R E S E N H A
Cantor: FILIPE CATTO
CD: “TOMADA”
Gravadora: INDEPENDENTE
Talvez o melhor cantor dentre os tantos que vêm surgindo de uns cinco anos para cá, o gaúcho Filipe Catto, após uma elogiada estreia com o álbum Fôlego, lançado em 2011, acaba de fazer chegar ao mercado, de maneira independente, “Tomada”, o seu segundo CD de estúdio (entre ambos se fez disponibilizado, em 2013, o registro ao vivo intitulado “Entre Cabelos, Olhos e Furacões”).
Longe de conceitos e métodos impostos pelas grandes gravadoras, trata-se esse novo trabalho de um disco inteiramente concebido pelo artista, o qual convidou o produtor da hora, Kassin, para formatá-lo e, como de costume, este o fez arregimentando músicos com quem possui grande entrosamento pessoal e artístico, caso de Domenico Lancellotti (na bateria), Danilo Andrade (nos teclados), Pedro Sá e Luiz Carlini (nas guitarras). Artista também em ascensão no meio musical, o paraense Felipe Cordeiro participa em quatro faixas com sua característica guitarra nortista (nestas, inclui-se a faixa escondida “Paloma Negra”, de Tomás Mendez Sosa, que surge alguns segundos após o término da última canção).
Oficialmente, o CD se faz composto por onze faixas e nelas Catto se mostra de fato um intérprete especial e ousado. É que, em gravações de estúdio, se faz convenção que o artista deve cantar as músicas de forma limpa, isso para facilitar o entendimento dos ouvintes, deixando quaisquer variações intencionais e melódicas para o palco. Catto, no entanto, em vários momentos já sai da linha melódica básica nesses registros, mostrando pleno conhecimento do que está cantando.
Dono de voz aguda e afinada, ele possui presença cênica convincente, mas não à toa e para não se repetir, embora também venha se revelando um bom compositor, incluiu apenas quatro temas autorais no recém-lançado projeto, duas delas criadas solitariamente (“Dias e Noites” e “Pra Você me Ouvir”) e duas feitas com os novos parceiros Moska (a ótima “Depois de Amanhã”) e Pedro Luís (a bonita “Adorador”, cujo arranjo se ressente de um maior peso).
Entre abordagem calma de tema gay composto por Caetano Veloso (“Amor Mais que Discreto”) e momento de pegada roqueira em que faz lembrar Cazuza (“Um Milhão de Palavras”, de Fernando Temporão e César Lacerda), Catto apresenta duas medianas composições de Thalma de Freitas: “Auriflama” e “Íris e Arco” (a primeira gerada sobre versos do escritor angolano José Eduardo Agualusa e a segunda resultante de parceria com Gui Held e Tiganá Santana). Também são apresentadas oportunas versões para a recente “Canção e Silêncio” (de Zé Manoel) e para a oitentista “Do Fundo do Coração” (de Ticiana Barros e Julio Barroso, pescada do repertório da banda Gang 90 e que conta com a participação especial da cantora Ava Rocha). Nada, contudo, que beire a lindeza que permeia “Partiu”, pérola pop de Marina Lima que participa da faixa tocando violão. Fosse somente por essa canção, o disco já teria valido a pena. Corra e ouça, portanto!
N O V I D A D E S
* Artista desde sempre polêmico, o baiano Tom Zé (que se tornou conhecido por fazer parte do movimento tropicalista capitaneado por seus conterrâneos Caetano Veloso e Gilberto Gil e depois caiu no ostracismo, só tendo voltado à voga quando redescoberto pelo produtor norte-americano David Byrne) tem colecionado inúmeros adeptos ao longo de sua trajetória, muito embora, pelo fato de sua obra não ser em geral de fácil assimilação, exista muita gente que não gosta do seu trabalho. Mas o fato é que, preferências pessoais à parte, Tom se mostra criativo desde o primeiro momento e, já há algum tempo, merecia ter um tributo em vida. Essa lacuna acaba de ser preenchida com o lançamento, no apagar das luzes de 2015, do ótimo CD “Multiplicar-se Única”, gravado pela cantora paulistana Regina Machado de forma independente sob a produção do competente Dante Ozzetti. Ele, que também assina os inspirados arranjos das nove canções escolhidas para compor o álbum, é o responsável maior pelo resultado alcançado que soa acima da média. Regina é realmente uma cantora muito boa e o fato de, tempos atrás já ter trabalhado com o homenageado como backing vocal, decerto a ajuda a entender suas invencionices. O repertório, logica e sabiamente, contempla canções construídas dentro de um formato mais tradicional e, nesta seara, se destacam a bela “Lua-Gira-Sol”, a ótima “Solidão” (que já fora gravada anteriormente com o título de “Só”) e o samba “Tô” (parceria com Elton Medeiros), mas o mais interessante é constatar que músicas originalmente experimentais, a exemplo de “Complexo de Épico” e “João nos Tribunais”, terminam, sob novas luzes, por ganhar contornos bem interessantes. Igualmente em temas mais conhecidos como “O Amor É Velho-Menina” e “Menino Jesus” se fazem descobertas novas nuances e isso se torna salutarmente agradável. Suzana Salles e Wandi Doratiotto surgem como convidados especiais em “Augusta, Angélica e Consolação”. Um CD pra lá de legal que merece ser ouvido e divulgado!
* Caberá à gravadora Universal o lançamento, em 2016, do próximo CD de Paulo Ricardo, o qual se intitulará “Novo Álbum” e trará várias canções inéditas e autorais no repertório. Quem viver ouvirá!
* O grupo paulistano de percussão corporal Barbatuques lançou recentemente, encartado em um livreto, o CD intitulado “Ayú”. Trata-se de um excelente painel do trabalho que vem sendo desenvolvido pelos seus quinze componentes (nove homens e seis mulheres), dentre eles os mais conhecidos Marcelo Pretto, Lu Horta e Taís Balieiro. Com a direção musical a cargo de Fernando Barba e Carlos Bauzys, o álbum apresenta o resultado de um trabalho de pesquisa que acomoda várias influências recolhidas pela estrada e conta com as participações especiais do pernambucano Naná Vasconcelos (em “Kererê” e “Tá na Roda”) e do alagoano Hermeto Pascoal (em “Lá na Casa da Madame Eu vi” e na faixa escondida “Galo Cantou”). Embora a maioria das canções não sejam letradas, há exceções como a ótima “Na Mata” (de já citado Barba) e “Você Chegou” (de André Hosoi e Renato Epstein, composta para o filme “Rio 2”, do cineasta Carlos Saldanha, a qual surge como bônus track). Alguns dos melhores momentos ficam por conta de “Skamenco”, “Totem”, “Tudo Fica” e “Barra do Dia”. Muito legal!
* O cantor, compositor e pianista Sérgio Sá já tem pronto para ser lançado no próximo ano o CD “Sérgio S/A”. O repertório desse novo projeto vai apresentar quinze músicas inéditas e autorais, dez delas gravadas com convidados. Estão lá, entre outros, Gilberto Gil, Elba Ramalho, Zeca Baleiro, Vânia Bastos e Carlos Navas. A conferir!
* Amigos de há muito na vida pessoal e adeptos artisticamente do som ruralista, os cantores e compositores Almir Sater e Renato Teixeira unem os seus talentos no CD “AR”, recém-lançado pela gravadora Universal. São dez faixas inéditas compostas pelos artistas, algumas resultantes de parcerias entre eles, as quais foram produzidas pelo próprio Almir ao lado de Eric Silver entre o Brasil e os Estados Unidos. Com destaque para a harmonização das vozes dos dois, os melhores momentos do repertório apresentado ficam por conta de ”A Flor que a Gente Assopra”, “Bicho Feio”, “O Amor Tem Muitas Maneiras” e “Noite dos Sinos”.
* O disco de estreia da Meia Banda, o quarteto carioca formado por Bruno Di Lullo, Domenico Lancellotti, Eduardo Manso e Estevão Casé, está sendo distribuído em formato físico, um ano após estar disponível em plataformas digitais. Nele, há as participações especiais de Dado Villa-Lobos, Danilo Caymmi, Moreno Veloso, Ney Matogrosso, Pedro Baby e Pedro Sá.
* É incrível como tudo o que a cantora e compositora fluminense Zélia Duncan se propõe a executar, ela faz muito bem feito. A mais corajosa das artistas brasileiras da atualidade (dona de bela voz grave afinada, ora em sua melhor forma), ela ocupou por anos o posto de diva pop nacional, tendo em seguida se transformado em outras e se tornado mutante, além de ter dividido o palco com a cigarra Simone e mergulhado de cabeça nas obras dos compositores Itamar Assumpção e Luiz Tatit. Eclética, ela pôs recentemente no mercado mais um projeto ambicioso. Trata-se do CD intitulado “Antes do Mundo Acabar”, lançado pela gravadora Biscoito Fino, no qual mostra como também lhe soa familiar o gênero mais genuíno do Brasil. São quatorze sambas compondo o inatacável repertório, dez deles inéditos e nove criados pela própria Zélia ao lado dos parceiros Bia Paes Leme (responsável pela produção musical do disco), Arlindo Cruz, Zeca Baleiro, Pedro Luís, Xande de Pilares e Ana Costa (estes dois últimos também presentes, como convidados especiais, na atual “No meu País” e na bela “Pra Quem Sabe Amar”, respectivamente). Com sonoridade acústica e arranjos assinados pelo violonista Marco Pereira (que arregimentou poucos e excepcionais instrumentistas, a exemplo de Webster Santos ao violão, Thiago da Serrinha na percussão, Gabriel Grossi na gaita, Rogério Caetano no violão 7 cordas e Luís Barcelos no bandolim e cavaquinho), o álbum se destaca desde já na discografia da artista, especialmente porque há novas músicas realmente muito bacanas, caso das autorais “Dormiu, Mas Acordou”, “Olha, o Dia Vem Aí”, “Eu Mudei” e “Um Final”, as quais se sobressaem de imediato como alguns dos melhores momentos do set list, ao lado de “Por Água Abaixo” (inédito samba composto para Zélia por Pretinho da Serrinha, Leandro Fab e Fred Camacho). Há ainda ótimas regravações de temas assinados por Paulinho da Viola (“Pintou um Bode”), Riachão (“Por Que Você Não me Convida Agora?”), Dona Ivone Lara (“Em Cada Canto uma Esperança”, feita com Délcio Carvalho) e “Vida da Minha Vida” (de Moacyr Luz, parceria com Sereno, em registro mais suave que o propagado na voz de Zeca Pagodinho). Um CD de fato necessário e obrigatório!
* O registro ao vivo do show realizado no mês passado no Teatro Net Rio pela cantora Teresa Cristina no qual, acompanhada pelo violão de Carlinhos Sete Cordas, deu voz a belas canções compostas por Cartola chegará às lojas no primeiro semestre do próximo ano. Torna-se então, desde já, um lançamento bastante aguardado…
* E o blog deseja a todos os que nos acompanham um Feliz Ano Novo! Que 2016 venha repleto de bênçãos divinas e que possamos desfrutá-lo com saúde, paz, amor, sabedoria e muita música!
RUBENS LISBOA é compositor e cantor.
Apresenta o programa "Musiqualidade", veiculado pela 104,9 Aperipê FM, todos os sábados das 13 às 15 horas.
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