Musiqualidade

R E S E N H A

Cantora: MÔNICA SALMASO
CD: “CORPO DE BAILE”
Gravadora: BISCOITO FINO

Há dezoito anos, a cantora Leila Pinheiro debruçou-se sobre a obra do compositor e violonista Guinga e lançou o excelente álbum “Catavento e Girassol”. Naquela oportunidade, o foco era a parceria do artista com Aldir Blanc, um dos melhores letristas da nossa MPB. Agora, torna-se a vez de Mônica Salmaso prestar seu tributo ao elogiado criador de melodias tão belas quanto intrincadas, mas atavés de um mergulho nas canções por ele feitas ao lado de Paulo César Pinheiro, talvez o mais profícuo autor de versos do nosso cancioneiro nacional (Guinga e Pinheiro compuseram juntos por um considerável período até que, na década de oitenta, um desentendimento os afastou).
É assim que acaba de chegar às lojas, através da gravadora Biscoito Fino, o CD intitulado “Corpo de Baile”, composto por quatorze faixas, seis delas inéditas. Não se trata efetivamente de um trabalho fácil de ser digerido. É um disco para ser apreciado pelos poucos sensíveis que ainda possuem tempo para desvendar canções de delicadeza ímpar que parecem ter saído de algum lugar do passado. Há – de fato – verdadeiras obras-primas e a faixa de abertura, o choro-canção “Fim dos Tempos”, é uma delas. E se existe alguma repreensão a ser feita é que a maioria das músicas selecionadas possui temperatura amena e isso, ao final, resulta por conferir certo ar monocórdio ao trabalho.
Salmaso, no entanto, ratifica ser cantora irrepreensível: possuidora de vasta experiência musical, inclusive na seara erudita, sabe colocar a técnica a serviço dos sentimentos das músicas. Seu timbre belo e seguro é um diferencial entre grande parte das cantoras da atualidade e se adequa perfeitamente à sonoridade camerística do projeto que traz a digital do flautista Teco Cardoso, marido da cantora, na produção musical. Constata-se, de pronto, que os arranjos (assinados, entre outros, por gente do calibre de Dori Caymmi, Nelson Ayres e Tiago Costa) foram concebidos com grande esmero e necessária preocupação com a atmosfera de cada canção. Exemplo disso é o que se constata ao ouvir “Porto de Araújo” que, com seus crescentes e quase silêncios, transporta o ouvinte aos contraditórios sentimentos de esperança e saudade de quem se despede da família amada.
As presenças, em alguns momentos, do Quarteto de Cordas Carlos Gomes e do Quinteto Sujeito a Guincho se tornam um diferencial e tanto, assim como a participação de instrumentistas que realmente entendem dos seus ofícios, caso de Milton Mori (bandolim, conferindo a necessária aura lusitana a “Navegante”), Nailor Proveta (clarinete em “Fonte Abandonada”) e Neymar Dias (viola caipira em “Violada”, raro momento com alguma pegada, sustentado também pela percussão precisa de Robertinho Silva). E enquanto o Brasil interiorano marca terreno em temas como “Quadrão” e “Curimã” (esta contando com a participação especial de Marlui Miranda, artista há muito familiarizada com a temática indígena), o desejo e a religiosidade se confundem na inspirada “Procissão de Padroeira”.
No campo das regravações, os melhores momentos ficam por conta das versões apresentadas para “Bolero de Satã”, “Nonsense” e “Noturna” (canções antes registradas por Elis Regina, Miúcha e pela já citada Leila Pinheiro, respectivamente). Já quanto às inéditas, convém ser destacada a marcha “Rancho das Sete Cores”, a valsa “Sedutora” e a música-título, uma ode à dança que envolve os casais pelos tantos salões país adentro.
Então, é isso… Mônica Salmaso segue com suas escolhas musicais, mostrando-se corajosa e, ao jogar luzes sobre as parcerias de Guinga e Paulo César Pinheiro, presta uma merecida homenagem a esses dois grandes artistas que já cravaram seus nomes na história da nossa música popular brasileira. Vale a pena conhecer!

N O V I D A D E S

* Há flerte com o flamenco (em “Saudade do Infinito”) e passeio pela seara nordestina (em “Procissão de um Homem Só”), além de um tema instrumental (“Vinho”), no repertório de “Loa”, o novo e oitavo CD do cantor e compositor mineiro Vander Lee, o qual chegou recentemente às lojas através da gravadora Radar Records. Produzido e arranjado por Robertinho Brant, o álbum se faz composto por doze faixas, onze delas inéditas e autorais, dentre as quais se destacam “Tu” e “Seu Rei”. Vander canta suave com sua voz de timbre característico e a influência de Djavan em sua obra se faz explicitada através da regravação de “Retrato da Vida” (pérola composta pelo alagoano em parceria com Dominguinhos). A ficha técnica do disco de sonoridade leve mostra a participação de músicos de primeira linha, a exemplo de Lincoln Cheib (na bateria), Marco Lobo (na percussão) e Chico Amaral (na flauta), além das afetivas participações familiares de Laura Catarina e Ivania Catarina (em “Prece Preciosa” e “A Vida É Bela”, respectivamente).

* ”Animal” é o título do primeiro álbum solo do cantor e compositor Adriano Cintra (ex-integrante do grupo paulista Cansei de Ser Sexy). Com a direção artística sob a responsabilidade de Marcus Preto, o repertório do disco (que tinha sido originalmente composto em inglês, mas terminou sendo gravado com letras em português) conta com parcerias do artista com Alice Caymmi, Gaby Amarantos, Guilherme Arantes, Kiko Dinucci e John Ulhoa, entre outros. Há a participação especial de Roberto Flausino, o vocalista do grupo Jota Quest.

* O niteroiense Sergio Mendes é, hoje, bem mais conhecido fora do Brasil do que por aqui. Músico de fama mundial que, com o seu teclado, conseguiu construir uma carreira sólida desde que, no início dos anos sessenta do século passado, passou a se apresentar em jam sessions de casas noturnas cariocas, especialmente no Beco das Garrafas, ele viu o seu disco “Sergio Mendes & Bossa Rio”, de 1964, ser considerado como básico no instrumental da bossa nova. Já o álbum “Herb Alpert Presents Sergio Mendes & Brazil 66" vendeu mais de um milhão de cópias, alavancado pelo sucesso da faixa "Mas Que Nada" (de Jorge Ben Jor), chegando aos primeiros lugares das paradas de sucessos dos Estados Unidos. O seu mais novo projeto acaba de chegar às lojas brasileiras através da gravadora Sony Music. Trata-se de “Magic”, o qual, por ele próprio produzido, já se consubstancia como um dos melhores títulos de sua discografia. Como Mendes não é cantor, ele sempre arregimenta um time de responsa para pôr as vozes nas canções selecionadas e desta vez isso não foi diferente. Com treze faixas, o repertório traz belos temas interpretados por Maria Gadú (“Meu Rio”, dela, Mendes e Mika Mutti), Ana Carolina (“Atlântica”, de Guinga e Thiago Amud), Seu Jorge (“Sou Eu”, de Moarcir Santos e Nei Lopes) e Milton Nascimento (“Olha a Rua”, parceria de Bituca com Ricardo Vogh). Ainda na seara nacional, há as participações do amigo Carlinhos Brown (em “Simbora” e “One Nation”, ambas de Brown, Mendes e John Powell) e da esposa Gracinha Leporace (em “Whem a Fell in Love”, de Toninho Horta, Brenda Russell e Tatta Spalla, “Hidden Waters”, de Mendes, Mika Mutti e Katie Hampton, e “Samba de Roda”, de Mika Mutti e Aila Menezes, esta também presente nos vocais). Quantos aos convidados de fora, marcam presença John Legend, Janelle Monae, Scott Maya e os rappers norte-americanos Cody Wise e will.i.am. Muito massa!

* O cantor e compositor Baia lançou recentemente, por enquanto somente em formato digital, o compacto “Do Romantismo à Roma Antiga”, o qual, além da canção-titulo, apresenta a inédita “Meu Facebook is on the Table”.

* Baterista francês radicado há mais de uma década no Brasil, Stéphane San Juan integra a Orquestra Imperial e vem tocando em discos e shows de vários artistas do cenário independente nacional. Também cantor e compositor, ele resolveu expor essas suas outras qualidades através do CD “Systeme de Son”, o qual chegou recentemente ao mercado de forma independente. Produzido pelo próprio artista, o álbum se faz composto por dez faixas, todas autorais, a maioria criada ao lado de parceiros como Alberto Continentino, Domenico Lancellotti, Gustavo Ruiz, Quito Ribeiro e Sean O’Hagan. Com voz segura de timbre grave, Stéphane conta, em alguns momentos, com o auxílio luxuoso de um coro formado por Laura Sanjuan, Gabriela Riley e Tulipa Ruiz (esta também presente em participação vocal mais efetiva na faixa “”Miroir En Nous”). As canções são cantadas em francês, com exceção da suingada “Retornado” e da instrumental “Fantaisies de Mio”. A ficha técnica, por seu turno, alberga nomes que povoam a tribo dos descolados da atual MPB: Kassin (na guitarra), Donatinho (no sintetizador), Zero (na percussão), Marlon Sette (no trombone) e Pedro Sá (também na guitarra) estão entre eles. Além da faixa-título, alguns dos melhores momentos do repertório apresentado ficam por conta do samba “Ô Chance” (que traz Wilson das Neves como convidado), “Les Ètres Humains” e “Amour Posthume”.

* E enquanto Jorge Mautner já se encontra mixando as faixas de seu novo álbum de inéditas, o qual teve a produção musical entregue a Kassin e Berna Ceppas, Mihay está gravando em estúdio carioca as canções que farão parte de um aguardado álbum produzido por Gabriel Muzak, o qual contará com as participações especiais de João Donato e Tulipa Ruiz (olha ela aí de novo!).

* O compositor e cantor carioca Gabriel Moura está relançando o seu mais recente CD. “Karaokê Tupi 2” volta às lojas através da gravadora Som Livre, trazendo uma nova capa e encarte totalmente reestruturado. O repertório, no entanto, é basicamente o mesmo, mas, além das onze canções do trabalho original, o artista adicionou uma música inédita (“Sempre Ipanema”, criada por ele solitariamente) e um remix que traz a participação de Seu Jorge (“Miss Favela”, de Gabriel em parceria com Pretinho da Serrinha Leandro Fab).

* A cantora pernambucana Claudia Beija está lançando o seu primeiro álbum solo. Intitulado “A.m.a.r.t.e.”, o CD foi produzido por Caca Barreto e conta com a participação especial de Elba Ramalho na regravação de “Flor de Maracujá” (de João Donato e Lysias Ênio). O repertório de quatorze faixas contempla criações de Ylana Queiroga (“Nossa”, feita com Júlio Morais), Noel Rosa (“Último Desejo”), China (“Um Dia Lindo de Morrer”) e Lula Queiroga (“O Habitat da Felicidade”, parceria com Lucky Luciano).

* Depois de dividir o CD “Hits do Underground” com a cantora Miranda Kassin, o cantor, compositor e ator paulistano André Frateschi (que, para quem não sabe, é filho dos atores Denise Del Vecchio e Celso Frateschi) resolveu lançar um trabalho solo. Trata-se do CD duplo intitulado “Maximalista”, um produto independente que aportou recentemente no mercado, trazendo, ao todo, quinze faixas (quatorze delas inéditas e autorais, algumas compostas pelo artista ao lado dos parceiros Fabio Pinczowski e Mauro Motoki). Trabalho de pegada roqueira, o repertório ressalta as incertezas e dúvidas que acometem o cidadão de uma grande cidade em meio a temas como solidão, fúria e impaciência. André canta muito bem e suas criações têm um quê oitentista, embora existam ecos mais recentes, como resquícios do Skank. Entre os melhores momentos, além da faixa-título, estão “A Máquina Preenche”, “Queda” “SP, Berlim” e “Isso É Coisa Pra Homem”. A citada Miranda se faz presente nos vocais, como convidada, em “Meta Fugidia” e o sempre antenado André Abujamra surge em participação especial na ácida “Todo Homem É uma Ilha”.

RUBENS LISBOA é compositor e cantor.
Apresenta o quadro "Musiqualidade" dentro do programa "Canta Brasil”, veiculado pela Aperipê FM todas as segundas-feiras, às 10 horas.
Quaisquer críticas e/ou sugestões a este blog serão bem-vindas e poderão ser enviadas para o e-mail: rubens@infonet.com.br

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