Negócios e criatividade em baixa?

“Pesquisa com executivos comprova que a sua capacidade criativa cai ano a ano e já não se distingue da média da população”

REVISTA EXAME (21/06/2006, p90-91)

 

A reunião de janeiro do Fórum Econômico Mundial, realizada em Davos, Suíça, chamou atenção para o nível de preocupação dos executivos das grandes empresas globais sobre a importância e necessidade urgente e imperiosa de se investir para resgatar/desenvolver a capacidade criativa dos executivos. E essa preocupação foi denominada “Criatividade Imperativa” e, como conseqüências, imediatamente, já durante o evento foram realizados 22 seminários sobre criatividade e inovação. Essa decisão foi notícia em todos os jornais do mundo.

 

Isso é uma coisa surpreendente? É uma mudança de postura radical? Nem tanto, criatividade na Europa é moeda de sobrevivência.

 

O que se procura: Como desenvolver talentos “criativos”? Como avaliar as melhores idéias? Como produzir mais e com melhores idéias? Como segurar na empresa os talentos criativos? Como tornar as pessoas mais criativas, já que nunca encontraremos pessoas criativas o suficiente?

 

Exatamente isso e tudo isso. Enquanto no Brasil todo mundo acredita que é criativo e se fala disso a todo o momento; são poucas as pessoas que conhecem o que é criatividade, que pode ser desenvolvida e o que pode acontecer em uma empresa na qual se consegue aumentar em apenas 10% o potencial criativo dos seus empregados.

 

Existem várias pesquisas por instituições mundiais que avaliam o potencial humano dos indivíduos nas organizações e todas essas pesquisas são contundentes ao dizer que só utilizamos no ambiente de trabalho – em média – 10% do nosso potencial criativo. Os motivos para isso são muitos que vão desde as severas regras organizacionais contra as novas idéias, as crenças ultrapassadas que os executivos pensam e os demais colaboradores apenas executam até aquela que acreditam que criatividade é coisa para artistas e nunca para pessoas sérias.

Infelizmente a criatividade no mundo organizacional não entra por decreto, e sim por um rigoroso plano estratégico no qual vai sendo rigorosamente disseminada e inserida na cultura organizacional através das pessoas partindo-se dos altos escalões até as pessoas mais simples. Isso leva tempo, é verdade, mas quanto acontece não tem quem segure essa empresa, a Motorola é um caso mundial de disseminação de criatividade na cultura da organização. Foram anos e anos de trabalho e investimento pesado. Geralmente o que mais constatamos é que muitas empresas querem implementar programas de criatividade, mas acreditam que bastam alguns cursos, para os seus empregados e ficando os seus executivos fora desse contexto porque “eles não precisam disto”.

 

No Brasil são poucas as empresas que têm programas focados na disseminação da criatividade na sua cultura organizacional e, a maioria delas não revela isso, porque na verdade consideram como um plano estratégico, mas cedo ou tarde os seus resultados organizacionais começam a mostrar que algo diferente está acontecendo e ai não dá mais para negar.

 

A Revista Exame, na sua edição de 21/06/2006, trás um artigo preocupante “Nota baixa para a criatividade”, nesse artigo resultante de uma pesquisa feita com 4.500 executivos brasileiro entre os anos de 1998 a 2004 e foram levantadas as características que estão mais presentes nos executivos; assim sendo enquanto a adaptabilidade, a comunicação e a liderança se mostraram como as habilidades mais trabalhadas e presentes, constatou-se que a ansiedade e a criatividade são as menos presentes. O pior apontado pela pesquisa é que a capacidade criativa dos executivos vem caindo ano a ano e atualmente já é mais baixa do que a média da população.

 

Em outras palavras as pessoas que precisam “ver com novos olhos”, buscar alternativas de negócios, enxergar novas oportunidades, ver os problemas de forma diferenciada, saber analisar oportunidades estão com seu nível de criatividade tão em baixa que pode se explicar porque se copia tanto no mundo dos negócios hoje em dia. Os incrementos de melhoria de um são imediatamente copiados por outros desde as coisas mais simples as mais complexas, justamente porque essa capacidade criativa está em baixa.

 

Cada vez mais é necessário que as empresas que estão em franco progresso comecem a estudar e pesquisar o pensamento dos seus clientes antes mesmos dos clientes imaginarem o que desejam em outras palavras as empresas de sucesso serão aquelas que possuem em “estoque de idéias estratégicas” os produtos que os clientes irão pensar em pedir no futuro.

 

Isso parece loucura, mas constatamos, hoje em dia, que as pessoas estão cada vez mais exigentes, e – por outro lado – cada vez mais exigentes e o pior é que muitas vezes, muitas vezes mesmo não sabem o que querem exatamente comprar. Cabe às empresas inteligentes e verdadeiramente criativas ocupar rapidamente esse espaço.

 

Recentes pesquisas comprovam que apenas 39% dos produtos que são propostos pelas equipes de marketing entram no processo de desenvolvimento; só 17% têm o processo concluído; destes 8% são introduzidos no mercado, no entanto só 1% alcança o sucesso desejado.

 

Portanto, falando-se mais objetivamente 99% do trabalho para gerar produtos é perdido! Será que a culpa de tudo isso é apenas dos empregados? Da competição? Da economia desenfreada?

 

Na verdade, contatou-se também que uma grande parte dos novos produtos lançados no mercado não foi desenvolvida com a finalidade de atender as necessidades, aspirações e desejos do mercado. Em suma, foram produzidos pensando-se apenas no que as empresas desejavam oferecer; ou seja, a estratégia empresarial levou muito pouco em consideração o que as pessoas estão querendo comprar.

 

Essa mesma pesquisa constata um outro aspecto interessante, cerca de 70% dos altos gerentes das empresas não deram uma contribuição significativa para a definição final dos produtos e, além disso, foram muito poucos os que se envolveram efetivamente com a definição desses produtos.

 

Infelizmente, esse escasso envolvimento dos executivos na geração de novos produtos é um comportamento ainda muito comum nas organizações. Isso acontece porque, na maioria das vezes, eles acreditam que estão mais envolvidos em outras atividades mais prioritárias para poderem “perder ou gastar o seu tempo precioso” em reuniões “pouco importantes” com o objetivo de gerar novos produtos. E, é justamente esse comportamento gerencial que irá influenciar no atitudinal criativo dos empregados; ou seja, quando os empregados são encorajados por seus próprios gerentes a serem criativos, quando lhes é permitida a oportunidade de gerarem e testarem novos produtos, mais cedo do que se espera dos resultados empresariais começam a mostrar sinais.

 

Mas, o grande desafio é: Como estimular a criatividade na organização sem que haja a participação efetiva dos seus gerentes? Ainda hoje constatamos que muitas delas acreditam que apenas criando espaços bonitos, agradáveis e muitas vezes milionários para os seus empregados trabalharem, como num passe de mágica eles se tornarão criativos. Já outras acreditam que para seus empregados se tornarem criativos é necessário apenas investir num curso de “dicas” sobre como ser criativo.

 

Aprendemos nas escolas, desde a infância, que para cada problema existe apenas uma solução certa e quanto mais rápida responder as questões mais “inteligentes” seremos considerados. Por este motivo, quando chegamos ao mundo organizacional continuamos com a síndrome da “resposta rápida” e conseqüentemente resolvendo problemas sem pensar muito.

 

Por outro lado, a criatividade não vem sendo estimulada nos bancos escolares, justamente porque o nosso sistema educacional é muito mais focado nas nossas fraquezas do que nas forças; e ainda muito cedo vamos sendo estimulados a competir uns com os outros através de notas, medalhas e classificações. Muitos de nós acreditamos que para crescer profissionalmente e atingirmos o sonhado sucesso precisamos competir uns com os outros, ao invés de construirmos redes colaborativas e nos apoiarmos mutuamente em busca de um objetivo comum.

 

Assim, para darmos o primeiro passo em busca da desejada e necessária transformação das nossas organizações e instituições, os seus dirigentes precisam compreender – principalmente – que para que os seus colaboradores consigam desenvolver o seu espírito criativo é necessário que os seus gerentes também dêem o exemplo. Portanto, não existem dúvidas que é possível prepararem-se ambientes para que se tornem mais receptivos ao trabalho com o pensamento criativo; mas uma coisa é certa, quando o clima favorável à criatividade é ativado e as pessoas entendem os princípios da responsabilidade em agir como um indivíduo criativo constata-se uma profunda transformação na ambiência.

 

Todavia, para que possamos ajudar efetuar uma mudança nas atitudes de pensamento e conseqüentemente atuarmos de maneira pró-ativa nas nossas ações pessoais ou profissionais, precisamos olhar – profundamente – para dentro de nós mesmos; porque cada um de nós poderá ter a oportunidade de vir a exercer algum tipo de cargo (público ou privado) e, mesmo sem saber, serviremos como exemplo para dezenas de pessoas que estarão observando as nossas atitudes.

 

(*) Fernando Viana

Presidente da Fundação Brasil Criativo

fbcriativo@fbcriativo.org.br

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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