MUSIQUALIDADE, por RUBENS LISBOA

M U S I Q U A L I D A D E

 

 

R E S E N H A     1

 

Cantora: ELZA SOARES

CD: “BEBA-ME”

Gravadora: BISCOITO FINO

 

Que Elza Soares é uma guerreira vencedora, todo mundo sabe. Menina pobre, nascida em um dos vários morros do Rio de Janeiro, desde muito cedo conheceu as intempéries da vida difícil. Raquítica quando jovem, é notória a sua participação no programa de calouros de Ary Barroso, o qual, quando a viu, indagou-lhe: “De qual planeta você veio, minha filha?”. Ao que Elza, de pronto, rebateu: “Do planeta fome!”.

Dona de uma voz poderosíssima, de um talento incontestável e de uma energia que parece confrontar-se com o tempo, Elza construiu a sua carreira no samba, embora nos últimos tempos tenha se voltado para a chamada MPB, terreno aliás que domina como poucos, chegando a se arriscar, inclusive, há anos atrás, pelo mundo da música eletrônica.

Essa cantora única, que se tivesse nascido americana certamente já seria conhecida como uma das melhores de todos os tempos, acaba de lançar um novo projeto, que sai nos formatos CD e DVD através da gravadora Biscoito Fino, o qual resultou de show ao vivo gravado no Teatro do Sesc Vila Mariana (SP). É com ele que ela retorna, altaneira, às suas origens e revisita grandes sucessos por ela já gravados como, por exemplo, “Lata d’Água” (de Luiz Antônio e Jota Jr.), na qual brinca com o próprio nome, substituindo-o pela Maria da letra original, e “Pra Que Discutir com Madame?” (de Janet de Almeida e Haroldo Barbosa).

O CD é aberto com uma vinheta, interpretada a capella, de “O Meu Guri”, obra-prima de Chico Buarque que a presenteou, anos atrás, com a densa “Dura na Queda” (só presente no DVD). De Caetano Veloso, outro fã declarado, Elza interpreta a pungente “Dor de Cotovelo” em um dos grandes momentos do  recém-lançado trabalho.

A artista também se mostra uma interessante compositora assinando as boas canções “Pranto Livre” e “Exagero”, esta em parceria com Glaucus Xavier, e, irrequieta, faz improvisos maliciosos em “O Neguinho e a Senhorita” (de Noel Rosa e Abelardo da Silva).

Outros destaques são “Estatutos da Gafieira” (de Billy Blanco), na qual Elza exibe seu suingue fora-do-comum, “Palmas no Portão” (de Walter Dionísio e D’Acri Luiz) e “Malandro” (de Jorge Aragão e Jotabê). No DVD, o medley que reúne, em ritmo de tango, “Volta Por Cima” (de Paulo Vanzolini) e “Fadas” (de Luiz Melodia), bem como a delicada “Flores Horizontais”, de Zé Miguel Wisnik, ressaltam em números de beleza ímpar.

E com a certeza de quem sabe o que está dizendo, Elza destila com fina ironia o “Rap da Felicidade” (de Juninho Rasta e Kátia), comprovando uma inata e invejável capacidade de sempre se reinventar. Palmas, gente, muitas palmas pra ela!

 

 

R E S E N H A     2

 

Cantor: CARLOS NAVAS

CD: “CANÇÕES DE FAZ DE CONTA”

Gravadora: LUA MUSIC

 

Não satisfeito em lançar um dos melhores discos de 2007, o belo “Quando o Samba Acabou”, no qual revisita o cancioneiro gravado por Mário Reis, o cantor Carlos Navas acaba de pôr no mercado a sua segunda incursão pelo universo infantil.

Trata-se do disco “Canções de Faz-de-Conta”, uma grande sacada que reúne dez músicas de autoria de Chico Buarque (com mais “O Caderno”, de Toquinho e Mutinho, como faixa bônus), algumas realmente criadas pensando na criançada, mas outras feitas para trabalhos adultos que, pinçadas com a sensibilidade e delicadeza características do artista, encaixam-se perfeitamente no conceito do trabalho.

Carlos é um cantor que vem em crescente evolução. Seus discos têm mostrando um incontestável aprimoramento artístico, seja no que diz respeito à escolha dos repertórios, seja no tocante à forma como interpreta as canções escolhidas.

Cantor corretíssimo, dono de um timbre mais que agradável, Carlos passeia com desenvoltura entre tons graves e agudos e tem o dom de mergulhar fundo nas canções, revestindo-as de sentimentos próprios.

Produzido com competência por Thiago Marques Luiz, o CD recém-lançado reforça o fato de que estamos diante de um dos melhores cantores brasileiros da atualidade.

Basta ouvir, por exemplo, as releituras conferidas a melodias complexas como as de “História de uma Gata” e “Hollywood”, a primeira da obra original “Os Saltimbancos” (feita em 1977 para o teatro) e a segunda de “Os Saltimbancos Trapalhões” (feita em 1981 para o filme homônimo). Soberbas!

Outros excelentes momentos ficam por conta das novas versões conferidas a “Boi Voador Não Pode” (com sua letra ambígua, lançada em plena ditadura militar) e “Ciranda da Bailarina” (sutil parceria de Chico com Edu Lobo). No entanto, o maior achado fica mesmo com a deliciosa “Rebichada” em uma regravação deliciosa que já se torna antológica.

As participações especiais da excelente Vânia Bastos e da polivalente Bibi Ferreira em “João e Maria” e “Minha Canção”, respectivamente, só vêm conferir um colorido adicional a esse álbum que merece lugar especial na discografia infantil nacional.

 

 

N O V I D A D E S

 

·               Aracaju terá uma semana movimentada! Se terça e quarta-feira o Teatro Tobias Barreto será o palco de mais uma edição do Projeto MBP Petrobrás, a partir das 21 horas, contando com a presença de Luiz Melodia, na quarta e quinta-feira, sempre às 18:30 horas, será a vez de o Teatro Atheneu receber o Projeto Pixinguinha que contará com a participação de Rita Ribeiro. Ambos são shows imperdíveis! Também no Atheneu se realizará na terça-feira, dia 20, a partir das 21 horas, o Projeto Prata da Casa que trará a cantora Márcia Chou e o grupo The Baggios.

 

·               O selo Dubas Música põe nas lojas o CD “Tempos Diferentes”, uma oportuna compilação da obra do compositor e violonista mineiro Nelson Ângelo. Como brinde para os fãs, o disco vem com duas gravações inéditas.

 

·               O CD duplo “Dentro do Mar Tem Rio”, baseado no mais recente show de Maria Bethânia, chegará às lojas no começo de dezembro. O anunciado DVD correlato, no entanto, ficou só na propaganda…

 

·               A cantora Fernanda Cunha confirma a herança musical genética (ela é sobrinha da excelente compositora Sueli Costa) com o lançamento de seu terceiro CD, o qual é dividido com o exímio violonista Zé Carlos. Intitulado “Zíngaro”, o disco é um lançamento da gravadora CID e reúne dez parcerias feitas entre Tom Jobim e Chico Buarque. As canções, originalmente compostas ao piano, ganham inusitados contornos melódicos quando executadas ao violão. Fernanda não possui um timbre avassalador, mas não faz feio. Muito pelo contrário, chega ao surpreender ao interpretar com segurança as complexas construções jobinianas para pérolas como “Pois É”, “Retrato em Branco e Preto”, “Imagina” e “Olha Maria” (esta a única que recebeu, em sua construção, a contribuição de outra fera, o poetinha Vinicius de Moraes). Um grande momento fica por conta da bela e pouco conhecida faixa “Meninos Eu Vi” e a maior curiosidade é a releitura de Fernanda para “Eu Te Amo”, canção que originalmente foi gravada por Chico com a participação de Telma Costa, mãe da cantora. Completam o repertório do álbum as canções “Piano na Mangueira”, “Anos Dourados”, “A Violeira” e “Sabiá”.

 

·               Magro, integrante do grupo MPB-4 é o responsável pela direção musical do segundo CD do conjunto vocal Toque de Arte que vai contar com a participação especial da cantora Alcione na faixa “Rio Antigo” (de Nonato Buzar e Chico Anysio). O disco chegará às lojas no mês que vem através da gravadora Albatroz e se intitulará “Pelos Quatro Cantos”.

 

·               Já está nas lojas, através da gravadora Biscoito Fino, o novo CD de Francis Hime. Trata-se de um registro ao vivo de show realizado no Sesc Pompéia no qual o artista mostra, através de dezoito faixas, porque é considerado um dos grandes criadores da nossa MPB. Embora do repertório constem algumas canções de seu último disco de estúdio (o bom “Arquitetura da Flor”), como “Mais-Que-Imperfeito”, “A Invenção da Rosa”, “Gozos da Alma” (estas parcerias com Geraldo Carneiro), “Sem Saudades” (com Cartola), “Cadê” (com Simone Guimarães), “Desacalanto” (com Olívia Hime), “Palavras Cruzadas” (com Toquinho) e “A Dor a Mais” (com Vinicius de Moraes), a base do novo álbum são mesmo as excelentes canções que Francis compôs com Chico Buarque (“Pivete”, “A Noiva da Cidade”, “Embarcação”, “Trocando em Miúdos”, “Amor Barato”, “Atrás da Porta”, “E Se” e “Quadrilha”). Completam o trabalho bem lembradas releituras para “Pau-Brasil” (outra com Geraldo Carneiro) e “Tereza Sabe Sambar” (outra com Vinicius de Moraes). O piano mágico de Francis faz-se acompanhar apenas por três músicos que, por si só, já valeriam o CD: Jorge Helder no baixo, Gabriel Improta na guitarra e Kiko Freitas na bateria.

 

 

RUBENS LISBOA é compositor e cantor


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