Musiqualidade

R E S E N H A

Cantora: MARIA GADÚ
CD: “GUELÔ
Selo: SLAP

Filha de mãe brasileira e pai francês, a cantora paulista Maria Gadú se transferiu para o Rio de Janeiro em 2008 e foi a partir daí que viu seu nome começar a ser comentado no meio musical. Autodidata, ela lançou o primeiro álbum no ano seguinte, recebendo, de imediato, uma saraivada de elogios da crítica e conquistando, em seguida, um séquito de fãs que lhe segue fiel. Puxado pela singela canção "Shimbalaiê", sua primeira composição feita aos dez anos, o disco teve várias faixas incluídas em produções da Rede Globo, o que expôs rapidamente o talento da artista de norte a sul do Brasil. Após um aclamado encontro nos palcos com Caetano Veloso, cujo registro fez-se perpetuado nos formatos CD e DVD, Gadú lançou, em 2011, o seu segundo álbum de estúdio. Intitulado "Mais Uma Página", não obteve o êxito comercial do primeiro, mas serviu para esboçar o amadurecimento artístico que se consubstancia agora com a chegada às lojas do CD “Guelã”, o qual aporta no mercado através do selo Slap, um dos berços da gravadora Som Livre.
Trata-se efetivamente de um disco muito bem produzido por ela própria (que nele toca guitarra e violão) ao lado de Federico Puppi (este o responsável pelo baixo e cello), os quais vêm se juntar a uma competente e enxuta banda-base completada por Doga (na percussão), Tomaz Lenz (na bateria) e Lancaster Pinto (no baixo).
Embora uma audição apressada possa fazer o ouvinte ter a impressão de uma sonoridade seca (como, aliás, reza a atual cartilha dos descolados), a real é que os arranjos são recheados de informações. Silêncios e detalhes fazem parte de um arsenal que merece ser percebido com atenção.
A impressão de que se trata de um álbum complexo se esvai quando é levada em conta a ousadia de Gadú em fugir da rota óbvia das canções de fácil aceitação e mergulhar de cabeça nos sentimentos que fazem parte se seu momento íntimo atual. Na contramão de muitos que talvez esperassem mais do mesmo, pode-se dizer que se trata do melhor trabalho lançado por Gadú em sua curta trajetória musical, não obstante conter o mesmo tão somente dez faixas, nove delas inéditas autorais (destas, Gadú assina solitariamente seis; nas outras três, assume parcerias com Maycon Ananias, James McCollum e Mayra Andrade).
Como que se completando em ciclo, o CD se abre e se fecha com duas canções que possuem consideráveis introduções instrumentais: e se “Suspiro” soa altamente confessional, equalizando passado e presente, “Aquária” segue em rota parecida, mas ressaltando aspectos mais sensoriais. E – detalhe importante – em ambas Gadú se acompanha, nota a nota do canto, com o seu violão.
Bastante sintomático é que na bela “Obloco”, a primeira canção de trabalho, ela verbalize o desejo de lançar um bloco seu, que seria o dos sem medo. Tanto quanto assim o é também a presença, em lugar de destaque no encarte, da frase: “todos os sentimentos são válidos quando são verdadeiros e genuínos”. Verdades de uma artista que opta por se mostrar cada vez mais inteira, ao contrário de outras que se revestem de personagens, algumas over, outras plácidas em demasia.
A etérea “Ela” entrega o amor entre iguais de forma inteligente e delicada, transformando-se de pronto em um dos melhores momentos do repertório ao lado de “Semi-Voz”, que bebe salutarmente em romântica-roqueira fonte caetaneana, da bem construída “Tecnopapiro” com seu inspirado refrão e da rítmica “Sakédu”, levada somente por encantadores vocalises da artista.
Completam o set list as menos interessantes “Há” e “Vaga”, além da única incursão em obra alheia: “Trovoa”, tema de autoria de Maurício Pereira, cujo maior charme fica por conta de sua letra caudalosa, embalsamada em canto quase falado.
Maria Gadú, que – frise-se – está cantando cada vez melhor, mostra, em apenas pouco mais de trinta minutos de som, que se encontra em sua melhor forma. Quem possuir inteligentes ouvidos para entendê-la, que com ela compartilhe suas novas e bem-vindas impressões sonoras!

N O V I D A D E S

* Em trinta e cinco anos de carreira, o cantor e compositor paulistano Jean Garfunkel se tornou conhecido no meio musical através de suas parcerias com o irmão Paulo Garfunkel. Juntos, eles lançaram quatro álbuns e conseguiram com que grandes nomes do nosso cancioneiro, a exemplo de Elis Regina, Zizi Possi, Renato Braz e Maria Rita gravassem suas canções. Agora, Jean acaba de lançar um CD solo no qual apresenta canções inéditas e autorais. Trata-se do independente “13 Pares e um Fado Solitário”, produzido pelo próprio artista. O título alude ao fato de o trabalho se fazer composto por quatorze faixas, treze delas compostas com diversos parceiros a apenas uma feita por ele solitariamente, o bom fado “Do Incógnito Conteúdo”. Entre os colaboradores estão Natan Marques (que assina a direção musical do disco), Júlio Medáglia, Prata, Sizão Machado e Arismar do Espírito Santo. Nos vocais, há, em alguns momentos, as participações especiais de Joana Garfunkel, Lula Barbosa e Theo de Barros, além do já citado Paulo. Entre baião, samba e toada, os melhores momentos ficam por conta das faixas “Era Apenas um Menino…”, “Tiê”, “Valsa Paulistana” e “É as Conta que Manda ni Nóis”.

* O cantor e compositor Hyldon lançou o seu primeiro disco em 1975. Dele, constavam canções que conseguiram ultrapassar os anos, sobrevivendo até hoje no inconsciente coletivo, a exemplo de “Na Rua, na Chuva, na Fazenda”, “Na Sombra de uma Árvore” e “As Dores do Mundo”. Exatos quarenta anos depois, o artista regravou todas as doze faixas que compõem o correlato repertório no formato voz e violão e está a lançá-las no CD intitulado “Na Rua, na Chuva, na Fazenda – A Origem”, o qual já se encontra à venda em seu site oficial. O set list contempla ainda, entre outras, “Sábado e Domingo”, “Vamos Passear de Bicicleta?” e “Guitarras, Violinos e Instrumentos de Samba”.

* O cantor e compositor carioca Cícero lançou recentemente o seu terceiro CD, o sucessor de “Canções de Apartamento” (2011) e “Sábado” (2013). Trata-se de “A Praia”, o qual, por ele mesmo produzido ao lado do aclamado Bruno Schultz e contando com dez canções inéditas e autorais, chegou às lojas através da gravadora Deck. Não se esperem canções radiofônicas nem um intérprete que chame a atenção por recursos vocais fora-do-comum. O artista se cerca de músicos de primeira qualidade (caso de Marlon Sette no trombone, Felipe Pinaud na flauta e Uirá Bueno na bateria) para emoldurar sua obra bastante pessoal. Embora menos tristonho que o trabalho anterior, não se pode dizer que o novo álbum chega a contagiar. Entre os destaques do repertório apresentado estão as faixas “De Passagem”, “O Bobo” e “Frevo por Acaso nº 2”. A cantora Luiza Mayall toma a linha de frente em “Cecília e a Máquina”.

* O segundo CD solo do cantor e compositor baiano Saulo Fernandes se intitulará “Baiuno” e chegará em breve às lojas, contendo treze músicas inéditas. O projeto, recheado de convidados, conta com as presenças de Roberto Mendes, Tó Brandileone e Dom Chicla, entre outros.

* Formada por Davi Escobar, Agenor Vasconcelos, Rafael Ângelo, Markito Rock e Anastácio Jr., a banda Alaídenegão é proveniente do norte do país e nasceu em 2008 entre Manaus (AM) e Boa Vista (RO). Daí, o som característico daquela região presente na maioria das quatorze faixas autorais de “Senoide Sensual”, o bom CD de estreia produzido pelo competente Rafael Ramos, o qual acaba de aportar no mercado através da gravadora Deck. Há, no entanto e também, nesse trabalho, reconhecidas células nordestinas, decerto por conta das origens paraibana de Agenor e pernambucana de Davi. Na sonoridade, predomina o suingue característico de ritmos regionais como o carimbó, a guitarrada e o brega, mas há também bem sucedidas incursões pelo samba e por terreno afro. A verdade é que os rapazes apresentam um condimentado caldeirão sonoro e temas como “Rodar na Bica”, “Minha Praia É a Lua”, “Cadê a Morena?” e “Caia em Si” (os melhores momentos do repertório apresentado), se bem trabalhados, possuem grandes chances radiofônicas. O trompetista Jessé Sadoc é o convidado especial em vários momentos, ajudando a azeitar ainda mais o som da galera.

* Sob a direção artística de Romulo Fróes, o cantor e compositor Rodrigo Campos está terminando de gravar o seu terceiro álbum solo. Com repertório inédito e autoral, o disco é focado na influência oriental na cultura cosmopolita em São Paulo. A conferir!

* O primeiro registro ao vivo de show solo de Pedro Luís (captado em agosto do ano passado durante apresentação íntima para convidados realizada no ateliê-estúdio do artista plástico carioca Sérgio Marimba) se intitula “Aposto” e estará sendo lançado em julho nos formatos CD e DVD. O registro em vídeo conta, nos extras, com as participações especiais de Bruna Caram, Cabelo, João Cavalcanti, Martinho da Vila e Mart'nália.

* Merecidas homenagens a Milton Nascimento chegaram às plataformas digitais nas últimas semanas. Podendo ser inteiramente baixadas pelos admiradores da obra do artista, as coletâneas inéditas “Mil Tom Vol. 1” e “Mil Tom Vol. 2” trazem interessantes releituras de canções compostas por Bituca ou que foram por ele gravadas ao longo de sua vitoriosa trajetória, as quais foram recentemente feitas por artistas e grupos da atual geração. Entre os melhores momentos estão as novas versões de “Paula e Bebeto” (com Pélico e Bárbara Eugênia), “Canoa Canoa” (com a Filarmônica de Pasárgada), “Paixão e Fé” (com Phill Veras), “Vera Cruz” (com Aline Calixto), “Amor de Índio” (com Thaís Gulin), “Beijo Partido” (com Blubell), “Canção do Sal” (com Verônica Ferriani) e “Caxangá” (com a Orquestra Contemporânea de Olinda). Também já se encontra disponível na net o Vol. 1 da também inédita coletânea “Mar Azul (Sons de Minas Gerais)” em que alguns novos nomes reverenciam a riqueza musical do Clube da Esquina. Aqui, os destaques ficam por conta de “Reis e Rainhas do Maracatu” (com Pedro Luís), “Cravo e Canela” (com Maíra Freitas), “Paisagem na Janela” (com Michele Leal) e “Quem Sabe Isso Quer Dizer Amor” (com Moska). Vale a pena conhecer!

RUBENS LISBOA é compositor e cantor.
Apresenta o programa "Musiqualidade", veiculado pela 104,9 Aperipê FM, todos os sábados das 13 às 15 horas.
Quaisquer críticas e/ou sugestões a este blog serão bem-vindas e poderão ser enviadas para o e-mail: rubens@infonet.com.br

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