MUSIQUALIDADE, por RUBENS LISBOA

M U S I Q U A L I D A D E

 

 

R E S E N H A     1

 

Cantoras: SIMONE & ZÉLIA DUNCAN

CD: “AMIGO É CASA”

Gravadora: BISCOITO FINO

 

No final da década de setenta e começo da década de oitenta não havia, neste imenso Brasil, quem não tivesse ouvido falar na cantora Simone. Suas canções eram cantaroladas em todas as esquinas e os lançamentos de seus discos tornavam-se acontecimentos nacionais. A baiana esguia e de voz grave e potente era um arrasa quarteirão e chegou mesmo a causar preocupação nas grandes intérpretes já de então: Maria Bethânia, Gal Costa e Elis Regina. Com o advento da chamada música romântica na década seguinte, Simone, de forma equivocada, resolveu enveredar por esse caminho, talvez má orientada por produtores e pela gravadora. O fato é que sua opção fez com que vários de seus admiradores deixassem de cultuá-la e somente há poucos anos a grande intérprete que sempre foi vem mostrando sinais de fênix.

Em 1994, depois do estouro da canção “Catedral”, muito por ter sido incluída em trilha sonora de novela global, a cantora Zélia Duncan passou a ser reconhecida como grande revelação da nossa música. De fato, letrista inspirada, soube cercar-se de bons parceiros, o que a fez freqüentadora assídua das paradas de sucesso. Dona de bela voz, também potente e grave, logo em seguida deu pistas de que não iria ficar muito tempo batendo na mesma tecla e, mostrando-se audaciosa, partiu para projetos onde mergulhou de cabeça na MPB tradicional até assumir, recente e temporariamente, o posto de vocalista do grupo Os Mutantes.

Essas duas talentosas mulheres resolveram se reunir em um projeto que acaba de chegar às lojas, através da gravadora Biscoito Fino, nos formatos CD e DVD. Para os fãs da boa musica, trata-se de um produto imperdível. As duas se mostram bastante sintonizadas e o repertório (que poderia se ater às suas canções mais conhecidas) mostra escolhas acertadas que passam por músicas lados B e algumas inéditas nas vozes delas.

Produzido pela competente Bia Paes Leme, as cantoras se cercaram de músicos que entendem do universo a que se destinam e realizaram um trabalho primoroso. Gravado ao vivo durante show realizado no Auditório Ibirapuera, Simone e Zélia cantam juntas a maior parte do tempo, mas também aparecem em solos individuais. Unidas, ressaltam a beleza inata de canções atemporais como “Alguém Cantando” (de Caetano Veloso) e “Tô Voltando” (de Maurício Tapajós e Paulo César Pinheiro) ou redescobrem grandes temas como “Petúnia Resedá” (de Gonzaguinha) e “Agito e Uso” (de Ângela Ro Ro). Sozinha, Simone mostra que se encontra em plena forma vocal quando deleita os ouvintes com primorosas interpretações para “Medo de Amar nº 2” (de Sueli Costa e Tite Lemos) e “Vou Ficar Nu pra Chamar sua Atenção” (de Roberto e Erasmo Carlos). Zélia, por sua vez, arrisca-se com maestria em canções mais atuais como “A Companheira” (de Luiz Tatit) e “Na Próxima Encarnação” (de Itamar Assumpção).

De verdade, um grande lançamento que coroa um felicíssimo encontro musical!

 

 

R E S E N H A     2

 

Cantora: KLÉBI NORI

CD: “DAQUI”

Selo: BRAZIL MÚSICA

 

A cantora e compositora Klébi Nori é paulistana e vem consolidando, devagarzinho, o seu nome entre as boas criadoras da chamada nova música popular brasileira. O Brasil, tão rico em intérpretes femininas, no quesito compositora tem seu número bastante reduzido quando comparado aos autores do sexo masculino. Poucas conseguiram, de fato, deixar seus nomes cravados nessa seara e a exceção é feita, com o perdão pelo talvez esquecimento de alguma, por Dolores Duran, Chiquinha Gonzaga, Rita Lee, Joyce, Sueli Costa, Ana Carolina, Marina Lima, Fátima Guedes, Ângela Ro Ro, Dona Ivone Lara e Adriana Calcanhotto.

Klébi, no entanto, chega ao seu quinto CD, intitulado “Daqui” (o qual acaba de chegar às lojas através do selo Brasil Música), mostrando um considerável amadurecimento artístico-criativo, o qual já vinha se esboçando desde o seu disco anterior, o ótimo “Inverno do Seu Jardim”. Dentre as treze faixas apresentadas, apenas uma não é assinada por ela. Trata-se da boa releitura para “Te Amo”, canção deslavadamente romântica de autoria de Roberto Corrêa e Sylvio Son que ganha ares elegantes nesta versão em que Klébi se faz acompanhar apenas pelo piano de José Antônio Almeida, o qual, aliás, é o responsável pela direção artística e produção musical do álbum.

Klébi tem voz precisa: afinada e com pronúncia irrepreensível, possui um timbre limpo e bonito que, por vezes, termina soando sensual, mormente quando posto a serviço de canções que falam de amores e suas variações sentimentais. O seu sotaque paulista (que em outros termina soando irritante) soa como um charme a mais, com os “erres” puxados na medida certa. Há a influência salutar de Zélia Duncan em algumas passagens, mas não a ponto de comprometer a identidade própria de Klébi, que se faz clara e indubitável.

A primeira faixa (“Bens”) já deixa claro que se trata de uma artista em busca de suas verdades. Sem medo de expô-las, o faz sem meias-palavras e certamente por isso formula, em linguagem simples, colocações próprias, muitas delas revestidas com boas doses de originalidade. É um dos bons momentos do disco, ao lado da balançada “Completo Conteúdo” (que possui um refrão que pega já na primeira audição), da inteligente “A Gente Não Sabe Nadar”, da gostosa “Susi”, da sensível “Meu” e principalmente do bem-humorado e delicioso samba “Corcovado Sem Seu Senhor” (que, com letra repleta de tiradas, brinca com a cultuada rixa entre Rio de Janeiro e São Paulo).

Se eu fosse você, não perderia mais tempo e correria para conhecer o trabalho dessa talentosa artista que ainda vai muito que falar!

 

 

N O V I D A D E S

 

·               Terça e quarta-feira próximas, a partir das 21 horas, estará se realizando, no Teatro Tobias Barreto, mais uma edição do projeto MPB Petrobrás. Desta vez a atração principal será o paraibano Chico César. Para a abertura, foi escolhido o sergipano Sergival que, aproveitando a oportunidade, estará mostrando algumas canções de seu recém-lançado CD “As Coisas do Caçuá”.

 

·               Julio Dain nasceu no Rio de Janeiro, cidade onde desenvolveu seu gosto pela música e pela poesia, mas aos vinte e três anos embarcou para Paris e lá viveu durante oito anos, chegando a gravar seu primeiro CD intitulado “Outro Vento”. De volta ao Brasil, o artista (que é compositor, cantor e instrumentista) acaba de lançar o aludido disco através da gravadora Biscoito Fino. São doze faixas nas quais Julio apresenta o seu bom trabalho, recheado das mais diversas influências musicais. Entre os destaques estão as faixas “Consciência X Sensação”, “Nas Entrelinhas” e “Calamidades Naturais”.

 

·               “Irreversíveis” é o nome do CD que chega às lojas através da gravadora Som Livre lançando no mercado os nomes de Léo Benitez e Carol Monte (esta vem a ser irmã de Marisa Monte). São dez faixas recheadas de programações eletrônicas que dão um ar moderninho ao disco, mas terminam por lhe conferir um ar desnecessariamente monocórdio. A opção por mixar a voz de Léo (Carol não canta) de maneira mais baixa que o usual (em comparação à base das canções) termina também por prejudicar o resultado final. Todas as canções são assinadas pela dupla, com exceção da regravação da manjadíssima “Wave”, de Tom Jobim.

 

·               Andréa Montezuma lança-se no mercado com um ótimo disco independente intitulado “Faces do Amor”. Não obstante o trabalho gráfico pouco criativo, o som que se ouve é muito bem elaborado. São doze boas faixas que podem ser superficialmente classificadas como pop-rock (onze delas assinadas pela própria artista ao lado de parceiros; a exceção é a excelente “Quinze Minutos”, de Cecelo Frony) que apresentam uma cantora pronta. Com voz firme e afinada, de grande potência e belo timbre, Andréa faz parte do time de intérpretes que, de fato, merecem ter o seu talento reconhecido pelo grande público.

 

·               Outra cantora que lança seu CD de estréia de maneira independente é Isla Jai. O disco intitulado “Zazas” vem em embalagem econômica e traz dez faixas compostas por ela própria. São canções interessantes, posto que passeiam à margem do convencional. Isla canta bem e imprime o tom certo a cada canção. Os melhores momentos ficam por conta de “C’est Bon”, “Não Repare” e “Quase Caía”.

 

·               Gonzaga Leal é um artista pernambucano admirado em sua terra mas que ainda necessita ver seu nome reconhecido além fronteiras. Com um trabalho gráfico primoroso, lançou recentemente o seu novo CD, curiosamente intitulado “E o Nosso Mínimo É Prazer!”. O artista mostra-se bastante perspicaz ao reunir um repertório que condensa antigas pérolas esquecidas (caso de “Você Tem Açúcar”, de Roberto Martins e Osvaldo Santiago, e “Seu Valdir”, de Marco Pólo) e ótimas canções da safra mais recente (como, por exemplo, “A Telefonista na Floresta Predial”, de Lula Queiroga, e “Leonor”, de Itamar Assumpção). Gonzaga supera qualquer suposta deficiência vocal com talento e criatividade e para abrilhantar seu álbum ainda conta com as participações de Ná Ozzetti, Alaíde Costa, Isaar e Mônica Feijó. Destaque especial para a bonita canção ruralista “A Manteiga e o Pão”, de Chico Lobo.

 

 

RUBENS LISBOA é compositor e cantor


Quaisquer críticas e/ou sugestões serão bem-vindas e poderão ser enviadas para o e-mail: rubens@infonet.com.br

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