Musiqualidade

R E S E N H A

Cantora: MARIANA DE MORAES
CD: “DESEJO”
Gravadora: BISCOITO FINO

Neta de Vinicius, a cantora carioca Mariana de Moraes já fez algumas incursões anteriores no mercado fonográfico: em 1997, marcou presença em “A Alegria Continua”, o disco que a uniu a Zé Renato e Elton Medeiros, e em 2001, mergulhou de cabeça no samba com o álbum “Se É Pecado Sambar”. Nenhum desses trabalhos, no entanto, a revelou como a interessante intérprete que ora se mostra com o lançamento do CD intitulado “Desejo”, avalizado pela gravadora Biscoito Fino.
Com a direção artística assinada pelo competente José Miguel Wisnik e sob a produção da dupla Alê Siqueira e Marcelo Costa, Mariana se solta em um repertório escolhido a dedo que, embora reúna temas aparentemente díspares, ao final parecem guardar uma salutar unidade, muito por conta dos experientes condutores a quem ela se entregou.
Fã confessa de Gal Costa, em alguns momentos o canto da baiana, especialmente na sua fase mais dolente, serve de influência para Mariana que é intérprete inteligente, cantando sem fazer muito esforço, mas alcançando as notas com naturalidade.
São quatorze faixas bem alinhavadas por atabaques, programações, violões e pianos, entre as quais se fazem predominar temas assinados pelo já citado Wisnik e por Caetano Veloso (são três de cada um). Do primeiro, a artista recolheu algumas de suas mais expressivas criações: estão lá a belíssima “Assum Branco” (em uma versão voltada para o baião, mais pulsante do que as outrora já registradas, contando com Dominguinhos em uma de suas derradeiras participações), a delicada e complexa “Cacilda” (uma mais que merecida homenagem à grande atriz Cacilda Becker) e a contagiante “A Liberdade É Bonita” (parceria com Jorge Mautner, em um registro que traz para a linha de frente o batidão do funk carioca). Já do irmão mais famoso de Maria Bethânia, Mariana recolheu duas ótimas músicas mais antigas, a tropicalista “Flor do Cerrado” e a etérea “Cá Já”, e uma mediana, “Morro Amor”, construída mais recentemente ao lado de Arnaldo Antunes.
Aberto com o ressoar de tambores em “Tabu” (da cubana Margarita Lecuona), o CD traz também um registro à moda da roda de samba do Recôncavo Baiano de “A Mãe d’Água e a Menina” (mais uma simples e linda composição de Dorival Caymmi), resgata “Engomadinho” (um interesssante samba pouco conhecido de autoria de Pedro Caetano e Claudionor Cruz, gravado originalmente por Aracy de Almeida) e joga luzes sobre “Amor em Lágrimas” (poema menos inspirado de Vinicius musicado por Claudio Simões). De uma safra mais atual, Mariana escolheu “Vai e Vem” (inusitado samba de Guilherme Arantes e Nelson Motta), “Veleiro Azul” (canção morna de Luiz Melodia e Rúbia Mattos) e “Motivos Reais Banais” (fragmento de texto de Wally Salomão que ganhou melodia de Adriana Calcanhotto).
Se algum senão há, é a falta de canções inéditas (se bem que, à epoca de sua gravação, no começo de 2012, três delas o eram). Mas, no geral, trata-se de um projeto bacana que credencia Mariana de Moraes para voos mais altos. Corra e confira!

N O V I D A D E S

* Nordestinos (um é cearense e o outro paraibano), Fagner e Zé Ramalho praticamente conheceram o sucesso na mesma época, a segunda metade da década de setenta do século passado. Ambos bons cantores e compositores que forneceram várias grandes músicas para o nosso cancioneiro, os dois continuam na ativa e frequentemente vêm lançando novos discos, embora, já de um considerável período para cá, não tenham conseguido engatar sucessos populares como foram, por exemplo, “Chão de Giz”, “Revelação”, “A Terceira Lâmina”, “Fanatismo” e “Eternas Ondas”, todas elas presentes no repertório de “Fagner & Zé Ramalho – Ao Vivo”, projeto que ora chega ao mercado, nos formatos CD e DVD, através da gravadora Sony Music e sob a direção musical de Robertinho de Recife. Registro ao vivo de apresentações realizadas no Theatro Net Rio, em julho deste ano, a ideia de unir esses dois grandes artistas vem de algum tempo, mas só agora se concretiza. Um e outro continuam em perfeita forma vocal e, sempre juntos (não há blocos individuais como geralmente costuma ocorrer em encontros desse tipo) e portando seus violões, se fazem ancorar, em alguns momentos, por uma banda enxuta, formada por Manassés (viola), Marcos Farias (teclados e sanfona), Chico Guedes (baixo) e Mingo Araújo (percussão), músicos competentes que os ajudam a reapresentar tanto canções menos conhecidas, tais como “Dois Querer”, “Asa Partida” e “Pelo Vinho e Pelo Pão”, quanto outras já entranhadas no inconsciente coletivo nacional, a saber: “Mucuripe”, “Admirável Gado Novo”, “Noturno” e “Garoto de Aluguel”. Embora aqui também faltem, no repertório selecionado (são dezessete canções apresentadas em dezesseis faixas), temas inéditos, o que seria bastante saudável, resta incontestável a importância dos dois na sedimentação da atual música popular brasileira e fica a saudade de um tempo em que se esperava com ansiedade pelos lançamentos anuais deles, os quais sempre vinham recheados de belas e eternas canções.

* Capiba ganha um CD em sua homenagem. Trata-se de “Elas e Outras Canções”, disco viabilizado pelo selo Sambada que reúne, sob a produção de Paloma Granjeiro e Pedro Rampazzo, dez cantoras, as quais dão voz a temas menos conhecidos do saudoso compositor pernambucano, a exemplo de “Começo de Vida”, “Serenata Suburbana” e “Resto de Saudade”. Entre as intérpretes convidadas para o projeto estão Alessandra Leão, Claudia Beija, Juçara Marçal, Karynna Spinelly, Vanessa Oliveira e Ylana Queiroga.

* A cantora Fabiana Cozza já se encontra com um novo CD totalmente gravado, o qual deverá ser lançado no primeiro semestre de 2015. Após o projeto em que homenageou Clara Nunes, a sambista deverá vir com um trabalho recheado de canções inéditas. A conferir!

* O cantor e compositor alagoano Djavan está particularmente feliz do alto de seus sessenta e cinco anos de vida e quase quarenta de carreira. É que ele tem praticamente toda a sua trajetória musical ora resgatada através da recém-lançada caixa “Djavan – Obra Completa”, que chega às lojas por uma inciativa da gravadora Sony Music, reunindo dezoito dos seus álbuns: desde o de estreia, “A voz, o Violão, a Música de Djavan” (de 1976) até “Ária” (de 2010), disco em que interpretou canções de outros compositores. O projeto (que traz todos os títulos remasterizados, além de letras e fichas técnicas revisadas, impressas num volumoso libreto) contempla ainda dois CDs contendo raridades. O artista supervisionou todo o processo, reouvindo cronologicamente os seus álbuns para saber exatamente como proceder e fazendo isso entre fitas que lhe foram entregues nos mais diferentes estados de conservação. Em alguns casos, ele recorreu até à remixagem para sanar problemas que o incomodavam. Foi o caso da faixa “Mundo Vasto”, integrante do CD “Vaidade”, de 2004 (cujo arranjo ele resolveu cortar pela metade) e de um álbum inteiro, o “Matizes”, de 2007 (porque, desde o seu lançamento, ele se mostrou insatisfeito com a sonoridade). Autor de grandes sucessos, tais como “Flor de Lis”, “Meu Bem-Querer”, “Faltando um Pedaço”, “Esquinas”, “Pétala” e “Oceano”, Djavan viu suas músicas serem gravadas pelos maiores nomes do nosso cancioneiro, caso de Roberto Carlos (“A Ilha”), Maria Bethânia (“Álibi”), Simone (“Liberdade”), Gal Costa (“Açaí”) e Zizi Possi (“Nobreza”), e se transformou em um dos maiores nomes da história da nossa MPB.

* Autor do samba “Mulheres”, grande sucesso na voz de Martinho da Vila, o compositor Toninho Geraes, que já teve músicas gravadas também, entre outros, por Beth Carvalho, Zeca Pagodinho e Nelson Rufino, está lançando “Tudo que Sou”, o quarto CD da carreira. Produzido pelo próprio artista e trazendo arranjos do maestro Ivan Paulo, o álbum se faz composto por quatorze faixas autorais. Há as participações de Tantinho da Mangueira, Joyce Cândido, Mauricio Tizumba, Marcos Sacramento e Marquinhos China.

* Produzido pelo multi-instrumentista Guilherme Kastrup, está chegando às lojas o primeiro e homônimo CD da cantora Natália Matos. É mais um nome que surge no cenário musical nacional advindo do boom que ora assola o Estado do Pará e, neste caso, trata-se, de fato, de uma bem-vinda novidade. A cantora de voz doce, afinada e bem colocada selecionou para o seu trabalho de estreia músicas que remetem às suas raízes, com vários dos ritmos característicos da região como cumbia, carimbó e brega. São onze canções dispostas em doze faixas, já que “Cio” (de Kiko Dinucci e Douglas Germano) aparece em duas versões, abrindo e fechando o álbum. Aliás, ela e “Um Amor de Morrer” (de Romulo Fróes e Clima), embora se consolidem em ótimos momentos, terminam de certa forma soando um pouco deslocadas do contexto do restante do repertório, o qual traz boas canções assinadas por Carlos Gomes, Niceas Drumond e Pim (“Este Pranto É Meu”), Arnaldo Antunes, Felipe Cordeiro, Manoel Cordeiro, Betão Aguiar e Luê (“Beber Você”) e pela própria Natália (“Você me Ama, Mas”). Nada que supere, todavia, o grande destaque do repertório: o delicioso tema “Coração Sangrando”, de autoria de Dona Onete, compositora local bastante respeitada e disputada pelos artistas paraenses, que traz Zeca Baleiro como convidado especial. Na ficha técnica podem ser encontrados músicos de primeira linha, a exemplo de Zé Nigro (baixo e teclados), Rodrigo Campos (guitarra) e Ricardo Hertz (violino).

* O EP “Banquete” contempla quatro canções, todas compostas por Márcio Bulk, Bruno Cosentino, César Lacerda e Rafael Rocha. Essas músicas ganharam as vozes de Alice Caymmi, Bruno Cosentino, César Lacerda, Lívia Nestrovski e Michele Leal. Vale a pena conhecer!

RUBENS LISBOA é compositor e cantor.
Apresenta o quadro "Musiqualidade" dentro do programa "Canta Brasil”, veiculado pela Aperipê FM todas as segundas-feiras, às 10 horas.
Quaisquer críticas e/ou sugestões a este blog serão bem-vindas e poderão ser enviadas para o e-mail: rubens@infonet.com.br

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