R E S E N H A
Cantora: MÍRIAM MARIA
CD: “RAMA”
Selo: PÔR DO SOM
Embora ainda pouco conhecida pelo público em geral, a cantora Míriam Maria, que estudou canto lírico por oito anos, enveredou pelos rumos da música nos anos noventa do século passado quando integrou os grupos Canastra e Orquídeas do Brasil, este capitaneado pelo já lendário Itamar Assumpção. Em 1999, atuou na ópera moderna "Clara Crocodilo", de Arrigo Barnabé, e, de lá para cá, vem participando de discos de nomes como Chico César, Zé Miguel Wisnik, Zeca Baleiro e do grupo Mestre Ambrósio.
Em seu primeiro disco solo, lançado em 2000 e intitulado "Rosa Fervida em Mel", ela mostrou de cara sua grande versatilidade ao interpretar músicas de compositores aparentemente díspares como Lenine, Gordurinha e Tom Zé. Passaram-se oito anos para que ela voltasse ao mercado fonográfico e tal se deu com o álbum "Sem Pensar nem Pensar", feito em parceria com o músico e compositor Sergio Molina e cujo repertório se fez majoritariamente formado por melodias deste, criadas sobre letras do mencionado Itamar.
Gravado em estúdios paulistas entre 2003 e 2012, somente agora aporta nas lojas, através do selo Pôr do Som, o novo CD de Míriam. Trata-se de “Rama”, produzido pela percussionista Simone Sou ao lado de Danilo Moraes e Chico César e que, segundo consta do encarte, se fez possível devido à colaboração dos músicos participantes que acreditaram no projeto.
É, na realidade, um trabalho diferente que se sobressai em meio a tantas modernidades indóceis que vêm aparecendo por aí todas as semanas. Em primeiro lugar porque Míriam canta de fato (é dona de bela voz, aguda e afinada, que transporta o ouvinte sempre para a emoção certa). Depois, porque ela soube se cercar de instrumentistas que enxergam a música como propulsora de ideias e não somente como ganha-pão (estão presentes, entre outros, feras como Fernando Nunes no baixo, Tiquinho no trombone, Hugo Hori na flauta, Zé Pitoco no clarinete, Gustavo Ruiz no cavaquinho e Gabriel Levy no acordeão). E ainda pelo fato de que a sonoridade não usual adotada, acústica e potente nas medidas certas, serviu como uma luva para dar vida às canções por ela escolhidas.
Composto por uma dezena de faixas, o álbum conta, ao final, com a faixa bônus “Filho de Santa Maria” (de Itamar Assumpção e Paulo Leminski) em registro personalíssimo que rivaliza com a gravação atemporal feita por Zizi Possi em 1996. Três das dez canções são assinadas pelo aqui multicitado paraibano Chico César (a interessantíssima inédita “Bauhaus” – parceria com Tata Fernandes e que conta com a participação especial, nos vocais, de Tião Carvalho -, “Na Rama” e “Moer Cana”) e duas pelo paulista Kleber Albuquerque (“Espera” e “Inequação” – esta também composta com Tata). Há um tema característico de Maurício Pereira (“Recipiente”, criado com Skowa) e uma canção do prolífico Arnaldo Antunes feita ao lado de Paulo Tatit e Sandra Peres (“Do Vento”).
Grandes momentos ficam por conta de “Ciganos” (de Zeca Baleiro e Miguel Torga, em registro que prioriza os impagáveis violões de Tuco Marcondes) e “Capitão do Mato” (simples e eficiente parceria de Vicente Barreto e Paulo César Pinheiro). Nada, contudo, supera a sublime “Luzes” (de Paulo Leminski), canção que por si só já valeria o disco inteiro e na qual a voz clara de Míriam se mistura tão somente ao piano (e efeitos) a cargo do mago Sacha Amback.
Um CD, enfim, que merece ser conhecido e uma cantora cujo talento precisa ser valorizado. Corra, ouça e divulgue!
N O V I D A D E S
* Com a produção musical assinada pelo filho Jonas Tatit, chegou há pouco às lojas o novo CD do cantor e compositor paulistano Luiz Tatit, o sexto solo de sua coerente carreira, iniciada com o Grupo Rumo no início da década de oitenta. Intitulado “Palavras e Sonhos”, é um lançamento da gravadora Dabliú Discos e revela um momento inspirado do artista que se notabilizou pelas suas letras longas e criativas e pelo seu canto falado. Composto por treze faixas autorais, seis delas compostas com colaboradores, o disco, que reitera o estilo próprio de Tatit, conta com as participações especiais de Juçara Marçal (em “Tristeza do Zé”, feita com Zé Miguel Wisnik), da moçambicana Lenna Bahule (em “Musa da Música”, criada com Dante Ozzetti), de Marcelo Jeneci (em “Estrela Cruel”, assinada pelos dois) e de Ná Ozzetti (em “Planeta e Borboleta”). Outros destaques do repertório majoritariamente inédito ficam por conta de “Mais Útil”, “Diva Silva Reis”, “Feitiço da Fila” e “Do Meu Jeito” (parceria com Vanessa Bumagny).
* O cantor e compositor Moyseis Marques lançou recentemente, ainda que por enquanto somente em formato virtual, o EP intitulado “Made in Brasil”, o qual se faz composto por seis músicas inéditas e autorais. Idealizado, produzido e arranjado pelo próprio, o projeto vai além do samba, passeando também por terrenos nordestinos. Há parcerias com Nei Lopes (“Profissional”), Bena Lobo (“A Barca dos Corações Partidos”) e Vidal Assis (“Madeixa”). A bela voz da cantora e atriz Laila Garin toma a linha de frente em “Juntando os Cacos”.
* Vale a pena conhecer “Festejo”, o CD que a Orquestra de Sopros ProArte lançou para comemorar os vinte e cinco anos do Projeto Flautistas da ProArte e que conta com as participações de Egberto Gismonti, Gilberto Gil, Guinga, João Bosco e Júlia Vargas, além dos músicos Carlos Malta (flauta), Marcelo Caldi (acordeão) e Nicolas Krassik (violino). Arranjos primorosos emolduram um repertório selecionado a dedo que contempla antológicas canções como “Coisa Feita”, “Domingo no Parque”, “Milagre dos Peixes”, “Corsário” e “Expresso 2222”.
* O cantor e compositor pernambucano Johnny Hooker estará realizando, em 21 de abril na casa Classic Hall, no Recife (PE), um show especial que dará origem ao seu primeiro DVD e contará com as participações especiais de Karina Buhr e Otto. Quem viver verá!
* A cantora Sandra de Sá retorna ao mercado fonográfico com o lançamento do EP “Lado B”, um produto que acaba de chegar às lojas de maneira independente com o objetivo de atualizar o seu som, trazendo-a para a geração pop atual. Composto por sete faixas (cinco delas regravações de músicas que passaram batidas em álbuns anteriores), o trabalho mostra a cantora em plena forma vocal, fazendo-se acompanhada, em cinco momentos, por convidados. Estão lá Bochecha, Xande de Pilares, Thiaguinho, o grupo Melanina Carioca e o DJ Detonna. Tentando resgatar espaço, Sandra atira em várias direções: há desde o pancadão carioca (o funk “Freneticão” que vem sendo propagado na web desde 2014) e os temas altamente dançantes (“Lucky” e “Usa e Abusa” – os melhores momentos) até as baladas românticas que a catapultaram ao sucesso nos anos oitenta (“Contrato Assinado” e a inédita “Vou Ficar”), passando pelo pagode romântico (“Perdidamente Apaixonada”) e por música que contém células de afoxé, rap e samba-soul (“Quero Ver Você Dançar”).
* O grupo de samba carioca Galocantô estará lançando em breve dois projetos: um é o terceiro CD de estúdio intitulado “Pano Verde”; o outro é o registro ao vivo do show “Galocantô canta Luiz Carlos da Vila – Kizomba, a Festa da Raça” que foi realizado em outubro do ano passado na Lona Cultural João Bosco, em Vista Alegre (RJ). O espetáculo contou com as participações de Dorina, Dudu Nobre, Gabrielzinho do Irajá e Wilson das Neves.
* Marcelo Callado começou a ver seu nome projetado na cena musical quando fez parte, como baterista, da banda Cê que acompanhou Caetano Veloso por um tempo considerável. Em 2012, ao lado da ex-mulher, a cantora Nina Becker, ele lançou o CD “Gambito Budapeste” no qual apresentava composições suas e também se aventurava na arte de cantar. Mas é com o recente lançamento do álbum “Meu Trabalho Han Sollo vol. II” (de forma paradoxal, o seu primeiro projeto solo), o qual aportou nas lojas através do selo Embolacha, que ele realmente concilia com talento esses seus dois “novos” lados. Com a produção assinada por ele próprio ao lado de Eduardo Manso e Estevão Casé, o disco desce redondo, composto por uma dúzia de faixas autorais, cinco delas criadas com o parceiro Gustavo Benjão. Há momentos muito legais mesmo, a exemplo das canções “Pau de Galinheiro”, “Música Triste”, “Olé”, “Papai Santo” e “Carambolou Arriou” (esta gravada com coro estelar que inclui Alice Caymmi, Jonas Sá e Silvia Machete, cujas vozes são regidas por Rubinho Jacobina).
* Ainda neste primeiro semestre, estará chegando ao mercado o novo CD de Zeca Baleiro. Intitulado “Era Domingo”, o álbum, um lançamento da gravadora Som Livre, está sendo formatado por vários produtores e é esperado com curiosidade pelos milhares de fãs do artista maranhense.
* Mais uma cantora tenta se firmar no panteão da nossa música nacional. Trata-se da carioca Clara Gurjão que, de maneira independente, está a lançar o CD “Ela”, o primeiro de sua carreira solo (já fez parte do grupo de samba Cabide de Molambo, do Clara Gurjão Trio e do grupo Violeiros Urbanos). Também violonista e compositora (ela assina dez das doze faixas do repertório do disco), Clara é também a responsável pela produção do álbum ao lado de Danilo Andrade, Kassin e Marcelo Costa. Dona de voz suave, límpida e bem colocada, ela conta com a participação especial da conterrânea Silvia Machete na hilária “Pequenos Segredos”. Cercada por uma banda base de responsa, a qual reúne músicos de primeira linha, tais como Danilo Andrade (teclados e arranjo vocal), Kassin (baixo), Marcelo Costa (bateria), Maurício Pacheco (guitarra) e Stéphane San Juan (percussão), Clara revê temas de Caetano Veloso (“Muito”) e de Ernesto Duarte Brito (o bolero cubano “Como Fue”). Embora haja momentos de menor inspiração (como “Rendição” e “Vou te Esperar”, esta equivocadamente escolhida como primeira música de trabalho), ao final fica uma boa impressão, mormente quando se constatam momentos autorais acima da média, a exemplo do blues “O Mundo É Tentador, Rapaz”, do tango “Leonino” e da lusitana “Canção Lisboeta”. A faixa-titulo tem como destaque o belo arranjo de metais arregimentado por Magno Souza.
* “Dance com seu Inimigo” é o sugestivo título do segundo CD da cantora e compositora Julia Bosco, filha do renomado João Bosco. Produzido pelo namorado da artista, Donatinho (filho de João Donato), o álbum trará parcerias inéditas dela com nomes como Emerson Leal, Gustavo Macacko, Juliana Sinimbú e Marcela Bellas, além de canções assinadas por Dona Onete (“Cartas Marcadas”) e Fernando Temporão (“Domingo”, composta com César Lacerda). Tulipa Ruiz surge como convidada especial do aguardado projeto.
RUBENS LISBOA é compositor e cantor.
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