MUSIQUALIDADE

R E S E N H A     1

 

Cantor: FÁGNER

CD: “FORTALEZA”

Gravadora: SOM LIVRE

 

Quando Raimundo Fágner surgiu, causou um verdadeiro rebuliço no meio artístico. O cara vinha munido de várias composições sensacionais (chegou a ter canções de sua autoria gravadas por Elis Regina, Simone, Roberto Carlos, Ney Matogrosso e Nara Leão, entre outros), cantava com uma voz agrestemente exótica e ainda colecionava desafetos (Caetano Veloso era um deles) e polêmicas (musicou o poema “Canteiros”, de Cecília Meireles, sem lhe dar os créditos devidos).


Durante uma carreira em que alternou altos e baixos, lançou pérolas em um estágio inicial, apaixonou-se pelo ritmo flamenco em seguida, mergulhou de cabeça no pop oitentista, lançou disco de forró e galgou os primeiros lugares das paradas de sucesso com canções de gosto duvidoso. Depois de um certo período lançando álbuns que passaram quase que despercebidos pelo grande público, juntou-se a Zeca Baleiro em 2003 e fez chegar ao mercado um excelente trabalho, marco do que parece vir a ser uma nova fase.

É cercado de grande expectativa que acaba de aportar nas lojas, através da gravadora Som Livre, o CD “Fortaleza”, no qual Fágner mostra sua real vontade de retomar ao merecido lugar de destaque que já ocupou na nossa música popular brasileira. São doze faixas produzidas pelo próprio artista, as quais passeiam por vários ritmos mas que, emolduradas por arranjos apropriados, terminam por conferir uma unicidade à obra, baseada na serenidade pela qual ele passa atualmente.

A voz afinada e possante continua em plena forma, embora já não se façam presentes os arroubos interpretativos de outrora (os quais – registre-se – terminaram por se transformar em sua marca característica), e o amor sempre assumido por sua terra natal desta vez se torna explícito já na faixa-título, parceria com o amigo Fausto Nilo.

Para o repertório, Fágner resgata “Maria do Futuro” (de Taiguara), “No Tempo dos Quintais” (de Sivuca e Paulinho Tapajós) e “Rancho das Flores” (adaptação de conhecido tema de Bach que recebeu versos de Vinicius de Moraes). Dentre os melhores momentos estão “Preciso de Alguém” (de Evaldo Gouveia e Paulo César Pinheiro), “Difícil Acreditar” (de Fágner e Clodô) e “Maria Luíza” (melodia de Fágner sobre poema de Câmara Cascudo). Há as participações especiais de Zeca Baleiro (no tango “Colando a Boca no teu Rosto”, de Capinam e Mirabô) e de Jorge Vercilo e Paulo Façanha (no reggae “Fácil de Entender”, do próprio Vercilo). Um bom retorno!

 

 

R E S E N H A     2

 

Cantores: VÁRIOS

CD: “MAYSA – ESTA CHAMA QUE NÃO VAI PASSAR”

Gravadora: BISCOITO FINO

 

Uma das grandes damas da música popular brasileira de todos os tempos, a capixaba Maysa nasceu em uma família bem liberal para a sua época. Aos dezoito anos, já em São Paulo, casou-se com um herdeiro da milionária família Matarazzo que tinha vinte anos a mais do que ela. Grávida de seu único filho (Jayme Monjardim, hoje famoso diretor de novelas da Rede Globo), foi descoberta por Roberto Corte Real, produtor musical, o qual lhe fez o convite para gravar o primeiro disco logo depois que o bebê nascesse.

Assim aconteceu e o Brasil rapidamente conheceu a força e a fúria de uma intérprete única que, em vida, meteu-se em encrencas várias, sofreu bastante, mas também cantou muito. Separou-se, casou, casou de novo e mais uma vez. Sempre encrencada com a bebida e com os quilos a mais, amou vários homens e também compôs diversas músicas, a grande maioria delas recheadas de tristeza e melancolia. No começo da década de sessenta, ajudou o mundo a descobrir a bossa nova ao lançar o emblemático disco “O Barquinho”, mas logo voltaria às canções de fossa, que era o que lhe falava mais alto ao coração. É essa artista (cuja vida serviu de base para o lançamento recente de duas interessantíssimas biografias) que é homenageada com o CD “Maysa – Esta Chama Que Não Vai Passar”, o qual acaba de chegar às lojas através da gravadora Biscoito Fino.

O tributo foi produzido por Thiago Marques Luiz e vem em muito boa hora pois as novas gerações merecem conhecer o talento de Maysa. Do repertório composto por vinte canções, algumas delas são de autoria da própria artista; as outras foram por ela gravadas ao longo de sua controvertida carreira.

Os arranjos, simples e eficientes, são quase todos elaborados e executados pelo competente músico Dino Barioni que se alterna entre violão, guitarra e bandolim.

O grande mérito do trabalho (além, é claro, o de resgate da obra) foi conseguir reunir intérpretes tão díspares em torno de uma única idéia (talvez tenham faltado somente Gal Costa e Simone – a primeira por ter sido uma das maiores amigas de Maysa; a segunda por planejar, há anos, lançar um disco em sua homenagem). Assim, o projeto alia nomes de ponta da nossa MPB (Maria Bethânia, Ney Matogrosso, Zélia Duncan, Leila Pinheiro, Alcione, Zeca Baleiro, Beth Carvalho) a outros ainda pouco conhecidos (Carlos Navas, Fernanda Porto), passando por alguns que se encontravam esquecidos (Édson Cordeiro, Cauby Peixoto, Cláudya, Claudette Soares, Cida Moreira, Leny Andrade) e outros de porte mediano (Célia, Alaíde Costa, Olívia Hime, Arnaldo Antunes). Até Bibi Ferreira comparece em interpretação teatral. Um luxo só!

 

 

N O V I D A D E S

 

·               Em mais uma recente demonstração de descaso para com o artista da terra, um Prefeito de conhecida cidade sergipana negou-se a cumprir o acertado, semana passada durante os festejos juninos, com a nossa grande e querida intérprete Amorosa. As lágrimas derramadas pela vigorosa artista representam não somente a sua tristeza pessoal, mas a estendida a todos os colegas que vivem situações similares, mas que (diferentemente dela) não têm a coragem necessária para enfrentar as injustiças que acontecem cotidianamente. O poeta Araripe Coutinho, em belo artigo publicado em sua coluna nesta mesma Infonet (o qual merece ser lido por todos), soube com propriedade e inteligência ímpares registrar o ocorrido e solidarizar-se com essa guerreira que tanto já deu a este Estado e que, lutando contra tantas adversidades, continua a nos presentear diariamente com o seu enorme talento.

 

·               Caetano Veloso gravou show ao vivo relativo ao seu último CD de estúdio, o roqueiro “Cê”, o qual foi realizado recentemente na Fundição Progresso, no Rio de Janeiro. O objetivo é o lançamento do registro, em setembro próximo, nos formatos CD e DVD. Ladeado pelo mesmo power trio com que o acompanhou no disco, a gravação resultou de uma parceria com o canal Multishow. O repertório trará novas leituras do compositor baiano para sucessos atemporais como “Sampa”, “London, London” e “Como Dois e Dois”.

 

·               Foi escolhido o homenageado para o 27º Prêmio Shell de Música Brasileira: Tom Zé. A cada ano, um compositor (vivo ou morto) é reverenciado pelo conjunto da obra. A cerimônia será realizada no segundo semestre e contará com a realização de show do controvertido artista baiano que, no ano passado, completou sete décadas de vida.

 

·               A gravadora Som Livre acaba de pôr nas lojas CD e DVD de Renato Teixeira, oriundos de registro ao vivo feito no Auditório Ibirapuera em São Paulo. Renato começou a se infiltrar no meio musical em 1967 quando classificou a música “Dadá Maria” no Festival da Record e a teve interpretada por Gal Costa. No ano seguinte e igualmente no citado Festival, viu Roberto Carlos defender “Madrasta”, também de sua autoria. No entanto, somente foi efetivamente revelado para o grande público em 1977, quando Elis Regina gravou duas canções dele: a obra-prima “Romaria” e a pouco conhecida (mas belíssima) “Sentimental Eu Fico”. A partir daí, teve suas criações registradas por diversos intérpretes que vão de Maria Bethânia a Rolando Boldrin, passando por Fafá de Belém e Xangai. Dono de voz grave e bem colocada, Renato é um compositor sensível que sabe registrar com maestria os desejos e as mazelas de seu povo. Atua, por vezes, como modernizador das músicas regional e caipira, dando-lhes uma roupagem mais atual, sem descaracterizá-las. O novo trabalho conta com as participações especiais de Joanna (em “Recado”), Leon Gieco (em “La Cigarra”), Pena Branca (em “Quando o Amor se Vai”) e Chitãozinho & Xororó (em “Frete”). Alguns dos grandes sucessos estão presentes, como é o caso de “Amora”, “Amizade Sincera” e “Tocando em Frente”, mas os melhores momentos ficam por conta de “Olhos Profundos” e “Curvelo”, duas graciosidades que merecem ser mais conhecidas.

 

·               Tânia Maria, Toninho Horta, Guinga e Paula Santoro são alguns dos artistas brasileiros que estarão participando, entre os dias 7 e 11 de julho, do Festival “Itinerario Brasile” que se realiza anualmente na Itália, mais precisamente em Frascati, pequena cidade medieval localizada nas redondezas de Roma e conhecida mundialmente pela sua tradição gastronômica, vinícola e cultural. Com um quarteto desses, certamente nosso país está muito bem representado.

 

 

RUBENS LISBOA é compositor e cantor


Quaisquer críticas e/ou sugestões serão bem-vindas e poderão ser enviadas para o e-mail: rubens@infonet.com.br

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