 1994, no Livro Guiness de Recordes como o mais antigo em atividade no mundo. A atual formação traz Izael Caldeira da Silva (timba), Sergio Rosa (afoxé), Ricardo Cassimiro Rosa (percussão), Roberto Barbosa, o Canhotinho (cavaquinho) e Wilder Paraizo, o Dedé Paraíso (violão), mas os “meninos”, no recém-lançado disco, contaram com a adesão de músicos de ponta, conforme se pode constatar através da ficha técnica. Estão lá, entre outros, Edimilson Capelupi (violão 7 cordas), Carlos Eduardo Noronha Carqueijo (baixo), Marcelo Tadeu Barreria (bateria), Osvaldo Barros (cuíca) e Fernando Pinheiro (teclados). O repertório selecionado ressalta a ótima combinação das vozes e traz sambas de diversas vertentes e estilos, alinhando músicas inéditas com regravações. Entre aquelas estão “Melô do Camelô” (de Canarinho), “Bêbado Mineirinho” (de Wider Paraízo, Ricardo Cassimiro Rosa e Roberto Barbosa) e “A Lei do Morro” (de Sérgio Moraes e Jorge Duarte). Já no terreno das releituras, encontram-se a faixa-título (de Jair Gonçalves e Fernando Pires, que mistura samba e boogie woogie) e a divertida “Ferdinando” (de Roberto Barbosa). Alguns dos melhores momentos ficam por conta de “Coral de Anjos” (de Dedé do Cavaco, Prateado e Carica), “Santa Luzia” (de Wilder Paraízo e Carlos Randal), “Vai Coração” (de Alceu Maia e Sarah Benchimol) e “Mariana” (de Roberto Neves e Diogo). Muito legal!

* O primeiro DVD da cantora e compositora paulistana Céu foi gravado no final do mês de julho durante apresentação realizada no Centro Cultural Rio Verde, em São Paulo, e chegará ao mercado este ano através de uma parceria entre a gravadora Urban Jungle e o selo Slap, integrante da gravadora Som Livre.

* O samba tem servido tanto para trazer a lume temas bem-humorados quanto para propagar as dificuldades e mazelas da vida cotidiana, principalmente as relacionadas à gente dos morros e favelas nacionais. É por essa dualidade que se baseia o repertório de “Favela Brasil II – O Soldado do Samba”, o novo projeto musical de Leandro Sapucahy, o qual foi gravado ao vivo durante apresentações realizadas, em julho do ano passado, na Fundição Progresso, no Rio de Janeiro. Trata-se de um lançamento da gravadora Sony Music que comprova o talento do artista que possui todas as chances para se consolidar como um dos maiores nomes do samba. Contando com as participações especiais de Xande de Pilares e Serginho Meriti (em “Bonde Pesado”, de Serginho Meriti e Rodrigo Leite, e “Tião”, outra do próprio Meriti, agora em parceria com Rogê, respectivamente), o CD se abre unindo espertamente os clássicos “O Morro Não Tem Vez” (de Tom Jobim e Vinicius de Moraes) e “A Voz do Morro” (de Zé Kéti). Entre os melhores momentos estão indubitavelmente as faixas “Mano” (de Rosyl), “Devotos do Samba” e “De Pai para Filho” (ambas de Meriti e Rodrigo Leite, a segunda feita também com a colaboração de Diogo Nogueira). Sapucahy é intérprete sem grandes arroubos vocais, mas canta bonito e entende muito do riscado.

* “Música de Fronteira” é o título do recém-lançado CD do saxofonista carioca Leo Gandelman. Trata-se de um álbum independente que foi gravado ao lado do pianista carioca Eduardo Farias. O repertório contempla temas como “Lapinha” (de Baden Powell e Paulo César Pinheiro), “Cubanos” (de Ernesto Nazareth) e “Lamentos” (de Pixinguinha).

* A voz doce e macia da cantora e compositora Ana Larousse é o principal atrativo do independente CD intitulado “Tudo Começou Aqui”, o qual, produzido pelo violonista Rodrigo Lemos, chegou recentemente ao mercado. Composto por nove faixas autorais (compostas entre Paris, Curitiba e São Paulo) e mais “Algo Como Essa Canção” (de Leo Fressato), trata-se, segundo definição da própria artista, de um “delicado tratado sobre solidão e partidas”. A faixa de abertura, “Vai, Menina”, conta com a participação especial do citado Fressato (que também se faz presente em “Menino Maroto”), enquanto que “Teresinha” (composta em homenagem à avó) traz Uyara Torrente como convidada. Há canção criada em inglês (“Meu Momento Bang-Bang”) e tema em que a própria Ana se acompanha unicamente por um violão (“A Menina que Apagou”). No final, depois de “A Paz do Fim” (a última faixa), o ouvinte vai poder encontrar, escondida, “Valentine Et La Chanson d’Hiver”, música composta pela artista para servir de tema para um curta-metragem francês.

* A cantora Mariana de Moraes, que vem a ser uma das netas de Vinicius, está com dois CDs prontos, os quais serão lançados em breve. Um deles é “Brisamar” que aportará nas lojas pela gravadora Dubas. O outro, ainda sem título definitivo, já tem distribuição acertada com a gravadora Biscoito Fino. A artista vai eternizar registros de temas criados, entre outros, por Maysa, Batatinha, Dominguinhos, Adriana Calcanhotto, Tom Jobim, João Donato e Moacir Santos, além da cubana Margarita Lecuona. Quem viver, ouvirá!

* Já está praticamente pronto o sexto CD de Rita Benneditto. Intitulado “Encanto”, ele trará regravações e temas inéditos. Entre aquelas estão “Banho de Manjericão” (de João Nogueira e Paulo César Pinheiro), “Água” (de Djavan), “Babalu” (de Margarita Lecuona), “Fé” (de Roberto Carlos e Erasmo Carlos) e “Extra” (de Gilberto Gil). Já no tocante às que serão apresentadas pela primeira vez estão “Pedra do Tempo” (dela em parceria com Felipe Pinaud e Lancaster Lopes, os produtores do álbum), “De Mina” (de Josias Sobrinho) e “O que É Dela É Meu” (de Rogê, Marcelinho Moreira e Arlindo Cruz, este presente na faixa). Há as participações especiais do grupo carioca Reggae B e do cantor e compositor Frejat.

* E na próxima quinta-feira, dia 18, a partir das 20h30min horas, o Teatro Atheneu se abrirá para receber a cantora Raquel Delmondes que vai apresentar, cercada por afiada banda, o show oficial do lançamento de seu segundo CD. Realmente uma noite de festa para a música sergipana, o que torna o espetáculo imperdível!

RUBENS LISBOA é compositor e cantor.
Apresenta o quadro "Musiqualidade" dentro do programa "Canta Brasil”, veiculado pela Aperipê FM todas as segundas-feiras, às 10 horas.
Quaisquer críticas e/ou sugestões a este blog serão bem-vindas e poderão ser enviadas para o e-mail: rubens@infonet.com.br

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