MUSIQUALIDADE

R E S E N H A     1

 

Cantora: ANA CAROLINA

CD: “DOIS QUARTOS”

Gravadora: SONY & BMG

 

No ano em que se consolidou como uma das maiores vendedoras de disco do Brasil (com o álbum ao vivo que lançou ao lado de Seu Jorge), a mineira Ana Carolina ainda encontra espaço para lançar um CD duplo recheado de canções inéditas, intitulado “Dois Quartos”, numa clara alusão ao fato de serem dois discos (sub-intitulados “Quarto” – o preto – e “Quartinho” – o verde) e de se tratar do quarto lançamento solo de sua carreira.

Contratada da multinacional Sony & BMG, a artista inequivocamente é bastante talentosa (além de cantar bem, compõe legal e toca violão e pandeiro com destreza), mas decerto a força de marketing que vem recebendo regularmente tem ajudado sobremaneira sua aceitação junto a um público afoito por grandes ídolos.

Várias das canções do repertório do novo trabalho são assinadas pela própria Ana Carolina em parceria com Antônio Villeroy (que até bem pouco tempo assinava-se artisticamente Totonho Villeroy), o autor do maior sucesso da cantora até hoje, a já lendária “Garganta”. É dele, inclusive, a primeira faixa a ser executada pelas rádios, a bonita “Rosas”. As letras da maioria das canções falam de experiências amorosas: desejos e desilusões, expectativas e angústias. São poucas as exceções nesse sentido (como, por exemplo: “Nada Te Faltará”, “O Cristo de Madeira” e “Notícias Populares”).

No canto, a intérprete resolveu dosar os arroubos interpretativos e mostra-se mais contida, o que é ótimo pois sua bela voz não precisa de exageros para se destacar (e isso fica claro em canções como “Tolerância”, “Ruas de Outono”, “Carvão” e “Eu Não Paro”). Há ainda dois dispensáveis temas instrumentais (“La Critique” e “Sen.ti.mentos”) e duas músicas de alto e explícito teor erótico (“Eu Comi a Madona” e “Cantinho”), o que justifica a tarja de “desaconselhável para menores de 18 anos – conteúdo adulto” impressa na contracapa do CD. Várias das canções possuem potencial para serem inseridas em trilhas sonoras de novelas (o que, decerto, acontecerá), mas a verdade é que o resultado geral do trabalho soa um pouco irregular e confuso.

Os maiores destaques ficam por conta das faixas “Vai” (de Mona Saback), “Um Edifício no Meio do Mundo” (parceria de Ana com Jorge Vercilo), “Nega Marrenta” e “Claridade” (estas duas em parceria com Aleh).

Muito embora Ana Carolina venha registrando em diversas entrevistas que, após assumir sua bissexualidade (corroborada na faixa “Homens e Mulheres”), chegou a hora de se mostrar inteira, não deixa de ser curioso que dois quartos, matematicamente falando, seja igual a um meio, o que, na verdade, é metade. Portanto, ainda não foi agora que a cantora de fato conseguiu realizar o seu intento. Mas, quem sabe, de uma próxima vez…?

 

 

R E S E N H A     2

 

Cantora: ANNA LUÍSA

CD: “DO ZERO”

Gravadora: INDEPENDENTE

 

Assim como a mais grata revelação de 2005 foi a (praticamente) estreante intérprete potiguar Roberta Sá (com seu excelente CD “Braseiro”), este ano a surpresa mias que agradável fica por conta da cantora carioca Anna Luísa com o álbum “Do Zero”, um trabalho independente produzido por Rodrigo Vidal.

Algumas coincidências interligam as duas artistas que, não por acaso, são amigas e admiradoras mútuas. Uma delas é que, antes do boom, Roberta anteriormente havia gravado somente um disco que ficou restrito ao consumo interno dos clientes de uma empresa que o encomendou como brinde natalino. De igual forma, antes de lançar o sensacional disco que ora está chegando ao mercado, Anna Luísa havia registrado sua voz apenas no projeto “Novelas Acústico”, encampado pela DeckDisc, mas que muito pouco representou para a sua carreira. Outro fato que as une é o contato musical que mantêm com Pedro Luís (da banda Pedro Luís e a Parede), o qual, de maneira pungente, vem se fazendo presente nas carreiras das duas.

O CD recém-lançado vem temperado com estilos bem brasileiros, como maracatu, afoxé, xote, ciranda e samba, mas os arranjos tentam dar uma visão mais moderna desses ritmos. O resultado soa formidável e, ao lado de composições assinadas por novos bons nomes da MPB, Anna Luísa mostra-se também uma compositora inspirada (é só ouvir, por exemplo, as contagiantes ”Cabra-Cega” e “Serena”, ambas parcerias com Emerson Mardhine, e a contemplativa “Todo Fim”, com Eugênio Dale), e, inobstante não possua um timbre especialmente único, canta muito bem, parecendo saber de verdade onde quer chegar.

Os melhores momentos ficam por conta da já antológica faixa-título (uma azeitada parceria entre o já citado Pedro Luís e Seu Jorge), da delicada “Um Par” (de Rodrigo Amarante) e da inspirada “O Osso” (de Rodrigo Maranhão – que ainda contribui com as ótimas “Ciranda” e “Pra Tocar no Rádio”).

Enfim, um CD para ser curtido com a intensidade que merece!

 

 

N O V I D A D E S

 

·               A cantora Clara Becker (filha dos atores Walmor Chagas e Cacilda Becker e, por conseguinte, sobrinha da também atriz Cleide Yáconis) chega ao seu segundo CD homenageando dois grandes compositores brasileiros também ligados por laços de família. No álbum intitulado “Dois Maior de Grande”, um lançamento independente, a artista mostra, através de arranjos quase camerísticos, belas canções compostas por Luiz Gonzaga e Gonzaguinha. Clara, enquanto cantora, está menos para a visceralidade de Maria Bethânia e mais para a delicadeza de Nara Leão. Sua voz pequena não atrapalha o conceito do projeto, mas o timbre pouco convencional pode não agradar a todos. Cercada de músicos excepcionais, a exemplo de Benjamim Taubkin, Leandro Braga, Zeca Assumpção, Caíto Marcondes e João Lyra, Clara conta ainda, no disco, com a participação da terceira geração da musical família homenageada: o filho de Gonzaguinha, Daniel Gonzaga, divide os vocais na interessante canção “Da Vida”. Entre alguns dos bons momentos do trabalho, dá para destacar: “Com a Perna no Mundo”, “Numa Sala de Reboco” e “Questão de Fé”. A propósito: como um bom impulso inicial, a faixa “Paixão” foi incluída na trilha sonora da novela “Pé na Jaca”.

 

·               Para quem se liga nas fichas técnicas dos encartes dos discos, o nome de Cecília Spyer não é novidade. Ela já participou de inúmeros álbuns de cantores e cantoras fazendo backing vocal. Dona de uma voz suave, aveludada e afinada, Cecília está agora pondo no mercado, de maneira praticamente independente, o seu primeiro CD intitulado “Repara”. São onze faixas, das quais a cantora é autora de nove, algumas destas em parceria. As duas restantes são as regravações de “A Mim e a Mais Ninguém” (de Ângela Ro Ro e Sérgio Bandeira) e “Nem Paletó, Nem Gravata” (de Marcos Valle e Paulo Sérgio Valle). A produção do trabalho leva a chancela de Christiaan Oyens, parceiro e produtor de Zélia Duncan, o que chancela arranjos modernos e interessantes. O som abraçado por Cecília é bem bacana: pop sem ser burro, balançado sem ser alienado e é nítida a influência dos Tribalistas e do Kid Abelha sobre sua obra musical. Os bateristas Charles Gavin (dos Titãs) e João Barone (dos Paralamas) participam das faixas “A Falta Que Você Faz” e “Penso Que Eu Me Esqueço”, e Dado Villa-Lobos (da Legião Urbana) e Dadi Carvalho (da Cor do Som) dão uma força nos vocais da já citada “A Mim e a Mais Ninguém” e de “Muito Além do Jardim” (esta, o maior destaque do CD). Outros bons momentos ficam por conta da faixa-título, de “Minha Zona” e de “Abrigo”.

 

·               A cantora Maria Rita e o cantor Leandro Sapucahy já começaram a realizar, juntos, uma série de shows nos quais centram o repertório basicamente em sambas compostos por feras como Cartola, Zeca Pagodinho, Arlindo Cruz, João Nogueira, Paulo César Pinheiro e outros. É bastante provável que o projeto resulte em CD e DVD, ainda que registrados ao vivo, a serem lançados no próximo ano.

 

·               Na verdade, o CD foi lançado em 2005, mas só agora está começando a ser devidamente reconhecido, especialmente no mercado estrangeiro. Trata-se do disco intitulado “Tropical Lounge Project”, do percussionista Marcelo Salazar, uma fera na sua especialidade. O álbum é todo ele um primor, de qualidade técnica impecável, o que não é de se estranhar já que leva a assinatura do experiente e competente Arnaldo DeSouteiro na produção executiva. Lançado pela gravadora JSR, traz dezesseis faixas nas quais Marcelo comprova a sua versatilidade ímpar, acompanhado por músicos de grande porte. Algumas composições são assinadas pelo próprio artista em parceria com Roberto Menescal, Danilo Caymmi e Marcelinho da Lua e ainda há as participações especialíssimas, nos vocais, das sensacionais Ithamara Koorax e Taryn Szpilman. Imperdível!

 

·               Délcio Carvalho, um dos mais constantes parceiros de Dona Ivone Lara, está lançando, através do selo Olho do Tempo, o CD intitulado “Profissão Compositor”. É um trabalho muito bem produzido que conta com quatorze inspiradas faixas. Délcio tem voz e talento voltados para o samba e apresenta criações suas feitas em parceria com gente que entende do riscado, tais como Zé Kéti (“Religião”), Ivor Lancellotti (“Que Saudade é Essa”), Mário Lago Filho (“Sá Mariqunha”), Wilson das Neves (“Vou Sair Daqui”) e Paulo César Feital (Brasil nas Veias”).

 

·    Para comemorar os vinte e cinco anos de carreira, Zélia Duncan irá lançar, no começo de 2007 e sob a direção de Oscar Rodrigues Alves, o seu terceiro DVD, resultado do registro de seu aclamado show “Pré Pós Tudo Bossa Band”.

 

·               A gravadora Trama repõe nas lojas o último disco gravado por Elis Regina, originalmente lançado pela EMI em 1980 (e que contém clássicos como “Aprendendo a Jogar”, “Rebento” e “Sai Dessa”). Totalmente remasterizado com os equipamentos mais modernos disponíveis atualmente, além de trazer faixas bônus em que a cantora canta a capella (“Se Eu Quiser Falar Com Deus” e “O Trem Azul”) e de apresentar outras em versão instrumental (“Vento de Maio”, “Calcanhar de Aquiles” e “Só Deus é Quem Sabe”), o projeto vem embalado em uma luxuosa caixa que traz, como bônus, um DVD contendo a última entrevista dada pela Pimentinha, a qual ocorreu no Programa “Jogo da Verdade” da TV Cultura. Elis se encontrava no seu auge vocal e fica difícil imaginar o que a baixinha arretada estaria fazendo hoje, caso estivesse viva… Trata-se realmente da maior intérprete brasileira de todos os tempos!

 

·               E este colaborador deseja a todos os leitores um Feliz Natal! Que o espírito do nascimento de Cristo ilumine os seres, trazendo paz para o mundo e que os homens possam de verdade, de agora em diante, se enxergar como irmãos! Em tempo: a Coluna da próxima semana será veiculada, por motivos óbvios, na terça-feira, dia 26 de dezembro.

 

 

RUBENS LISBOA é compositor e cantor


Quaisquer críticas e/ou sugestões serão bem-vindas e poderão ser enviadas para o e-mail: rubens@infonet.com.br

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