Musiqualidade

R E S E N H A

Cantora: JUSSARA SILVEIRA
CD: “PEDRAS QUE ROLAM, OBJETOS LUMINOSOS”
Gravadora: DUBAS / UNIVERSAL

A cantora Jussara Silveira (que é mineira, embora tenha fincado raízes na vizinha Bahia) vem construindo sua carreira de forma coerente, longe da mídia e dos modismos musicais. Dona de voz afinada e timbre claro, ela vem lançando discos com regularidade e, se no começo da carreira, dedicou um álbum inteiro à obra de Dorival Caymmi, recentemente fez chegar às lojas, através da gravadora Dubas Music, um disco em que se volta para dez canções compostas pela dupla de compositores Beto Guedes e Ronaldo Bastos (o primeiro é mineiro e o segundo, fluminense), ambos egressos do movimento que ficou conhecido como Clube da Esquina.
Produzido a quatro mãos pelo pianista Sacha Amback e pelo percussionista Marcelo Costa (músicos que já há algum tempo vêm trabalhando no estúdio e nos palcos com Jussara), o CD teve o seu repertório selecionado meio a meio entre belas músicas que já se entranharam no inconsciente coletivo nacional e boas canções que, por motivos ignorados, não resultaram muito conhecidas. No primeiro caso, além de “Lumiar” e “Sol de Primavera”, as quais se tornaram indissocialmente associadas aos registros originais do próprio Beto Guedes, estão “Amor de Índio”, “O Sal da Terra” e “A Página do Relâmpago Elétrico”. E embora esses três temas já tenham sido eternizados através de irrepreensíveis gravações feitas por Milton Nascimento, Simone e pela banda RPM, respectivamente, terminam por ganhar novas nuances com o canto seguro e suave de Jussara. Ela, que quase nunca se faz afeta a grandes arroubos interpretativos, vem ultimamernte se mostrando aberta a novas experimentações, fato que se torna bastante salutar posto que um dos grandes perigos que rondam qualquer artista é a acomodação.
Cercada por instrumentistas do primeiro time da nossa MPB, tais como Zeca Assumpção (no baixo acústico), Alberto Continentino (no baixo elétrico), Tuco Marcondes (ao violão), Milton Guedes (na gaita) e Jaques Morelenbaum (no cello), Jussara parece à vontade tanto em momentos mais contundentes (caso de “Pedras Rolando”, a faixa de abertura, e de “Rio Doce”, criada por Guedes e Bastos ao lado de Murilo Antunes) como em outros que poderiam soar monótonos se não impregnados por uma dosagem exata de técnica e emoção (e aqui se situam “O Amor Não Precisa”, composta com a colaboração de Ricardo Milo, e “Choveu”, que surge com a inserção dos versos de “Zorongo”, de Federico Garcia Lorca, declamados por Leonel Pereda).
No entanto, talvez o grande destaque do disco seja a potentosa versão feita para “Tanto”, canção que já ganhou belo registro anterior a cargo de Fafá de Belém, mas que agora soa definitiva com um arranjo que, ao final, vai crescendo em intensidade e altura de notas.
Enfim, um CD bem legal que merece ser conhecido, especialmente para os aficcionados na música mineira de qualidade. Corra, ouça e divulgue!

N O V I D A D E S

* Na próxima quinta-feira, dia 17, a partir das 20 horas, no Museu da Gente Sergipana, estará se realizando a final do Festival “Um Banquinho, uma Canção”. Os classificados João Mário, Luiz Fontineli, Ronise Ramos, Giló Santana, Gustavo Mattos, Silvio Rocha, Gabriel Gois, Fernando Crateús e Sena estarão disputando prêmios que variam de R$ 500,00 a R$ 5.000,00. Trata-se de uma louvável iniciativa da Secult com o apoio cultural do Banese. A gente se vê por lá!

* O terceiro CD solo de Tó Brandileone, integrante do quinteto paulistano 5 a Seco, está chegando às lojas. Intitulado “Eu Sou Outro”, foi gravado pelo artista paulistano com o percussionista Zé Luis Nascimento. O repertório é inteiramente autoral.

* Depois que saiu da banda Titãs e optou pela carreia solo, o cantor e compositor Nando Reis veio construindo sua carreira em ciclos. E se, em um primeiro momento, ele conseguiu engatar apoteóticos sucessos na voz de Marisa Monte, foi com grandes registros de canções suas feitas pela saudosa Cássia Eller que ele conheceu, de fato, o reconhecimento popular, o que lhe possibilitou uma abertura maior para os seus discos que, de uns tempos para cá, vêm sendo construídos com a marcante presença dos músicos da banda que o acompanha denominada Os Infernais. Assim, soa curioso vê-lo em um projeto em que se ouve unicamente o seu violão, que é o que ora ocorre no recém-lançado CD “No Recreio – Volume 1”, o qual chegou às lojas através da gravadora Deck Discos. Produzido por ele próprio, o álbum se faz composto por quatorze faixas e foi gravado ao vivo durante apresentação realizada em abril deste ano no Citibank Hall, em São Paulo. Nando não é o que pode ser chamado de um artista vocacionado para o canto (suas criações invariavelmente crescem em vozes alheias), mas, no geral, ele termina dando conta direitinho do recado. Alguns dos seus hits – é claro! – estão lá, caso de “As Coisas Mais Lindas”, “Os Cegos do Castelo”, “Diariamente”, “Relicário” e “All Star”, mas o set list se abre também para outros bons temas, a exemplo de “N”, “Lamento Realengo”, “Sutilmente”, “Sei” e “Pra Você Guardei o Amor”.

* “Violar” é o título do álbum do coletivo paulistano Instituto que acaba de chegar ao mercado sob a produção de Rica Amabis e Tejo Damasceno. O repertório contempla homenagem ao cantor e compositor pernambucano Chico Science em “Alto do Zé do Pinho”. Há as participações de Criolo, Tulipa Ruiz, Jorge Du Peixe, Curumin, Juçara Marçal e Otto, entre outros.

* A tempo de comemorar os quarenta anos de carreira de Miúcha, a Warner Music está repondo em catálogo o CD homônimo que a artista lançou originalmente em 1988 pela gravadora Continental sob a direção musical do violonista Luiz Cláudio Ramos. A voz grave e aveludada da cantora (irmã de Chico Buarque) está toda lá em um repertório de onze faixas que priorizou parcerias de Guinga com Paulo César Pinheiro (“Chorando as Mágoas”, “Por Gratidão”, “Porto de Araújo” e a genial “Non Sense”), mas que conta também com canções assinadas por Jards Macalé (“Anjo Exterminado”, parceria com Wally Salomão, imortalizada na voz de Maria Bethânia) e Vinicius de Moraes (“Valsa dos Músicos”, feita com Mutinho). Há as participações especiais de Bebel Gilberto (filha de Miúcha com João Gilberto) em “Saudosismo” (de Caetano Veloso) e de Pablo Milanés na autoral “Buenos Dias, América”. A reedição do álbum traz como bônus a bonita “Fonte Abandonada” (outro tema que é fruto da parceria de Guinga com Pinheiro).

* A cantora carioca Eline Porto está lançando seu primeiro EP, composto de cinco músicas e produzido por Ary Sperling. “De Caso com Acaso” traz quatro temas autorais, além de “Você Agora Depois”, de Dudu Falcão.

* Ambos com carreiras influenciadas pelo Clube da Esquina, espécie de movimento musical mineiro que catapultou para a fama nomes como Milton Nascimento, Beto Guedes, Lô Borges, Wagner Tiso e Fernando Brant, o compositor e violonista Toninho Horta e a cantora Alaíde Costa uniram os seus talentos no CD “Alegria É Guardada em Cofres, Catedrais”, um produto independente que chegou recentemente ao mercado sob a produção de Geraldo Rocha. O repertório de onze faixas se faz aberto pela instrumental “Nos Tempos do Paulinho” (de Toninho) e foge da rota mineira unicamente na releitura de “Sem Você” (de Tom Jobim e Vinicius de Moraes). Nos demais momentos, o caminho segue tranquilo com a bela e afinada voz de Alaíde (em forma, ainda que sobre ela pesem os recém-completados oitenta anos) sendo conduzida pelos acordes precisos de Toninho, um mestre em harmonias complexas, que se reveza entre o violão e a guitarra. Entre temas pra lá de batidas, a exemplo de “Travessia” (de Milton e Brant), “Sol de Primavera” (de Beto Guedes e Ronaldo Bastos) e “Nascente” (de Flávio Venturini e Murilo Antunes), o álbum se abre a bonitas canções menos conhecidas pelo público em geral, caso do samba “Aqui, óh!” (de Toninho e Brant), de “Bons Amigos” (de Toninho e Bastos) e de “Saguin” (assinada solitariamente por Toninho). Um CD formatado no tempo da delicadeza que certamente agradará aos mais exigentes ouvidos!

* Através do selo SESC, será lançado no próximo ano um novo CD do quarteto vocal MPB-4. Com apenas dois integrantes da formação original, o grupo encontra-se em estúdio gravando as treze faixas que comporão o inédito repertório com arranjos do pianista Gilson Peranzzetta. Dentre os compositores selecionados estão Joyce Moreno e Paulo César Pinheiro. Quem viver ouvirá!

RUBENS LISBOA é compositor e cantor.
Apresenta o programa "Musiqualidade", veiculado pela 104,9 Aperipê FM, todos os sábados das 13 às 15 horas.
Quaisquer críticas e/ou sugestões a este blog serão bem-vindas e poderão ser enviadas para o e-mail: rubens@infonet.com.br

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