Musiqualidade

R E S E N H A

Cantor: JUCA NOVAES
CD: “CANÇÕES DE PRIMEIRA – Vol. 1”
Gravadora: DABLIÚ DISCOS

Filho de mãe cantora de rádio, o cantor e compositor Juca Novaes aprendeu a escutar, desde cedo, a nata do cancioneiro nacional. Apaixonado por música (começou a estudar piano aos oito anos), ele participou de alguns festivais e, a partir daí, resolveu estudar violão clássico (o que o fez aprimorar seu lado autoral)  e se formar em Direito (especializando-se em direitos autorais). Paralelamente, criou a Feira Avareense de Música Popular (Fampop), em sua cidade natal (Avaré – SP), evento até hoje tido como um dos mais importantes reveladores de novos talentos no Brasil.
Depois de lançar, em 2010, o ótimo CD “Goa” (que se consequenciou em um registro ao vivo), em cujo repertório predominavam canções de sua própria autoria, Juca resolveu mostrar o seu lado intérprete e, para isso, mergulhou em canções alheias que foram consagradas no retromencionado Fampop. Assim, nasceu o conceitual álbum “Canções de Primeira – Vol. 1”, o qual chegou recentemente ao mercado através da gravadora Dabliú Discos. Sob a produção musical do violonista Sérgio Bello (também responsável pelos arranjos), o artista registrou doze canções pinçadas daquele evento e mais a inédita “Coração Afobado” (de Celso Viáfora, que entrou no roteiro porque nasceu quando o compositor foi desclassificado do festival, em 1983, e resolveu falar sobre a experiência e a necessidade de continuar escrevendo novas canções).
Juca é – frise-se – um cantor corretíssimo. Dono de timbre bastante agradável, ele, talvez por também ser compositor, entende o que cada canção quer dizer e, com isso, se transforma em intérprete adequado para temas até já bastante conhecidos, como é o caso de “Encontro das Águas” (de Jorge Vercillo e Jota Maranhão, que conta com a presença de Pedro Altério) e “Pra Você Dar o Nome” (de Tó Brandileone, recentemente propagado a nível nacional por conta de sua inclusão, na versão do seu autor, na trilha sonora da telenovela global “Em Família”).
Antenado, Juca soube reunir músicas feitas por nomes que praticamente surgiram nas edições do Fampop e que hoje já ocupam um lugar de destaque na nossa MPB com outras criadas por gente que ainda almeja um lugar no panteão dos reconhecidos. Entre estes estão Carlin de Almeida e Mauro Mendes que, juntos, compuseram a bonita “Era Você” (abrilhantada com as vozes do MPB-4) e Sérgio Misan que, ao lado de João Boamorte, deu vida a “Água e Azeite” (que traz a cantora Ceumar como convidada especial). Já quanto àqueles, há espaço para os talentos de Kleber Albuquerque (a inspirada “Logradouro”, parceria com Rafael Altério, que traz Dani Black nos vocais) e Moacyr Luz (a pulsante “O Tocador É Bom”).
O grande momento do disco, no entanto, fica indubitavelmente por conta da obra-prima “Quilombos”, música pouco conhecida de Lenine que ganha agora o seu registro definitivo. Outros destaques recaem sobre “Dindinha” (uma das melhores composições de Zeca Baleiro, em gravação que conta com a bem-vinda participação de Chico César), “Samba de uma Noite Só” (de Fernando Cavallieri) e “Belorizontem” (de Alyssinho Lima e Danilo Horta). 
Trata-se, pois, de um projeto especial muito bem concebido e concretizado, o qual, por assim ser, merece fazer parte da cedeteca de todos os amantes da nossa música brasileira de real qualidade. Corra e ouça!

N O V I D A D E S

* Formada por Tim Bernardes (voz, guitarra e piano – filho do cantor e compositor Maurício Pereira), Guilherme d’Almeida (baixo) e Victor Chaves (bateria), a banda paulistana O Terno chega ao segundo e independente CD, mostrando um rock de primeira linha. Composto por uma dúzia de faixas inéditas e de autoria de Tim (apenas “O Cinza”, um retrato direto e contundente de São Paulo, é parceria dele com Victor), o álbum leva o nome do próprio trio e foi produzido pelos três rapazes. Há uma miscelânea de influências (todas boas) na sonoridade e postura do trabalho que vai dos Mutantes até Caetano Veloso, passando por Raul Seixas e descambando em Tom Zé, artista que, aliás, surge em participação afetiva em “Medo do Medo”. As canções ganham arranjos com pulsações que trazem o ouvinte para dentro dos seus temas, os quais se mostram salutarmente plurais. Tim tem muito a dizer e sabe fazer isso com inteligência e simplicidade e, como cantor, possui lá um charme vocal bastante peculiar. Entre os destaques de um repertório de fato acima da média estão “Quando Estamos Todos Dormindo”, “Ai, Ai, Como Eu me Iludo”, “Bote ao Contrário”, “Eu Confesso” e “Desaparecido”. Merece ser conhecido!

* “Se Apaixone pela Loucura do seu Amor” é o título do terceiro CD do cantor e compositor paraense Felipe Cordeiro, efetivamente lançado no começo deste ano. Produzido a quatro mãos por Carlos Eduardo Miranda e Kassin, o álbum de sonoridade dançante traz seu repertório calcado nos ritmos da região Norte do país, ora tão em moda (uma mistura de brega, lambada, guitarrada, cumbia, zouk e outros afins). São onze faixas (duas criadas solitariamente por Cordeiro e nove compostas ao lado de parceiros como seu pai, Manoel Cordeiro, Arnaldo Antunes, Betão Aguiar, Saulo Duarte e Lia Sophia), além da regravação de “Marcianita”, versão de Fernando César para sucesso da década de sessenta do século passado. Entre os destaques estão a instrumental “Lambada Alucinada” e as graciosas “Ela É Tarja Preta”, “É Fogo”, “Alta Voltagem” e “Um Beijo”.

* O CD “Dorival Caymmi – Centenário” está chegando às lojas através da gravadora Biscoito Fino trazendo arranjos sinfônicos divididos entre Dori Caymmi e Mario Adnet. O repertório encontra-se centrado nos grandes sucessos do compositor, entre os quais “Rosa Morena”, “Nem Eu”, “Saudade da Bahia”, “Dora”, “Sábado em Copacabana”, “João Valentão” e “Marina”. Os manos Nana, Dori e Danilo Caymmi se juntam a Caetano Veloso, Chico Buarque e Gilberto Gil e prestam nova e merecida homenagem ao nosso Buda Nagô.

* O pesquisador musical Marcelo Fróes descobriu, em 1998, o registro de uma apresentação de Gal Costa com Gilberto Gil, feita em novembro de 1971 no Student Centre da City University London, na Inglaterra, quando este se encontrava auto-exilado em Londres, dando um tempo por lá devido à ditadura que assolava o Brasil. Após conseguir as autorizações necessárias e proceder aos devidos processos de adequação de som, esse encontro chegou recentemente ao mercado através do selo Discobertas. Trata-se do CD duplo intitulado “Live in London 71” (no total, são dezoito faixas) que traz, no CD 1, Gal Costa, ainda um diamante a ser lapidado, entoando belos temas como “Vapor Barato” (de Jards Macalé e Wally Salomão), “Falsa Baiana” (de Geraldo Pereira) e “Como Dois e Dois” (de Caetano Veloso, esta um dos destaques com sua versão impactante), acompanhada por vocalises de Gil (muitas vezes excessivos). Já o CD 2 mostra o baiano interpretando, ao lado de Bruce Henry (no baixo), Chiquinho Azevedo (na percussão) e Tutty Moreno (na bateria), algumas de suas canções que viriam, em seguida, a se tornar antológicas, caso de “Procissão”, “Expresso 2222” e “Oriente”. Um momento da história da nossa MPB apropriadamente resgatado!

* Paulinho da Viola vai gravar ao vivo o show comemorativo de seus cinquenta anos de carreira com o intuito de, futuramente, lançá-lo em CD e DVD. O repertório albergará os grandes sucessos do portelense, mas deverá se abrir para ao menos uma música inédita.

* Vocalista da banda carioca Os Outros, o cantor e compositor Botika está lançando o seu primeiro CD solo. Trata-se de “Picolé da Cabeça”, o qual foi produzido por Bernardo Pauleira.

* Em seu projeto musical mais audacioso, o cantor Pedro Mariano se cercou da portentosa Orquestra Eleazar de Carvalho sob a regência de Otávio de Moraes e realizou um belo show, em outubro do ano passado, no Teatro Alfa em São Paulo, o qual, devidamente registrado, se transformou no CD (contendo quatorze faixas) e DVD (com dois números adicionais: “Poder”, de Jorge Vercillo, e “Simplesmente”, de Samuel Rosa e Chico Amaral) intitulado “Pedro Mariano e Orquestra”, os quais recentemente aportaram no mercado. Pedro canta bonito (tem a quem puxar, já que é o filho do meio de Elis Regina) e, especialmente no trabalho em tela, soterrou antigos maneirismos americanizados que somente descaracterizavam a sua obra. O repertório, selecionado a dedo, alberga canções que já se entranharam no inconsciente coletivo nacional (a exemplo de “Certas Coisas”, de Lulu Santos e Nelson Motta, “Faltando um Pedaço”, de Djavan, “Você”, de Roberto e Erasmo Carlos, e “Sangrando”, de Gonzaguinha) e outras de beleza inquestionável que merecem ser mais conhecidas e valorizadas (caso da belíssima “Simples”, de Jair Oliveira, “A Medida da Paixão”, de Lenine e Dudu Falcão, e “Miragem”, de Dani Black). O roteiro do espetáculo ainda abriu espaço para dois temas inéditos: “Um Pouco Mais Perto” (de Ana Carolina, Chiara Civello e Edu Krieger) e “Sem Você Sou Não” (outra de Jair Oliveira). Muito legal!

* O cantor e compositor argentino Fito Paez prepara álbum em dueto com o carioca Moska, o qual será lançado em toda a América Latina em data ainda incerta.

* O CD “Som e Fúria”, feito em conjunto por Jussara Silveira e Rita Benneditto e que chegará às lojas ainda este ano, foi gravado em uma caverna da Chapada Diamantina, no sertão da Bahia. Com produção de Alê Siqueira e direção artística a cargo de Zé Miguel Wisnik, o álbum trará no acompanhamento das duas cantoras, como único instrumento, o teclado executado por Mikael Mutti. Deve vir coisa muito interessante por aí!

* Residindo já há algum tempo em Lisboa, os cantores e compositores Marcelo Camelo e Mallu Magalhães resolveram se juntar ao baterista português Fred Pinto Ferreira e formaram o trio luso-brasileiro Banda do Mar. O resultado desse projeto alternativo se concretiza com o lançamento de um CD homônimo, o qual chegou recentemente ao mercado nacional através da gravadora Sony Music. Produzido e arranjado pelos próprios componentes, o álbum se faz composto por uma dúzia de faixas, sete delas de autoria de Camelo e as outras cinco compostas por Mallu. Disposto dessa forma, na verdade o CD, de nítida sonoridade pop e conceito bem mais arejado que trabalhos solos anteriores dos dois, parece soar como um disco de casal: um EP duplo onde cada um fica responsável por praticamente metade do material apresentado. Ambos já se mostram mais seguros no que se refere ao cantar e, da nova safra apresentada, as canções de Mallu se mostram um pouco superiores às de Camelo. Juntos, eles só se encontram rapidamente em “Pode Ser” e “Vamo Embora” (ambas de Camelo), uma vez que optaram por, cada um, registrar as suas próprias criações. Entre os melhores momentos do repertório estão as faixas “Mais Ninguém” e “Muitos Chocolates” (ambas de Mallu) e “Hey Nana” (de Camelo).

RUBENS LISBOA é compositor e cantor.
Apresenta o quadro "Musiqualidade" dentro do programa "Canta Brasil”, veiculado pela Aperipê FM todas as segundas-feiras, às 10 horas.
Quaisquer críticas e/ou sugestões a este blog serão bem-vindas e poderão ser enviadas para o e-mail: rubens@infonet.com.br

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