R E S E N H A
Cantor: ALEX SANT’ANNA
CD: “ENQUANTO ESPERA”
Selo: DISCO DE BARRO
O compositor e cantor baiano Alex Sant’anna já é sergipano de coração não apenas pelo tempo considerável que reside em Aracaju, mas principalmente porque foi por aqui que ele formatou o seu talento musical. E se não optou, em sua obra, pelo axé e baticuns característicos de seu Estado natal, também não o baseia em pesquisas folclóricas sergipanas, coisa tão em voga entre os nossos artistas. No entanto, esses elementos e muito mais lhe servem de referências para condimentar sua eclética efervescência criativa, conforme se pode constatar através da audição do seu segundo e recém-lançado CD solo intitulado “Enquanto Espera”, o qual chegou há pouco ao mercado através do selo Disco de Barro.
Produzido pelo irmão, o tecladista Leo Airplane, o álbum mostra um incontestável avanço quando comparado a “Aplausos Mudos, Vaias Amplificadas”, gravado em 2004, tanto no quesito das composições quanto no lado intérprete. Nesse espaço de mais de uma década, é fato que ele, sempre ativo como componente da banda NaurÊa, não se esqueceu de sua trajetória individual, tanto que lançou dois EPs (“Cansado”, em 2011, e “Fragmentos”, em 2012), mas igualmente é verdade que devia aos seus fãs um trabalho inteiro como o que ora apresenta.
Composto por uma dúzia de faixas, onze delas autorais (a exceção é a soturna “A Culpa”, de Márcio de dona Litinha, que traz ecos de Zeca Baleiro e ganha arrebatadora interpretação especialmente em seu terço final), o disco mostra parcerias em apenas três momentos: no reggae “Tralha” (composto com Marco Vilane), no pop rock “Verniz” (feito com a esposa e atriz Diane Veloso) e no hard mantra “Cansado” (criado ao lado do já citado Márcio de dona Litinha).
Cercado por uma banda afiada, formada por alguns dos melhores músicos sergipanos da atualidade (caso de Arnaldo Silva na bateria, Betinho Caixa d’Água na percussão, Luiz Oliva e Allen Alencar nas guitarras e Rafael Ramos, Rafael Findans e Robson Lira nos baixos, além de Leo Airplane nos teclados), Alex construiu um CD muito bacana, o qual já garantiu seu espaço entre os melhores lançados por estas plagas.
Com destaque para os arranjos muito bem concebidos, há que se registrar a inclusão de músicas com inequívoco potencial para ganhar o gosto popular, desejo maior de todo artista. Inspirado artífice em melodias, mormente na criação de refrões que, em sua grande parte, se fazem por marcar desde a primeira audição, Alex não tenta complicar nem reinventar a roda e, por isso mesmo, o disco desce redondinho, gerando vontade de ouvi-lo repetidamente.
Já na homônima faixa de abertura, ele se apega a tema atual que faz parte dos questionamentos, angústias e anseios de todos (“Espera adormecer / Espera levantar / Quem vai chegando, vai ficando atrás”), o que se repete logo em seguida em “Impreciso” (“Tem dias que eu só preciso respirar”). E se na ótima “O que Eu te Peço”, mostra o lado romântico, na bonita “O Dono da Dor” revela, em poucas e precisas palavras, a urgência humana em se livrar do que incomoda.
Mas a vida é cíclica em seus movimentos e, ciente disso, o artista intercala o trabalho sério com momentos de bom humor. Embora de forma crítica, isso se faz presente em “Engolindo Sapo”, canção com grandes chances radiofônicas. E também com a contagiante “A Marcha da Coceira”, criada originalmente para integrar trilha de peça teatral e que, como bônus track, fecha o disco em alto astral.
Impossível, contudo, esquecer-se das duas pérolas que reluzem no repertório: a inspirada “Ileso” (“Tem que fazer sorrir / Pode até fazer chorar / Só não pode sair ileso daqui”) e a criativa “Em Círculos” na qual relata de maneira inteligente e delicada a insana tentativa de superação da amante após a perda amorosa (“Mirou o céu, mirou o mar / Dispensou o salto em algum lugar a girar / Mirou o céu, mirou o mar / E entrou na dança sem um par a girar”).
Viabilizado através de financiamento coletivo, o novo CD de Alex Sant’anna é um daqueles projetos que merece ser ouvido, curtido e compartilhado. Se você ainda não o conhece, corra e ouça-o!
N O V I D A D E S
* Com canções gravadas por grandes intérpretes da nossa MPB, Fátima Guedes, depois de dezesseis anos longe do mercado fonográfico, acaba de lançar, através da gravadora Fina Flor, o seu novo CD intitulado “Transparente”. Dona de um estilo único de cantar, a própria artista assina a produção do álbum ao lado de Bororó. São quatorze faixas autorais, sendo apenas quatro inéditas (a canção- título, “Ética”, “Sempre Bate o Sol” e “Lua de Cereja”). Há novas versões de canções que se tornaram sucesso em sua voz, como é o caso de “Cheiro de Mato” (agora em andamento bem mais lento que a gravação original), “Faca” e “Minha Nossa Senhora”, e regravações de músicas que já se tornaram antológicas nas vozes de Elis Regina, Leila Pinheiro, Simone e Maria Bethânia (“Onze Fitas”, “A Vida que a Gente Leva”, “Condenados” e “Flor de Ir Embora”, respectivamente). Em plena forma vocal, Fátima conta, nesse novo trabalho, com músicos de primeiríssima qualidade (conforme se pode constatar da ficha técnica) e traz, como cereja do bolo, as participações especiais de Dori Caymmi e do grupo vocal Arranco de Varsóvia, cada um em dois momentos distintos. Completam o repertório as canções “E Agora”, “Criatura” e “Ela”. Vale super a pena conhecer!
* O show que Maria Bethânia realizou em 2004, logo após o lançamento, no ano anterior, do seu CD “Brasileirinho” apenas chegou às lojas, naquela oportunidade, no formato DVD. Mas os fãs da cantora baiana já podem comemorar porque a gravadora Biscoito Fino, visando às compras natalinas, está fazendo chegar às lojas, embora tardiamente, o registro do mesmo espetáculo, desta feita em CD. Trata-se de um dos melhores títulos da Abelha Rainha!
* Já os apreciadores de Gal Costa aguardam para 2016 o lançamento dos registros, em CD e DVD, do show no qual a cantora mergulhou de cabeça na obra de Lupicínio Rodrigues. Deverá sair também no próximo ano um registro audiovisual do elogiado show “Estratosférica”. A propósito, uma gravação do espetáculo foi feita no Tom Brasil (SP) no mês de novembro próximo passado, mas não se sabe se será essa a que de fato irá chegar ao mercado ou se a baiana ainda fará outra que, em sendo o caso, se transformará na definitiva. A conferir!
* O selo Discobertas está repondo em catálogo, embalados num mesmo box e devidamente remasterizados, os três primeiros discos do cantor e compositor Fábio Jr., os quais foram lançados originalmente em 1979, 1981 e 1982. São daquela época bonitas canções que marcaram a trajetória do artista, tais como a autoral “Pai”, “O que É que Há?” (parceria dele com Sérgio Sá), “Seu Melhor Amigo” e Enrosca (ambas de Guilherme Lamounier). Apropriado para as novas gerações!
* Um delicado fio de voz é o que caracteriza o canto bonito e afinado de Ana Cláudia Lomelino, também vocalista da banda Tono, cantora que está lançando o seu primeiro CD solo através da gravadora Joia Moderna. Intitulado “Mãeana” (também o nome de interessante canção de Rubinho Jacobina), o disco foi produzido por Bem Gil (um dos filhos de Gilberto Gil) e conta com quatorze faixas formando o coeso repertório. Destas, três foram compostas pela própria artista ao lado de parceiros, destacando-se “Pérola-Poesia” (feita com o baterista Domenico Lancellotti). Da lavra alheia, os melhores momentos ficam por conta da boa parceria de Cézar Mendes com Quito Ribeiro (“Colo do Mundo”) e das criações de duas mulheres: Luana Carvalho (“Mãe Ímã”) e Letícia Novaes (“Conchinha”), não obstante o set list contar com inéditas de Caetano Veloso (“Não Sei Amar”) e Adriana Calcanhotto (“Bem Feito”). O sergipano Mestrinho é nome recorrente na ficha técnica, arrasando como sempre com o seu acordeão iluminado.
* O grupo paulistano Funk Como Le Gusta está voltando ao mercado fonográfico com o lançamento do quarto álbum. Trata-se de “A Nave-Mãe Segue Viagem…”, disco produzido pelo guitarrista Emerson Villani. Para os aficcionados em suingue funk-soul, o produto se revela como um prato e tanto.
* Gravado com recursos obtidos junto ao programa Rumos Itaú Cultural, chegou recentemente às lojas o segundo CD da cantora paranaense Janaina Fellini. Intitulado “Casa Aberta”, o álbum conta com dez faixas, as quais foram produzidas por Beto Villares e arranjadas por Letieres Leite. Dona de voz de belo timbre, segura e afinada, a artista já há algum tempo merece ver o seu talento reconhecido além das fronteiras de sua aldeia. Antenada, ela formou o repertório juntando canções de artistas emergentes da cena indie nacional (a exemplo de César Lacerda, Lucas Santtana e Lirinha, de quem pescou as boas “Infinita Efêmera”, “É Sempre Bom se Lembrar” e “Preta”, respectivamente) com convincentes regravações de belos temas assinados por Gilberto Gil (“O Seu Amor”) e Itamar Assumpção (“Sutil”). Ótimos momentos ficam por conta de “Promessa” (de Bruno Capinan e Luisão Pereira), “Sol das Lavadeiras” (de Zé Manoel e Mavi Pugliesi) e “Quem” (outra de Itamar Assumpção, agora em parceria com Alice Ruiz). Apenas a inspirada canção “Árida” é uma criação da própria Janaina, mas feita com Bernardo Bravo, Estrela Leminski, Téo Ruiz e o já citado Beto Villares, o qual surge nos vocais como convidado especial. Altamente recomendável!
* Intitula-se “A Fúria do Mar” o novo CD de Maurício Baia, cantor e compositor baiano que se faz radicado há anos no Rio de Janeiro. O repertório alinha músicas inéditas autorais com regravações de composições de Gabriel Moura e Pedro Luís, entre outros. Produzido pelo guitarrista Shilon Zygiel, o álbum tem como primeira faixa de trabalho a música “Ladrão que Rouba Ladrão” (de Baia com Gustavo Macacko e Luciano Luck).
* E o nosso blog, como não poderia deixar de ser, deseja a todos os leitores um Feliz e Santo Natal! Que o espírito da verdadeira fraternidade chegue ao coração dos homens e que o Cristo Jesus abençoe seus irmãos, trazendo-lhes saúde, paz, amor, sabedoria e luz!
RUBENS LISBOA é compositor e cantor.
Apresenta o programa "Musiqualidade", veiculado pela 104,9 Aperipê FM, todos os sábados das 13 às 15 horas.
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