MUSIQUALIDADE, por RUBENS LISBOA

M U S I Q U A L I D A D E

 

 

R E S E N H A     1

 

Artistas: LEILA PINHEIRO & ROBERTO MENESCAL

CD: “AGARRADINHOS”

Gravadora: EMI

 

Sabe aquele CD que você ouve, ouve, ouve e não se cansa de ouvir? Sabe aquela cantora irrepreensível, com uma técnica fora do comum, uma afinação extraordinária, um timbre que se posiciona entre os mais bonitos de todos os tempos da nossa MPB, uma emoção que salta à pele e, ainda por cima, um talento inato como tecladista? Sabe aquele músico que já é uma lenda mas que consegue se renovar a cada trabalho, fazendo-se cúmplice na maestria da sutileza dos arranjos e, ao mesmo tempo, agigantando-se nas complexas harmonias esboçadas?

Pois está a se falar de Leila Pinheiro e de Roberto Menescal que, juntos, acabam de lançar, através da gravadora EMI, o CD sugestivamente intitulado “Agarradinhos”, bela parceria de Menescal com Rosália de Souza. O disco foi gravado ao vivo, no estúdio de Leila, em apenas dois dias e resultou surpreendente menos pela felicidade do encontro dos dois que pela homogeneidade conferida a um repertório que passeia entre canções inéditas, pérolas esquecidas e canções que já fazem parte do inconsciente coletivo nacional.

Leila surgiu para o grande público quando se classificou em terceiro lugar no “Festival dos Festivais”, realizado pela Rede Globo em 1980. De lá para cá, a paraense vem sendo reconhecida como uma das melhores cantoras desse país tão rico em boas vozes femininas, tendo lançado discos memoráveis (“Outras Caras”, “Na Ponta da Língua” e “Nos Horizontes do Mundo” estão entre eles), além de alguns com repertório dedicado a compositores como Guinga e Aldir Blanc (“Catavento e Girassol”) e Ivan Lins e Gonzaguinha (“Reencontro”), e outros em que revisitou hits da Bossa Nova.

Foi exatamente este movimento musical que projetou mundialmente o talento de Roberto Menescal, autor de grandes sucessos, ao lado de Ronaldo Bôscoli, como “O Barquinho”, “Você”, “Áh, Se Eu Pudesse”, “Nós e o Mar”, “A Volta” e a contundente “A Morte de Um Deus de Sal”, todas presentes neste álbum recém-lançado que tem como alguns de seus grandes momentos interpretações memoráveis de Leila para criações de Johnny Alf (“O Que É Amar”), Fátima Guedes (“Tanto Que Aprendi de Amor”) e Jorge Vercilo (“Encontro das Águas”, parceria com Jota Maranhão). Mas surpreendente mesmo é constatar que Leila também compõe: as faixas “O Céu Nos Protege” e “Luz da Natureza” resultam da parceria dos dois artistas, mas “Minha Mangueira”, uma homenagem à escola de samba verde-e-rosa, é composição somente de Leila. Todas ótimas!

A interação dos dois é ressaltada através das fotos contidas no belo encarte que embala, com delicadeza ímpar, este CD que se torna imperdível para todos os que possuem gosto musical refinado. 

 

 

R E S E N H A     2

 

Cantor: EMÍLIO SANTIAGO

CD: “DE UM JEITO DIFERENTE”

Gravadora: DECKDISC

 

Emílio Santiago foi descoberto após participar de um quadro de calouros do programa de Flávio Cavalcanti, comunicador que dominava a televisão brasileira na década de setenta. Lançou bons discos no começo de sua carreira, mas só veio a obter sucesso comercial quando, contratado pela gravadora Som Livre, gravou diversos álbuns que integraram o projeto “Aquarela Brasileira”, os quais, na sua maioria, tiveram os repertórios constituídos por regravações de canções que se tornaram famosas nas vozes de outros intérpretes.

Já alguns anos, contudo, ele vem tentando se desvencilhar desse estigma, tanto que revisitou os cancioneiros de Dick Farney e de Gonzaguinha e apresentou um bom disco ao lado de João Donato. Mas foi somente agora que Emílio, dono de incontestável bela, grave e aveludada voz, acertou em cheio. Acaba de chegar às lojas, através da gravadora Indie Records, o CD sintomaticamente intitulado “De Um Jeito Diferente”, um dos melhores títulos de sua vasta discografia e que, produzido com competência por Ricardo Silveira, vem comprovar que artistas como ele conseguem resultados bastante satisfatórios quando ousam mais.

Dedicado afetuosamente a Durval Ferreira (que está presente no repertório com a delicada “Moça Flor”, parceria com Lula Freire), o álbum traz quinze faixas, nas quais se destaca a capacidade de Emílio de pintar com cores próprias canções razoáveis, alçando-as a patamares elevados.

Emílio, que vem cantando cada vez mais suave, incluiu três canções de autoria de Mart’nália (“Calma”, “Contradição” e “Não Me Balança Mais”, a primeira uma parceria com Arthur Maia e as outras com Viviane Mosé), mostrando que a filha de Martinho da Vila igualmente tem talento no que diz respeito à arte de compor. Registre-se que a artista faz-se presente também como convidada. Outra participação especial é a de Nana Caymmi que se mostra contrita nos vocais de “Olhos Negros” (de Johnny Alf e Ronaldo Bastos).

Já Marcos Valle contribui com “Água de Coco”, parceria com Paulo Sérgio Valle, “Disfarça e Vem”, com Ronaldo Bastos, “Até o Fim”, com Carlos Lyra, e “Valeu”, com Joyce. Emílio passeia por idiomas outros: espanhol em “Desilusión” (de Rosa Passos e Santiago Auseron) e inglês (“My Foolish Heart”, de Victor Young e Ned Washington). Os melhores momentos, contudo, ficam por conta da deliciosa inédita “Um Dia Desses” (de João Donato e Carlinhos Brown) e da inspirada releitura de “Dindi” (de Tom Jobim e Aloysio de Oliveira).

Um belo CD que vem renovar a criatividade desse grande artista que é Emílio Santiago…

 

 

N O V I D A D E S

 

·               Amanhã (dia 04) acontecerá nova edição do Projeto Prata da Casa. Desta vez, a partir das 21 horas, subirão ao palco do Teatro Atheneu o cantor Issac R. A. e a banda Sulanca. Estaremos por lá!

 

·               O cantor e compositor Glauco Lourenço lança seu primeiro disco, depois de alguns anos na estrada. Totalmente independente, o CD reúne 12 melodias inéditas de sua própria autoria em parceria com Suely Mesquita e Mathilda Kóvak. Os arranjos foram feitos por Glauco, João Gaspar (violões e guitarras), Bruno Migliari (baixo) e Edu Szajnbrum (bateria e percussão). Ainda participam do trabalho os músicos Marcos Nimrichter (acordeom), Nicolas Krassik (violino), Eduardo Neves (sax soprano e flauta) e Carlos Fuchs (piano). O álbum, dedicado a Joni Mitchell, foi produzido e teve direção musical do próprio artista, e não se trata de um trabalho de fácil assimilação melódica. A voz adequada de Glauco encontra seus melhores momentos em “Boi”, “Curare” “Travesseiro”, “Loteria de Deus” e na faixa-título.

 

·               A gravadora Biscoito Fino confirmou para 2008 o lançamento do disco que Maria Bethânia gravou com a cubana Omara Portuondo em janeiro deste ano no Rio de Janeiro.

 

·               E o samba anda mesmo em alta! Se você curte o mais genuíno dos ritmos brasileiros, não pode deixar de conhecer o CD de estréia de Moyseis Marques que acaba de chegar às lojas através da gravadora Deckdisc. O rapaz canta bem pra caramba, com voz educada de timbre claro e extenso, tornando-se, desde logo, uma grata revelação. Com um disco habilmente construído que leva a assinatura de Paulo César Figueiredo, Moyseis mostra rara competência ao reunir canções aparentemente díspares como a obra-prima “Nomes de Favela” (de Paulo César Pinheiro) e “Roda” (da fase inicial de Gilberto Gil). Se no terreno das regravações acerta em cheio com suas versões para “Minha Verdade” (de Dona Ivone Lara e Délcio Carvalho) e especialmente “O Vendedor de Caranguejo” (de Gordurinha), no terreno das inéditas mostra-se um compositor razoável. É bem verdade que “Samba, Ciência da Graça” e “Prece à Inspiração” não são grandes canções, mas “Palpite de Gafieira”, “Receita de Maria” e “Branda Liberdade” já denotam que o garoto pode ter também futuro no terreno da criação. Grandes destaques ficam por conta de “Profissão” (de André Renato, Sereno e Luiz Carlos da Vila) e do medley que fecha o álbum com os sensacionais partidos altos “Mocotó do Tião” e “Fidelidade Partidária” (ambas fruto da parceria de Wilson Moreira e Nei Lopes), faixa que conta com a participação do Grupo Tempero Carioca. Outro convidado especial é Elton Medeiros em “Quatorze Anos” (de Paulinho da Viola).

 

·               O filho de Tim Maia acaba de lançar, através da gravadora Indie Records, o seu segundo disco. Com o título de “Cidadão do Bem”, Léo Maia mostra um repertório coeso que apresenta como um dos destaques a regravação de “Como Vovó Já Dizia”, de Raul Seixas e Paulo Coelho.

 

·               Gilberto Gil, que anunciou recentemente que vai se afastar do cargo de Ministro da Cultura no próximo ano para fazer uma operação nas cordas vocais, vai gravar algumas músicas novas e disponibilizá-las na Internet. Dentre elas, duas parcerias com Jorge Mautner “Os Pais” e “Outros Viram” e o xote “Despedida de Solteira”.

 

 

RUBENS LISBOA é compositor e cantor


Quaisquer críticas e/ou sugestões serão bem-vindas e poderão ser enviadas para o e-mail: rubens@infonet.com.br

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