Musiqualidade

R E S E N H A

Cantor: ARLINDO CRUZ
CD: “HERANÇA POPULAR”
Gravadora: SONY MUSIC

Arlindo Cruz ganhou o primeiro instrumento, um cavaquinho, quando tinha sete anos. Cinco anos depois, ao lado do irmão, o hoje também compositor Acyr Marques, já tirava muitas músicas de ouvido. Foi com o sambista Candeia que ele entrou pela primeira vez em um estúdio de gravação e ainda que, na adolescência, tenha ido estudar na escola preparatória de Cadetes do Ar em Barbacena (MG), nunca abandonou a música, tendo começado, em seguida, a participar de festivais. Deixando a Aeronáutica, passou a frequentar a roda de samba do conhecido bloco carioca Cacique de Ramos e foi lá que ele conheceu, entre outros, Jorge Aragão, Beth Carvalho, Almir Guineto, Zeca Pagodinho e Sombrinha. Este, viria a ser um de seus mais frequentes parceiros, tendo ao seu lado, inclusive, gravado cinco discos. Em 1996, Arlindo emplacou o enredo “E Verás que um Filho teu Não Foge à Luta” no carnaval do Império Serrano, sua escola de coração.
Ele, que atualmente possui mais de setecentas músicas gravadas por diversos artistas e é considerado o responsável pela proliferação do banjo no samba, está lançando mais um CD. Trata-se de “Herança Popular,”, o qual chega ao mercado através da gravadora Sony Music e se consubstancia como o seu primeiro trabalho totalmente autoral. Produzido pelo filho, Arlindo Neto, o álbum se faz composto por dezesseis canções apresentadas em quinze faixas que confirmam a inspiração de um artista que se mostra preocupado com a desigualdade social, fruto direto da corrupção (em “Ilicitação”) ou que ressalta a importância da fé em Deus para não cair no destino mais comum dos menos afortunados (em “O Mundo em que Renasci”, que traz a presença, nos vocais, de Marcelo D2).  
E se o artista sabe que tem que se modernizar e falar sobre temas atuais como o culto ao corpo e a conquista via campo virtual (no medley que reúne “Melhor Parar” e ”Whatsappiei pra Ela”) e ainda a TPM feminina (em “Motivo Banal”), também não pode esquecer aqueles que fizeram sua cabeça de músico, tais como Cartola, Adoniran Barbosa, Ataulfo Alves, Dorival Caymmi e João Nogueira, e, assim, os homenageia na faixa-título que conta com o auxílio luxuoso do virtuoso bandolim de Hamilton de Holanda.
Os fins de relacionamentos e as desventuras amorosas, assuntos tão comuns em toda e qualquer roda de samba que se preze, logicamente marcam espaço no repertório, representados por músicas como “Sinceridade”, “Me Dê um Tempo pra Pensar” e “Somente Sombras” (esta contando com Zeca Pagodinho como convidado), bem como canções que exaltam lições de otimismo e bem viver, a exemplo do que se constata em “Isso É Felicidade” e “Paixão e Prazer”, esta trazendo a participação especial de Maria Rita.
Entre samba mais dolente (“Não Penso em Mais Nada”) e partido alto pra lá de animado (“Caranguejo”), Arlindo saúda os que abraçam o futebol como profissão (em “Jogador”) e o amigo Pedro Scooby (em “O Surfista e o Sambista”). Nada, contudo, que supere a regravação de “Ela Sambou, Eu Dancei” (com Mr. Catra), uma deliciosa mistura de samba-enredo com funk, momento máximo de um CD que comprova o talento e a versatilidade de um dos maiores sambistas da história da nossa música popular.

N O V I D A D E S

* Anelis Assumpção traz na sua linhagem musical muito das características herdadas do pai, o saudoso Itamar Assumpção. Paulistana, ela iniciou a carreira aos dezoito anos, e em seguida, integrou o grupo DonaZica. A carreira solo teve como marco principal o lançamento, em 2011, do CD “Sou Suspeita Estou Sujeita Não Sou Santa”, trabalho bem recebido pela crítica especializada. Mostrando amadurecimento artístico, ela acaba de pôr no mercado, através da gravadora Scubidu Music, o seu novo álbum, sugestivamente intitulado “Anelis Assumpção & Os Amigos Imaginários”, o qual, produzido por ela ao lado dos músicos de sua banda (o baterista Bruno Buarque, o guitarrista Cris Scabello, o baixista Mau e o tecladista Zé Nigro), se faz composto por uma dúzia de faixas autorais, três delas compostas ao lado de parceiros. Cantora de voz pequena mas agradável por conta da tessitura doce, ela se mostra uma autora interessante, capaz de construções inteligentes até mesmo quando aborda temas surrados, como é o caso de “Eu Gosto Assim”, uma das melhores faixas desse bem-vindo trabalho. Entre dub (“Mau Juízo”), rap (“Devaneios”, feita com Russo Passapusso) e ska (“Song to Rosa”), há até um bom tema em espanhol (“Inconcluso”). Outros grandes destaques do repertório apresentado ficam por conta do ótimo samba “Declaração” (composto pela artista com Céu e Kiko Dinucci) e pelo possante rock “Minutinho” (parceria com Alzira E, arrudA e Jerry Espíndola).

* Em 2015, dentro da série “Tons”, a gravadora Universal fará chegar ao mercado três títulos do Quarteto em Cy: “Som Definitivo” (de 1966, que contou com a participação do Tamba Trio), “Antologia do Samba-Canção” (de 1975) e “Quarteto em Cy interpreta Gonzaguinha, Caetano, Ivan e Milton” (de 1980). Apropriado!

* A gravadora Warner faz chegar ao mercado o DVD que registrou o show realizado pela cantora Joyce Cândido no Teatro Maison de France, no Rio de Janeiro, no qual ela interpretou canções de Caetano Veloso, Chico Buarque e Noel Rosa, entre outros. Na oportunidade, a artista recebeu Elza Soares como convidada especial. Nos extras do produto, há o encontro de Joyce com João Bosco.

* Jurema é uma jovem cantora baiana que está lançando, através do selo Saravá Discos, o seu segundo CD (o primeiro, “Batuque de Canoa”, chegou ao mercado há doze anos). Intitulado “Mestiça” e produzido por Marcos Vaz e Cássio Calazans, o álbum é um projeto conceitual que foge do axé e similares, calcando-se na baianidade afro. O ponto alto do trabalho é mesmo a artista, a qual se mostra uma intérprete interessante e segura. Dona de bela voz de timbre doce e claro, ela consegue apresentar uma identidade toda própria, fugindo da repetição de tantas cantantes tão parecidas que pululam por este imenso Brasil. Não é um disco que deva tocar nas rádios, embora possua faixas bastante palatáveis, a exemplo de “Maxixe Nagô” (de Marcos Vaz e Zeca Baleiro) e de “Não Pedi” (de Roberto Mendes e Nizaldo Costa). Além de Baleiro, surgem como convidados especiais: Chico César, Letieres Leite, Tiganá Santana e Lenna Bahule. O repertório, composto por onze musicas, tem como autores predominantes o citado Tiganá e Elomar e inclui temas em francês, inglês e espanhol.

* Enquanto o trompetista Guizado está lançando seu terceiro álbum solo (que se intitula “O Voo do Dragão”), Nando Reis encontra-se em estúdio gravando um disco ao lado da cantora Ana Cañas. Por seu lado, Ivan Lins anuncia se encontrar em processo de seleção das faixas que farão parte de seu próximo CD.

* Já se encontra no mercado o CD contendo a trilha sonora original da telenovela global “Império”. Entre os fonogramas escolhidos para marcar as emoções das principais personagens estão “Ai que Saudade d'Ocê” (com Zeca Baleiro), “Beijos de Hortelã” (com Ivete Sangalo), “Amor Perfeito” (com Ney Matogrosso), “Dom de Iludir” (com Gal Costa), “Aonde Quer que Eu Vá” (com os Paralamas do Sucesso), “Enrosca” (com Moska), “Lamento Sertanejo” (com Gilberto Gil e Dominguinhos) e “Lucy in the Sky with Diamonds” (com Dan Torres), este o tema de abertura. Algumas músicas como “Dona” (com Alex Cohen), “Preciso me Encontrar” (com Cartola), “Tá Escrito” (com o grupo Revelação), “Cara de Rica” (com Erikka Rodrigues) e ”Mel na Boca” (com Péricles), já executadas em cenas da novela, ficaram de fora desse CD, o que indica que deverá sair, em breve, um volume dois.

* O lançamento de Natal de Roberto Carlos este ano será o registro do show que ele realizou na MGM Grand Garden Arena, em Las Vegas (EUA), em setembro passado. O Rei cantou em português, espanhol, inglês e italiano.

* Luciana Coló é uma cantora, compositora e atriz paulista que foi criada no Rio de Janeiro. Dona de voz afinada e belo timbre, ela lançou recentemente, através da gravadora Fina Flor, o CD intitulado “O Mar e seu Sol”. Composto por onze faixas e produzido pela própria artista ao lado de Raphael Gemal, o álbum faz o ouvinte se deparar com uma intérprete pronta que, no entanto, precisa deixar seu talento se encontrar com o de outros compositores. Cercada por músicos excepcionais, a exemplo de Rui Alvim (no clarinete), Marcelo Caldi (na sanfona), Ocelo Mendonça (no violoncelo), Gabriel Improta (no violão) e Carlos Fuchs (no piano), Luciana apresenta um repertório majoritariamente autoral (a exceção é a faixa “Chamada”, de Gemal e Ricardo Szpilman, o ponto alto do disco) no qual ela musica três poemas de Carlos Drummond de Andrade e um de Nadam Guerra, abre parcerias com o já citado Gemal, Carlos Pontual e Claudia Castelo Branco e se revela solitariamente em outros três momentos.

* Makely Ka nasceu em Valença do Piauí, mas com menos de três anos foi com a família para o interior de Minas Gerais, onde viveu até o início da adolescência. Seguiu para Belo Horizonte antes de completar os quinze anos para cursar Eletrônica Industrial, começando a frequentar o circuito alternativo ao acompanhar shows e eventos culturais da cidade. Em seguida, passou a ouvir muito punk rock e música eletroacústica, mas foi quando assistiu a shows de Tom Zé e Itamar Assumpção que resolveu abraçar a música como a mola propulsora de sua vida. O primeiro disco foi “A Outra Cidade”, dividido com os compositores Kristoff Silva e Pablo Castro e, a partir daí, Makely começou a ver algumas de suas canções gravadas por vários artistas, a exemplo de Alda Rezende, Titane, Ná Ozzetti, Carol Saboya, Aline Calixto, Dani Gurgel, Juliana Perdigão e Paula Santoro. Foi o segundo álbum, “Danaide” (lançado em 2006 e gravado ao lado da cantora Maisa Moura), no entanto, que o possibilitou criar em parceria com gente do porte de Chico Saraiva, Mário Sève, Flávio Henrique, André Mehmari,  Estrela Leminski, Natan Marques, Marku Ribas e Chico Amaral. Dois anos depois, chegou ao mercado o seu primeiro CD solo intitulado “Autofágico”, o qual ora se faz sucedido com o lançamento do ótimo “Cavalo Motor”. Trata-se de um projeto corajoso no qual se faz revelada sua imersão nos caminhos do personagem Riobaldo do romance “Grande Sertão: Veredas”, escrito por Guimarães Rosa. Produzido pelo próprio artista ao lado de Lucas Miranda e Patrícia Rocha, o álbum resulta contundente e interessante nas medidas certas. A voz característica de Makely confere tintas especiais a canções belas e ásperas, formatadas em um repertório de quinze faixas autorais, dentre as quais se destacam o repente “Código Aberto”, o rock-maracatu “Da Idade da Pedra”, a ciranda “Roda da Fortuna” e a delicada “Assum Cinza”. Há as participações especiais de Suzana Salles (em “Itinerário Tatarana”) e da já citada Maisa Moura (em “Sertão”). De fato, imprescindível!

RUBENS LISBOA é compositor e cantor.
Apresenta o quadro "Musiqualidade" dentro do programa "Canta Brasil”, veiculado pela Aperipê FM todas as segundas-feiras, às 10 horas.
Quaisquer críticas e/ou sugestões a este blog serão bem-vindas e poderão ser enviadas para o e-mail: rubens@infonet.com.br

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