MUSIQUALIDADE

R E S E N H A     1

 

Cantor: ROBERTO CARLOS

CD: “DUETOS”

Gravadora: SONY & BMG

 

Entra ano, sai ano e já se tornou uma tradição do povo brasileiro: todo Natal tem disco novo de Roberto Carlos na praça.

Bom… novo é maneira de se dizer, uma vez que de um certo tempo para cá o Rei vem cada vez compondo menos. Assim, tem se restringido a lançar projetos ao vivo revendo as músicas mais famosas de sua carreira ou a gravar álbuns de estúdio em que as canções inéditas quando muito chegam a duas ou três faixas.

Este ano, mais acomodado do que nunca, o Rei não fez uma coisa nem outra. Não realizou show do qual pudesse ser lançado o correspondente registro ao vivo nem entrou em estúdio para mostrar algo de novo. Mesmo assim, acaba de chegar às lojas o seu aguardado CD anual, desta vez intitulado “Duetos”.

A idéia de lançar um disco cantando com diversos convidados não é nova. Vários artistas já fizeram isso. Quando estão em um momento meio devagar em suas carreiras, trata-se de uma estratégia certeira para voltar a vender bem. Erasmo Carlos, parceiro mais constante de Roberto, já fez isso e vai voltar a fazê-lo no próximo ano. Nada contra tal estratégia, até porque por vezes resulta em alguns encontros memoráveis.

Mas o fato é que Roberto sequer se deu ao trabalho de selecionar algumas faixas, escolher determinados artistas e gravar com eles as canções. E é claro que sendo ele quem é, qualquer um que convidasse aceitaria na hora. Porém, simplesmente resolveu compilar alguns encontros dele com artistas que se fizeram presentes a especiais natalinos levados ao ar pela Rede Globo.

Juntamente com a imagem (no caso do DVD homônimo que também acaba de sair) isso ainda funciona, mas no caso do CD termina soando como um balaio de gatos, não só pela precária qualidade técnica dos registros, mas também pela diferença sonora entre eles, vez que originários de anos diferentes. 

Embora estejam lá, por exemplo, Gal Costa, Tom Jobim, Milton Nascimento, Ângela Maria, Fafá de Belém, Fágner e Caetano Veloso, todos nomes de ponta da nossa MPB, nem tal time estelar alivia o caráter rançoso do trabalho. E o perigo maior é que esse tipo de coisa passe a virar rotina – afinal, foram tantos especiais…

O Rei está precisando – urgente – de uma injeção de ânimo para que sua carreira volte a ficar interessante. Torçamos por isso, pois!

 

 

R E S E N H A     2

 

Cantora: RITA RIBEIRO

CD: “TECNOMACUMBA”

Gravadora: BISCOITO FINO

 

Após lançar três belos CD’s como contratada do selo MZA, de propriedade do renomado produtor Mazzola, nos quais incursionou pelo universo da nova MPB, gravando obras de compositores como Zeca Baleiro, Chico César e Vander Lee, a maranhense Rita Ribeiro começou a realizar uma série de shows abraçando a temática de canções voltadas para o terreno cultural afro-brasileiro e revestindo-as com programações eletrônicas. A esse projeto ela intitulou “Tecnomacumba” e por meses chegou a procurar alguma gravadora que o encampasse. Como não conseguiu, resolveu bancá-lo do próprio bolso e, quando já começava a vender o novo disco diretamente através de seu site, a Biscoito Fino resolver acreditar no trabalho e fechou acordo com a artista para distribuí-lo.

É dessa forma que acaba de chegar às lojas o quarto álbum de Rita, uma artista corajosa que, se nada mais tivesse a se dizer sobre ela, já mereceria os nossos aplausos pela capacidade de ousar e não se acomodar.

Mas Rita Ribeiro tem mais a oferecer ao público brasileiro. Canta muito bonito, de maneira forte e afinada, possui um timbre característico e – melhor que tudo – não imita ninguém. Também não se insinua pelos caminhos da composição (como várias de suas colegas que o fazem abusadamente), fincando o pé na sua arte de intérprete (as melhores são assim, basta citar Elis Regina, Maria Bethânia e Zizi Possi).

O recém-lançado CD é composto de quatorze faixas e nelas se constata o trabalho de garimpo efetuado por Rita ao se verem inseridos diversos pontos ligados ao candomblé e à umbanda (de Xangô, de Ogum, de Oxóssi, de Iansã e de Iemanjá), os quais foram recolhidos em comunidades e terreiros das matrizes gueto, angola e jeje. As canções (todas elas regravações) possuem arranjos bem elaborados que pegam o ouvinte pela força percussiva, o que decerto se transforma em uma verdadeira festa quando levadas ao palco.

Dentre músicas apropriadas ao contexto abraçado (“Domingo 23”, de Jorge Ben Jor, “Babá Alapalá”, de Gilberto Gil e “Rainha do Mar”, de Dorival Caymmi), há duas meio deslocadas (“Oração ao Tempo”, de Caetano Veloso, e “Cocada”, de Antônio Vieira), mas nada que venha a prejudicar o trabalho como um todo. Os melhores momentos ficam por conta de “Cavaleiro de Aruanda” (de Tony Osanah), “Iansã” (de Caetano e Gil) e “Jurema” (canção de domínio público adaptada pela própria Rita). Um trabalho de peso que merece ser conhecido!

 

 

N O V I D A D E S

 

·               Tentando recuperar o espaço perdido na seara romântica por conta dos projetos equivocados quando da tentativa de retomada do RPM e do lançamento de sua banda PR 5, o cantor Paulo Ricardo acaba de lançar o seu mais novo CD que chega às lojas através da gravadora EMI. Intitulado “Prisma”, o disco não chega a empolgar porque é composto, em sua maioria, de canções melodicamente superficiais. Paulo é um talentoso artista, canta bem (com um timbre sensual e elegante) e compõe direitinho, mas tem se mostrado meio enferrujado ultimamente. Até as inéditas que ganhou de Guilherme Arantes (“Contradição”) e de Kiko Zambianchi (“Ímã do Amor”) não são lá grandes coisas. Dentre as faixas que apresentam uma certa capacidade de se destacar estão “Diz”, “A Pessoa Errada”, “Ninfa” e “O Dia D, a Hora H”. Mas o fato é que Paulo continua devendo aos seus fãs um álbum à altura do seu estupendo disco de estréia na carreira solo, lançado em 1989, o qual continha preciosidades como “A Um Passo da Eternidade”, “A Fina Poeira do Ar” e “Nas Rochas”.

 

·               O novo CD de Marcos Sacramento já está nas lojas através da gravadora Biscoito Fino. Intitulado “Sacramentos”, é um belo disco de sambas interpretados com galhardia por um cantor talentoso e inspirado. Além das duas belas inéditas (a faixa-título e “Desconsideração”, ambas de Luiz Flávio Alcofra) há espaço para alguns destaques que ficam por conta de “Adivinhe Coração” (de Custódio Mesquita e Evaldo Ruy), “Baião da Penha” (de Guio de Moraes e David Nasser) e principalmente “Cai Dentro” (de Baden Powell e Paulo César Pinheiro), canção gravada por Elis Regina e que ganha releitura à altura do registro original. Como curiosidade, ainda se pode ouvir Marcos mergulhando no universo feminino de “Cabaret no Morro” (de Herivelto Martins), sucesso antigo de Carmen Miranda.

 

·               Uma ótima pedida é o CD de estréia da cantora Maíra Martins intitulado “Processo de Feitura”. Produzido por Augusto Ordine, trata-se de um lançamento independente que mostra uma artista antenada com a nova e boa geração de compositores nacionais. Estão presentes no repertório canções de Edu Krieger, Paulo Malaguti, Edu Kneip, Raphael Gemal, Edu Prestes e do excelente Rodrigo Maranhão que termina assinando a melhor faixa do álbum, a bela “Samba de Um Minuto”. Mas há outros bons momentos, como as faixas “O Bonde”, “E o Mar Secou” e “Antonieta”. Maíra canta bem e tem interpretação bastante convincente, deixando clara, todavia, a influência que Elis Regina exerce sobre seu canto. Quem puder, não deve deixar de conhecê-la!

 

·               Em seu primeiro disco intitulado “Tinge”, lançado há três anos, a cantora Giana Viscardi já demonstrava seu potencial inato para a música. Gravado no ano passado, mas somente agora chegando às lojas com distribuição da Tratore, o seu segundo CD (“4321”) comprova que a bela morena tem realmente tino para a coisa. Também compositora, Giani assina a maioria das faixas do novo trabalho ao lado de Michael Rizitschka, responsável pela produção, direção musical e arranjos.  São canções que, se não contagiam de imediato, possuem qualidade incontestável. Ótima cantora (afinada e de timbre limpo), Giana vai construindo sua carreira devagar, mas sobre bases sólidas. Tanto é que nomes como Chico César já começam a avalizar o seu trabalho (ele é parceiro de Giana na faixa “Deslumbrada Lua”, uma das melhores do disco, e também comparece nos vocais como convidado especial). Dentre os destaques estão “Me Leva” (super suingada, que remete aos bons momentos criativos de Gilberto Gil – olha aí, Maria Rita, sua mãe certamente gravaria essa!), “Amar é Maré” e “Fera Bela”, mas a releitura para “Vem Morena” (de Luiz Gonzaga e Zé Dantas) não pode ser esquecida: está entre as melhores já feitas (e são muitas) até hoje!

 

·               A gravadora WEA, através do seu departamento que albergou o acervo da antiga Continental, acaba de pôr no mercado a coleção “As Divas”, composta de discos raros e antigos, todos devidamente remasterizados. Dentre os títulos há alguns realmente imperdíveis, a exemplo do que registrou o show “Ao Vivo e à Vontade” realizado por Aracy de Almeida em 1980 no Teatro Lira Paulistana, do disco de Vanusa lançado originalmente em 1973 e que continha sucessos como “Manhãs de Setembro” e “O Mago de Pornois”, do original projeto lançado por Carmen Costa em 1979, o qual dava ênfase a músicas que remetem ao cabaré, relatando a atmosfera das mulheres “da vida” e de seus amores libertinos e proibidos (com canções como “Valsa do Bordel”, de Toquinho e Vinicius de Moraes, “Boneca de Pano”, de Assis Valente, e “Garota do Dancing”, de Alberto Ribeiro e Jorge Faraj) e do álbum em que Isaura Garcia, em 1968, dividiu o repertório entre pérolas de autoria de duas feras da MPB, o já veterano Noel Rosa e o então recém-descoberto Chico Buarque.

 

·               A paulistana Penha Pinheiro põe nas lojas, através da distribuidora Tratore, o seu primeiro CD intitulado “Novo Endereço”, o qual tem Lucina à frente da direção musical. Penha mostra-se uma intérprete pronta, com pleno domínio vocal e timbre grave e vigoroso, o qual lembra, por vezes, o de Zélia Duncan. A maioria das canções que compõem o repertório do álbum é assinada por compositores pouco conhecidos. Algumas delas são insossas, mas há momentos bem bacanas como, por exemplo, “Meu Disco Riscado” (de Tom Soares), “Não Consigo Te Deixar” (de Tony Babalu) e “Vulcão” (de Lucina em parceria com Marcelo Diniz). O maior destaque, contudo, é a regravação (em roupagem mais pop) da belíssima “Barcos e Beijos”, de autoria da nossa grande compositora sergipana Joésia Ramos. Só por ela já vale a pena conhecer o disco de Penha!

 

·               Maurício Tapajós foi um compositor inspirado que exerceu papel importante na nossa MPB não somente por ter contribuído com várias obras que se incorporaram ao inconsciente coletivo (entre elas: “Querelas do Brasil”, “Flamboyant”, “Tô Voltando”, “Mudando de Conversa” e “Dama da Noite”), mas também porque sempre foi um batalhador pelos direitos da classe artística em geral. Há onze anos foi chamado para o altar de cima, porém se aqui estivesse estaria completando vinte e cinco anos de carreira. A fim de marcar essa data, a gravadora CPC-Umes está lançando o CD “Sobras Repletas”, composto por quatorze canções criadas por Maurício com vários de seus parceiros (a exemplo de Paulo César Pinheiro, Aldir Blanc, Capinam, Hermínio Bello de Carvalho e Cacaso). Para interpretá-las foi arregimentado um time de primeira linha: alguns dos que estão presentes no recém-lançado projeto são Chico Buarque, Joyce, Alaíde Costa, MPB-4, Zélia Duncan, Clara Nunes, Dori Caymmi, Zé Renato e Mônica Salmaso. Um álbum que se torna obrigatório até porque várias das músicas apresentadas são inéditas!

 

·               E mais um ano se finda! Assim sendo, resta agradecer ao bom Deus por todas as dádivas com que Ele nos ofertou, pedir perdão pelos deslizes que cometemos com nossos semelhantes e desejar a todos um Feliz e Próspero Ano Novo, com muito amor, saúde, paz, fé, grana e música! Até o dia 02 de janeiro de 2007!

 

RUBENS LISBOA é compositor e cantor


Quaisquer críticas e/ou sugestões serão bem-vindas e poderão ser enviadas para o e-mail: rubens@infonet.com.br

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